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3. Análise das Diretrizes Curriculares dos Cursos de Licenciatura

3.1 A Coleta de Dados

A coleta de dados foi realizada com os acadêmicos concluintes dos 4º anos de cinco licenciaturas, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), que são: História, Pedagogia, Química, Matemática e Biologia. A escolha decorre do fato de que estes cursos estão contemplados por professores da área no projeto Letramento Docente do Mestrado em Educação, também da UEPG.

A escolha pelos alunos participantes foi elaborada de forma aleatória, com base, na vontade dos que gostariam de colaborar. Explicavam-se os propósitos da pesquisa na sala e, dentre os acadêmicos que demonstravam interesse, escolhia-se aleatoriamente. Após a seleção dos participantes, repassavam-se algumas informações iniciais – como eram as situações-problema, que havia liberdade para que se expressassem, etc.

As situações-problema consistem em três casos que envolvem fatos cotidianos em sala de aula e que envolvem a noção de alteridade. Com base nelas, os acadêmicos são questionados sobre como agiriam enquanto professores daquela sala de aula hipotética. A partir dessas considerações iniciais, gerou-se a discussão dando abertura para o Grupo Focal. Em cada situação-problema procurou-se contemplar faces da alteridade social, política, cultural, etc.

Ressalta-se a importância das situações-problema e dos questionamentos buscados nos Grupos Focais com os concluintes das licenciaturas da UEPG, pois, nesse momento, evidenciam-se não só as concepções sobre o conceito de alteridade presentes nos documentos oficias e durante sua caminhada na graduação, mas, também, representações e compreensões sobre suas visões do campo educacional decorrentes das experiências de vida no seio familiar, grupo de amigos e nas instituições da sociedade.

As três situações-problema apresentadas aos licenciados foram construídas buscando diversificadas faces que o conceito de alteridade abrange e permeia nos inter- relacionamentos sociais. Desse modo, de maneira sugestiva e alusiva, em cada situação procurou-se corresponder a uma ou mais dessas faces.

Na situação A trabalhou-se com questões sócio-econômicas, trazendo-se um problema que gira em torno da precariedade das condições de vida de um aluno que,

devido a estas condições chega atrasado a aula. Nessa situação-problema ocorre um confronto entre o regimento do colégio e os fatores sócioeconômicos de sua família, permanecendo no centro do conflito o professor. Segue a situação-problema A:

Situação A

O regimento do colégio não tolera atrasos por parte dos alunos. Entretanto, em sua sala de aula do turno da manhã há um aluno (pré-adolescente) que rotineiramente se atrasa, pedindo para entrar em sua sala de aula. Na tentativa de descobrir os motivos desse atraso, você vai até a casa do aluno, descobrindo, então, que se trata de uma família muito humilde, com poucos recursos financeiros, que não tem em casa, nem mesmo, um despertador. Por isso, o aluno depende que a sua mãe o acorde. Quando isso não acontece, ele chega atrasado à escola ou simplesmente não aparece nas aulas. Na classe, os demais alunos da sala reivindicam de você uniformidade nos procedimentos, ou seja, que você permita o atraso para todos ou para ninguém.

Diante dessa realidade, você professor posiciona-se de que forma? Traga argumentos para sustentar sua posição.

Na situação B mesclavam-se diversas faces da alteridade, procurando-se envolver de forma macro, o âmbito político e o jurídico-institucional, quando se faz referência ao número de vagas, falta de estrutura dos colégios e a transferência de alunos. A nível micro, abordar a postura do professor enquanto um intelectual crítico e a participação da comunidade nas discussões, focalizando, assim, a relação indivíduo/coletivo. Além disso, tem-se o prisma identitário, cuja presença influencia na vontade de pais e alunos para mudar de colégio, isto é, a rede de amizades e a identificação com o bairro representam laços de afeto e de identidade. Abaixo explicita- se a situação-problema B:

Situação B

Diante da falta de estrutura básica da escola em que você leciona, um de seus colegas professores propõe que haja uma diminuição ou corte do número de alunos para além de 30 alunos em cada sala de aula. Esse professor argumenta que os excedentes podem ser encaminhados para uma escola recém inaugurada, que se situa em outro bairro, bem longe da escola em questão. Os demais professores concordam e manifestam a necessidade de adotar critérios para agir com justiça diante da situação. Um grupo de professores propõe o critério acadêmico, ou seja, que passem para outra escola os alunos com as piores notas. Outro professor sugere verificar os endereços mais distantes da atual escola para encaminhá-los para a nova escola. Outros ainda sugerem que sejam passados para a nova escola os alunos que tem matrículas mais recentes, usando-se do critério da antiguidade. A situação já está indo para os jornais e as mães estão se mobilizando para garantir que todos os alunos permaneçam na escola, mesmo com sobrecarga de trabalho para os professores. Qual critério e argumento você apresenta para a resolução dessa questão? Defenda-o.

