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“(...) no cinema temos um jogo de olhares, uma „polivisão‟, cuja natureza é difícil decifrar.”

Arlindo Machado

O cinema não foi idealizado com a intenção de servir à prática educativa formal. Almeida (1994) afirma que o cinema é fruto de um projeto artístico e cultural que se assume como produto de mercado. Não obstante o cinema não ter sido criado com a intenção formativa do sujeito, sua relação com a educação é estreita pelas próprias características comunicacionais verificadas em sua essência. Para Sá (1967, p.18), o cinema:

“Exerce grande poder sobre as massas e os indivíduos, graças à sua grande força sugestiva e ao impacto que provoca sobre a sensibilidade das diferentes platéias em conseqüência da diversidade de seus gêneros e dos grandes recursos técnicos de que dispõe. É uma língua universal”

Embora Almeida (1994) perceba que só recentemente têm surgido propostas de uso do cinema como recurso didático-metodológico na escola de maneira sistematizada - através de publicações que orientem o professor, é importante destacar que no Brasil, já na primeira metade do século XX, o cinema teve seu espaço idealizado e reservado à educação. É o que expressa o Boletim de Educação Pública, escrito por Anísio Teixeira em dezembro de 1934. No documento, Teixeira justifica a criação da “Divisão de Bibliothecas e Cinema Educativo” a partir do relato do Art. 7º do decreto nº 3.763, de 1º de fevereiro de 1932:

“Fica creada uma Bibliotheca Central de Educação, directamente subordinada ao Diretor Geral do Departamento de Educação disposto de uma secção de Filmotheca para incentivar o intercambio bibliographico e cinematographico, ou quaesquer outros que a estes se relacionem e coordenar as actividades referentes ás bibliothecas escolares e ao cinema escolar (...)” (TEIXEIRA, 1934, p.231).

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Teixeira (1934) tencionava estabelecer os termos organizacionais da Divisão de Bibliothecas e Cinema Educativo, que teria na “Filmotheca Central”, o centro natural de todas as atividades do cinema escolar. Foram aparelhadas 70 escolas, que recebiam por semana três filmes. Foram instituídos cursos destinados ao aprimoramento da cultura dos professores com relação às ações da Filmotheca, “esses cursos tiveram grande procura” (TEIXEIRA, 1934, p.239).

Em trabalho recente, Napolitano (2003) direciona algumas proposições frente à utilização do cinema em sala de aula. Para o autor, o papel do professor é fundamental “como mediador entre a obra (cinematográfica) e os alunos” (p.14), mesmo que sua atuação ao longo da exibição do filme seja passiva. É preciso aprender a estabelecer um diálogo com aluno diante das experiências cotidianas dele em torno do cinema, mas é importante aprofundar-se nas práticas:

“É preciso que a atividade escolar com o cinema vá além da experiência cotidiana, porém sem negá-la. A diferença é que a escola, tendo o professor como mediador, deve propor leituras mais ambiciosas além do puro lazer, (...) incentivando o aluno a se tornar um espectador mais exigente e crítico, propondo relações de conteúdo/linguagem do filme com o conteúdo escolar” (NAPOLITANO, 2003, p.15)

O autor destaca algumas dificuldades com relação ao uso do cinema em sala de aula, observando entraves estruturais do contexto da escola, como a falta de material adequado à exibição dos filmes e o tempo das aulas incongruentes ao tempo de duração das películas. O autor sugere atividades de acordo com as disciplinas, com os temas transversais e aqueles baseados no conteúdo e na linguagem dos filmes.

Com relação ao uso do cinema na escola, Napolitano (2003) destaca três categorias básicas no processo de ensino-aprendizagem: o conteúdo curricular, as habilidades/competências e os conceitos.

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O conteúdo curricular compreende adequação dos enredos dos filmes aos conteúdos dos diferentes componentes curriculares, de acordo com cada seguimento de ensino (fundamental e médio). Também são relevantes as proposições que buscam integrar as disciplinas. Nesse sentido, um mesmo filme pode alcançar o conteúdo de diversas disciplinas, fator que favorece a prática interdisciplinar. Os Parâmetros Curriculares Nacionais podem ser contemplados caso o conteúdo fílmico discuta aspectos em torno dos temas transversais.

Para Napolitano (2003) o trabalho sistemático com os filmes contribui para o desenvolvimento de diversas habilidades e competências, como leitura e produção de texto, capacidade narrativa e descritiva, decodificação de signos e códigos não-verbais, aperfeiçoamento criativo artístico e intelectual. De forma mais especifica, é possível oportunizar ao aluno o despertar crítico a uma atividade reconhecidamente importante à cultura humana. Assistir a cinema com um enfoque pedagógico conduz o sujeito a se tornar um consumidor mais exigente do ponto de vista qualitativo.

Os conceitos são retratados como temáticas que podem ser vistas de acordo com as peculiaridades das práticas pedagógicas utilizadas pelo professor. Para isso, é necessário identificar os argumentos presentes nos filmes que foram selecionados pelo professor como mote de debate, ou também, que surgiram a partir dos interesses dos alunos.

Ademais, as contribuições de Napolitano (2003) nos oferece uma estrutura conservadora se caso fizéssemos o exercício de cotejar suas ideias com aquilo que por ora apresentei até aqui, observando os estudo de Mídia-educação. Por isso, com o ensejo de continuar pelo caminho das tecnologias do audiovisual, mas seguindo a mesma orientação teórica traçada a pouco, sobretudo pelos ensinamentos de Belloni (2005) e passado adiante por Orofino (2005), cabe-nos aprofundar na perspectiva de uma pedagogia crítica que

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deliberadamente possa engendrar um universo educativo que valorize a autonomia dos estudantes. No caso específico do cinema, dois autores me parecem loquazes suficientemente para atender esta perspectiva, são eles Milton José de Almeida e Mônica Fantin. Sobre o primeiro, destacarei suas contribuições que enaltecem inquisitivamente a importância do cinema na educação como elemento da cultura humana que almeja não ser secundarizada; e sobre a segunda, seus registros experimentais quanto ao uso do cinema na escola.