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CNDM: avanços e retrocessos

Conforme informado na introdução deste trabalho, há uma escassez de referências na literatura quando se trata do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. Durante as pesquisas realizadas, localizei poucos textos que tratavam sobre o tema. A riqueza de informações e de documentos anexados a esta tese devem-se, sobretudo, à generosidade das ex-presidentas do Conselho Cátia Vasconcelos, Sylvia Auad, Rosiska Darcy de Oliveira e Solange Bentes Jurema, que gentilmente cederam cópias de diversos documentos e registros fotográficos que contribuíram para desenvolvimento desta leitura da história do CNDM. A essas senhoras reitero meus sinceros agradecimentos.

Além desse acesso a documentos originais e, muitas vezes, confidenciais, tive o privilégio de participar, como ouvinte, de duas palestras que tinham por objetivo principal traçar um panorama geral acerca da institucionalização do CNDM. O tópico que será desenvolvido a seguir tem como base de informações, além dos documentos mencionados e das entrevistas realizadas, os artigos, relatórios e transcrições das palestras abaixo relacionadas:

no endereço eletrônico: http://www2.camara.gov.br/atividade-legislativa/processolegislativo. Acesso em Julho de 2010.

116 Nos Anexos 06 e 07 desta tese podem ser encontrados, respectivamente, o Projeto de Lei Nº. 5.778 de 17 de

junho de 1985, a exposição de motivos Nº. 270 de 14 de junho de 1985 e a lei Nº. 7. 353 de 29 de agosto de 1985.

Artigos:

As Mulheres e a Constituição de 1988, de Jacqueline Pitanguy, s/d.

Lugar no Governo: Álibi ou Conquista?, de Maria Aparecida Schumaher e Elisabeth

Vargas, 1993.

A gestão federal e a questão de gênero - perspectivas de institucionalização, de Thereza

Lobo, 2003.

As políticas públicas de gênero: um modelo para armar. O caso do Brasil, de Sônia

Montaño, 2003.

Movimento de Mulheres e Políticas de Gênero no Brasil, de Jacqueline Pitanguy, 2003.

CNDM, Uma visão histórica, de Maria Aparecida Schumaher, 2004.

Relatórios:

MEMÓRIA: Gestão 95/99 – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, 1999.

Relatório da Gestão 1999/2002 do CNDM e da SEDIM “Políticas para a Mulher”, 2002.

Relatório Nacional Brasileiro. CEDAW. Convenção sobre a eliminação de todas as

formas de discriminação contra a Mulher, 2002.

Relatório de Implementação. Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, 2006. • Relatório Memória 2003-2006, 2006.

Palestras:

A participação das mulheres e a reforma política, proferida por Maria Betânia Ávila no

Seminário “Democratizar a democracia: a reforma política e a participação das mulheres”, realizado em 28 de março de 2007 em Brasília-DF; promovido pela Fundação Perseu Abramo e Fundação Friedrich Ebert.

Mulheres, Constituintes e Constituição, proferida por Jacqueline Pitanguy no “Seminário

20 anos da Constituição”, realizado em 04 de setembro de 2008 em Brasília-DF; promovido pela Diretoria de Estudos Sociais do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

1º. Fase: 1985-1990 – Efervescência e materialização

O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) foi aprovado e efetivado na Lei Nº. 7. 353, de 29 de agosto de 1985,

(...) com a finalidade de promover, em âmbito nacional, políticas públicas que visem assegurar a eliminar a discriminação da mulher, assegurando-lhe condições de liberdade e de igualdade de direitos, bem como sua plena participação nas atividades políticas, econômicas e culturais do País117.

Os principais objetivos do CNDM, segundo o art. 4º. da Lei que o instituiu, eram: a) formular diretrizes e promover políticas em todos os níveis da administração pública direta e indireta, visando a eliminação das discriminações que atingem a mulher;

b) prestar assessoria ao Poder Executivo, emitindo pareceres e acompanhando a elaboração e execução de programas de Governo no âmbito federal, estadual e municipal, nas questões que atingem a mulher, com vistas à defesa de suas necessidades e de seus direitos;

c) estimular, apoiar e desenvolver o estudo e o debate da condição da mulher brasileira, bem como propor medidas de Governo, objetivando eliminar todas as formas de discriminação identificadas;

d) sugerir ao Presidente da República a elaboração de projetos de lei que visem a assegurar os direitos da mulher, assim como a eliminar a legislação de conteúdo discriminatório;

e) fiscalizar e exigir o cumprimento da legislação que assegura os direitos da mulher; f) promover intercâmbio e firmar convênios com organismos nacionais e estrangeiros, públicos ou particulares, com o objetivo de implementar políticas e programas do Conselho;

g) receber e examinar denúncias relativas à discriminação da mulher e encaminhá-las aos órgãos competentes, exigindo providências efetivas;

h) manter canais permanentes de relação com o movimento de mulheres, apoiando o desenvolvimento das atividades dos grupos autônomos, sem interferir no conteúdo e orientação de suas atividades;

