• Nenhum resultado encontrado

O cartão-postal corporativo na Europa

Agora que o MacHeath está de volta à cidade É melhor você trancar as portas, e chamar a polícia Porque o MacHeath está de volta à cidade283

A cidade-empresa no período exílico

Sabe-se que Match Point (2005) deveria ser ambientado em Nova York, mas Woody Allen reescreveu o roteiro para Londres por problemas de financiamento nos Estados Unidos. O diretor revelou que não pôde filmá-lo em sua cidade, pois os executivos dos estúdios cinematográficos queriam interferir no filme, exercendo uma espécie de censura de mercado. Em entrevistas, Allen afirmou que filmaria Match

Point em Nova York, porém, por conta de entraves no financiamento do filme, teve que reescrever o roteiro para Londres, “o que foi fácil de fazer, pois Nova York e Londres são tão parecidas. As mudanças foram apenas cosméticas.”284 Seguindo esse raciocínio, Wall Street poderia ser substituída pela City londrina sem maiores alterações.

No entanto, a partir de uma primeira análise dos “Papeis de Woody Allen”e ao comparar as diferentes versões de Match Point285 encontramos algumas das modificações que foram feitas por Allen e sua equipe: desde a adequação dos nomes dos personagens – há um estudo encomendado pelo diretor sobre os nomes e sobrenomes mais utilizados para as classes alta e baixa na Inglaterra286– até a indicação das especificidades dos bairros287 e a estratificação social por meio dos sotaques e variedades linguísticas. Esse documento encontra-se no arquivo intitulado “Notas sobre WASP 2004” 288 que revela, entre outras informações, algumas das mudanças realizadas para as filmagens em Londres. Uma das mais significativas é a       

283 Trecho traduzido da canção “Mack the Knife” (1928), da versão em inglês da Ópera dos três

vinténs, de Marc Blitzstein, Bertolt Brecht, Eugen Berthold e Kurt Weill.

284 Matloff, Jason. “Woody Allen’s European Vacation”, In: JasonMatloff.com. 2010. Disponível em: <http://jasonmatloff.com/selected-articles/woody-allens-european-vacation/>. Acesso em 10 de out. de 2015.

285 In: Match Point (film); 2005; Woody Allen Papers, Box 23, Folder 1-4; Manuscripts Division, Department of Rare Books and Special Collections, Princeton University Library.

286 Idem, ibidem. Por exemplo, há a sugestão dos nomes Ed e Ted para os personagens da classe baixa. Entre os nomes femininos, Chloe aparece como o mais registrado em 2002 e Eleanor como “um bom nome para mães de classe alta.”

287 Idem, ibidem. Indicação do local para situar a galeria de arte de Chloe: “a galeria de arte dela, se for para ser em um lugar que esteja na moda, deveria localizar-se na parte Leste de Londres (HOXTON) ou Whitechapel. As galerias de arte mais tradicionais ficam em torno das ruas Bruton ou Abermale fora de Piccadilly.”

passagem de Wall Street para a City (o centro financeiro de Londres). Por exemplo, em um fragmento de diálogo, o personagem Tom Hewett (Matthew Goode) afirma: “Desde o dia em que nasci foi dito que eu seria um príncipe de Wall Street.” 289 Nas “Notas sobre WASP 2004”, há a correção desta passagem para Londres: “[...] eu entendi que trabalharia na City.” Ou ainda, as anotações sobre o personagem Chris Wilton, o qual nesta versão do roteiro chamava-se Leo:

*Você precisa localizar as origens do Leo em algum lugar longe o bastante de Londres para que ele não conheça bem a cidade. Poderia ser Liverpool, Newcastle, Manchester, Birmigham, ou Edinburgh ou Glasgow. Qualquer lugar que você escolher exigirá que o ator principal tenha um pouco de sotaque correspondente à área.290

O ator Jonathan Rhys Meyers é irlandês e, no filme, conforme demonstramos no mestrado, o personagem interpretado por Meyers, o professor de tênis Chris Wilton, utiliza o mesmo sotaque de seus alunos, o RP291: em diversos momentos da narrativa, a origem irlandesa do personagem é retratada no contexto da elite inglesa, demonstrando a questão do preconceito de classe na família Hewett e as tentativas do protagonista de não falar de seu passado. Dessa maneira, no confronto dos arquivos com o filme, observa-se o trabalho atento na passagem do contexto norte-americano para o europeu, especialmente, no retrato das classes sociais. No caso específico de

Match Point, trata-se da representação do chamado WASP norte-americano transposto para o contexto da classe alta inglesa.

