• Nenhum resultado encontrado

5 – CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA INDÚSTRIA DE GÁS NATURAL

CAPÍTULO I – CUSTOS DE TRANSAÇÃO NA INDÚSTRIA DE GÁS NATURAL

I. 5 – CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA INDÚSTRIA DE GÁS NATURAL

Nesta seção iremos analisar as cláusulas dos contratos da indústria de gás natural. Segundo Klein (apud Santos, 2004), o contrato é um mecanismo que permite aos agentes da transação realizar esforços conjuntos de produção, minimizando os riscos de ruptura de forma oportunista nas transações. Para Lyons (1996) um contrato entre duas partes possui como funções básicas: garantir uma troca eficiente e distribuir os ganhos da troca. Dessa forma, um contrato ideal seria aquele que obedecesse tais funções básicas. Porém a incerteza comportamental

19

presente nas transações faz com que o uso eficiente das cláusulas contratuais e dos contratos completos nas transações seja limitado.

A possibilidade de mudanças de preços gerais e relativos, que podem tornar impróprios os preços acordados no futuro, as imperfeições nos mecanismos garantidores de conduta e estratégicas durante a vigência do contrato, possibilitam o surgimento de conduta oportunista por parte dos agentes. Para minimizar esta incerteza comportamental os contratos utilizam mecanismos de monitoramento e de criação de incentivos, conhecidos como cláusulas de esforço (Santos, 2004). Veremos adiante tais cláusulas utilizadas dentro da indústria de gás natural, que reduzem a incerteza comportamental e distribuem o risco oriundo de investimentos em ativos específicos.

Segundo Almeida (2005, p. 11), os contratos na indústria de gás natural “são acordos, firmados entre duas partes, que determinam as características da transação, segundo: condições de quantidade e de qualidade do produto; locais de entrega, prazo; preço, e, garantias para ambos os lados.”

Segundo Almeida (2005), os contratos na indústria de gás natural que podem ser de venda de gás ou serviços de transporte podem ser qualificados como relativos ao tempo. Estes podem ser divididos em critérios de duração e de continuidade. No critério de continuidade de fornecimento de gás existem dois tipos de contrato: o contrato firme, que é contrato de comercialização de gás ou de serviços de transporte, em que o fornecimento deve ser feito de forma interrupta até o final da quantidade/capacidade contratada; e o contrato interruptível, que é o contrato de comercialização de gás ou de serviços de transporte, em que é possível interromper

o serviço de acordo com cláusulas contratuais previamente acordadas, sendo estas regulamentadas ou não pelo regulador.

Em relação ao critério de duração, os contratos de compra e venda de gás ou de serviço de transporte podem ser de longo ou curto prazo. O contrato de longo prazo, sejam eles firmes ou interruptíveis, possuem duração geralmente superior a um ano (o prazo mínimo para que o contrato seja considerado de longa duração varia de acordo com o país). Estes contratos também permitem uma folga de flutuações diárias ou mensais. Os contratos de curto prazo, sejam eles interruptíveis ou firmes, possuem duração geralmente inferior a um ano (o prazo máximo para que o contrato seja considerado de curta duração varia de acordo com o país). A indústria de gás natural, ao longo dos anos, utilizou com maior freqüência contratos de longo prazo, pois estes se adaptam melhor as suas especificidades.

Ao analisarmos os contratos de longo prazo da indústria de gás natural, podemos observar que estes possuem cláusulas de esforço que buscam a diminuição da incerteza a respeito da distribuição da renda futura e possibilidade de hold-up. Tais cláusulas podem ser divididas pelos critérios de cláusulas relativas a preços ou cláusulas não relativas a preços (sendo estas com cláusulas de fornecimento e mecanismos de arbitragem).

As cláusulas contratuais relativas a preço procuram diminuir a incerteza sobre a variação imprevisível do preço futuro do bem ou do serviço durante a vigência do contrato. Ao diminuir o risco desta incerteza, diminui-se também, a possibilidade de hold-up. Tais cláusulas estão diretamente relacionadas com a distribuição de renda entre os agentes.

O ideal seria que as cláusulas de preços refletissem o custo de oportunidade dos agentes. O diferencial entre o preço pago pelo agente e o seu custo de oportunidade pode ser usado como indicador de competição na indústria de gás natural. A competição no mercado de gás natural será maior na medida em que menor for a diferença entre o preço pago pelo agente e o seu custo de oportunidade (Pinto Jr., 2002). Em mercados competitivos (spot) o custo de oportunidade se iguala ao preço pago pelo agente na transação, mas em contratos de longo prazo pode haver disparidade entre estes fatores. Assim, o agente que tiver perda de sua renda tentará, através de cláusulas contratuais, redistribuir a renda e minimizar a suas perdas.

Segundo Santos (2001), podemos dividir as cláusulas relativas a preços da seguinte forma: contratos de preços de mercado; contratos de preço fixos; contratos do tipo cost-plus; e contratos indexados. A diferença entre esses contratos se refere às características das regras de ajuste, quanto mais idiossincrática a transação, menor será a eficiência de suas regras que usam índice de preços gerais.