117 Art. 1º da Lei no. 7.353, de 29 de agosto de 1985. Também disponível em:

i) desenvolver programas e projetos em diferentes áreas de atuação, no sentido de eliminar a discriminação, incentivando a participação social e política da mulher.

Como se pode observar, o principal objetivo do Conselho era o de promover a liberdade, a igualdade de direitos e a plena participação das mulheres em âmbito nacional. O CNDM deveria agir nas esferas federal, estadual e municipal, atuando como ferramenta auxiliar do poder Executivo no que tange às políticas públicas para as mulheres, além de sugerir projetos de lei, fiscalizar sua aplicação e promover interação com organismos nacionais e internacionais.

Os conselhos de direitos118, entendidos como forma participativa da sociedade civil organizada, geraram a ampliação dos canais de participação na defesa da democracia e do interesse de segmentos que carecem de ações políticas singulares, como as mulheres. A abertura de um espaço institucional para que a voz das mulheres pudesse ser ouvida na esfera estatal, segundo Eva Blay, “(...) se adequava a um país recentemente saído da ditadura que não confiava na estrutura do Estado e dos governos.” (apud MONTAÑO, 2003, p. 13) É preciso lembrar que o contexto em que o CNDM é criado é o de luta pela democracia, momento delicado de reconciliação entre a sociedade e o Estado, no qual os movimentos feministas podem ser considerados “convidados de honra” para atuar no cenário político brasileiro.

Como já observamos neste trabalho, o CNDM nasce vinculado à pasta da Justiça. O mesmo dispositivo legal que o cria prevê uma estrutura - localizada, em princípio, no prédio do Ministério da Justiça - composta por uma Secretaria Executiva, uma Assessoria Técnica119 e um Conselho Deliberativo. O Conselho Deliberativo foi designado pelo Presidente José Sarney em 02 de setembro de 1985, conforme cópia do Diário Oficial da União no Anexo 09. Assim como o Conselho Deliberativo, o corpo técnico era composto, na sua expressiva maioria, por feministas autônomas vindas de diversas regiões do país. Estas mulheres traziam na bagagem não só o pioneirismo, mas, sobretudo, grandes desafios: abrir e consolidar o espaço para a garantia dos direitos das mulheres na estrutura política do governo; promover a

118 Vistos como frente institucionalizada de participação com capacidade de agir no aparelho do Estado, os

conselhos de direitos foram criados para estimular e impulsionar a experiência democrática participativa. O debate sobre o papel dos conselhos será visto com maiores detalhes no Capítulo 3 desta tese.

119 A Assessoria Técnica era responsável pela formação de diversas comissões de trabalho e por assuntos

específicos, tais como: educação, cultura, creche, trabalho, mulher rural, legislação, violência, saúde reprodutiva, mulher negra, comunicação e constituinte.

legitimação do canal de interlocução com os movimentos de mulheres; formular e monitorar a implantação de políticas públicas.

Havia uma grande preocupação dos movimentos feministas de que o Conselho se tornasse uma retórica, ou seja, um órgão exemplar na forma, mas sem expressão política. Para que isso não acontecesse, foi estabelecido no artigo 8º. da lei que criou o CNDM, o “Fundo Especial dos Direitos da Mulher” (F.E.D.M), destinado a gerir recursos e financiar suas atividades. Consistia em um Fundo Especial, de natureza contábil, onde seriam creditados todos os recursos, orçamentários e extra-orçamentários, destinados a atender às necessidades do Conselho, o que assegurava condições de operacionalidade a esse órgão. Mediante decreto, o chefe do Executivo deveria estabelecer os limites financeiros e orçamentários, globais ou específicos, a que o CNDM ficaria submetido. (conforme § 2º, art. 8º. da Lei Nº. 7.353/85)

