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CAPÍTULO I SOCIEDADE, TRABALHO E ESCOLA

1.2 CENTRALIDADE DO TRABALHO NA ORGANIZAÇÃO SOCIAL

Para iniciar as discussões sobre a centralidade do trabalho na constituição da sociedade humana, apresentamos uma síntese sobre a forma como as alterações ocorreram no modo de o homem perceber o seu próprio trabalho. Uma vida cheia de sentidos é possível a partir do trabalho.

As produções sobre a questão do trabalho do autor De Masi (2000) demonstram a necessidade de os sujeitos libertarem-se da ideia tradicional que relaciona o trabalho à obrigação. Por isso, há a proposta da simultaneidade entre trabalho, estudo e lazer. A partir disso, há uma espécie de mistura entre o tempo

livre, estudo e trabalho. Uma espécie de busca pela redistribuição do tempo dedicado ao trabalho e do tempo livre com concentração das nossas potencialidades.

Quando o trabalho é tomado como centro para discutir a organização social contemporânea, torna-se importante diferenciar qual o conceito de trabalho estamos nos embasando. É o trabalho, portanto, como unidade primitiva indissociável da educação do homem e não no plano ontológico. O trabalho como estruturante da sociedade salarial, com expressão do social, de forma intensa em ritmo e processo de interação social. Assim, para reverter a superexploração do trabalhador, torna-se necessária a reconstrução do pensamento social e da classe trabalhadora.

Diante das chamadas metamorfoses no mundo do trabalho, Antunes (2008) destaca o processo de heterogeneização, fragmentação e complexificação da classe trabalhadora. A ampliação da subproletarização acontece. Formas de trabalho parcial, temporário, subcontratado, terceirizado, vinculados à economia informal e outras formas de trabalho precário ficam evidentes. Desse modo,

[...] essas diversas categorias de trabalhadores têm em comum a precariedade do emprego e da remuneração; a desregulamentação das condições de trabalho em relação às normas legais vigentes ou acordadas e a conseqüente regressão dos direitos sociais, bem como a ausência de proteção e expressão sindicais, configurando uma tendência à individualização extrema da relação salarial. (ANTUNES, 2008, p. 49).

Como consequência da exploração da classe trabalhadora, as condições de trabalho apresentam-se precárias. Com tais condições, surge o que estudiosos da temática denominam como a sociedade dual. Para explicitar o significado de tal terminologia, Antunes (2008) destaca que os países de capitalismo avançados viram o decréscimo de empregos em tempo integral. Nesse mesmo período, eles assistiram a um aumento das formas de subproletarização, no caso, com a ampliação de trabalhadores informais.

As reformas ocorridas na forma de contratação do trabalhador, nas jornadas de trabalho e no modo de remuneração a partir de novas formas de trabalho11 são

exemplos das alterações na conjuntura global. Desse modo, a divisão advinda do modelo fordista cede espaço para a organização em rede (FREITAS, 2005). Todavia, essas reformas são vistas como contrarreformas. Há um desmonte dos direitos trabalhistas.

Ao acompanhar as mudanças no mundo do trabalho, surgem os termos como trabalhador flexível, com a prestação de serviços temporários. Estes ocorrem a partir de projetos que interferem na contratação do trabalhador. O fato gera insegurança permanente do trabalhador e impossibilidade de criar identidades. Consequentemente, a noção de classe de trabalho também não se efetiva. Ao decorrer de sua trajetória, o trabalhador realiza vários contratos e não tem a possibilidade de conhecer e participar dos ideais da classe de trabalho a que pertence. Há uma mudança muito rápida com as propostas de flexibilização. Outro ponto que fragiliza as categorias de trabalho é a ocorrência da terceirização.

Da mesma forma, o processo de desespecialização e polivalência dos trabalhadores é nítido e, por isso, transformam-se em trabalhadores multifuncionais. Tal afirmação deriva dos estudos de Antunes (2008), a partir das afirmações de Coriat, sobre os modos de produção. Nesse caso, as mudanças entre a implementação do fordismo, toyotismo e acumulação flexível.

As transformações ocorridas no mundo, ao longo da década de 1980, são complexas. O desenvolvimento da tecnologia é elevado e interfere nas relações de trabalho e de produção do capital (ANTUNES, 2008). A partir de então, o modelo fordista sofre um processo de influência muito grande e até mesmo sendo perceptível a sua substituição pelo padrão toyotista de produção. Com a situação das formas transitórias de produção, os direitos do trabalho também têm alterações profundas, sendo agora a participação do trabalhador um dos eixos centrais – entendendo tal participação como manipulatória do próprio trabalhador.

Sobre os direitos do trabalho, com as transformações na década de 1980, Antunes (2008) considera que

[...] são desregulamentados, são flexibilizados, de modo a dotar o capital do instrumental necessário para adequar-se a sua nova fase. Direitos e conquistas históricas dos trabalhadores são substituídos e eliminados do mundo da produção. (ANTUNES, 2008, p. 24).

