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A resistência ao cisalhamento entre duas partículas é a força que dever ser aplicada para causar um movimento relativo entre essas partículas. Segundo Lambe e Whitman (1969), a origem da resistência ao cisalhamento são as forças que atuam entre as superfícies das partículas. Sendo assim, a resistência ao atrito entre duas partículas é fundamentalmente da mesma natureza que a da resistência ao cisalhamento de um bloco sólido de aço, por exemplo.

No entanto, o entendimento da magnitude da resistência ao cisalhamento entre partículas envolve o entendimento dos fatores que influenciam a interação entre seus pontos de contato.

Pode-se resumir o efeito dessa interação dizendo que a resistência ao cisalhamento total (o produto da resistência de cada contato e o número total de contatos) é proporcional à força normal que une as duas partículas. Se esta força normal diminui, a resistência ou o número de contatos também diminui e então a resistência cisalhante total diminui. Portanto, diz-se que a resistência ao cisalhamento interpartículas é de natureza friccional.

Esta natureza friccional é traduzida em resistência devida ao atrito, que participa do processo de mobilização de resistência da estrutura granular.

Douglas (2002) acredita que a resistência ao cisalhamento dos enrocamentos para uma dada tensão confinante pode ser vista como uma combinação de um ângulo de atrito básico (resistência entre superfícies de rocha), φb, mais uma componente de

dilatância, menos uma parcela causada pela perda da aspereza do contato dos grãos devido ao esmagamento/cisalhamento. Desta forma, o ângulo de atrito, atualmente denominado de ângulo de resistência ao cisalhamento, será dado pela Equação 2.13.

quebra

b ψ φ

φ

φ = + − (2.13)

O valor de φb é um parâmetro fundamental para rochas intactas, e, segundo

cisalhamento dos enrocamentos. Este parâmetro é considerado quando as juntas rochosas não estão saturadas.

Segundo Barton e Kjaernsli (1981), os enrocamentos e as juntas rochosas têm várias características comuns, incluindo comportamento dilatante sob baixas tensões normais efetivas e significante quebra de pontos de contato com dilatância reduzida sob tensões elevadas.

Segundo estes autores, cada ruptura nos pontos de contato é resistida por ângulos de atrito fortemente dependentes do nível de tensão. Como exemplo, cita-se que o ângulo de atrito de pico drenado (φ’) de um enrocamento próximo do centro e na base de uma barragem alta pode ser inferior a 35°, enquanto que próximo ao pé da barragem o mesmo enrocamento pode exibir um valor de φ’ maior que 60°.

Estes autores destacam que o ângulo de atrito dos enrocamentos pode ser estimado pelo conhecimento dos seguintes parâmetros: resistência à compressão simples da rocha, o d50, o grau de esfericidade dos grãos (entendido como coeficiente de

forma) e a porosidade após compactação. O grau de esfericidade dos grãos e a porosidade determinam a magnitude da componente estrutural de resistência.

Conforme relatado anteriormente, se a resistência ao cisalhamento dos enrocamentos é função do nível de tensão, então a envoltória de Mohr-Coulomb é curva, podendo ser traduzida pela Equação 2.14 (Mello; 1977, citado em Neves, 2002). Esta equação mostra que a resistência ao cisalhamento dos enrocamentos obedece a uma relação do tipo exponencial.

τ = A (σ)b (2.14)

Onde τ é a resistência ao cisalhamento, σ a tensão normal e A e b são parâmetros característicos do material podendo ser obtidos por ajuste dos dados de ensaios. O parâmetro A é igual a tan φ para tensão normal unitária e b reflete as variações de φ com σ.

A Tabela 2.6, apresentada em Cruz et al. (2009), mostra alguns resultados de ensaios triaxiais realizados por vários pesquisadores, inclusive os parâmetros A e b.

Tabela 2.6 – Resultados de ensaios de resistência em enrocamentos (adaptado de Cruz et al., 2009). Material Ensaio Dmáx (mm) A (kPa) b φ1 Ref.

