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5 PERCURSO METODOLÓGICO

5.2 O método

5.2.2 Codificação

A fase da codificação é a fase é fase do tratamento dos dados, ela "corresponde a uma transformação - efetuada segundo regras precisas - dos dados brutos do texto" (BARDIN, 2011, p.133). Esta transformação se dá por meio de recortes, agregações e enumerações que viabilizam o surgimento de "representação do conteúdo ou da sua expressão; suscetível de esclarecer o analista acerca das características do texto, que podem servir de índices”. (BARDIN, 2011, p.133).

Três escolhas organizam esta fase de acordo com a proposta de Bardin (2011, p. 134): 1 – o recorte: realizado através de escolha das unidades;

2 – a enumeração: definição de regras de contagem; e, 3 – classificação e a agregação: escolha das categorias.

Nas escolhas relacionadas ao recorte define-se quais elementos do texto decomposto serão trabalhados como elementos completos. Esta escolha é conhecida como demarcação de

unidades de registro e contexto. A unidade de registro é a "unidade de significação

codificada e corresponde ao segmento de conteúdo considerado unidade de base, visando a categorização e a contagem frequencial". (BARDIN, 2011, p. 134). Estes recortes são identificados em níveis semânticos por temas, ou linguísticos, por palavras e/ou frases.

Os critérios da Análise de Conteúdo são "sempre de ordem semântica". (BARDIN, 2011, p. 134). Mas, é correspondente ao método a utilização de unidades formais como palavra e palavra-tema; frase e unidade significante, por exemplo. Abaixo, no quadro 5, segue-se a descrição das unidades de registro mais frequentemente utilizadas pelos analistas:

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Quadro 5 – Unidades de registro mais frequentemente utilizadas por analistas de conteúdo.

Unidades de registro

Descrição

A palavra Cada palavra de um texto pode ser considerada como unidade de registro. Também é possível adotar palavras-chave, ou palavras-tema. É possível também classificar as palavras como vazias ou cheias, ou considerar apenas categorias de palavras como verbos ou adjetivos, por exemplo.

O tema É compreendido como uma afirmação acerca de um assunto. "O tema é a unidade de significação que se liberta naturalmente de um texto analisado segundo certos critérios relativos à teoria que serve de guia de leitura". (BARDIN, 2011, p. 135). O texto pode ser reorganizado por ideias,

enunciados e proposições, por exemplo. Sua validade é de ordem psicológica, não linguística. Os núcleos de sentido são definidos por presença e

frequência de aparição. O objeto ou

referente

São temas-eixos agregados que surgem a partir da observação de como os discursos se organizam. O recorte do texto é feito em função desses eixos. O personagem Atributos do ator ou actante, como estatuto social, idade etc. Bardin

exemplifica que um filme pode ser analisado segundo seus personagens. Esta unidade pode ser combinada com outros tipos de unidades.

O acontecimento Unidades de registro na qual relatos e narrações são recortados como unidades de ação. Exemplos: contos, notícias, relatos de experiência etc. Nestes casos, o próprio acontecimento é a unidade de registro ao redor da qual os discursos se encontram.

O documento As unidades de gênero (relato, livro, artigo etc.) também podem ser

consideradas unidades de registro se for possível caracterizá-los globalmente. Isto significa que a "ideia dominante ou principal seja suficiente para o objetivo procurado". (BARDIN, 2011, p. 135).

Fonte: Elaboração própria baseada em texto de BARDIN, 2011, p.134-137.

Dois aspectos relativos às unidades de registro necessitam de um olhar mais atento nesta pesquisa. O primeiro deles diz respeito ao tema ser considerado uma unidade de registro bastante utilizada no estudo de motivações, opiniões, atitudes, valores e crenças. Entrevistas com questões abertas, por exemplo, geralmente são analisadas por unidades de registro organizadas em temas. Assim, seu recorte se baseia no sentido, não na forma, pois, este "depende do nível de análise e não de manifestações formais reguladas" (BARDIN, 2011, p. 135).

O segundo aspecto que precisa ser destacado aqui é uma consideração imprescindível ao observar o quadro teórico que baseia este estudo. Quando Bardin (2011, p. 136) descreve os personagens enquanto possibilidades de unidades de registro, ela demarca pontualmente a interpretação de atores e actantes como ou humanos, ou equivalentes, os animais.

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Esta afirmação não é problematizada adiante pela autora. Vale destacar que, apesar da edição da publicação do texto da autora utilizado como referência aqui é de 2011, mas a primeira publicação é de 1977. Possivelmente, a partir dessa colocação, uma plataforma digital poderia ser considerada como objeto ou referente.

Porém, ao tratar de agenciamentos sociotécnicos e tomar por base teorias nas quais os artefatos sociotécnicos são compreendidos como agentes e, cujos ambientes digitais possuem a affordance da comunicação por meio de discursos verbais e imagéticos, ou seja, são actantes "falantes"168. Assim, no que concerne a este trabalho, as plataformas digitais, assim como canais do YouTube, por exemplo, serão considerados como personagens, e não, objetos ou referentes.