Em inglês, o substantivo wasp designa o inseto vespa. Em O Conto

Maravilhoso do Tsar Saltan, de Aleksandr Púchkin, uma das transformações do príncipe Guidon para visitar o seu pai, o tsar Saltan é em uma vespa. Na versão em inglês, a última metamorfose do príncipe em inseto foi traduzida para wasp292. Feita pelo cisne mágico, a transformação em insetos (mosquito, mosca e vespa) permite o voo do príncipe Guidon da Ilha de Buyan para a terra do Tsar Saltan. Conforme analisamos anteriormente na seção dedicada à A Era do Rádio, por meio da utilização       

289Woody Allen Papers, 2005, op.cit. 290 Idem, ibidem.

291 No arrivismo de Chris Wilton, a questão do sotaque como distinção de classe também é analisada. Em Match Point (2005), o irlandês utiliza a Received Pronunciation (RP), o sotaque “padrão” da realeza britânica e da aristocracia inglesa, usado pela família Hewett. No filme, observa-se a questão da pronúncia como distinção, elemento estratégico para a ascensão social do protagonista.

292 Pushkin, Alexander. “The Tale of Tsar Saltan, of His Son, the Glorious and Mighty Knight Prince Guidon Saltonovich, and of the Fair Swan-Princess”; translated by Louis Zellikoff. In: Marxists.org.

Dez.2001. Disponível em:

<https://www.marxists.org/subject/art/literature/children/texts/pushkin/tsar.html>. Acesso em 10 out.2015.

do interlúdio orquestral de Rimsky-Korsakov, “O voo do Zangão,” apresentado nos créditos de abertura do filme de Allen, introduz-se a questão da ingerência norte- americana no exterior e da intervenção corporativa na cidade. No conto de Púchkin, as metamorfoses do príncipe em inseto acompanham o desenvolvimento de sua ilha.

No caso das anotações sobre WASP nos filmes de Allen do período exílico, o termo refere-se ao acrônimo WASP (White Anglo-Saxon Protestant – branco, anglo- saxão e protestante). Utilizado muitas vezes de maneira depreciativa, WASP define um membro da classe alta dos Estados Unidos: “o topo da pirâmide social, cujos modos de vestir e agir foram amplamente imitados.”293 Nos verbetes dos dicionários consultados, o termo varia desde definições mais específicas, tais como: “o norte- americano cuja família originalmente veio do norte da Europa, especialmente da Inglaterra, e que é considerado parte do grupo mais poderoso da sociedade;” 294 ou ainda, “integrante da classe alta ou média, norte-americano, branco e protestante, considerado como um membro do grupo mais poderoso da sociedade;”295 como classificações mais gerais, “uma palavra para pessoas que são brancas e que têm dinheiro, poder, e oportunidades que outras pessoas não têm;”296 ou ainda, aquele “cuja família originalmente veio do norte da Europa, e é, portanto, parte de um grupo considerado muitas vezes como tendo mais influência e dinheiro na sociedade norte- americana.”297

Em estudo sobre a ascensão e queda da “Anglo-América,” Eric Kaufmann discorre sobre o predomínio da elite WASP nos EUA que mantém a sua influência hegemônica no país por meio do controle “de salas de reuniões corporativas, dirigentes universitários, clubes privados, subúrbios exclusivos, universidades de elite e escolas preparatórias.”298 De acordo com Kaufmann, a ascendência WASP funciona como um marcador de status:

A permanência de uma massa-cultural de Anglo-Saxonismo foi suficiente para convencer a maioria dos escritores nos anos 1950 e início dos anos 1960 [...] e mesmo aqueles provenientes do caldo de imigrantes para que tendessem a se conformar com um tipo ideal WASP, baseado em figuras como Lincoln e Washington. [...] A indústria norte-americana de cinema, por mais que fosse composta por um elevado número de católicos e judeus,

      

293 Disponível em: <http://www.pbs.org/peoplelikeus/film/wasp.html>. Acesso em 30 set.2015. 294 Disponível em: <http://www.merriam-webster.com/dictionary/wasp>. Acesso em 30 set.2015. 295 Disponível em: <http://www.oxforddictionaries.com/definition/english/wasp>. Acesso em 30 set.2015.