Basalto – São Francisco TR 200 1,68 0,79 59 Marsal, 1971

Diorito – Barragem El Infiernillo TR 200 1,00 0,90 45 Marsal, 1973 Granito-gnaisse-mica TR 200 85,32 0.90 41 Marsal, 1973 Conglomerado silicificado – Barragem El Infiernillo TR 200 1,53 0,79 57 Marsal, 1973 Granito-gnaisse-xisto/ Barragem Mica TR 200 78,45 0.94 38 Marsal, 1973 Basaltos - - 151,02 0.82 57 Mello, 1977 Basalto TR - 220,65 0.75 65 M. Neves, 2002 Grauvaca TR - 208,88 0.75 64 Intertechne Arenito – DR=85% 0,85 0,96 40 Marachi, 1969

Basalto Barragem Marimbondo

Pedreira TR - 213,78 0.79 64

Maia, 2001

Barragem (após 25 anos) TR - 171,62 0.85 62

Alterado TR - 156,91 0.88 61

Basalto – Campos Novos DS 51 135,33 0.892 54 Basso e Cruz,

2006 Gnaisse-xisto-micaxisto Itapebi DS 25.0 75.0 81,4 88,26 1 1 - Fleury et al., 2004 Enrocamento com 25% de material cimentado TR - 294,20 0.60 72º Peng Yii, 2006

Barragem Oroville TR - 1,12 0,82 48 Marachi et al.,

1969

φ1 – ângulo de atrito para σ = 98,0665kPa

TR – ensaio triaxial

DS – ensaio de cisalhamento direto

A Figura 2.10 apresenta envoltórias de resistência de enrocamentos ensaiados por Marsal (1973; citado em Cruz et al., 2009).

0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 0 1000 2000 3000 4000 5000

Resistência ao cisalhamento (kPa)

Pressão normal efetiva (kPa)

Basalto ‐ São Francisco Diorito ‐ El Infiernillo Gnaisse‐granítico  Barragem Mica X Gnaisse‐granítico  Barragem Mica Y Gnaisse‐granítico + 30%  xisto ‐ Barragem Mica

Figura 2.10 – Curvas de Mohr de alguns materiais granulares (adaptado de Cruz et al., 2009).

A análise desta figura mostra que as envoltórias são curvas, o que reflete uma redução no valor do ângulo de resistência ao cisalhamento, pois ocorre uma restrição à dilatância do sistema.

Apesar do comentário no item 2.31 sobre a dilatância ocorrer mais frequentemente em baixos níveis de tensão, ressalta-se que é válido analisar a mudança de volume durante o cisalhamento, uma vez que este fenômeno é importante para caracterizar a deformação plástica nos solos.

Dentro desse contexto, Mitchell e Soga (2005) relatam que o ângulo de atrito de pico mobilizado (φ’m) ou taxa de tensão cisalhante de pico consiste tanto do

imbricamento quanto do deslizamento friccional entre grãos.

Rowe (1962; citado em Mitchell e Soga, 2005) reconheceu que o ângulo de atrito mobilizado (φ’m) leva em conta tanto o rearranjo das partículas quanto a

resistência ao deslizamento nos contatos e a dilatância. Este autor afirma que a quebra de grãos, que aumenta em importância à medida que a pressão confinante aumenta e o índice de vazios diminui, também deve ser adicionada a estes componentes.

As interrelações gerais entre os fatores contribuintes para a resistência e a porosidade são representadas na Figura 2.11.

Figura 2.11 – Contribuições para a resistência ao cisalhamento de solos granulares (Rowe; 1962, adaptado de Mitchell e Soga, 2005).

Na Figura 2.11, φ’f é o ângulo de resistência ao cisalhamento corrigido pelo

trabalho da dilatância. Ele é influenciado pelo arranjo dos grãos e o deslizamento nos contatos. Quanto mais densa a amostra, mais importante é a dilatância. À medida que o índice de vazios aumenta, o φ’m diminui. O estado crítico é definido pela condição onde

não há mudança de volume pelo cisalhamento. Então o φ’m correspondente é o φ’crit.

Segundo o autor, o “atrito verdadeiro” mostrado na Figura 2.11 está associado à resistência ao deslizamento nos contatos.

Para porosidades menores, a resistência de pico é alcançada antes que ocorra movimento significante entre os grãos, o que indica que o trabalho de rearranjo é pequeno. A ruptura requer expansão volumétrica contra a tensão confinante, resultando na grande contribuição de dilatância mostrada. Se as tensões confinantes são muito altas, haverá menos dilatância, mas maior quebra para acomodar as deformações cisalhantes. Para porosidades maiores, o rearranjo de grãos se desenvolve antes da ruptura.

Com base nos aspectos apresentados, pode-se concluir que a resistência ao cisalhamento de materiais granulares depende de vários fatores que atuam

conjuntamente, tais como: mineralogia, tamanho e forma dos grãos, distribuição granulométrica, densidade relativa, estado e trajetória de tensões e tipo de ensaio. Deste modo, a seguir serão discutidos os principais fatores e suas implicações no comportamento dos enrocamentos.

2.4 – PRINCIPAIS FATORES INFLUENCIANTES NO