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CAPÍTULO III – PENAS ALTERNATIVAS OU O GOVERNO DAS PESSOAS PELA

3.3 A abordagem metodológica para análise de conteúdo das penas alternativas

3.3.2 Codificação

Devido à variedade de fontes e ao volume de dados na amostra, o processo de análise foi realizado utilizando o software de pesquisa qualitativa Nvivo versão 10. O software permitiu que extensos segmentos de texto fossem codificados, e referências (fontes) e categorias (nós) relacionadas com facilidade. As categorias usadas compreenderam uma ou duas palavras que pudessem suficientemente descrever ou expressar para o pesquisador o

18 Apesar da Lei de Acesso à Informação, os pesquisadores brasileiros ainda encontram dificuldades no acesso às

informações. Devido à volatilidade na gestão do serviço público brasileiro, muitas vezes os acordos firmados com os gestores de programas ou políticas públicas precisam ser constantemente renovados. Por isso, os projetos analisados cobrem somente o período de 2007 a 2010. Não houve sucesso no acesso aos projetos submetidos à CGPMA posteriores ao ano de 2010.

19 A análise não inclui documento produzido pelo último Conepa, realizado entre os dias 19 e 21 de outubro de

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significado dos enunciados. Segmentos de texto, variando em extensão, de quatro palavras a parágrafos inteiros, foram codificados e posteriormente relacionados a conceitos, ideias, argumentos e proposições a fim de verificar a especificidade ou generalidade das codificações. O Nvivo permitiu a localização e recuperação de cada segmento de texto codificado em todas as fontes de consulta. Esse software também forneceu o número de vezes que cada categoria apareceu, bem como o número de referências que continha uma categoria.

O primeiro passo foi o exame da categoria central de análise, que procurou deter inar “o que” está nos a os de forma exploratória e interpretativa. A partir da categoria central, pôde-se criar outras categorias relacionadas entre si e diretamente conectadas com a execução das penas alternativas. Assim, primeiro foram identificadas as descrições e as relações entre a categoria central e as categorias subjacentes: punição, penas alternativas, responsabilização, política pública, comunidade, prisão, intervenção, penal, inclusão, justiça criminal, prevenção, encaminhamento e tratamento. Isso permitiu determinar complementaridades ou mudanças nas relações entre as categorias durante o desenvolvimento da análise dos enunciados.

A revisão da literatura foi crucial para emergência das primeiras categorias e posteriormente para integrá-las como temas, por meio de uma (re)codificação teórica e seletiva. O quadro teórico existente a respeito da punição foi empregado como um recurso de interpretação, constituindo uma estrutura teórica importante para verificação de relações entre a teoria e os resultados da análise de conteúdo. Para isso, foi tomada uma postura indutiva para extrair os significados a partir dos dados. Intencionalmente, a categoria punição assumiu o papel de referencial teórico, que orientou e conduziu a interação entre os dados e os conceitos extraídos da teoria geral sobre penas alternativas e a própria punição. Resumidamente, a escolha da punição como eixo tanto teórico quanto metodológico permitiu a emergência de temas com densidade conceitual e intimamente ligados uns com os outros.

3. 3. 3 Análise dos dados

A análise dos dados procurou não se restringir à descrição do fenômeno penas alternativas, abordagem apropriada quando a teoria ou literatura de pesquisa existente sobre um fenômeno são limitadas. Ao contrário, o uso da literatura permitiu maior fluidez, indução

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e interpretação dos dados. Com isso, foi adotada uma abordagem analítica voltada para uma compreensão dos significados da punição nas penas alternativas e, por consequência, sua execução penal, cuja intenção não foi a validação de conceitos ou teorias. Em outras palavras, o desafio foi se desprender das limitações e vieses inerentes e informados por uma teoria, o que pode tornar o pesquisador mais propenso a destacar evidências favoráveis a uma assertiva teórica em detrimento de outra.

Três questões distintas, mas relacionadas, conduziram a análise dos dados. A primeira: quais são os elementos constitutivo-argumentativos mais proeminentes das penas alternativas? A segunda questão: as penas alternativas, enquanto dispositivo penal, expandem o controle penal na vida social de indivíduos e grupos sociais? Terceira: as penas alternativas, enquanto tecnologia penal, afirmam ou superam o viés punitivo da justiça criminal?

Metodologicamente, foi adotada uma abordagem indutiva-interpretativa na análise dos dados, a finalidade foi enquadrar e processar os segmentos de texto enquanto conteúdos constitutivo-argumentativos das penas alternativas, que puderam ser contados, comparados e visualizados como temas.