296 Disponível em: <http://www.macmillandictionary.com/dictionary/british/wasp_1>. Acesso em 30 set. 2015.

297 Disponível em: <http://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/wasp>. Acesso em 30 set.2015. 298 Kaufmann, Eric. The rise and fall of Anglo-America. Cambridge, MA: 2004, p.35.

reforçou o processo anglo-conformista para retratar os não-Anglo-Saxões em papeis secundários, e as figuras WASP (ou imitação-WASP) nos papeis principais dos americanos íntegros.299

O retorno do WASP norte-americano é um tema recorrente no cenário político norte-americano. O caso mais recente é o do empresário faraônico republicano Donald Trump, a mais propagandeada celebridade do momento entre os pré- candidatos à presidência dos EUA, que afirmou, entre inúmeros outros comentários xenófobos, racistas e machistas, que apesar de ser presbiteriano, ele pode ser considerado como o “último grande WASP norte-americano”300. Sobre a presente atuação de Trump nas primárias para as eleições presidenciais dos EUA, Allen afirmou:

Ele é repugnante e esse é o seu M.O. [modus operandi]. E está funcionando para ele, não funcionaria de uma forma séria, porque ele não ganhará a nomeação, e se ele fosse nomeado, seria engolido... como num deslizamento de terra. Ele sabe que não vai ganhar, então, ele pode pagar para ser repugnante. Jeb Bush não pode ser repugnante, porque o Jeb Bush é um candidato viável, Jeb Bush é um sujeito humano confiável e o Donald Trump é um entertainer. Ele é engraçado, grandiloquente... quanto pior, mais de mau-gosto forem as suas afirmações, mais linhas e espaço ele ganha. Conforme a eleição aproxima-se da realidade, ele vai desaparecer... Se fosse uma coisa Trump/Hillary ou Trump/Bernie Sanders, Trump/Biden, Trump/qualquer um, ele não teria chances de vencer. Ele é apenas um bom ator. Acho-o divertido. E conheço-o, de cumprimentá-lo em Nova York, ele foi sempre muito legal e afável. Utilizei-o em um filme uma vez e ele apareceu, é um ator muito extrovertido. Mas eu não o vejo, nem por um segundo, nem acredito que ele realmente veja a si próprio como um candidato sério à presidência. 301

Donald Trump faz o papel de si mesmo em Celebridade (1998). O filme constitui-se como uma reflexão sobre a cidade de Nova York na era Bill Clinton (1993-2001). O ano de 1998 marca o escândalo midiático, que quase custou o mandato do ex-presidente Clinton, por causa das relações sexuais extraconjugais que manteve com a estagiária da Casa Branca, Monica Lewinsky. Entre outros temas correlatos ao escrutínio da vida privada do casal Clinton, Celebridade marca a “vitória” da mulher traída302, a personagem Robin Simon (Judy Davis) – de professora       

299 Idem, ibidem.

300 Balz, Dan. “The Trump circus comes to Iowa.” In: Washington Post. 04 jun.2015. Disponível em: <https://www.washingtonpost.com/politics/the-trump-circus-comes-to-iowa/2015/06/17/35ae4e68- 1500-11e5-9518-f9e0a8959f32_story.html> Acesso em: 27 out. 2015.

301 Disponível em: <http://entertainment.suntimes.com/movies/woody-allen-donald-trump-entertainer- cant-win/>. Acesso em 30 set. 2015.

302 É sabido que as primárias norte-americanas são um show televisivo, no qual os candidatos atuam, entretendo o público sobre os rumos políticos do país. Além disso, conforme demonstramos na seção dedicada à análise do filme Annie Hall, os comediantes norte-americanos e outros trabalhadores da

primária para âncora de tevê. No filme, acompanha-se o efeito Pigmaleão303 de Robin. Após descobrir as inúmeras traições do marido, o jornalista Lee Simon (Kenneth Branagh), Robin transforma-se em repórter de programa televisivo, graças ao “seu príncipe encantado”, o empresário midiático Tony Gardella (Joe Mantegna), que ela encontra na clínica de cirurgia plástica do médico celebridade do momento. No novo emprego, a católica Robin, ex-professora especialista em Geoffrey Chaucer, autor dos

Contos de Canterbury304 (escritos entre 1386 e 1400), apresenta o programa “Almoço no au Bijou,” no qual entrevista celebridades da elite do poder reunidas no “restaurante mais fascinante de Nova York, no qual todos os dias há um pot-pourri dos residentes mais ricos e famosos da cidade”: uma corretora de imóveis dos “mais iluminados” novos residentes da cidade, um senador que sofre investigação no Ministério da Justiça por traição, uma jornalista “imperatriz das fofocas” e o empreendedor-imobiliário Donald Trump. Sorrindo para a novata repórter, o magnata Trump conta os seus novos planos para Nova York: “estou de olho na compra da Catedral de St. Patrick’s, talvez retirá-la, e construir um arranha-céu muito alto e bonito.” Desse modo, o filme apresenta uma radiografia, em preto-e-branco, das mudanças sofridas na cidade durante a era Clinton. Na abertura e desfecho de

