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2.2 Organização e representação da Informação

2.2.1 Organização da Informação

2.2.1.2 Classificação e Arranjo

Apesar de a atividade de classificação ser comum tanto nos arquivos quanto nas bibliotecas, ao se proceder a essa atividade nos acervos arquivísticos cabe fazer algumas diferenciações, tendo em vista o caráter peculiar da informação orgânica. Bellotto (2006), de forma sintética, faz essa diferenciação no prelúdio de sua obra Arquivos Permanentes:

Os sistemas de classificação bibliográfica e suas extensões (no caso dos centros de documentação), salvo raríssimas exceções, podem ser rigidamente obedecidos, mas a organização de arquivos deve submeter-se à estrutura dos órgãos geradores do documento e à natureza do material ordenado. (BELLOTTO, 2006, p. 40).

Quando Bellotto defende que as classificações bibliográficas, salvo raras exceções, podem ser rigidamente obedecidas devemos fazer uma observação. Apesar de um método de

53 classificação utilizado em bibliotecas possibilitar uma aplicação irrestrita, existem várias formas de se classificar documentos no âmbito dessas instituições. Autores da Ciência da Informação como Lima e Alvares (2012) e Pombo (1998) defendem a não existência de um ‘método ideal’ ou ‘forma correta’, já que existem inúmeras teorias que podem ser mais ou menos adequadas a cada caso. Schiessl e Shintaku (2012) ainda afirmam que “não existe uma classificação única, mas a classificação contextual para uma finalidade” (SCHIESSL e SHINTAKU, 2012, p. 59).

Retomando a discussão quanto às peculiaridades no âmbito arquivístico, Sousa (2008) cita a complexidade dessa atividade aplicada aos documentos de arquivo, tendo em vista a grande produção documental dentro das instituições, o que exige “maior sofisticação dos esquemas de classificação”. (SOUSA, 2008, p. 121).

Outro fator que se faz necessário salientar é que não existe um sistema de classificação arquivístico único que possa ser aplicado de forma satisfatória em todos os casos. Como os documentos de arquivo refletem as funções e as atividades dos órgãos produtores, e cada entidade possui peculiaridades, é natural que ao se conceberem instrumentos como o plano de classificação ou quadros de arranjo estes devem, idealmente, ser feito por meio de uma análise particular, ou seja, considerando-se caso a caso.

A diferença entre arranjo e classificação por sua vez só se apresenta, segundo Bellotto (2006), na terminologia.

A fase denominada classificação, em bibliotecas e em arquivos correntes corresponde, nos arquivos de segunda e terceira idades, ao que se chama de arranjo no concernente aos fundos e séries, e de ordenação no que respeita à ordem interna dos documentos nas séries. (BELLOTTO, 2006, p. 40).

Todavia, o uso da palavra arranjo tornou-se consagrada na terminologia arquivística brasileira, traduzida do inglês arrangement, que corresponde à classificação nos arquivos correntes (BELLOTTO, 2006, p. 135). Sousa (2013) fala sobre a distinção existente na literatura brasileira quanto à classificação segundo a idade documental do acervo. Desse modo a atividade definida “como a distribuição de indivíduos em grupos distintos, de acordo com caracteres comuns e caracteres diferenciadores” (SOUSA, 2013, p. 81) aparece dividida em dois termos, que seriam a classificação e o arranjo. Para ele essa se utilizando essa duplicidade de termos, classificação (para arquivos correntes e intermediários) e arranjo (para arquivos correntes), causa uma confusão metodológica. Por isso, ele defende a utilização do:

Uso do conceito de classificação para representar a atividade intelectual de construção de instrumentos para organização dos documentos, independente da

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idade à qual eles pertençam. A confusão terminológica entre os dois termos (arranjo e classificação) não parece salutar ao desenvolvimento da Arquivística, pois expõe uma quebra entre arquivos correntes e permanentes, que no nosso entendimento não existe. Trata-se apenas de fases de um mesmo processo. (SOUSA, 2013, p. 85).

Ainda segundo Sousa (2013) a diferença de usos da documentação arquivística, conforme a idade documental ao qual elas pertençam, não seria resolvida pela utilização de termos distintos para cada fase e sim pela descrição. Consequentemente, de acordo com o autor, para os fins deste trabalho e a fim de evitar equívocos, daqui em diante utilizaremos somente o termo classificação, posto que os acervos DOPS são provenientes de órgãos extintos e, portanto, fundos fechados. Foram recolhidos aos arquivos públicos devido ao seu caráter probatório e/ou informativo (que são caraterísticas dos documentos permanentes ou de terceira idade). Desse modo ratificamos o entendimento de que, apesar de aparecerem na literatura e na fundamentação teórica os termos arranjo e classificação, os utilizaremos como sinônimos para a mesma atividade do processo classificatório em arquivos permanentes.

