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3. A PERFORMANCE AFRO-BRASILEIRA DO TERNO DE CONGO

3.2. O CORPO CONGADEIRO E AS PRÁTICAS INCORPORADAS DA

3.2.1.4. Ciranda Cirandinha

Ainda sobre as novas danças do Verde e Preto, nos ensaios para a Festa da João Vaz em 2015, o Capitão André Lúcio introduzira um novo canto com o refrão adaptado de um conhecido brinquedo cantado. Com a primeira e a segunda estrofe sendo cantada por uma das filas, enquanto a terceira e a quarta são cantadas pela outra, a adaptação do canto ficara com a seguinte letra:

Ciranda cirandinha / vamos todos cirandar Vamos dar a meia-volta / volta e meia vamos dar Olha que Festa boa / é dia de virar

Oi que Festa bonita / é a Festa da João Vaz

30 Abaixo serão discutidos alguns aspectos referentes aos ritmos executados pelo Verde e Preto, inclusive o rojão

Nos ensaios para a Festa da João Vaz/2015, fora observado como Bandeirinhas e Dançadores tentavam aprender a nova coreografia. Neste caso, a partir de algumas falas de André Lúcio, canto e dança foram criados juntos, um em sintonia com o outro.

Na execução da nova dança, sempre que cantada a primeira metade da segunda estrofe, Dançadores e Bandeirinhas realizam um giro de 180º em torno do próprio eixo do corpo. Estes, então, imediatamente, enquanto cantam a segunda metade da mesma estrofe, realizam um giro inverso, retornando de costas para a posição inicial. Estes movimentos são feitos de forma ininterrupta, e em tom de brincadeira, por todos que os realizam. Também foi observado, entre os congadeiros, um sutil caráter de desafio, dada a dificuldade da execução de toda a sequência, seguida da volta do corpo no tempo certo para a continuação do cortejo.

Na Festa de Catalão em 2015, no final do grande cortejo para a entrega da coroa, à frente de um grande palco destinado às autoridades, cada Terno se apresentou, tendo o seu nome, bem como o dos Capitães, mencionados no microfone por um apresentador. De vez em quando o apresentador entregava o microfone para o Capitão cantar, instigando ainda mais os Dançadores e Bandeirinhas, além do público em geral. Nesta edição da Festa, quando o Verde e Preto se aproximou deste palco, o Capitão André, durante o calor do cortejo, com um jogo de olhares e meias palavras, solicitara ao Capitão Osório a permissão para cantar a Ciranda Cirandinha em frente ao palco, o que foi consentido por seu superior na hierarquia do Terno.

Neste momento, os congadeiros do Verde e Preto dançavam, tocavam e cantavam intensamente, ao som dos aplausos do público e da animação dos Generais diante do Terno. Enquanto este momento acontecia, diante do grande êxtase à qual os presentes estavam envolvidos, percebi a felicidade de Osório Alves, que dançava a alguns passos atrás. Seu semblante era de satisfação e a minha interpretação deste momento é de que seu olhar parecia dizer que o Verde e Preto estava com seu lugar garantido por muito tempo na Festa de Catalão, mesmo em caso da sua ausência. Algo que não pode deixar de ser mencionado é que diante desses fluxos das tradições, em algumas situações os mais velhos, geralmente, portadores da prerrogativa do conhecimento, se colocam também como aprendizes dos saberes produzidos pelos mais novos.

Conforme já mencionado no primeiro capítulo, apesar da centralidade que o Verde e Preto exerce na Festa da João Vaz, a Festa de Catalão, de uma forma geral, mas principalmente para Osório Alves, representa uma espécie de consagração para os Dançadores. Ao que parece, importância que os Congadeiros atribuem à participação do Verde e Preto na Festa de Catalão vincula-se a uma multiplicidade de sentidos e interesses,

que não são percebidos, com exclusividade, em um ou outro indivíduo, podendo se fazer presentes, simultaneamente, em diferentes congadeiros. Alguns destes sentidos vinculam-se ao sagrado; à fé; ao lazer; ao passeio; o rever velhos amigos e parentes; à historicidade e tradição da festa, representando maior proximidade com os saberes e forças ancestrais; entre tantos outros.

Dentre as considerações que alguns Dançadores do Verde e Preto ressaltaram a respeito da importância da Festa de Catalão, destacam-se: o tempo de sua existência; o fato do Verde e Preto sempre ter participado, desde o seu surgimento; a quantidade de congadeiros na cidade; o vínculo com tradições mais antigas; e a mobilização da cidade – inclusive com a presença de alguns serviços públicos como guardas de trânsito, além de certidões, autorizações e alvarás expedidos pela prefeitura.

Destarte, o canto e a dança “Ciranda Cirandinha31”, acabou demonstrando a característica já ressaltada no Verde e Preto, pelos Capitães Osório e André Lúcio, quanto ao potencial criativo do Terno, principalmente, no que diz respeito ao processo criativo das danças, alcançando a sua consagração no Terno durante a Festa de Catalão/2015. Nos dizeres de alguns Dançadores, é possível que no ano seguinte outros Ternos entoem o mesmo canto e realizem a mesma dança, ou com pequenas mudanças. Apesar de suas especificidades, parte do sentimento de reconhecimento e legitimidade de alguns congadeiros do Verde e Preto passa pela aprovação de performance na comunidade congadeira catalana. A possibilidade de verem elementos produzidos e manifestados pelo Verde e Preto em outras guardas de Catalão, representa a consagração de sua performance no território consagrado de sua tradição.

Sobre a relação do Verde e Preto com os Ternos de Catalão, Osório conta que quando o Verde e Preto fora criado, a cor da calça era branca, e diante da semelhança com a farda de um dos Congos de Catalão, que se diferenciava apenas pela cor da faixa utilizada na cintura, o Congo da Vila João Vaz foi informado pela Irmandade de Catalão, sobre a necessidade de modificar a cor do fardamento para que o mesmo não fosse confundido durante a Festa. A partir desse momento a calça branca foi substituída pela preta, enquanto a faixa, que era preta, tornou-se amarela.

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Figura 52 - Croqui do fardamento masculino. Desenhado por Veruska Bettiol.

Figura 53 - Croqui do fardamento feminino. Desenhado por Veruska Bettiol.

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