Celebridade, a cena do filme dentro do filme, na qual observa-se um avião sobrevoando o skyline de Nova York para escrever a palavra HELP, sintetiza o pedido de socorro da cidade sob intervenção corporativa. Por meio da composição de quadros episódicos, o filme de Allen demonstra que a contemplação das celebridades é o bálsamo que une os cidadãos no mundo corporativo: eles buscam o mesmo efeito

Pigmaleão, a metamorfose WASP observada no voo de Robin305.

       

mídia estadunidense colaboram nas eleições redigindo discursos, fazendo apresentações para as campanhas dos candidatos e conduzindo entrevistas. Nesse sentido, o sucesso televisivo de Hillary Clinton nos debates para as eleições primárias democratas e o escândalo Donald Trump, nas republicanas, retomam os temas trabalhados pelo filme Celebridade.

303 A peça Pigmaleão (1912), de Bernard Shaw, é frequentemente readaptada para o cinema, os casos mais conhecidos são o filme homônimo de 1938, de Anthony Asquith e Leslie Howard; e Bonequinha

de Luxo (1961), de Blake Edwards. A questão da pronúncia combinada ao arrivismo é tema recorrente na obra de Allen. No caso mais recente, o efeito Pigmaleão foi retrabalhado pelo cineasta no filme

Magia ao Luar (2014). Pode-se dizer que em Zelig (1983), semelhante processo caracteriza-se como efeito camaleônico, no qual o personagem adapta-se constantemente, levando à aniquilação do sujeito e ao fascismo.

304 No filme Os contos de Canterbury (1972), Pier Paolo Pasolini reelabora a estrutura episódica da obra de Chaucer para compor uma crítica ao conservadorismo. Celebridade deve ser entendido como uma retomada desta tradição épica de Chaucer e Pasolini, entre outros.

305 Em inglês, robin significa um passarinho, o pintarroxo. Os personagens mais famosos que possuem esse nome no imaginário da cultura de massa norte-americana são: Robin Hood, o herói mítico inglês que roubava dos ricos para dar aos pobres; e Robin, o amigo do blockbuster Batman.

Essa cosmética das elites norte-americanas, copiada internacionalmente, ao que tudo indica, não exige coerência religiosa ou de origem. No WASP norte- americano atual, tudo pode variar, menos o dinheiro: membros de diferentes credos e procedências sociais consideram-se parte, ou tentam imitar o modo-de-vida, desta fatia cheia de privilégios da elite norte-americana. Por exemplo, o escritor Joseph Epstein306 identifica a tentativa de WASPificação entre os judeus norte-americanos bem-de-vida:

Por muito tempo, os judeus bem-de-vida nos Estados Unidos foram trancados para fora das instituições sociais e comerciais WASP – os clubes de campo elegantes, as principais universidades Ivy League,307os escritórios e bancos mais conhecidos e bem-frequentados, as grandes corporações, os subúrbios elegantes [...]. Uma geração mais nova passou agora a dar nomes WASPy para os seus filhos, de maneira que, hoje temos pares de nomes cômicos, tal como, Tyler Ginsberg, Mackenzie Rosenthal, Hunter Fefferman, Kelly Rabinowicz, e outros absurdos. E o mesmo acontece com os clubes de campo judaicos. O próprio clube do Madoff, o clube de campo Palm Beach, cujos membros provaram ser tão frutíferos para o tio Bernie, é um pouco raro não carregar um nome WASPish, como tantos outros clubes judaicos que conheço em Chicago—Bryn Mawr, Briarwood, Ravisloe, Twin Orchard, Green Acres [...]— uma imitação de nomes tradicionais de clubes de campo WASP.308

Em outro texto, Epstein defende o retorno da casta WASP para “moralizar a política” e vocifera contra a meritocracia na política norte-americana: “confiança, honra e caráter: elementos que deixaram a vida pública dos EUA com a saída do predomínio da cultura WASP, que não foi absorvida pelos meritocratas.” 309 Citando um financista amigo seu, Epstein argumenta que a crise de 2008 poderia ter sido evitada se houvesse uma moralização da política, esses “‘porcos gananciosos’ sem um pingo de caráter ou de preocupação com os seus clientes e o seu país. Naturalmente, acrescentou, todos eles têm mestrado nas melhores escolas de negócios do país.”310 Entre os inúmeros crimes cometidos por Madoff, responsável pelo “maior esquema de       

306 Epstein considera-se um membro do culto: “Jamesianos, nós nos chamamos, menos frequentemente Jacobitas, e nos dedicamos à propagação e santificação da obra de Henry James (1843-1916).” In: Epstein, Joseph. “The James Cult.” The New Criterion, 10/1/2012, Volume 31, Issue 2, p.1.

