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CHINESES EM PORTUGAL: DADOS ESTATÍSTICOS

II. ENQUADRAMENTO TEÓRICO: CULTURA ORGANIZACIONAL CHINESA

2.4. CHINESES EM PORTUGAL: DADOS ESTATÍSTICOS

Segundo os números do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), dados confirmados por Y Ping Chow, um dos nossos entrevistados e presidente da Liga dos Chineses em Portugal, há mais de 20 mil cidadãos de nacionalidade e de ascendência chinesa (nem todos residentes legais), a viver em Portugal (mesmo se de acordo com os Censos de 201117, residiam, nesse ano, em Portugal 11 458 cidadãos de nacionalidade

chinesa), tendo-se registado, na última década, um acréscimo muito significativo, cerca de cinco vezes entre 2001 e 2011 e passou a ser a nona comunidade estrangeira residente em Portugal. Os chineses que chegam a Portugal são maioritariamente jovens casais, 76% das crianças de nacionalidade chinesa dos 0 aos quatro anos e 64% das crianças entre os cinco e os nove anos (idade escolar) já nasceram cá, mostra o estudo do Instituto Nacional de Estatística (INE)18.

Quase metade da população chinesa em Portugal vive na região de Lisboa, principalmente na capital, com destaque para a freguesia de Arroios. A população chinesa vive essencialmente do trabalho:

“para 75,7% dos cidadãos chineses com 15 ou mais anos, a principal fonte

de rendimento é o trabalho, seguindo-se “a cargo da família”19 com 17,8%. As

restantes formas de rendimento identificadas abrangem uma percentagem muito residual de indivíduos.” (Censos, 2011: 86)

A maioria da população chinesa exerce uma profissão: “de acordo com a condição perante a atividade económica, 64,6% da população chinesa é ativa e 63,6% da população está a trabalhar. A percentagem de desempregados entre a comunidade chinesa, à data dos Censos 2011, é de apenas 1%.” (Idem)

Esta população ativa está dedicada a lojas: “cerca de 42,5% da população chinesa

empregada tem como profissão vendedor em loja20, seguindo-se com 21,8% a profissão

de diretor ou gerente de comércio a retalho/grosso e 9% exerce a profissão de cozinheiro”

17De facto, tomando como referência o ano de entrada em Portugal dos indivíduos de nacionalidade chinesa, os Censos 2011 revelam que a grande maioria, 78,5% dessa população entrou no país a partir de 2000. O fluxo anual de entrada foi relativamente regular e constante, observando-se, no entanto, um crescimento em 2008, 2009 e 2010, coincidente com o período de crise económica verificado em Portugal e em vários países da UE.

18www.economico.sapo.pt, consultado em julho de 2014

19De referir que, de acordo com a metodologia dos censos, todos os indivíduos com menos de 15 anos são considerados “a cargo da família”. (Censos, 2011: 86)

20“A prevalência deste tipo de profissões está muito associada às atividades económicas que esta população

exerce, nomeadamente ao negócio das chamadas “lojas chinesas” que tem vindo a aumentar no nosso país.” (Censos, 2011: 86)

(Idem); verifica-se, assim, que os restaurantes passaram a ser secundários21, pelo que o

impacto da comunidade chinesa em Portugal pode medir-se pelo número de estabelecimentos: cerca de 300 restaurantes, quase 500 armazéns e entre 4.000 e 5.000 lojas, segundo contas do presidente da Liga dos Chineses em Portugal. Os indicadores do INE22revelam que 42,2% da população chinesa a trabalhar em Portugal é dona do próprio

negócio: “A atividade económica “Comércio a retalho e por grosso” concentra quase 72% da população chinesa empregada” (Idem). Uma parte significativa dos chineses em Portugal cria o seu próprio negócio. A população chinesa apresenta as taxas de empreendedorismo mais elevadas em Portugal – 22,2% em 1981 e 42% em 2011. (Figura: 3).

Taxa de empreendorismo23 da China em Portugal entre 1981 e 2011 China 1981 1 1991 2001 2011 Taxa de variação de empregadores 2001/2011

Taxa de variação de ativos 2001/2011

22,2 24,1 36 42,2 426,5 349,5

Figura 3 - Taxa de empreendedorismo da China em Portugal entre 1981 e 2011

Fonte: Censos, INE

Estes indicadores e esta vitalidade organizacional são representativos das particularidades da comunidade chinesa, claramente vocacionada para a instalação dos seus próprios negócios tão próprios nas áreas do comércio a retalho ou por grosso e da restauração. (Censos, 2011)

Figura 4 - Dados do RIFA24 sobre a comunidade chinesa em Portugal

(Fonte: sefstat.sef.pt, consultado em julho de 2014)