Em seu art. 9º., a mencionada lei prevê que “fica o Poder Executivo autorizado a abrir crédito especial, em favor do F.E.D.M., no valor de até Cr$ 6.000.000.000 (seis bilhões de cruzeiros), destinado a despesas de instalação e funcionamento do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher”. Além desse montante, informa Sonia Montaño que o CNDM teria um orçamento equivalente a US$ 7 milhões para investir em programas e projetos, excluindo-se deste valor os pagamentos de salários e despesas administrativas. (MONTAÑO, 2003, p. 10)

Conforme prevê o artigo 6º. da Lei 7.353/85, o Conselho Deliberativo era composto por 17 (dezessete) integrantes e 3 (três) suplentes designadas pelo Presidente da República, para um mandato de 4 (quatro) anos. Destaca o parágrafo único deste artigo que 1/3 (um terço) dos membros do Conselho Deliberativo deveria ser escolhido dentre pessoas indicadas por movimentos de mulheres, seguindo o critério de contribuição, de forma significativa, em prol dos direitos femininos. Também a presidência do Conselho deveria ser designada pelo Presidente da República. (Art. 5º., Lei 7.353/85)

Embora subordinado institucionalmente à pasta da Justiça, o Conselho respondia diretamente ao Presidente da República. Com autonomia administrativa e financeira, a criação deste espaço na esfera governamental possibilitou a inserção da sociedade civil em um papel de protagonista120, especialmente com a formalização da participação dos movimentos de mulheres no Conselho Deliberativo e a nomeação da primeira presidenta do CNDM: Ruth Escobar.

120 Como se pode observar, o CNDM teve o caráter deliberativo reconhecido em lei desde 1985, diferente de

outros conselhos, como o da Saúde, que só o tiveram nos anos 90. Desta forma, o CNDM aparece com um caráter inovador, não se restringindo como exemplo às políticas para as mulheres, mas atingindo boa parte da malha de políticas públicas.

Portuguesa, nascida na cidade do Porto em 31 de Março de 1935, a atriz, jornalista e empresária Maria Ruth dos Santos, mais conhecida como Ruth Escobar121, à época de sua nomeação122 ao CNDM, era deputada estadual por São Paulo. Ruth Escobar participou ativamente da vida política brasileira. Militante, organizou o 1º Congresso Internacional pela

Anistia no Brasil e foi membro do Comitê da ONU para a eliminação da discriminação contra a mulher. Foi deputada estadual por duas vezes (1983/1987 e 1987/1991) pelo PMDB e PDT, respectivamente. Foi eleita Deputada Constituinte com 61.124 votos, oriundos na maioria da capital paulista123. Licenciou-se do seu mandato de Deputada e assumiu a presidência do CNDM em 10 de Setembro de 1985124.

É importante destacar que Ruth Escobar, junto com outras lideranças femininas do PMDB na época - como Junia Marise, Cristina Tavares, Selma Bandeira, Irondi Pugliesi, entre outras - participou, em Dezembro de 1984, do Seminário Nacional de Mulheres do

PMDB “Mulher, Mobilização e Mudança”. Sobre este evento, recorda a historiadora Rosanita Monteiro de Campos:

Ao abrir o seminário, Tancredo destacou a importância da participação da mulher no processo de democratização, na luta pela anistia, nas mobilizações por eleições diretas, na construção da Nova República, onde a justiça social deveria por fim à fome, ao desemprego, à inflação, à mortalidade infantil, males que afetam de maneira particular a mulher brasileira. (CAMPOS, 1988, p. 119)

O mencionado seminário foi realizado em Curitiba-PR e nele foi aprovada, como uma das agendas políticas do PMDB, a criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, conforme lembra Campos:

Em 20 de dezembro, dando encaminhamento às decisões do Seminário Nacional de Mulheres do PMDB, foi entregue a Tancredo Neves o documento contendo as resoluções ali aprovadas. As lideranças femininas presentes ressaltaram o crescimento do movimento de mulheres e a necessidade urgente da constituição do Conselho; um órgão que verdadeiramente refletisse a força da mulher na sociedade e que auxiliasse o governo a aplicar uma clara política de incentivo à participação e aos interesses da mulher. (Idem, p. 121)

121 Maria Ruth dos Santos adotou o sobrenome do marido, o filósofo e dramaturgo Carlos Henrique Escobar. 122 Fotos da cerimônia de posse de Ruth Escobar como presidenta do CNDM podem ser vistas no Anexo 10. 123 Informações extraídas de http://www.al.sp.gov.br/web2/constituinte/deputados/PDT-

RUTH_ESCOBAR.html. Acesso em Julho de 2010.

