• Nenhum resultado encontrado

Caso da Empresa Brasileira de Aeronáutica EMBRAER

5. ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS SOBRE DISPENSA COLETIVA

5.1 Caso da Empresa Brasileira de Aeronáutica EMBRAER

A EMBRAER é uma empresa nacional fabricante de aeronaves executivas, militares e de médio porte, no qual, em fevereiro de 2009, dispensou cerca de 4.200 trabalhadores em São José dos Campos/SP, número equivalente a 20% de seu número total de empregados naquela época, em decorrência da crise mundial, pelo cancelamento de pedidos feitos de aviões, gerando uma perda econômica que se aproximava em 5 bilhões de dólares.

Diante da dispensa, o sindicato, representante dos trabalhadores, ajuizou dissídio coletivo, discutindo a nulidade das despedidas, já que não havia sido observada a negociação prévia com o sindicato, pois evidenciou-se que não houve qualquer interesse e intenção de negociar por parte da empresa, violando o direito à informação e à boa-fé, os princípios democráticos da relação entre capital e trabalho no mundo contemporâneo, como também normas internacionais, entre elas a Convenção nº 98 da OIT e as Recomendações nº 94 e 163, no qual pregam a necessidade do empregador de comunicar de forma clara e transparente a decisão de demitir.

De acordo com Eduardo Soto Pires, “Na fundamentação da ação, argumentou-se ainda que o Direito Comparado demonstraria que a negociação coletiva é um requisito prévio obrigatório, segundo o estabelecido por vários ordenamentos jurídicos na regulação da dispensa coletiva.”56

Além do pedido de nulidade, os trabalhadores requereram uma medida cautelar para suspender os efeitos da dispensa coletiva de todos os trabalhadores envolvidos, sendo deferida pelo TRT-15, já que entendeu que estavam presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, determinando, ainda, a suspensão de futuras dispensas que seriam efetuadas pela empresa em razão da crise econômica.

56 PIRES, Eduardo Soto. Demissões coletivas: lições para a sua regulamentação futura pelo sistema jurídico

No dia determinado, as partes tentaram a conciliação na audiência, mas não chegaram a um acordo final para solucionar o caso, tendo a requerida juntado sua defesa, no qual argumenta que a redução de trinta por cento dos pedidos levou à decisão de redução do contingente de pessoas envolvidas no processo produtivo e que, caso contrário, estaria comprometida a saúde da empresa e a condição de trabalho dos cerca de 17 mil empregados que lá trabalham. Além disso, afirma que o direito brasileiro não disciplina a dispensa coletiva nem mesmo limita de forma explícita as dispensas individuais e coletivas, nem as condiciona à negociação coletiva.

Após as tentativas de conciliação, o TRT-15 apresentou sentença de mérito, no qual confirmou os termos da medida cautelar e entendeu que as dispensas são abusivas, já que não se observou um período prévio de negociação com o sindicato representante dos trabalhadores, como também nem foi oferecido um Programa de Demissão Voluntária – PDV. Apesar do caráter abusivo da extinção dos contratos de trabalho, ficou determinado que não existia direito de readmissão dos trabalhadores, pois não havia direito à estabilidade ou à garantia de emprego.

Outrossim, ficou determinado que a empresa deveria dar preferência aos trabalhadores atingidos, durante dois anos, em caso de futuro processo seletivo para cobrir a abertura de postos de trabalho na empresa, sempre que estes reúnam as qualificações exigidas para os postos disponíveis.

Ao fim, foi publicada a ementa declarando a abusividade da dispensa coletiva diante da ausência de negociação prévia, observe:

CRISE ECONÔMICA - DEMISSÃO EM MASSA – AUSÊNCIA DE PRÉVIA NEGOCAÇÃO COLETIVA – ABUSIVIDADE – COMPENSAÇÃO FINANCEIRA – PERTINÊNCIA. As demissões coletivas ou em massa relacionadas a uma causa objetiva da empresa, de ordem técnico-estrutural ou econômico-conjuntural, como a atual crise econômica internacional, não podem prescindir de um tratamento jurídico de proteção aos empregados, com maior amplitude do que se dá para as demissões individuais e sem justa causa, por ser esta insuficiente, ante a gravidade e o impacto socioeconômico do fato. Assim, governos, empresas e sindicatos devem ser criativos na construção de normas que criem mecanismos que, concreta e efetivamente, minimizem os efeitos da dispensa coletiva de trabalhadores pelas empresas. À míngua de legislação específica que preveja procedimento preventivo, o único caminho é a negociação coletiva prévia entre a empresa e os sindicatos profissionais. Submetido o fato à apreciação do Poder Judiciário, sopesando os interesses em jogo: liberdade de iniciativa e dignidade da pessoa humana do cidadão trabalhador, cabe-lhe proferir decisão que preserve o equilíbrio de tais valores. Infelizmente não há no Brasil, a exemplo da União Europeia (Directiva 98/59), Argentina (Ley n. 24.013/91), Espanha (Ley del