21“A restauração, com cerca 22% da população empregada, constitui igualmente uma das atividades económicas

mais tradicionais e antigas no nosso país, à qual associamos a presença desta comunidade ” (Censos, 2011: 86)

22www.economico.sapo.pt, consultado em julho de 2014

Ainda que tenham começado pelos restaurantes, agora apostam nas lojas, porque o investimento é menor e o negócio mais rentável, tal como explicou Y Ping Chow em entrevista à Lusa24. Também esclareceu que em 1979, quando Portugal estabeleceu

relações diplomáticas com a República Popular da China, "havia apenas algumas centenas de chineses no país, praticamente todos com passaporte de Taiwan", tal como ele próprio (ver IE em anexo 3). A partir de 1990, "registou-se um aumento significativo com a ajuda da regularização extraordinária da lei de imigração portuguesa".

Essa opinião é confirmada pelos dados do SEF: de acordo com este serviço, o número de pessoas de nacionalidade chinesa a residir em Portugal quase quadruplicou entre 1999, ano da transferência de Macau para a China, e 2007, passando de 2.762 para 10.448.

No entanto, importa, para o nosso estudo, tentar averiguar outros dados a respeito da população chinesa em Portugal: número de empresas, empresários, associações, crescimento desses números. Da pesquisa realizada verifica-se que, por ocasião do Dia Internacional dos Migrantes, 18 de dezembro, o INE apresentou um estudo que pretende caracterizar a população estrangeira residente em Portugal, analisando em particular as suas 12 maiores comunidades, segundo os resultados do Censos 2011. Nesse ano, e segundo os dados recolhidos, residiam em Portugal 394 496 estrangeiros representando 3,7% do total de residentes do país, um acréscimo de mais 70% relativamente aos valores de registados em 2001. Já posteriormente a esses censos, outros dados referem que os chineses foram a comunidade estrangeira residente em Portugal que mais cresceu em 2013, tendo aumentado 6,8 por cento em relação a 2012, totalizando 18.637 imigrantes, segundo um relatório do SEF (relembramos a dificuldade em apurar os números exatos, uma vez que a comunidade chinesa em Portugal continua a contar com muitos cidadãos ilegais).

Dos dados obtidos, observa-se que a comunidade chinesa é cada vez mais relevante e a sua permanência em Portugal ao longo dos últimos 30 anos tem permitido melhorar a intervenção económica, social e cívica dessa comunidade. Entretanto de há 30 anos para cá, como o explica Choi Man Hin, presidente da Associação de Comerciantes e Industriais Luso-Chineses, e como já referimos anteriormente, houve evoluções, tanto nas pessoas que chegaram como nos interesses envolvidos.25

24www.acidi.gov.pt consultado em julho de 2014 25www.ccilc.pt, consultado em maio de 2014

Com 20 mil a 21 mil cidadãos a viver em Portugal, sobretudo concentrados em Lisboa, faz sentido falar-se de uma Chinatown26, por exemplo, na Expo ou no Martim Moniz,

sendo que grande parte dos empresários é, neste espaço específico, da restauração e do pequeno retalho, e sendo a Chinatown entendida como algo cultural e não apenas comércio.

O Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo (RIFA), divulgado na cerimónia que assinalou os 38 anos do SEF27, indica que as únicas comunidades estrangeiras que

registaram um aumento do número de residentes em Portugal foram a chinesa e guineense sendo que a China em 2013 passou a ser a sexta mais relevante em termos de crescimento (18.637), com 6,8%.

Com o intuito de averiguar a presença da cultura organizacional chinesa nos negócios em Portugal e uma vez que os poucos dados existentes, quer relativos ao número de empresas chinesas em Portugal, quer ao crescimento desse mesmo número nos últimos dez anos, se apresentam consideravelmente discrepantes de acordo com os diversos institutos e ou estudos (esses assaz escassos) consultados. Entendemos como necessário estabelecer, também, a cronologia dos investimentos chineses em Portugal. Desde a compra de 21,35% da EDP pela China Three Gorges Corporation28 -

中国长江三 峡集团公司- foram vários os passos de investidores chineses em Portugal.

DATA Investimento Explicação sucinta

DEZEMBRO 2011

CTG compra 21,35% da EDP

A 22 de Dezembro de 2011, o Governo português anunciou a escolha da China Three Gorges Corporation (CTG) como comprador dos 21,35% da EDP que o Estado pôs à venda, por 2,69 mil milhões de euros.