Após o falecimento de Tancredo Neves, José Sarney - mantendo os compromissos da “Nova República125” - criou o CNDM e designou Ruth Escobar para presidi-lo.

Sobre a indicação de Ruth Escobar para a presidência do Conselho há um fato curioso. De acordo com Sonia Montaño, o Conselho foi formulado pela necessidade da existência de um órgão para atender as demandas das mulheres, que ocupasse o mais alto nível possível no processo decisório federal, para o qual a líder feminista Ruth Escobar deveria ser designada para a direção. Por ter nascido em Portugal, razões legais associadas à sua nacionalidade a impediam de assumir a cadeira de Ministra. Segundo informa Montaño, esta história foi ratificada pela própria Ruth Escobar, em setembro de 2002, na “Tenda das Sábias”, evento realizado em Brasília pela SEDIM (Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher). (MONTAÑO, 2003, p. 10) Solange Bentes Jurema (ex-presidente do CNDM e ex-presidente da SEDIM no período 1999-2002), confirmou126 a informação a respeito da indicação de Ruth

Escobar para a presidência do CNDM: “Quando o Conselho foi criado, ele foi criado com

muita força política. A interlocutora para a criação do Conselho foi Ruth Escobar e a Ruth Escobar era portuguesa. E quando ele foi criado, ele foi criado com a força ministerial, mas foi chegado a um acordo de se criar um Conselho porque a Ruth, sendo estrangeira, não poderia ser Ministra de Estado, e aí se criou o Conselho [...] Nós fizemos uma reunião, uma

reunião final, que nós chamamos de “Tenda das Sábias”, onde nós reunimos todas as feministas históricas nessa reunião de despedida e a consolidação do movimento de transição para o governo que ia assumir [...] e foi nessa reunião que a Ruth Escobar fez aquela

declaração”.

Atualmente acometida pela doença de Alzheimer, grave enfermidade degenerativa cerebral, Ruth Escobar sofre de perda de memória e não reconhece sequer os filhos127. Legalmente interditada128, a entrevista com a primeira presidenta do Conselho infelizmente não pode ser realizada.

Foram indicadas como as primeiras conselheiras do CNDM: Eunice Mafalda Michiles, Leila de Almeida Gonzáles, Ruth Cardoso, Jacqueline Pitanguy, Rose Marie Gebara Muraro, Marina Colassanti, Tizuko Yamazaki, Maria da Conceição Tavares, Maria Elvira Salles

125 “Nova República” é a expressão como ficou conhecido o período da história política brasileira que se iniciou

após o fim da ditadura militar. Considera-se o marco inicial dessa época o ano de 1985.

126 Solange Bentes Jurema, durante entrevista concedida a mim em 13 de Setembro de 2010, em Maceió-AL. 127 Informações obtidas por meio de contato telefônico com a Sra. Eliete Aparecida da Silva Souza, secretária de

de Ruth Escobar.

128 Prevê o Código Civil Brasileiro (Lei Nº. 10.406/2002), em seu artigo 1.767, I, que estão sujeitos a interdição

(também chamada curatela) aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil.

Ferreira, Cristina Tavares, Benedita da Silva, Irondi Pugliesi, Nair Goulart, Leila de Abreu, Nair Guedes e Ana Montenegro. Como suplentes foram designadas Lúcia Arruda, Maria Betânia Melo D´Avila e Maria Lúcia D´Avila Pizolanti.

Sob a gestão de Ruth Escobar, em setembro, ou seja, logo depois de assumir a presidência do Conselho, foi aprovado o Regimento Interno do CNDM por meio do Decreto Nº. 91.697, de 29 de setembro de 1985. Neste regimento foram detalhadas as organizações, funções, composições, funcionamento, competência e atribuições das pessoas integrantes do Conselho.

Neste momento de institucionalização, o CNDM mantinha relação com os mais diversos segmentos político-ideológicos dos movimentos feministas e buscava desenvolver programas e projetos que apoiassem o movimento autônomo de mulheres. Em entrevista datada de 2005129 ao informativo “Mulheres em Pauta”, boletim eletrônico de produção da

Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Ruth Escobar destacou que “(...) a criação

do CNDM deu outra perspectiva às mulheres, sobretudo nas classes menos privilegiadas”.

Nesta entrevista, a ex-presidenta destacou a maior vitória do CNDM: “(...) foi a criação das

Delegacias da Mulher. Nessa mesma época eu visitava diferentes bairros da periferia para estimular as mulheres a denunciar todo e qualquer tipo de repressão e violência.” E a maior dificuldade “(...) foi convencer as mulheres de classe média e classe alta a denunciarem. Eu

diria a vergonha social.”

