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3.4.1 – Ciclos de carga-descarga pelas oscilações do reservatório

A atuação de carregamentos cíclicos nos maciços de enrocamento produz uma série de efeitos que são caracterizados pelas mudanças de comportamento observadas principalmente por meio dos registros dos instrumentos instalados e algumas vezes até mesmo visualmente.

Os ciclos de elevação e rebaixamento no reservatório de uma barragem de enrocamento produzem alterações no estado de tensões da estrutura produzindo rearranjos de forma a atingir um novo estado de equilíbrio. Os fenômenos de quebra e fraturamento dos grãos/blocos bem como o deslizamento e rolamento são resultantes deste processo.

Na fase de elevação do nível de água, além do colapso, apresentado no item 3.2, ocorre um alívio de tensões na estrutura, devido à saturação dos materiais de montante da barragem, que estarão submetidos ao peso específico submerso. O alívio de tensões, por si só, poderia ocasionar “levantamento” na parte de montante das barragens.

Entretanto, do ponto de vista estrutural, não é suficiente considerar apenas este efeito, uma vez que mecanismos como quebra dos grãos e a perda de resistência devida ao colapso, provavelmente, se sobreporão ao alívio de tensões, o que se traduzirá em deformações no sentido gravitacional.

A importância da consideração dos efeitos de carga e descarga do reservatório foi reforçada por Cruz (1996). Este autor afirma que se estes efeitos não forem incorporados aos cálculos de deformações, as previsões nunca serão satisfatórias.

Maia (2001), ao avaliar a alterabilidade dos enrocamentos das barragens de Marimbondo (basalto) e Serra de Mesa (granito), realizou ciclos de carregamento, descarregamento e recarregamento para conhecer e, assim, avaliar sua influência no comportamento das estruturas construídas com estes materiais.

Nas Figuras 3.8, 3.9 e 3.10,

tipo de material: G = granito da barragem de Serra da Mesa M = basalto da barragem de Marimbondo estado de densidade: d = corpo de prova densificado (denso)

f = corpo de prova vertido (fofo) granulometria: o valor indicado representa o d50 das partículas

estado de umidade: i = amostra inundada durante o ensaio fase do ensaio: (c) = carregamento

(r) = recarregamento (i) = inundação do corpo de prova

As amostras de granito da barragem de Serra da Mesa foram consideradas sãs, uma vez que normalmente, os granitos não apresentam alterações físicas e químicas tão pronunciadas como os basaltos.

A Figura 3.8, corresponde ao ensaio de compressão simples em enrocamentos denso e fofo d granito da barragem de Serra da Mesa com granulometria 26 (d50 =

26mm).

Observa-se que durante o descarregamento e recarregamento até o nível de tensão do início do descarregamento (tensão de pré-carregamento), o material tem comportamento aproximadamente linear, com módulo de compressibilidade superior ao da fase de carregamento. Acima da tensão de pré-carregamento, o comportamento do material tende ao mesmo comportamento da fase de carregamento inicial do ensaio.

Segundo Maia (2001), os enrocamentos apresentam deformações predominantemente plásticas, fato justificado pelo rearranjo das partículas que geram deformações irrecuperáveis.

Este autor ressalta ainda que a compressibilidade na fase de descarregamento seja superior à da fase de recarregamento, mas que devido à influência do atrito interno entre as paredes da câmara utilizada no ensaio, pode-se considerar que os módulos, para os ensaios por ele realizados, são praticamente iguais.

Figura 3.8 – Comportamento cíclico dos enrocamentos de granito da barragem de Serra da Mesa (Maia, 2001).

A Figura 3.9, apresentada também por Maia (2001), indica que o módulo de compressibilidade dos enrocamentos densos na fase de recarregamento pode ser até três (3) vezes maior que o módulo do material no carregamento inicial.

Figura 3.9 – Curvas dos enrocamentos densos de basalto da barragem de Marimbondo (adaptado de Maia, 2001).

Para os enrocamentos fofos, Figura 3.10, verifica-se que o valor do módulo no recarregamento pode ser até dez (10) vezes maior que o módulo no carregamento inicial.

Figura 3.10 – Curvas dos enrocamentos fofos de basalto da barragem de Marimbondo (adaptado de Maia, 2001).

Considera-se que os ensaios realizados nos enrocamentos de granito da barragem de Serra da Mesa reproduzem, na verdade, não os enrocamentos sãos, mas

estes enrocamentos já alterados, uma vez que as amostras foram obtidas a partir de blocos de rocha em utilização na barragem, que estão expostos às condições ambientais no campo a aproximadamente 25 anos.

Maia (2001) ressalta que os resultados sejam representativos apenas para uma avaliação aproximada do comportamento dos enrocamentos, pois foram utilizadas câmaras de ensaio distintas, uma do Laboratório de Furnas, no Brasil e outra do Laboratório de Geotecnia do CEDEX, em Madri, Espanha.

Naylor (1991; citado em Cruz, 1996) recomenda que seja adotado um módulo de descarregamento/recarregamento da ordem de 4 a 5 vezes o valor do módulo de carregamento.

A autora desta dissertação entende que na fase de descarregamento (rebaixamento), o aumento do peso específico aparente dos materiais, não mais sujeitos ao empuxo hidrostático, aliado à redução da tensão confinante, ocasione maiores recalques que na fase de recarregamento, especialmente na porção montante das barragens.

No entanto, destaca-se que para quaisquer das fases de carregamento, recarregamento ou descarregamento, é importante considerar qual é o nível de tensão de partida, uma vez que o comportamento dos enrocamentos será distinto em função da tensão anterior.

Neste sentido, Fell et al. (2005) relatam que o enrocamento é susceptível de apresentar um módulo equivalente inferior do que em rebaixamentos anteriores do reservatório, se o reservatório for levado a um nível abaixo dos níveis mais baixos anteriores, ou seja, o enrocamento exibe tanto comportamento sobreadensado quanto normalmente adensado.

Esta constatação é muito importante para uma análise consistente do comportamento dos enrocamentos em barragens.

Ainda neste contexto, Liu (2005), ao realizar ensaios de carregamentos cíclicos em enrocamentos, observou que as deformações aumentam gradativamente com o aumento do número de ciclos. Nestes estudos, observou-se que os enrocamentos têm propriedades cíclicas de deformação maiores que as das areias, com as deformações cumulativas aumentando com os acréscimos de ciclos.

Para garantir a segurança das estruturas de enrocamentos, tais deformações cíclicas cumulativas não devem ser ignoradas, uma vez que a garantia da estabilidade destas estruturas passa obrigatoriamente pelo controle de deformações.