Estatuto de los Trabajadores de 1995), França (Lei do Trabalho de 1995), Itália (Lei

nº. 223/91), México (Ley Federal del Trabajo de 1970, cf. texto vigente - última reforma foi publicada no DOF de 17/01/2006) e Portugal (Código do Trabalho), legislação que crie procedimentos de escalonamento de demissões que levem em

conta o tempo de serviço na empresa, a idade, os encargos familiares, ou aqueles em que a empresa necessite de autorização de autoridade, ou de um período de consultas aos sindicatos profissionais, podendo culminar com previsão de períodos de reciclagens, suspensão temporária dos contratos, aviso prévio prolongado, indenizações, etc. No caso, a EMBRAER efetuou a demissão de 20% dos seus empregados, mais de 4.200 trabalhadores, sob o argumento de que a crise econômica mundial afetou diretamente suas atividades, porque totalmente dependentes do mercado internacional, especialmente dos Estados Unidos da América, matriz da atual crise. Na ausência de negociação prévia e diante do insucesso da conciliação, na fase judicial só resta a esta Eg. Corte, finalmente, decidir com fundamento no art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil e no art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho. Assim, com base na orientação dos princípios constitucionais expressos e implícitos, no direito comparado, a partir dos ensinamentos de Robert Alexy e Ronald Dworkin, Paulo Bonavides e outros acerca da força normativa dos princípios jurídicos, é razoável que se reconheça a abusividade da demissão coletiva, por ausência de negociação. Finalmente, não sobrevivendo mais no ordenamento jurídico a estabilidade no emprego, exceto as garantias provisórias, é inarredável que se atribua, com fundamento no art. 422 do CC – boa-fé objetiva - o direito a uma compensação financeira para cada demitido. Dissídio coletivo que se julga parcialmente procedente. (TRT-15 - DC: 333 SP 000333/2009, Relator: JOSÉ ANTONIO PANCOTTI, Data de Publicação: 30/03/2009)

Dessa decisão de mérito, a EMBRAER interpôs recurso ao TST, com pedido preliminar de concessão de efeito suspensivo aos efeitos jurídicos da decisão recorrida, o que foi acolhido, gerando a suspensão de tais efeitos até que fosse julgado o mérito do recurso.

Ao analisar o mérito, o TST reformou a decisão da instância inferior, pois declarou a legalidade das dispensas, afirmando que não houve qualquer violação ao princípio da boa-fé por parte da empresa. Apesar de tal entendimento determinou, por meio de uma técnica de formação de precedentes chamada de signaling57, que em situações futuras, a negociação coletiva prévia com o sindicato será requisito de validade das dispensas coletivas, observe:

Em síntese: as dispensas coletivas de trabalhadores, substantiva e proporcionalmente distintas das dispensas individuais, não podem ser exercitadas de modo unilateral e potestativo pelo empregador, sendo matéria de Direito Coletivo do Trabalho, devendo ser submetidas à prévia negociação coletiva trabalhista, ou, sendo inviável, ao processo judicial de dissídio coletivo, que irá lhe regular os termos e efeitos pertinentes. Neste ponto, para casos futuros, a d. Maioria da SDC fixou a premissa (embora a d. Maioria, para o caso vertente nestes autos, não reconheça abusividade ou falta de boa-fé objetiva na dispensa massiva perpetrada – até mesmo porque a premissa aqui fixada não era ainda acolhida na jurisprudência até então dominante). (TST - RODC: 309001220095150000 30900-12.2009.5.15.0000, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 10/08/2009, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: 04/09/2009)

Dessa forma, percebe-se que o poder potestativo do empregador em casos de demissão coletiva fica relativizado, já que se torna necessária a participação dos sindicatos

para defender e representar os direitos da categoria, corroborando com a ideia de que a dispensa coletiva, diferentemente da individual, exige a aplicação de normas especificas, como também foi salientado no acórdão:

A dispensa coletiva, embora não esteja tipificada explícita e minuciosamente em lei, corresponde ao fato econômico, social e jurídico diverso da despedida individual, pela acentuação da lesão provocada e pelo alargamento de seus efeitos, que deixam de ser restritos a alguns trabalhadores e suas famílias, atingindo, além das pessoas envolvidas, toda a comunidade empresarial, trabalhista, citadina e até mesmo regional, abalando, ainda, o mercado econômico interno. É um fato manifestamente diferente da dispensa individual. (TST - RODC: 309001220095150000 30900-12.2009.5.15.0000, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 10/08/2009, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: 04/09/2009)

A EMBRAER insatisfeita com parte da decisão do Tribunal Superior do Trabalho, apresentou Recurso Extraordinário ao STF, alegando que o acordão violou diversos dispositivos constitucionais e que o TST, ao criar condições para a dispensa em massa, estaria atribuindo ao poder normativo da Justiça do Trabalho tarefa que a Constituição reserva a lei complementar, como previsto no art. 7º, inciso I, invadindo assim a esfera da competência do Poder Legislativo.

O TST inadmitiu a remessa do recurso ao Supremo, levando a empresa a interpor agravo, que foi provido pelo relator, Ministro Marco Aurélio, para dar prosseguimento ao RE. Ao submeter o processo ao Plenário Virtual do STF, foi verificada a repercussão geral em 2013, sobre o entendimento do TST que determinou a exigência de negociação coletiva para que uma empresa possa promover a demissão em massa de empregados. O mérito do recurso não foi analisado pelo Plenário da Corte até o presente momento.

Isto posto, deve ser reconhecido o caráter determinante dessa decisão do TST, pois ao estabelecer a premissa que dever-se-á negociar previamente a dispensa coletiva com os trabalhadores da empresa, fica clara a importância da negociação coletiva e mostra-se a necessidade de se prever um instrumento legal que determine a sua obrigatoriedade durante o procedimento da dispensa em massa, além de definir, caracterizar e diferenciar a dispensa coletiva da dispensa individual.

Enquanto se aguarda o julgamento da constitucionalidade da premissa, fica a ideia como uma mera recomendação às empresas para praticar o instituto de solução de conflitos, visando a redução de efeitos da extinção do contrato, medida que pode ser estipulada em acordo ou convenção coletiva, ou seja, legitimada pela vontade das partes.

5.2 Caso da Sociedade de Assistência à Maternidade Escola Assis Chateaubriand -

Documentos relacionados