307 Ivy League: a Liga da Era, formada por universidades tradicionais norte-americanas localizadas no nordeste dos EUA, de alto nível acadêmico e prestígio social: Brown, Columbia, Cornell, Dartmouth, Harvard, Pennsylvania, Princeton e Yale. Disponível em: <http://www.merriam- webster.com/dictionary/ivy%20league>. Acesso em 10 out. 2015.

308 Epstein, Joseph. “Bernie Madoff and the Jews.” In: Newsweek. 01 set.2009. Disponível em: <http://www.newsweek.com/bernie-madoff-and-jews-77977>. Acesso em 30 set. 2015.

309Epstein, Joseph. “The Late, Great American WASP.” In: The Wall Street Journal. 23 dez.2013.

Disponível em:

<http://online.wsj.com/news/articles/SB10001424052702304367204579268301043949952>. Acesso em 30 set. 2015.

fraude na história dos EUA,”311 Epstein considera o erro mais grave, a traição de sua tribo:

Madoff embebedou os ricos, mas ele parece ter-se especializado em embebedar os judeus ricos. O espetáculo apresentado por um judeu fraudando judeus é em si mesmo uma descarga de interesse. [...] Os judeus são suficientemente tribais para pensar vagamente nos seus correligionários como família, e que o Madoff tenha trapaceado a sua própria família, por assim dizer, tira, supõe-se, algum tipo de estigma antissemita, fazendo do Madoff, igualdade de oportunidades, um verdadeiro filho da *. Esse epíteto, eu prometo a vocês, é um eufemismo para a maneira como muitos judeus sentem-se sobre Madoff enganando diversas instituições de caridade judaicas, retirando as suas doações – Hadassah, Yeshiva University, Fundação Elie Wiesel para a Humanidade – levando algumas delas à falência. Em uma boa inversão de Robin Hood, Madoff roubava dos pobres para dar a si mesmo.312

Além do roteiro de Match Point, nos “Papeis de Woody Allen” analisados pela presente pesquisa, encontra-se o título “WASP 2014”313 na primeira capa de

Magia ao Luar. A história desenvolve-se nos anos 1920 em uma cidade europeia, “por hora, Berlim,”314 no entanto, por conta das mesmas questões de financiamento, Allen filmou o roteiro do projeto “WASP 2014” sobre “magia e ilusões,”315 uma “sensação internacional”316 na Riviera Francesa. O filme trata, entre outros aspectos, do casamento entre a norte-americana arrivista social, Sophie (Emma Stone), e o lorde/mágico inglês, Stanley (Colin Firth). A ideia de que a crise de 2008 passou como um grande passe de mágica do sistema financeiro transnacional retorna no filme de 2014 – reelaboração da “Ópera dos três vinténs” (1928), de Bertolt Brecht e Kurt Weill. Para citar apenas um breve exemplo, a música “Mack the knife” é tocada ao piano, enquanto os dois mágicos trocam velhos truques. Não é preciso avançar muito para dizer que o roteiro de 2014 guarda semelhanças com o episódio Madoff, o “mágico de mentiras”317.

      

311 Yang, Stephanie. “5 Years Ago Bernie Madoff Was Sentenced to 150 Years in Prison – Here’s How His Scheme Worked.” In: Business Insider. 01 jul.2014. Disponível em: <http://www.businessinsider.com/how-bernie-madoffs-ponzi-scheme-worked-2014-7>. Acesso em 27 out. 2015.

312 Epstein, 2009, op.cit.

313 In: Magic In the Moonlight (Screenplay); 2013; Woody Allen Papers, Box 49, Folder 8; Manuscripts Division, Department of Rare Books and Special Collections, Princeton University Library.

314 Idem, ibidem. 315 Idem, ibidem. 316 Idem, ibidem.

317 O título de uma das biografias mais conhecidas sobre Madoff, escrita pela jornalista Diana

Documentos relacionados