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Interlocução Propósito Adequação contextual

Fonte: Elaborado por mim.

Os parâmetros indicam a necessidade de realizar “ a ação solicitada ” e de “ cumprir o propósito dentro do contexto de produção solicitado ”. A meu ver, a necessidade de enunciados que indiquem o propósito do texto vai ao encontro da proposição de Austin (1962 [1990]) de que usamos as palavras não somente para descrever o mundo mas, também, para agir sobre ele e modificá-lo de alguma maneira.

Ademais, acredito que o propósito textual representa, em termos pragmáticos, a força ilocucionária do ato comunicativo (AUSTIN (1962 [1990]), sendo um elemento indispensável em tarefas comunicativas/pragmáticas. O valor da força ilocucionária existe em função do ato comunicativo que é despertado pelo próprio gênero discursivo, afinal, conforme afirma Deusdará (2013, p. 35), “os valores [ilocucionários] terão intensidade maior ou menor,

poderão ser compreendidos de forma distinta, dependendo do gênero em que estiverem inseridos”.

Em resumo, o propósito textual depende da força ilocucionária do ato discursivo que, por sua vez, é definido a partir da caracterização do gênero no qual a comunicação emerge. Bakhtin (2010 [1992], p. 281) aborda a questão da relação entre propósito e gênero ao 54 afirmar que

Em cada enunciado abrangemos, interpretamos, sentimos, a intenção discursiva de discurso ou a vontade discursiva do falante, que determina o todo do enunciado, o seu volume e as suas fronteiras. Imaginamos o que o falante quer dizer, e com essa idéia verbalizada, essa vontade verbalizada (como a entendemos) é que medimos a conclusibilidade do enunciado. Essa ideia determina tanto a própria escolha do gênero [...] quanto os seus limites e sua exauribilidade semântico-objetal. Ele determina, evidentemente, também a escolha da forma do gênero na qual será construído o enunciado.

Os parâmetros estipulam, também, que o examinando deve considerar o “ contexto de produção ” da tarefa. De acordo com Bronckart (2009), o contexto de produção diz respeito aos elementos que influenciam a organização do texto. Tais elementos pertencem a dois grupos distintos: o primeiro grupo está relacionado ao mundo físico e abarca o lugar de produção, o momento de produção, o emissor e o receptor do texto; o segundo grupo trata do contexto sociossubjetivo no qual identifica-se o lugar social de produção do texto, a posição social do emissor, a posição social do receptor e o objetivo da produção textual (o efeito que o emissor deseja produzir no receptor) (BRONCKART, 2009).

Ao considerar o contexto de produção, o examinando é convidado a mobilizar elementos de sua competência sociopragmática uma vez que é esta dimensão que permite que sejamos contextualmente apropriados em nossos atos discursivos. Assim, a necessidade de adequação contextual está atrelada à necessidade de observação do examinando aos papéis que os interlocutores desempenham durante o ato comunicativo. De um ponto de vista sociopragmático, penso que o papel dos interlocutores na construção e interpretação de sentidos vincula-se fortemente à relação que eles possuem (de distância e de poder, por exemplo) uns com os outros. O papel social dos sujeitos (descritos no quadro 18) é um fator que resvala sobre a questão da interlocução pois, conforme salienta Duranti (1986, p. 241), “o sentido é definido (e às vezes redefinido) coletivamente com base nas relações sociais”.

54 Penso que o propósito textual possa ser relacionado à intenção discursiva (nos termos bakhtinianos) e à força ilocucionária (nos termos austinianos).

Para obter pontuação máxima na tarefa, o exame observa se o examinando “ configura adequadamente a relação de interlocução no gênero discursivo proposto na tarefa ”. Isso está em conformidade com a perspectiva bakhtiniana sobre a linguagem - que está, por sua vez, em conformidade com a avaliação por meio de gêneros discursivos, como é o caso do Celpe-Bras - uma vez que “um traço essencial (constitutivo) do enunciado é o seu direcionamento a alguém, o seu endereçamento ” (BAKHTIN, 2010 [1992], destaques do autor).

A construção do sentido envolve, como ressaltado anteriormente, a constante negociação entre os interlocutores durante a interação. Desse modo, a questão da adequação contextual implica, também, na observância às variáveis contextuais/pragmáticas (como a distância e o poder entre os interlocutores, por exemplo) e ao grau de ameaça à face que cada tipo de tarefa demanda (BROWN; LEVINSON, 1987).

Por essa razão, penso que a presença da adequação contextual como fator avaliativo nos Parâmetros de Avaliação abrange elementos da pragmática como a (im)polidez, por exemplo, ainda que não haja menções explícitas a esse fator. A questão da polidez também está implícita, a meu ver, no tópico dos parâmetros referente à capacidade do examinando de relacionar “ o propósito do texto e a interlocução ”: para alcançar o propósito proposto pelo enunciado e para determinar as estratégias discursivas que serão utilizadas na produção textual, o examinando precisará considerar as relações entre enunciador e interlocutor.

A partir dessa breve análise sobre os parâmetro de avaliação e sobre as orientações do Manual de Orientações, pude identificar forte relação entre a interlocução (e o papel dos participantes), o propósito das tarefas e a necessidade de adequação contextual - itens considerados pelo Celpe-Bras - com pressupostos sociopragmáticos. Concluo, dessa forma, que questões relacionadas à pragmática subjazem ao construto e aos Parâmetros de Avaliação da Parte Escrita do Celpe-Bras. Na próxima seção, trato de como as tarefas do Celpe-Bras - em relação a sua estrutura e a seus enunciados - trabalham essas questões.

4.2 - A dimensão sociopragmática nos enunciados do Celpe-Bras

Conforme dito anteriormente, de 1998 até o momento, o Celpe-Bras contou com 43 edições do exame. Para a análise, selecionei as versões dos seguintes anos: 1998, 1999/1,

2003/1, 2003/2, 2008/1, 2008/2.1, 2013/1, 2013/2, 2019/1 e 2019/2, totalizando assim dez edições e 40 tarefas analisadas. As categorias de análise dos enunciados são:

Quadro 16: Categorias de Análise dos Enunciados

CATEGORIAS DE ANÁLISE DOS ENUNCIADOS