A segunda escolha deve definir a enumeração da unidade de registro, assim como a regra que irá delimitá-la. Após a identificação ou recorte dos textos, as unidades de registro são identificadas com base em uma referência criada para tal fim. Com a norma de identificação definida é possível enumerar as unidades por presença/ausência, frequência ponderada, intensidade, direção, a ordem e a co-ocorrência.

Sobre as regras de enumeração destacam-se alguns elementos. Do ponto de vista da Análise de Conteúdo, a ausência (ou silêncio) pode significar tanto quanto a presença a depender dos objetivos da pesquisa. (BARDIN, 2011, p. 138). Pela frequência não-ponderada, geralmente interpreta-se que quanto mais um elemento se repete (é presente), mais importante ele é dentro do discurso. Porém, é possível interpretar esse dado de outra modo a partir da regra da frequência ponderada.

Algumas ausências, por exemplo, podem ter mais peso que certas presenças. Por exemplo, no corpus desta pesquisa os problemas técnicos do YouTube têm maior presença por frequência entre os criadores de conteúdo com mais de 1 milhão de inscritos e ausência entre os criadores com menos de 100 mil inscritos.

Quais aspectos estão relacionados entre a presença e ausência desta unidade de registro específica? A presença é mais importante que a ausência? Considera-se que a presença e ausência desta unidade de registro têm importância equivalente nesta análise. A ponderação pode ser uma "decisão tomada a priori, mas pode também traduzir as modalidades de expressão ou a intensidade de um elemento". (BARDIN, 2011, p. 139-140).

168 Ver ARAÚJO, Willian. A construção da norma algorítmica: análise dos textos sobre o Feed de Notícias

do Facebook. E-Compós. 21, 2018.

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O grau de intensidade pode ser delimitado pela definição de verbos, tempo verbal, adjetivos e outras unidades formais da língua, por exemplo. Essas regras podem ser utilizadas todas em combinação ou isoladamente, escolha a ser tomada pelo analista à medida que a análise se desenvolve.

Segundo Bardin, os dados de frequência demonstram uma natureza quantitativa (intensidade) ou qualitativa: a direção. "A direção pode ser favorável, desfavorável ou neutra (...). Os polos direcionais podem ser de natureza diversa: bonito/feio (critério estético), pequeno/grande (tamanho)." (BARDIN, 2011, p. 141). Caso opte-se pela regra de direção, o analista deve elaborar um índice qualitativo, por exemplo, o sinal "+" (soma) pode indicar direção positiva, e, o sinal "-" (subtração) pode identificar uma direção negativa.

Pela regra da ordem, as aparições que surgem primeiramente são consideradas mais relevantes para a análise do que as que são mais frequentes. Identifica-se assim, por exemplo, encadeamentos e sucessões de entre os índices de acordo com a ordem com que aparecem. A medida de co-ocorrência "é a presença simultânea de duas ou mais unidades de registro numa unidade de contexto". (BARDIN, 2011, p. 142). Ela pode ser escolhida recortando o texto em quantos elementos forem necessários para identificar em quais elementos ocorrem em quais unidades de registro, ou, determina-se uma unidade-eixo que indica as unidades de registro anteriores e posteriores, por exemplo. Na co-ocorrência trabalha-se com os indicadores

associação, equivalência e oposição.

Qualquer escolha de uma regra (ou de várias regras) de enumeração assenta numa hipótese de correspondência entre a presença, a frequência, a intensidade, a distribuição, a associação da manifestação da linguagem e a presença, a frequência, a intensidade, a distribuição, a associação de variáveis inferi das, não linguísticas. É conveniente procurar-se a corres- pondência mais pertinente. (BARDIN, 2011, p. 143).

É importante mencionar que a Análise de Conteúdo é um método utilizado em tanto em pesquisas quantitativas, quanto qualitativas e quantitativas-qualitativas. Por mais que se trate de uma abordagem estruturalista, a variedade de regras aplicáveis conjuntamente ou separadamente, proporcionam um amplo espaço de análises possíveis.

O analista pode criar regras específicas a partir do aparecimento de dados na pré- análise, por exemplo. Assim, o método fundado no estruturalismo, ao contrário do que muitos podem avaliar, embora ofereça estruturas de organização muito bem delineadas, elas não limitam o potencial de expansão dos dados a serem codificados em em estruturas pré- definidas e inflexíveis.

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Isto permite, como no caso desta pesquisa, a combinação de interpretações tanto por meio de dados quantitativos (já que se decompõe o texto), quanto qualitativo. Regras de enumeração podem ser combinadas com medidas semânticas, como a intensidade e a direção, por exemplo. Não há impedimento da utilização de elementos em conjunto.

O importante é que esta forma de organização seja utilizada de modo a fazer os dados falarem quanto mais não esteja claramente visível no discurso. O desafio do analista é compreender que a Análise de Conteúdo apresenta ferramentas para uma exploração infinita dos dados e ter em mente que encerrar a análise será mais uma entre tantas decisões que cabem ao analista que trabalha com este método.

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