Ao citar as características de um modo de produção a partir da transição entre os modelos de produção, Antunes (2008) analisa que o movimento de transformação no modo de produção não deve ser entendido a partir de uma visão que considera como um avanço em relação ao capitalismo da era fordista e taylorista. As questões referentes à participação devem ser analisadas também como forma de manipulação dos trabalhadores. O autor citado deixa evidente a

lógica despótica do fordismo e a lógica consensual do toyotismo. A concepção participativa traz a subsunção do ideário do trabalhador ao capital. Há a intensificação em relação à sujeição do trabalhador ao ideal capitalista e a sua participação também pode ser vista como forma de manipulação.

As transformações no mundo do trabalho repercutiram também no modo de sindicalização dos trabalhadores. Nota-se o fenômeno da dessindicalização especialmente na década de 1980 (ANTUNES, 2008). Como resultados, percebemos a fragmentação e a heterogeneização da classe que vive do trabalho. O processo excludente e parcial que a classe trabalhadora convive também é ampliado.

Com as quedas nas taxas de sindicalização, os movimentos de greve apresentam reduções. Agora, em uma mesma empresa, é possível encontrarmos operários em diferentes situações – estáveis e temporários, sendo que estes não possuem direitos de representação sindical. Assim, as dificuldades para o estabelecimento de uma consciência de classe dos trabalhadores são cada vez maiores:

Tudo isso dificulta ainda mais as possibilidades do desenvolvimento e consolidação de uma consciência de classe dos trabalhadores, fundada em um sentimento de pertencimento de classe, aumentando conseqüentemente os riscos de expansão de movimentos xenofóbicos, corporativistas, racistas, paternalistas, no interior do próprio mundo do trabalho. (ANTUNES, 2008, p. 68, grifos do autor).

As dificuldades para a união da classe trabalhadora estão acompanhadas de características de uma relação mais individualizada. A desregulamentação e a flexibilização do mercado de trabalho, o esgotamento dos modelos sindicais vigentes, a burocratização e a institucionalização das entidades sindicais com distanciamento dos movimentos sociais autônomos e, por fim, a utilização de métodos ideológicos para o processo de manipulação em substituição à repreensão são visíveis (ANTUNES, 2008).

Transformações no mundo do trabalho deixam nítido de modo cada vez mais crescente a intensificação e a exploração do trabalhador. Dessa forma, a flexibilização torna-se imprescindível. Nas palavras de Antunes (2008), com o modelo toyotista, os trabalhadores passam a ter:

Direitos flexíveis, de modo a dispor desta força de trabalho em função direta das necessidades do mercado consumidor. O toyotismo estrutura-se a partir de um número mínimo de trabalhadores, ampliando-se, através de horas

extras, trabalhadores temporários ou subcontratação, dependendo das condições de mercado. O ponto de partida básico é um número reduzido de trabalhadores e a realização de horas extras. (ANTUNES, 2008, p. 34).

Frente a tais elementos, questionamos sobre a perda da identidade do trabalhador. Ele exerce diferentes funções de acordo com as demandas do mercado. Nesse caso, referimo-nos aos trabalhadores de um modo geral e, posteriormente, problematizaremos sobre a condição dos professores em relação à tal intensificação do seu trabalho.

Diante das considerações realizadas sobre o trabalho, percebemos que a forma de organização dele, no modelo de produção capitalista, faz com que o ensino adquira cada vez mais elementos da lógica do produtivismo. O individualismo e a acumulação de riquezas burguesas são sua essência (SANTOS, 2012). A ideologia capitalista faz com que o princípio da meritocracia esteja presente nas escolas. Com isso, há um processo que mascara a real situação do professor. Ele assume a responsabilidade pela condição de precarização em que a docência se encontra e também pelo fracasso escolar.

A organização do trabalho na sociedade capitalista, em nossos dias, traz os elementos dos modelos taylorista e fordista (SANTOS, 2012). Esses modelos primam pelo trabalho dissociado, ou seja, realizado em etapas. O trabalhador vê-se impossibilitado de perceber a sua função a partir de um contexto, pois o fordismo é um meio de consolidação da indústria e do processo de trabalho, com elementos da produção em massa. A linha de montagem e o cronômetro são utilizados pela existência do trabalho parcelado. Nesse sentido, separar o momento da elaboração e o momento da execução caracteriza o fordismo um processo de trabalho predominante na indústria capitalista.

A partir de tais pontos, é possível analisarmos as proposições realizadas por De Masi (2000) no sentido do significado do trabalho para os sujeitos. Nada adianta passarmos um longo tempo realizando determinada atividade se esta não tiver um significado para nós. As análises presentes nos estudos de Masi (2000) demonstram a necessidade da redução da carga horária de trabalho para que o ser humano também tenha tempo livre para refletir e construir conhecimentos. A intenção é que o homem consiga ultrapassar o desempenho de funções apenas técnicas e rotineiras.

1.3 A ESCOLA E OS PROFESSORES COMO INTELECTUAIS