Prosseguindo com a explanação, Bellotto (2006) entende que a classificação que ocorre nos arquivos permanentes “resume-se à ordenação dos conjuntos documentais remanescentes das eliminações (ditadas pelas tabelas de temporalidade e executadas nos arquivos correntes e intermediários), obedecendo a critérios que respeitem o caráter orgânico dos conjuntos, interna e externamente.” (BELLOTTO, 2006, p. 136). Este seria o procedimento ideal quando aplicada a gestão de documentos, porém, não é o que costuma ocorrer na prática.

Evidente que não houve por parte dos órgãos da repressão a aplicação de planos de classificação e tabelas de temporalidade porque, à época, ainda não existia a Lei de Arquivos (8.159/1991) nem a Resolução nº 14 do CONARQ (de 24 de outubro de 2001). No entanto, é provável que houvesse uma organização original dos documentos, sem a qual as Delegacias não teriam como obter êxito nas suas atividades investigativas. Tal organização, talvez, foi propositalmente desfeita quando do recolhimento aos arquivos públicos como especulam, por exemplo, os autores que relatam o recolhimento dos arquivos da DOPS ao Arquivo Público do Paraná (RONCAGLIO et al., 1998, p.42).

A partir do recolhimento as instituições arquivísticas identificaram uma desordem deliberada ou mesmo uma eliminação intencional anterior ao recolhimento como possíveis causas para o estado em que se encontrava a documentação. Desse modo é necessário que os profissionais dos arquivos procedam a um ‘trabalho arqueológico’ para que os documentos classificados [ou não] “reflitam, claramente, a organização e as funções que os produziram” (BELLOTTO, 2006, p. 138).

55 É importante salientar que a classificação não é apenas uma atividade física, de ordenar os suportes em lugares determinados, mas é também uma atividade intelectual. Para Bellotto “o arranjo é uma operação ao mesmo tempo intelectual e material” (BELLOTTO, 2006, p. 139), levando-se em conta a existência de uma distinção entre quadro de classificação e classificação interna. Já Barbosa Sousa (2013) assim os distingue:

Podemos dividir o processo classificatório em duas partes: a parte intelectual e a parte física. A parte intelectual se refere à classificação propriamente dita (processo mental de estabelecimento de classes) e à ordenação (a disposição dos documentos nas classes estabelecidas). (SOUSA, 2013, p. 86).

Para Bellotto (2006) o recolhimento aos arquivos permanentes propicia que acervos de proveniências distintas passem a ‘conviver’ uns com os outros e, dessa forma, passem a ser reconhecidos como fundos. Desse modo, o fundo é considerado pela Arquivologia contemporânea como a unidade de classificação mais geral e que garante a unicidade do conjunto documental.

Já as divisões internas de um fundo, bem como a classificação como um todo, devem seguir o mesmo pressuposto de refletir as funções e atividades do produtor. Sousa (2008) defende a necessidade de se conhecer o produtor para que o acervo possa refletir suas funções e atividades:

O percurso entre a missão da entidade, instituição ou organização e o surgimento dos documentos, concomitantemente às relações estabelecidas entre eles, são a chave para a definição das divisões internas de um fundo. (...) A identificação da cadeia, descrita acima, nem sempre é tão evidente, principalmente no caso de fundos de entidades extintas e por causa da dinâmica, da instabilidade e da desorganização daquelas em atividade. Trata-se, muitas vezes, de um trabalho arqueológico, em que as camadas superiores devem ser retiradas com muito cuidado para não comprometer o entendimento das inferiores e não perder o vínculo delas com o documento. (SOUSA, 2008, p. 15).

Quanto às divisões internas de um fundo, há um claro dissenso na literatura arquivística. O trabalho de Barbosa Sousa (2013) faz um apanhado dos níveis de classificação, de acordo com alguns autores e explicita que a acepção adotada pela Norma Geral Internacional de Descrição Arquivística – ISAD (G) se aproxima dos postulados da arquivística canadense. Para a ISAD (G), grosso modo, são divisões internas de um fundo: seção (subfundo), série, subsérie, dossiê/processo e item documental. Trataremos essas divisões de forma mais detalhada no tópico sobre representação da informação.

De todo modo, o que se deseja ao se classificar não é apenas o ordenamento das unidades documentais, mas também que o conjunto reflita as funções e atividades do produtor, já que o ‘todo’ é maior do que a soma de suas partes:

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A desejada justaposição entre as funções (que se desdobram em atividades) desempenhadas e as respectivas séries documentais que as comprovam muitas vezes não se realiza. As razões têm a ver com as lacunas causadas pelas baixas permitidas (expurgos criteriosos) ou por desfalques (perdas causadas por incúria, má-fé ou ignorância) [...] Na sistemática de arranjo é preciso levar em conta, sempre, a estrutura orgânica da instituição; as ‘ações’ que os documentos demonstram em cumprimento das operações geradas pelas atividades, estas, por sua vez, oriundas das funções e estas últimas geradas pela competência que justifica a criação e o funcionamento da entidade produtora (BELLOTTO, 2006, p. 142; 145).