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3 A CAMINHADA EM BUSCA DE RESPOSTAS

3.4 Coleta de dados

Ao longo das leituras teóricas, o campo da ergologia me pareceu propício para dar suporte e consistência ao meu objetivo de pesquisa, podendo desta forma abarcar a subjetividade e a experiência intrínseca que o trabalhador traz ao seu trabalho. Porém esta área de conhecimento não é de fácil navegação. Talvez a maior dificuldade da investigação no campo ergológico esteja no fato de que o conhecimento tácito ou o conhecimento informal é de difícil verbalização ou explicitação, afinal o que é trabalho prático, não se mostra através de protocolos ou manuais, se aprende fazendo.

Assim, me cerquei de vários métodos investigativos para que as informações e observações adquiridas pudessem estar o mais próximo possível da realidade dos trabalhadores de enfermagem, levando em conta que várias pesquisas, nesta área de atuação, apontaram algumas carências na parte metodológica tal como o estudo dirigido por Cavaco (2009). A autora refere que encontrou no percurso metodológico uma barreira formada pelas interferências externas, as parcialidades dos trabalhadores e a difícil elaboração por parte dos trabalhadores de suas experiências práticas. A autora aponta que se faz necessário a utilização de investigações inovadoras que consideram a especificidade dos processos de formação experiencial e dos saberes resultantes de tal formação.

Na minha experiência enquanto pesquisadora, enxergar o invisível da atividade não foi tarefa fácil, porém considero que fazer parte, enquanto trabalhadora, do setor no qual se deu a pesquisa, facilitou esse processo. Desenvolver um olhar crítico e apurado para as situações que deveriam ser vistas ao longo da coleta de dados foi um exercício diário enquanto pesquisadora, tendo em vista que a análise e a observação das situações não se deram apenas em determinado momentos programados, eles permearam toda a minha ação ao longo da coleta de dados e até mesmo antes desse período formal se estabelecer.

Os métodos de pesquisa utilizados foram observação participante, com um olhar critico sobre o campo de pesquisa, ao longo do turno da manhã, ao qual eu fazia parte, o que a propósito já vinha ocorrendo, a partir do momento em que os conceitos de ergologia passaram fazer parte da minha rotina acadêmica. Segundo Alves-Mazzotti e Gewandsnajder (1996), nas pesquisas qualitativas, o pesquisador é “o principal instrumento de investigação e [existe] a necessidade de contato direto e prolongado com o campo, para poder captar os significados dos comportamentos observados” (p. 132).

O método da observação participante não apresenta uma única definição por parte dos estudiosos da área da sociologia e da antropologia, porém o caminho lógico para

esclarecê-la é que se trata de uma observação onde o pesquisador coopera ou participa ativa ou passivamente do campo observado e com os pesquisados. Portanto Haguette (1995) cita a definição dada por Morris S. Shwartz e Charlotte Green Schwartz, onde os autores definem a observação participante como não só um instrumento de captação de dados, mas também, como um instrumento de modificação do meio pesquisado, tendo em vista que o pesquisador faz parte do contexto, no qual ao mesmo tempo que ele modifica, também é modificado por este contexto.

Segundo os autores que estudam sobre a participação do pesquisador na observação, tal presença e o compartilhamento de aspectos subjetivos das ações das pessoas pesquisadas, se torna um requisito para a compreensão da ação humana, aspecto fundamental para uma pesquisa qualitativa com uma visão dialética dos fatos.

As observações abrangeram em especial a troca de ideias entre os técnicos de enfermagem, e destes com o enfermeiro do setor; as renormalizações contidas no trabalho; a maneira (com qual tipo de saber – saber formal ou informal) que a orientação é passada para o técnico de enfermagem novo no setor, ou aquele que apresenta dúvidas sobre algum processo e os momentos onde a experiência torna-se equivalente ou se sobrepõem ao conhecimento científico. O intuito era entender a lógica da ação dos trabalhadores no momento da atividade. Segundo Ávila (2007), “quanto menos se sabe sobre o trabalho do outro mais necessário é conhecer, em detalhamento, as interações de elementos que o levaram a agir de determinada maneira e não de outra” (p.161).

Porém vale lembrar que tal método apresenta algumas limitações, assim como tantos outros métodos. O primeiro seria as interferências que o pesquisador pode fazer nas suas observações, em consequência de seu envolvimento na situação pesquisada. Haguette (1995) aponta ainda que outro ponto desfavorável seria a impossibilidade de generalizações dos resultados. A autora afirma que “por ser uma técnica que busca mais os sentidos do que as aparências das ações humanas ela coloca seus próprios limites, não pode pretender a abrangência do “survey” embora o supere em termos de profundidade dos dados” (p. 76).