FEVEREIRO 2012

STATE GRID29-国家

电力公司 - com

25% da REN

Na privatização da REN - Redes Energéticas Nacionais, a chinesa State Grid é um dos

26 Uma região urbana que contém uma grande população de chineses dentro de uma sociedade não-chinesa, como a do concelho de Sesimbra, desenvolvida pelo grupo Opway, um projeto imobiliário com e para empresários chineses e visa funcionar como um ponto de encontro para a comunidade chinesa em Portugal; www.expresso.sapo.pt, consultado em junho de 2014); ou a de Vila do Conde, Mindelo Park, de acordo com Y Ping Chow, com o melhor que se faz na China: produtos serão de marca chinesa, com qualidade superior ao que se está habituado a ver em Portugal, mas vendidos a preços acessíveis (www.ionline.pt); ou ainda no bairro da Mouraria, bairro escolhido por muitos chineses para morarem e trabalharem (www.dn.pt, consultado em junho de 2014)

27Em 1976 foi criado o Serviço de Estrangeiros, transformado, em 1986 em SEF através do Decreto-Lei n.º 440/86, de 31 de dezembro

28Empresa estatal de energia da China, www.ctgpc.com, consultado em junho de 2014 29 Companhia Nacional da Rede Elétrica da China.

vencedores, ficando com 25% da gestora de infraestruturas, a troco de 387 milhões de euros. FEVEREIRO

2012

ICBC -中国工商银行

- instala-se em lisboa

O ICBC - Industrial and Commercial Bankof China abre em Lisboa, perto do Marquês de Pombal, o primeiro escritório em Portugal.

FEVEREIRO 2012

HUAWEI inaugura centro tecnológico

em Portugal

A chinesa Huawei30, presente em Portugal

desde 2004, inaugura a 15 de fevereiro de 2012 o seu novo centro tecnológico no País, um investimento de 10 milhões de euros, a acrescer aos 40 milhões já aplicados pela Huawei desde a entrada no mercado português.

DEZEMBRO 2012

CTG compra 49% da EDP Renováveis

Portugal

No âmbito dos compromissos da privatização, a Three Gorges acordou no final de 2012 a compra de 49% dos ativos eólicos da EDP em Portugal, por 359 milhões de euros.

FEVEREIRO 2013

Bank of China -中国

银行 - em Lisboa

À semelhança do ICBC, também o Bank of

China31 escolheu as imediações do Marquês de

Pombal para instalar as suas operações em Portugal. Em Fevereiro deste ano abriu os escritórios e um balcão de atendimento a clientes.

MARÇO 2013

Beijing Enterprises toma Veolia Water

Portugal

O Beijing Enterprises Water Group32, maior

operador do sector da água na China, anuncia a compra, por 95 milhões de euros, da Veolia

Water Portugal33, empresa francesa

concessionária do abastecimento de água em Valongo, Paredes, Mafra e Ourém.

30 Nome oficial: Huawei Technologies Co. Ltd. É uma empresa multinacional de equipamentos para redes e telecomunicações, www.tudocelular.com, consultado em junho de 2014

31 Banco estatal, nasceu em fevereiro de 1912 e é um dos maiores bancos da República Popular da China, consultado em www.bancosdeportugal.info, em junho de 2014

32 Uma das empresas líder no fornecimento de soluções de sistemas integrados para o setor da água, consultado em www.bewater.com.pt, em junho de 2014

33 Com a venda da atividade da água à Beijing Entreprises Water Group, o Grupo Veolia sai de Portugal, consultado em www.dinheirovivo.pt, em junho de 2014

MARÇO 2013 Hanergy Solar -汉能 ,给你力量 - negocia projetos em Portugal

Em março deste ano, a Hanergy Solar34 comunicou ao mercado ter encetado negociações para a compra de dois projetos fotovoltaicos em Portugal, com potência de 4,4 megawatts. As conversações, entretanto, acabaram por falhar.

MARÇO 2013

Chineses nos mármores

Ainda em março, o jornal "Expresso" deu conta de um projeto para a aquisição de 35% da empresa EDC Mármores, do Alentejo35, por parte de uma empresa chinesa, que investirá 24 milhões de euros em Portugal. Não houve até ao momento novidades sobre esse negócio. SETEMBRO

2013

FOSUN -复星集团 - quer seguros

No final de agosto de 2013, o governo português anunciou a escolha de duas propostas para a fase final de privatização do negócio de seguros da Caixa Geral de Depósitos: a norte-americana Apollo Investment e o grupo privado chinês, Fosun. Ganhou esta última que já tinha pago mil milhões de euros por 30% do mercado segurador português (Fidelidade e Multicare36). O grupo chinês Fosun assinou na quinta-feira, 15 de maio de 2014, com a Caixa Geral de Depósitos (CGD) a compra de 80% da Caixa Seguros.

ANO DE 2014

Papel decisivo dos vistos Gold

O investimento chinês em Portugal no âmbito dos Golden Visa tem sido “muito positivo” e cria postos de trabalho na saúde, no sector dos serviços domésticos, na restauração, no comércio.O Golden Visa tem permitido a Portugal captar muito investimento que de outra forma iria

para outros países37.

