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CIBERESPAÇO E OS SEUS DESAFIOS

2 CAPÍTULO II O AGENTE INFILTRADO EM MEIO DIGITAL 2.1 SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

2.2 CIBERESPAÇO E OS SEUS DESAFIOS

Não podíamos deixar de fazer referência no nosso trabalho à noção de ambiente digital, também designado por ciberespaço, assim como das suas características, pelo motivo de ser este o meio em que a nossa figura do agente infiltrado se movimenta.

Já tínhamos anteriormente afirmado que o termo ciberespaço surge referenciado na obra de ficção científica de William Gibson “Neuromancer”, sendo este definido como uma rede de computadores que dá origem a um ambiente no qual circula uma enorme quantidade de informação e onde os utilizadores poderiam vivenciar ambientes ficcionados com efeitos no mundo real.

A visão de Gibson é a de que a maioria dos utilizadores mais se identifica sobre o que é o ciberespaço, em que temos pontos de acesso (computadores smartphone, etc.) a uma quantidade de informação, mas este ambiente vai mais longe, ao ponto que não gere um consenso alargado como podemos verificar pelas diversas noções que apresentamos em seguida.

O Departamento de Defesa Norte Americano designa o ciberespaço como um domínio global dentro do ambiente de informação, que consiste numa rede interdependente de infraestruturas de tecnologia de informação, na qual se incluem a internet, redes de telecomunicações, sistemas de computadores e os inerentes processadores e controladores.63

Michael Benedick propõe na sua obra “Cyberspace: First steps” uma definição de ciberespaço: “Ciberspace is a globally networked, computer- sustained, computer-accessed, and computer-generated, multidimensional, artificial, or "virtual" reality. In this reality, to which every computer is a window,

63 Department of Defense Dictionary of Military and Associated Terms p58, consultado em

54 seen or heard objects are neither physical nor, necessarily, representations of physical objects but are, rather, in form, character and action, made up of data, of pure information. This information derives in part from the operations of the natural, physicalworld, but for the most part it derives from the immense traffic of information thatconstitute human enterprise in science, art, business, and culture.The dimensions, axes, and coordinates of cyberspace are thus not necessarily the familiarones of our natural, gravitational environment: though mirroring our expectations ofnatural spaces and places, they have dimensions impressed with informational valueappropriate for optimal orientation and navigation in the data accessed.”64

Para este autor, o ciberespaço é um novo e paralelo universo, criado e mantido por computadores e linhas de comunicação, onde circulam conhecimentos e segredos. É uma realidade virtual, presente, ao mesmo tempo, em qualquer lugar e em lugar algum.

Não existe consenso sobre uma definição uniforme e universal de ciberespaço, mas podemos identificar algumas características. Assim, existe um consenso generalizado de que ele não se confunde com a internet, apesar de ser o seu principal e mais relevante ambiente. Neste sentido, o ciberespaço consiste, não só na Internet e nos computadores a ela ligados, mas também nos sistemas e equipamentos eletrónicos ligados com outros equipamentos ou

64 Consultado em http://mbenedikt.com/royal_swedish_academy.pdf p4, “O Ciberespaço é uma

realidade globalmente conectada em rede, sustentada por computador, com acesso por computador e gerada por computador, multidimensional, artificial ou "virtual". Nessa realidade, para a qual todo computador é uma janela, os objetos vistos ou ouvidos não são nem físicos nem necessariamente representações de objetos físicos, mas sim, em forma, caráter e ação, compostos de dados, de informação pura. Essa informação deriva em parte das operações do mundo natural, físico, mas em grande parte deriva do imenso tráfego de informações que constituem o empreendimento humano em ciência, arte, negócios e cultura. As dimensões, eixos e coordenadas do ciberespaço são: portanto, não necessariamente as palavras familiares de nosso ambiente gravitacional natural: embora espelhando nossas expectativas de espaços e lugares naturais, elas têm dimensões impressas com valores informacionais apropriados para orientação e navegação ideais nos dados acedidos.”