Reflexos dessa postura de combate à violência contra a mulher podem ser encontrados na primeira grande campanha do CNDM em nível nacional, que tinha por bandeira de luta: “O silêncio é cúmplice da violência”. Para ilustrar e dar visibilidade a estes feitos, podem ser encontrados no Anexo 12 desta tese os cartazes das campanhas mais significativas.

Do ponto de vista internacional, a criação do CNDM obedece a uma diretriz muito clara da III Conferência Internacional de Mulheres130, realizada em Nairóbi, Quênia, em 1985, quando as Nações Unidas instaram os governos a criar postos governamentais - chamados “mecanismos” - que realmente fossem voltados para “a condição da mulher”. Também conhecido como “Fórum 85”, esta Conferência revela uma perspectiva importante:

129 Entrevista ao informativo “Mulheres em Pauta”, boletim eletrônico de produção da Secretaria Especial de

Políticas para as Mulheres, ANO IV - Número 6 - Brasília, 30/05/2005. Disponível em: http://200.130.7.5/spmu/informativo/informativo.asp?edicao=6 Acesso em Julho de 2010.

130 A primeira Conferência Mundial da Mulher aconteceu no México em 1975, seguida da Conferência celebrada

em Copenhague em 1980. A terceira Conferência Mundial da Mulher foi realizada em Nairóbi em 1985 e a quarta em Beijing no ano de 1995. Informações disponíveis em http://www.escueladefeminismo.org/spip.php?article383 Acesso em Julho de 2010.

não se considerava mais somente um direito legítimo das mulheres sua “incorporação”, mas colocava-se como “necessidade” sua participação em todas as esferas da vida, como informa Rosanita M. Campos:

Também pela primeira vez, a nível internacional, prevaleceu a compreensão de que é impossível atingir a plena emancipação da mulher sem que a fome, a miséria, o desemprego, a ignorância e o subdesenvolvimento sejam superados. Esses são os problemas que mais atingem as mulheres. São essas as principais questões que, através de seus próprios meios e autonomamente, o movimento feminista deve abraçar, não apenas para o desenvolvimento das sociedades, mas sobretudo para o desenvolvimento das próprias mulheres. Ao contrário do que se pensava até então, isso não restringe o assumimento (sic) e o enfrentamento das questões mais específicas da mulher. Na verdade, abre muito mais espaço para a sua luta, dá mais autonomia e condições às mulheres para que essas dificuldades sejam superadas (CAMPOS, 1988, 151)

É oportuno destacar que 157 Estados - incluindo o Brasil - e aproximadamente 15.000 representantes de organizações não governamentais participaram deste evento, no qual foram traçados três principais objetivos estratégicos: criação de medidas de caráter jurídico; medidas para alcançar a igualdade na participação social e medidas para alcançar a igualdade na participação política e nos lugares de tomada de decisões.

Reconhecemos que este tratado foi um instrumento importante para a promoção da participação das mulheres na política, pois recomendou aos governos o estabelecimento de linhas de ação para alcançar a igualdade entre mulheres e homens nas esferas da vida social, da política e do trabalho. Seguindo as diretrizes desta Conferência, o CNDM se tornou um dos primeiros órgãos na América Latina criado com foco nos direitos das mulheres e influenciou iniciativas semelhantes nos países do Cone Sul, especialmente Argentina e Chile, os quais possuem um processo de democratização e uma história política semelhante à brasileira.

Com José Sarney Presidente da República e a previsão, para o ano seguinte, de uma eleição para a Assembléia Nacional Constituinte, 1985 foi um ano de rearticulação de forças e de partidos políticos. Neste momento, é possível observar um cenário político bem mais complexo do que aquele da década de 70, principalmente no que tange às reivindicações dos movimentos sociais.

Em novembro de 1985, com intensa mobilização das integrantes do Conselho131, o CNDM lança a campanha Alerta da Mulher para a Constituinte, fato noticiado por jornais da época, como o Jornal do Brasil132. Constituinte sem mulher fica pela metade foi o slogan criado para a divulgação da campanha A mulher e a Constituinte133 e permaneceu contínuo na mídia até outubro de 1988.

Nesse momento, segundo Ruth Escobar134, as principais reivindicações na arena política, além da defesa intransigente da autonomia dos movimentos de mulheres, eram:

• Participação igualitária nas listas eleitorais para cargos eletivos dos partidos políticos;