Os contratos de preços de mercado são utilizados apenas em estruturas de governança não complexas, onde o mercado spot é bem desenvolvido. Nestes contratos o sistema de preços coordena as transações dos agentes, sendo utilizados pela a estrutura de governança do mercado.

Nos contratos com preço fixo o ofertante assume risco de mudanças no ambiente de negócios. Dado um preço fixo, o fornecedor tem incentivo em reduzir os seus custos de produção para ter maior ganho líquido. Não obstante, segundo Santos (2004), tais contratos apresentam problemas no que diz respeito a continuidade da transação perante problemas exógenos de performance. Caso o custo do ofertante suba por alguma contingência, este terá incentivo para

reduzir a sua oferta no curto prazo e diminuir seus investimentos em expansão da capacidade de oferta.

Nos contratos do tipo cost-plus o demandante, é que possui o risco de mudanças no ambiente de negócios, todas as alterações no custo da produção são repassadas para ele. Portanto, um ofertante ineficiente não possui incentivo para melhorar sua produtividade via diminuição de custo. Segundo Joskow (Santos, 2004), os contratos do tipo cost-plus se aproximam muito da forma de organização de uma firma verticalizada. Tais contratos possuem a vantagem de serem flexíveis na necessidade de mudanças nos projetos de investimento (algo vantajoso para projetos de alto custo e de longo prazo de maturação). Além disso, tendem a incentivar a adoção de maiores níveis de qualidade nos produtos e serviços utilizados no projeto, já que o custo adicional será pago pelo demandante, obrigando-o a manter uma forte fiscalização na realização do projeto, a fim de prevenir gastos desnecessários.

Os contratos indexados são um misto entre os contratos de preço fixo e do tipo cost-plus. Sendo assim, possuem os problemas dos dois tipos de contratos, caso o mecanismo de indexação não seja feito de forma correta. Se feito de forma correta, o ofertante terá incentivo a produzir eficientemente, pois se seus custos de produção sobem por ineficiência, seu lucro líquido vai diminuir.

As cláusulas não relativas a preços estão relacionadas ao tamanho do investimento em ativos específicos, influenciando diretamente a capacidade produtiva e a quantidade da renda gerada na transação. Tais cláusulas podem ser divididas em: cláusulas de arbitragem e cláusulas de fornecimento do produto.

As cláusulas de arbitragem buscam contornar problemas que não podem ser previamente identificados na formulação do contrato. Em contratos de longo prazo e com alto volume de investimentos envolvidos a arbitragem pode ser uma boa alternativa para evitar custosas e incertas disputas judiciais que possam vir a ocorrer. Tais cláusulas buscam diferenciar uma fraca performance oriunda de uma alteração nos fatores exógenos, de uma relacionada a má conduta de um agente, identificando o agente responsável pela fraca performance.

Segundo Austivik (2003), as cláusulas de arbitragem mais utilizadas na indústria de gás natural são: cláusula de nação mais favorecida, que garante aos agentes da transação a aplicação das mesmas regras aos contratos semelhantes, numa determinada região geográfica; cláusula de renegociações periódicas, que permite aos agentes a renegociação do contrato, possibilitando que estes possam se adaptar melhor às circunstâncias não previstas na formação do contrato; e force majeur, que determina as condições nas quais os agentes não precisam cumprir a performance acordada no contrato.

As cláusulas de fornecimento de produto são utilizadas normalmente em contratos de longo prazo e foram de extrema importância no desenvolvimento da indústria de gás natural. Tais cláusulas garantem uma demanda mínima para o ofertante, como também um fornecimento mínimo para o demandante. Dessa forma diminuem a incerteza na transação, através da redução dos riscos do retorno de investimentos específicos com características de sunk cost (necessários para a construção da infra-estrutura da indústria de gás natural) e diminuição das variações de movimento de oferta e demanda na vigência do contrato.

Segundo Austivik (2003), as principais cláusulas de fornecimento na indústria de gás natural são: cláusulas do tipo take-or-pay, referente à situação em que o demandante compra do ofertante uma quantidade fixa de gás durante um determinado período e concorda em pagar um valor fixo, mesmo que não venha consumir a quantidade de gás específica no contrato; e cláusulas do tipo deliver-or-pay, que se refere à mesma situação a do tipo take-or-pay com a diferença que nesta a cláusula beneficia o comprador.

Porém os contratos com cláusulas do tipo take-or-pay também apresentam problemas. Existe uma grande incerteza em relação a taxa de crescimento da demanda, ritmo da expansão das reservas de gás e conseqüentemente da oferta de gás, tornando complexo a elaboração de um contrato de longo prazo com tal cláusula (Pinto Jr., 2003).

Com o desenvolvimento da indústria de gás natural, maior número de agentes atuantes, maior grau de maturidade de sua rede física e diversificação da demanda, os contratos de longo prazo com cláusulas de fornecimento do produto se mostraram extremamente rígidos diante a necessidade de flexibilidade deste novo cenário. A seguir, veremos as opções de flexibilização existentes na indústria de gás natural.