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VI.2. As ONGD e os ODM

VI.2.2. Categoria 4: outros projetos e iniciativas referidos pelas ONGD

Fora do âmbito das ONGD, a maior ação para a promoção dos ODM, referida numa das entrevistas, foi desencadeada pela RTP em 2010 com a 2ª série dos “Príncipes do Nada”. Esta série era composta

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por 13 programas em que cada um deles incluía duas ou três histórias de vida passadas em diferentes países de expressão portuguesa. Este programa apresentado por Catarina Furtado relatava na primeira pessoa o trabalho feito por organismos da ONU, organizações religiosas e pela cooperação portuguesa, através do IPAD (atual Camões) em países em desenvolvimento. Como se pode ler na descrição do programa no site da RTP

Esta nova série tem um dado novo e importante: a preocupação de traduzir para o espetador, através das pessoas que sofrem e dão a cara, o que são os oito objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), uma declaração assinada no ano 2000 por 192 Estados membros da ONU comprometendo-se até 2015 a erradicar a pobreza, promover a paz e alcançar os direitos fundamentais para todos13.

Face ao exposto anteriormente, podemos verificar que apenas três das cinco ONGD entrevistadas (FGS, Par-Respostas Sociais e IMVF) acabaram por criar projetos específicos, todos eles executados em Portugal na área de educação para o desenvolvimento. A Aidglobal incluiu os ODM em projetos já existentes que foram adaptados. E o CIDAC optou por não desenvolver projetos sobre os ODM. No que toca à cooperação para o desenvolvimento, não houve criação de projetos específicos que concorressem para os ODM nas ONGD entrevistadas, mas os temas destes objetivos, estavam de alguma forma em consonância com alguns dos projetos que já existentes na IMVF e CIDAC (embora não especificassem o nome do projeto).

As cinco organizações entrevistadas referiram que a partir de um certo período tornou-se obrigatório, em algumas candidaturas a financiamento, especificar para que ODM estavam a concorrer, e por isso foi importante encontrarem pontos de ligação com os projetos que já estavam a decorrer.

Sendo que estas agendas marcaram o enquadramento de todo o mundo associativo das organizações de desenvolvimento, tornou-se difícil para as ONGD mais críticas estarem completamente fora do mesmo: “Ao longo dos anos, durante o período de vigência dos ODM, fomos trabalhando em temas que tocaram alguns dos temas dos ODM: educação, reforço para a capacitação, grupo de mulheres, etc. (…) muitas linhas de financiamento fazem menção aos ODM” (entrevista A). A FGS acrescenta ainda que mais difícil ter projetos fora da agenda dos ODM devido aos critérios das ajudas públicas: “As ONGD portuguesas neste processo foram um pouco empurradas a trabalhar os ODM, se não puséssemos ODM nas nossas agendas as ajudas públicas não vinham, as ajudas de outras entidades não chegavam, porque eles tinham de ter uma luz para poderem pôr nas estatísticas para apresentar” (entrevista B).

Os entrevistados advertem para uma das consequências de trabalhar fora dos temas dos ODM - projetos sem financiamento:

na altura dos ODM estava a trabalhar numa ONGD ligada à Saúde Mental que é um problema muito grave em países em desenvolvimento, sendo que existe uma grande necessidade de apoiar e dar formação, e não havia uma única linha de financiamento para a saúde mental. Era um flagelo, mas estava tudo focado nas agendas dos ODM (entrevista E).

13(rtp.pt/programa/tv/p26960).

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VI.2.2.1. Categoria 5: Aspetos positivos

Em relação aos aspetos positivos há unanimidade em apontar que os ODM, beneficiaram de uma campanha de comunicação bem construída, trazendo para o público em geral temas que até então estavam muitas vezes fora dos debates internacionais. Os ODM foram também identificados como um bom instrumento para trabalhar alguns temas: “Ter 8 temas isso foi bom porque começamos a ver que há aqui 8 temas fundamentais” (entrevista C)

A visão da Plataforma Portuguesa das ONGD sobre os ODM foi expressa num documento intitulado “Pós-2015: Uma agenda de Direitos Humanos” e está alinhada com a opinião das ONGD entrevistadas:

É inegável o contributo dos oito objetivos enquanto ferramenta de sensibilização de advocay e de recentramento sobre questões consideradas prioritárias, numa perspetiva de luta contra a pobreza e assente em princípios de dignidade e igualdade. Porém em época de balanços, existe igualmente um consenso generalizado do seu fator de distorção e de marginalização, ao constatar-se pouco ou nenhum progresso em determinadas questões-chave que não estão diretamente cobertas pelos ODM, como as desigualdades, o desemprego, a governação ou a questão da segurança dos Estados (Plataforma Portuguesa das ONGD, 2013: 2).

VI.2.2.2. Categoria 6: Limitações dos ODM

Independentemente de terem ou não criado projetos que concorressem diretamente para os ODM, as ONGD têm um olhar crítico sobre os mesmos.

Para o CIDAC, os ODM estavam apenas preocupados em tratar sintomas, em vez de se preocuparem com as causas da pobreza e das desigualdades nas relações comerciais entre países, e com as desigualdades na distribuição de riqueza:

A nossa perspetiva é que os ODM centraram-se mais em tratar causas imediatas (…) houve alguns progressos, mas por exemplo também houve situações em que pioraram”. Como exemplos disso os retrocessos a nível da rede de distribuição de riqueza, a nível ambiental com impactos na agricultura, na degradação do solo, alterações climáticas e concentração da riqueza e a inexistência de casos ligados à justiça social.

Para a FGS “[os ODM] não foram uma boa maneira para diminuir a pobreza, as desigualdades são ainda maiores”, referindo que apesar de ter havido algumas transformações “os ODM eram uma agenda que serviam outra coisa e não o desenvolvimento humano” (Entrevista C).

Por fim, todas as organizações referem o facto de vários temas terem ficado excluídos, como a igualdade de género e o trabalho digno “é uma agenda global, sim, mas eram apenas 8 e muita coisa ficou de fora” (Entrevista C).

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VI.3. As ONGD e os ODS