55 sistemas com quem partilham a mesma estrutura de energia. Temos ainda a perceção da perda de uma presença física, pois tudo desenrola maioritariamente no domínio ou ambiente virtual, num anonimato quase total. A noção de desmaterialização é imediatamente constatável porquanto no ciberespaço, na sua dimensão virtual, não há matéria, não existe nada de físico, tudo circula, flui e se armazena no ambiente virtual citado. Também a perspetiva de territorialidade é alterada, uma vez que não existem fronteiras para a comunicação, para a transmissão de dados.

Estas características entram em conflito com qualquer sistema normativo que tenha a sua base assente em dois princípios fundamentais: o Princípio da Territorialidade e o Princípio da Soberania.

O primeiro princípio traduz-se nas fronteiras territoriais (geográficas) que delimitam áreas, dentro das quais diversos conjuntos de normas são aplicáveis. O segundo princípio está relacionado com a necessidade de existência de uma autoridade investida de poderes para fiscalizar a aplicação de normas e, em caso de desrespeito, sancionar a infração.

A Internet trouxe consigo importantes fatores que põem em causa princípios jurídicos, tais como o aspeto transnacional de uma rede que não conhece fronteiras nacionais e a desmaterialização da informação. Perante o domínio digital e as novas realidades do ciberespaço, os Estados sentem-se ineficazes na aplicação do seu Direito interno. Acreditamos que este é um dos grandes desafios que o Direito enfrenta, mas também um enorme ponto de aproveitamento para a realização de ilicitudes.

Nestes tempos da era da informação, a Internet é um excelente veículo para as organizações com interesses na pedofilia ou no tráfico de seres humanos, na prostituição, bem como para todos os tipos de seitas religiosas. Perante o acesso rápido e desprotegido à informação, torna-se fácil para estas entidades conseguirem encontrar novos alvos, no primeiro e segundo caso, bem como novos interessados e afiliados, no terceiro caso. Se estes atores

56 pretenderem aumentar a possibilidade de não serem descobertos pelas autoridades, existem ainda outras redes como a “Darket”, na qual grande parte dos conteúdos se encontra indisponível para a maioria das pessoas, por ser necessário uma senha de acesso que dá entrada numa quase “secreta” Internet. Outras vantagens emergem diariamente nesta era da globalização como não termos necessidade de procurar por certos serviços, já que estes vêm até nós. São disso exemplo as facilidades bancárias para pedir empréstimos aos bancos que são enviadas diretamente para as nossas caixas de correio ou as compras on-line que nos possibilitam uma maior qualidade de vida e comodidade se pensarmos no desperdício de tempo que as levaríamos a fazer, proporcionando-nos tempo para outras atividades. Porém, em sentido inverso a todas estas facilidades que surgiram, temos o reverso da moeda que nos mostra episódios de crianças que são levadas até aos pedófilos ou de mulheres que são levadas até aos clientes para prestarem serviços de prostituição, em muitos casos, contra a sua vontade e sob ameaça de represálias.

De igual forma, o aumento da partilha de informação pessoal na Internet quer de imagens, fotografias, vídeos, relatos de atividades do dia-a-dia, através das redes sociais, tem também gerado novos desafios para o Direito, já que são cada vez mais os casos de extravio desses dados pessoais, furto de identidade ou de casos mais graves, como o Cyberstalking.

Por fim, cabe referir aquela que consideramos ser uma crescente ameaça do Ciberespaço: o Ciberterrorismo. Esta é uma ameaça cada vez mais comum e global que usa a Internet como meio de propaganda, para transmitir as suas mensagens, para causar o terror e como forma de recrutamento de novos afiliados, infiltrados e seguidores por todo o mundo. O principal epicentro deste fenómeno e talvez o mais catastrófico de todos os tempos foi o atentado de 11 de setembro às torres gémeas nos Estados Unidos da América, que colocou o mundo em constante alerta, com transmissões em direto dos próprios atentados.

57 As situações de risco apresentadas são realidades que no ciberespaço ganham contornos de globalização numa escala que acarreta grandes dificuldades de resolução para o Direito.