Figura 5 - Cronologia dos investimentos chineses em Portugal

34 Consultado em junho de 2014, em www.hanergy.com. 35 www.jornaldenegocios.pt, consultado em junho de 2014 36 www.publico.pt, consultado em junho de 2014

(Elaboração própria, a partir dos dados obtidos em www.jornaldenegocios.pt, consultado em julho de 2014)

Como reflexo da intensificação das relações económicas entre Portugal e a China, associações como a Câmara do Comércio e a Indústria Luso-Chinesa, cujo número de associados tem crescido substancialmente nos últimos anos, se têm assumido como importantes plataformas para a criação de parcerias estratégias entre empresas portuguesas, chinesas e claro está, as empresas portuguesas de capital chinês.38

A comunidade chinesa em Portugal é considerada uma comunidade fechada, com pouco contato com os costumes portugueses, uma comunidade que aparentemente mantêm os mesmos hábitos sociais que tinha na China:

“A vida organizacional da diáspora chinesa em Portugal está muito associada à sua cultura e à sua família, tendo como base as relações sociais, funciona com uma cultura de clã, autónoma e coesa, onde o espírito de entreajuda e solidariedade facilitam a sua integração no país de acolhimento.” (Patrício, 2010: 1)

De acordo com Igreja (2011)39, tal se justifica, em parte, porque “o desconhecimento

da língua portuguesa é claramente um grande entrave ao relacionamento entre a comunidade chinesa e a portuguesa” (Igreja, 2011: 3), mas também, sempre segundo Igreja, porque o chinês “não participa em festas da comunidade portuguesa porque para si não tem significado” (Idem), ideia reforçada por Patrício que escreve a esse respeito:

“Outro fator que dificulta a integração da diáspora chinesa em Portugal é a pouca interação e convivência com os portugueses o que realça a necessidade de amadurecer uma atitude de mais abertura, disponibilidade

e conhecimento por parte do país de acolhimento.”(Patrício, 2010: 10)

A mesma autora explica ainda:

“Outra dificuldade apontada é o acesso às estruturas básicas sociais, principalmente a nível da saúde. Os conceitos de saúde e de doença para os chineses são representações culturais bem diferentes das portuguesas, pelo que é fundamental conhecer os seus valores, hábitos e costumes para uma melhor orientação e satisfação das suas necessidades, sempre numa atitude de parceria e não de imposição o que pode conduzir à ineficácia do

relacionamento.” (Patrício, 2010: 10)

Com o passar do tempo, no entanto, e especialmente se pensarmos nas gerações que nascem em Portugal e aqui estudam, observa-se que esta comunidade tem mais

38 www.ionline.pt, consultado em junho de 2014

contato com a cultura portuguesa. Diz Pereira à laia de explicação: “O facto de ter filhos na escola provavelmente facilitará o processo de aculturação.” (Pereira, 2009: 28)

No entanto, e tendo em conta a opinião de Ilhéu40, essa aculturação depende muito da situação social de cada pessoa: se for um chinês letrado, curioso, que trabalhe em contato próximo com portugueses em trabalhos que impliquem a troca de impressões e conhecimentos (professores, investigadores, artistas, …), muito mais depressa e de forma mais fácil se poderão observar as influências mútuas; no caso mais frequente do chinês que tem um negócio de pequena/média dimensão, a trabalhar quase exclusivamente com funcionários chineses e fornecedores chineses, o nível de aculturação é praticamente inexistente.

Apesar desta distinção, a literatura explica que os chineses adaptam-se à cultura do país de integração com alguma facilidade, especialmente as gerações já ali nascidas, mesmo se nunca se aculturam ao ponto de negar a sua origem, as suas tradições trazidas do local de origem e dos seus ancestrais, produto de uma civilização com mais de cinco mil anos. Normalmente, as comunidades de origem chinesa são muito discretas.

Na senda do exposto parece-nos importante recordar a opinião de Y Ping Chow (embora tal afirmação não faça prova da diferença da cultura chinesa) que numa recente entrevista, e quando questionado sobre o fenómeno de aculturação dos chineses em Portugal, respondeu:

“Se calhar sou como um galão, um café com leite. Já não sei bem o que é ser-se chinês. Ajo socialmente como português, mas ainda mantenho a profundidade de pensamento, de discernimento, de um chinês. A forma de trabalhar, de falar e atuar, é portuguesa, até porque o português é mais direto, gosto mais. O chinês tem uma maneira de falar diferente, é mais indireto, mais reservado. Se pensar se sou chinês ou português... Considero-me chinês, sinto-

me mais chinês. Sei lá, é uma mistura.”41

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