Na situação C tem-se, novamente, a tensão existente na relação indivíduo/coletividade, representado no dilema entre alunos com dificuldades de aprendizagem e outros com facilidade, sendo o professor o mediador desse elo. Destarte, as concepções pedagógicas e as decisões do docente sofrem influências do currículo, dos pais, dos diretores, etc., figurando como manifestações das condições externas a prática docente que catalisam forças político-sociais. Desse modo, apresenta- se em uma mesma situação caracteres políticos e pedagógicos. A seguir demonstra-se o enunciado da situação-problema C:

Situação C

Em sua sala de aula há alguns alunos com dificuldades de aprendizagem decorrentes de problemas psicossomáticos. Para que estes alunos também consigam apreender os conteúdos, você precisa atrasar a velocidade das suas explicações e a realização das atividades, pois esses alunos sempre necessitam de maior apoio. Com isso, o andamento do programa de sua disciplina ficou atrasado, sendo que os alunos mais velozes ficam irrequietos na classe e mostram-se insatisfeitos por terem que “esperar” enquanto você atende os alunos com dificuldades de aprendizagem. Algumas mães já foram à Direção do Colégio queixar-se da sua falta de atenção justamente com os “melhores” alunos da classe. Como agir nessa situação? - Sugerir à Direção a separação dos atrasados para terem atendimento especial fora do horário de aula, mesmo que esta não lhe pague horas extras? - Tentar o diálogo com todos os alunos da classe para que compreendam e apóiem a necessidade dos que estão com dificuldades, ainda que isso gere tempo ocioso para alguns? - Permanecer apoiando os alunos com dificuldades, mas também prover atividades desafiadoras para serem realizadas apenas pelos alunos mais velozes? - Outra opção? Qual? Defenda sua posição.

O número de participantes girou em torno de 20% do total de acadêmicos das salas pesquisadas, o que significa entre três a seis acadêmicos. Na Licenciatura em Pedagogia, seis acadêmicas participaram do Grupo Focal, denominadas de (P1, P2, P3, P4, P5 e P6); na Licenciatura em História, quatro concluintes participaram, denominados de (H1, H2, H3 e H4); na Licenciatura em Biologia, cinco acadêmicos participaram, denominados de (B1, B2, B3, B4 e B5); na Licenciatura em Matemática, três acadêmicos participaram, denominados de (M1, M2 e M3); na Licenciatura em Química, quatro acadêmicos participaram, denominados de (Q1, Q2, Q3 e Q4).

Dessa forma, tem-se uma porcentagem que se pode chamar de segura e substancial, sem que se perca o foco das discussões, afinal, um número muito grande de participantes dissiparia as questões no momento do Grupo Focal. O quadro a seguir evidencia algumas informações:

CURSO DATA DO GRUPO FOCAL NUMERO TOTAL DE ACADÊMICOS POR TURMA ACADÊMICOS PARTICIPANTES

Pedagogia 21/05/2009 30 ACADÊMICOS 6 acadêmicos

História 19/05/2009 22 ACADÊMICOS 4 acadêmicos

Biologia 21/10/2009 24 ACADÊMICOS 5 acadêmicos

Matemática 22/10/2009 8 ACADÊMICOS 3 acadêmicos

Química 23/10/2009 17 ACADÊMICOS 4 acadêmicos

Pretende-se, identificar as aproximações e distanciamentos das respostas dos acadêmicos em relação às Diretrizes Curriculares e aos Projetos Pedagógicos, apontando os focos de conflitos, as relações ideológicas e as ressignificações entre os níveis de análise (que vão desde os documentos oficiais à prática na formação de professores).

Com base nessa costura de fontes, pretende-se expor questões sobre a alteridade na educação, focalizando seus entraves e o contexto em que está inserida, além de possíveis caminhos para uma concepção aprofundada de diversidade. Os variados níveis – desde as DCN’s ao Grupo Focal com os acadêmicos – possibilitam uma série de questões a serem debatidas e que refletem uma dentre várias faces da alteridade e do sistema sócio-político, cultural e econômico que a faz emergir no ensino.