Os temas foram usados para unir as categorias e suas relações com o propósito de eliciar o significado ou a essência dos conteúdos constitutivo-argumentativos para o pesquisador – uma ação interpretativa.

As codificações da categoria central e subjacentes e, posteriormente, dos temas foram usadas para análise comparativa e constante interpretação no contínuo processo de pesquisa. Basicamente, a categoria central e subjacente reuniram uma coleção de enuciados classificados como semelhantes em seu sentido, que permitiram identificar e descrever as características punitivas das penas alternativas, propósitos e contextos da sua execução. Por sua vez, os temas foram constituindo-se enquanto "essência" significativa que atravessou os dados. Resumidamente, os temas constituíram-se como as narrativas em geral das penas alternativas (MORSE, 2008).

No primeiro momento, foi realizada uma rodada inicial de codificação e análise, cujos primeiros temas informados e selecionados foram: punição, referência à prisão, punição ou política pública, ruptura com a prisão e cumprimento da pena na comunidade. Uma vez que esses temas foram reunidos, uma ideia analítica e uma imagem indutiva-relacional surgiram desse processo, que permitiu acesso cognitivo aos seus conteúdos e significados. As observações desses temas, primários, foram invocadas como um sumário dos conteúdos constitutivo-argumentativos das penas alternativas.

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A codificação inicial dos temas também serviu para visualização e redução dos dados e progressão no desenho da pesquisa pela identificação e análise das relações entre palavras, conceitos, ideias e conteúdos constitutivo-argumentativos. Em seguida, outras perguntas sobre as comunicações e conexões apresentadas nos temas foram realizadas. O que é isso? Como os temas se comunicam? Nesse sentido, a codificação dos temas permitiu que a unidade central, a punição, fosse estreitando a análise de conteúdo de maneira gerenciável. Isso, por sua vez, tornou possível a análise conceitual e relacional dos resultados de investigação. Por exemplo, a forma como a punição é apresentada na construção das penas alternativas indica um paradoxo: por um lado, como dissuasão e, por outro, como política pública de inclusão social pela reabilitação na comunidade. A própria palavra punição raramente apareceu nos textos analisados, os termos mais frequentes foram responsabilização, ressignificação do ato, resposta penal, sanção penal ou cumprimento de uma pena pelo cometimento de uma infração penal.

Estrategicamente, a primeira codificação de temas também buscou identificar e determinar novos temas a partir dos primeiros conteúdos constitutivo-argumentativos. Dessa forma, foi possível apreender novas observações de segmentos de texto relevantes ao estudo, que, dependendo do tipo e amplitude, puderam permitir a identificação de novos temas para posterior análise.

Assim, novas rodadas de análise foram realizadas buscando verificar a convergência e a complementaridade ou não das relações verificadas a partir dos diferentes temas. De fato, tratou-se de uma análise de constante comparação, de forma estruturada e sistemática. Segundo Glaser, Strauss e Corbin (GLASER, 1978; GLASER; STRAUSS, 1967; STRAUSS, 1987; STRAUSS; CORBIN, 1990, 2008), a análise de constante comparação teve como propósito fornecer ao pesquisador ferramentas analíticas para análise dos dados e a compreensão dos seus múltiplos significados. Então, as novas rodadas tomaram os resultados da primeira codificação – conteúdos constitutivo-argumentativos – como dados descritores.

Para executar a análise de constante comparação, novos temas foram criados, que, juntos com os temas anteriores, foram agrupados e comparados em clusters. Então, foram realizadas mais três rodadas de análise.

Segunda rodada com a inclusão dos temas: intervenção penal, prevenção criminal, para quem e tecnologia penal-governos das pessoas.

Terceira rodada com a inclusão dos temas: ação política, moral e ordem (jurídico- legal).

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Quarta rodada com a inclusão dos temas: pressuposto abolicionista, completude da pena e net-widening/Add-Ons.

Dessa forma, foi possível construir um mapa cognitivo para compreensão das interações entre os temas, seus quadros conceituais e teóricos. Essencialmente, o processo constituiu-se em considerar como diferentes temas podem se combinar para formar um quadro teórico abrangente – uma narrativa. Os temas foram examinados a fim de estabelecer sua existência e/ou frequência, bem como o nível de abstração e generalização dos conteúdos constitutivo-argumentativos.

Pode-se tomar a narrativa como o componente final do processo da análise de conteúdo, que tratou de responder às questões da pesquisa. A narrativa procurou tornar os resultados tanto compreensíveis quanto acessíveis aos leitores. Ainda, os conteúdos constitutivo-argumentativos das penas alternativas foram apresentados em um formato visual.