Da mesma forma tendo em vista que esse método não apresenta roteiro ou instrumento específico para guiar o pesquisador, corre-se o risco de vieses do observador do tipo emocional, cultural, profissional, ideológico, entre outros que possam surgir ao longo da observação podendo levar a uma visão não tão neutra e real dos fatos. Portanto, tal técnica traz em si algumas desvantagens, assim segundo Haguette (1995), é fundamental que o pesquisador esteja atento a fim de evitá-las quando for possível e de aceitá-las quando inevitáveis, embora consciente das distorções que podem provocar.

Outra ferramenta utilizada já no inicio do projeto e que continuou sendo útil até o final da coleta de dados foi o diário de campo, onde todas as observações e conversas que se tornaram pertinentes foram sistematicamente anotadas. Segundo Triviños (1987), as anotações de campo tanto podem ser descritivas quanto reflexivas, portanto anotei tanto a descrição de comportamentos, ações e atitudes, o meio físico e os diálogos, quanto, as reflexões criticas sobre as situações vividas no trabalho, tendo a atenção de não me deixar levar por preconceitos e me mantendo em estado de alerta para as situações que pudessem contribuir para a pesquisa.

No diário de campo foram anotados diálogos entre a equipe técnica e de enfermeiros sobre momentos e modos de capacitações, conversas informais entre colegas, procedimentos técnicos onde o saber informal teve que ser utilizado, comentários da equipe sobre como seus conhecimentos anteriores e anos de experiência profissional facilitaram sua adaptação aos processos de trabalho, criticas da equipe sobre os trâmites burocráticos dos processos, entre outros.

Para que se pudesse ter um momento sozinho com cada participante da pesquisa a fim de buscar algumas opiniões dos mesmos, foi elaborada uma entrevista semiestruturada a qual foi aplicada individualmente a cada participante da pesquisa. Tal entrevista foi agendada previamente com o pesquisado sendo que o horário imediatamente após a jornada de trabalho foi elencado pelos participantes como sendo o horário ideal para esse momento.

Dessa forma, as entrevistas se deram no período entre às 13 horas e às 15 horas, com duração diferenciada, porém não ultrapassando uma hora de entrevista. O ambiente escolhido para a aplicação da mesma foi um consultório que não é utilizado no período da tarde, dentro do setor escolhido como local da pesquisa.

Antes da aplicação desse método cada pesquisado foi devidamente informado e assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo que a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa, sob protocolo n° 2785/11.

O instrumento para a entrevista foi elaborado cuidadosamente a fim de elucidar as opiniões e “modos de ver e agir” de cada trabalhador na sua atividade. Para que não se perdesse nenhum dado relevante no momento da entrevista, as mesmas foram gravadas, com o consentimento do pesquisado, e após transcritas. Procurei ao longo da entrevista estar atenta para os sinais, movimentos e atitudes de cada participante, para assim poder também compreender as mensagens não verbais transmitidas naquele momento.

O instrumento utilizado para entrevista ao técnico de enfermagem se encontra no Anexo B e para o enfermeiro no Anexo C desse trabalho. Vale lembrar que foram aplicados

dois instrumentos diferentes em função das questões que envolviam a formação profissional e as relações hierárquicas.

Os documentos institucionais, tais como protocolos, manuais, fluxos institucionais e normas técnicas que envolvem o trabalho de enfermagem foram analisados, entendendo que tais documentos formam o que podemos chamar de trabalho prescrito da enfermagem, e desta forma, podem nos levar a um maior esclarecimento das rotinas do trabalho de enfermagem, sua organização e processo de trabalho. Este material foi importante para que pudesse ocorrer a confrontação entre o trabalho prescrito e o trabalho real, no contexto da divisão do trabalho de enfermagem.

A coleta de dados se deu no período de Abril de 2011 à Julho do mesmo ano, sendo que alguns métodos, tais como a observação participante e as anotações no diário de campo, se deram concomitantemente ao meu horário de trabalho e outras, tais como a entrevista, foram realizadas após meu horário de trabalho. Acredito que ser pesquisadora no meu horário de trabalho pode me proporcionar exemplos riquíssimos para posterior análise bem como estar em atividade ao mesmo tempo em que procurava entender e observar algumas situações foi uma experiência muito interessante. Penso que o meu trabalho enquanto enfermeira da instituição não ficou prejudicado por ter realizado a coleta de alguns dados ao longo da minha jornada de trabalho. Ressalto que tive tive a autorização da chefia e da direção do hospital para realizar a pesquisa dessa maneira.