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4. A ANÁLISE NA PESQUISA

4.2. Análise qualitativa das categorias e subcategorias sobre os vieses semânticos e as

4.2.1. Sobre Classe Social/Consciência Social

Diante disso, segundo Marx e Engels (1998), a forma de pensamento dos indivíduos tem, entre seus determinantes, as relações sociais de produção, situação que implica uma consciência humana direcionada à geração de ideias derivadas das condições materiais de existência. Ou seja, segundo os autores, um dos fatores responsáveis pela formação da consciência dos indivíduos são as condições de existência, dentro do processo de produção.

No entanto, as condições de existência e o processo de produção, no que tangem às necessidades de relação entre indivíduos, acabam gerando uma nova forma de consciência, a consciência social. Todavia, no desenvolvimento desta forma de consciência, surgem mudanças substanciais, como por exemplo, o acúmulo de riqueza para determinado grupo de pessoas que detém o poder econômico em detrimento a um outro grupo que tem como única opção de subsistência a venda da sua força de trabalho. É diante dessa condição social que Marx e Engels (1998) defendem o aparecimento da divisão da sociedade em classes.

No entanto, segundo os autores citados, classe social está vinculada ao conceito de ideologia, pois tal conceito amarra à produção de ideias a relação entre classes. Assim dizem os autores: “as ideias da classe dominante são, em cada época, as ideias dominantes, isto é, a classe que tem a força material na sociedade é, ao mesmo tempo, a sua força intelectual dominante”. (MARX E ENGELS, 1998, p. 41). Ou seja, a ideologia é um sistema de ideias que expressa os interesses da classe dominante em relação à classe desfavorecida economicamente.

Os autores a entendem como fator de uma simplificação das diferenças sociais. Isto é, daquilo que intenta a redução dos conflitos entre burguesia e proletariado. Ela seria um sistema de representações que serviria para sustentar as relações de dominação

da classe economicamente superior através da orientação de imagens e ideias que mascaram a realidade e desviam da busca coletiva de mudança social.

Porém, diante dessa afirmativa fica a lacuna sobre a forma ou estratégia da classe dominante para operacionalizar essa ideologia. É nessa lacuna que o filósofo Francês Louis Althusser (1985) é enquadrado. O autor diz que para a perpetuação da dominação da classe dominante são criados mecanismos que mantém/reproduzem as condições ideológicas de exploração. Isto é, os Aparelhos Repressores - tribunais, governo, política, forças armadas, polícia etc. e os Aparelhos Ideológicos - escola, família, cultura e religião. Ou seja, a submissão às relações e condições de exploração se dá ou pela repressão ou pela ideologia.

O conceito de ideologia em Althusser (1985) traz consigo a representação da relação do homem com as suas condições reais de existência em que esta representação é sempre imaginária. Além disso, em consonância com Marx e Engels (1998), ela tem uma existência material, pois as relações vividas e representadas pelos sujeitos supõem uma série de práticas e rituais no interior dos aparelhos ideológicos.

O filósofo russo Mikhail Bakhtin (2006) também tem o olhar voltado às teorias marxistas na elaboração dos seus estudos sobre linguagem, discorrendo assim, acerca da classe social e da ideologia. Para ele, no que diz respeito ao processo histórico da existência dos indivíduos, a ligação com o trabalho humano e a luta estabelecida entre as classes sociais, dadas pelo controle dos meios de produção, estão diretamente ligadas aos problemas da filosofia da linguagem.

Para Bakhtin (2006), as ideologias derivam do consenso de uma determinada classe social, na qual legitima os signos ideológicos de outra classe, pois o grau de consciência e de clareza da atividade mental dos indivíduos está intrinsecamente ligado ao seu grau de orientação social. Ou seja, a atividade mental do indivíduo, bem como sua expressão exterior, é formada a partir do território social, resultando na enunciação como expressão verbal socialmente dirigida, nesse caso, como reprodução dos signos ideológicos da classe dominante.

Um exemplo da afirmação do autor acima é a reprodução compartilhada por um grande número de pessoas de classe pobre, no ano de 2011, do bordão "Ai, como eu tô bandida!"71. Tal fala era remetida ao deboche à Janete na aceitação do assédio sexual tendo em vista as suas características físicas e de vestimentas desconexas com os

71

Disponível em: http://www.diariosp.com.br/blog/detalhe/3013/2011+deu+o+que+falar. Acesso em: 15 de Dez de 2016.

padrões de corpo e moda ditados como signos ideológicos dominantes no discurso da classe detentora do poder econômico.

Presente em todas as relações entre os indivíduos, a linguagem é um dos indicadores das transformações sociais. Sendo o signo verbal marcado por uma época e grupo social determinados, qualquer modificação nas formas de organização social gera reformulação nesse mesmo signo. A premissa inversa também é verdadeira, pois a alteração na formação discursiva fomenta a alterações nas relações de produção e de existência.

É bem sabido que as distintas classes sociais usam uma mesma língua para se comunicar, dessa forma, no signo ideológico há o confronto de índices de valor contraditórios que geram um processo de retroalimentação entre tais índices. Todavia, a classe dominante intenta situar o signo ideológico acima das lutas de classe, para dessa forma, não apenas ocultar a luta de classes, mas fazer a manutenção de seus domínios.

Devido ao entrecruzamento de índices de valores o signo se torna vivo, móvel e capaz de se aperfeiçoar. “O signo se torna a arena onde se desenvolve a luta de classes” (BAKHTIN: 2006, p.45). Ou seja, a linguagem abarca tanto a luta de classes, como a tentativa, da classe dominante, de cristalizar o signo verbal para ocultar o embate.

É dentro das abordagens dos autores citado que a categoria consciência social, imbricada no conceito de classe social, fomenta as aparições das personagens Valéria Vasques e Janete. Ou seja, como fontes criadoras das ideias dominantes, dadas por uma classe dominante Marx e Engels (1998), através de mecanismos que mantém/reproduzem as condições ideológicas de exploração Althusser (1985) e na tentativa de tornar o signo monovalente e conferir à linguagem um caráter inatingível e acima das diferenças de classes, para assim, a classe dominante ocultar e revelar somente o que lhe aprouver Bakhtin (2006).