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Colonização do lenho das árvores por fungos apodrecedores

3.2 Biodeterioração do lenho das árvores

3.2.1 Biodeterioração do lenho por fungos apodrecedores

3.2.1.2 Colonização do lenho das árvores por fungos apodrecedores

Segundo Rayner e Boddy (1988), a colonização do lenho de uma árvore pelos fungos ocorre em uma série de heterogêneos microambientes que inibem ou favorecem o seu estabelecimento. Os padrões de colonização são muito diversificados e de difícil classificação em categorias. Entretanto, Rayner (1986 apud RAYNER; BODDY, 1988), propôs que a colonização de fungos de podridão branca, parda e/ou mole pode ser descrita em cinco estratégias, que consideram a distribuição de água e sua relação com a aeração, sendo:

1ª. Apodrecimento do cerne (heart rot): é a maior causa da deterioração do

lenho das árvores e de possíveis problemas de instabilidade estrutural (Figura 4, A).

2ª. Oportunismo não especializado (sap rot): envolve a colonização do

alburno não suscetível, exposto por injúria ou pela morte da casca, resultando na descoloração do lenho e eventual apodrecimento (Figura 4, B). O termo sap rot ou apodrecimento do alburno foi proposto por Blanchette (2003).

3ª. Oportunismo especializado: os fungos se estabelecem em porções do

tronco das árvores que estão sob condições micro-ambientais estressantes. Estes fungos possuem a capacidade de se adaptar e/ou modificar estes microambientes (especialização), levando vantagem sobre outros organismos competidores na captura de recursos nutricionais (oportunismo). O apodrecimento causado por estes fungos ocorre, principalmente, nos galhos e raízes mais afetados pelo estresse da planta; ascomicetos e basiodiomicetos são reconhecidos por esta estratégia de colonização, tais como, Hypoxylon spp. e Stereum spp., respectivamente.

Figura 4 – Apodrecimento em tipuana. A: apodrecimento do cerne (podridão branca) em corte transversal do lenho (seta) (escala = 0,20 m); (B) oportunismo não especializado ou apodrecimento do alburno (podridão branca) em injúria no colo (seta) (escala = 0,10 m)

4ª. Patogenia ativa: alguns fungos apodrecedores podem colonizar o alburno

sadio por mecanismos patogênicos conhecidos, sendo o ataque considerado necrotrófico, quando ocorre a destruição das células vivas do lenho. Nesta estratégia, os fungos (i) modificam as condições micro ambientais do lenho da árvore (ex.: degradação das membranas das pontoações) permitindo o avanço da deterioração ou (ii) atacam as células do câmbio, interrompendo as suas funções fisiológicas e expondo o xilema para a ação dos fungos e outros organismos. Nesta estratégia são reconhecidos 3 mecanismos, sendo: (i) infecção ectotrófica das raízes, quando os fungos produzem uma extensa massa micelial sobre a superfície da raiz e, posteriormente, matam as células do câmbio, colonizando seu interior (ex.:

Heterobasidion annosum, Ganoderma spp. e Armillaria sp); (ii) infecção por injúria,

quando o fungo estabelece um inóculo em tecidos expostos por injúrias, sendo utilizado por fungos seletivos que se desenvolvem em condições específicas de estresse da árvore/meio ambiente e/ou associados a algum vetor, como insetos (ex.: Stereum

sanguinolentum; Coriolus versicolor); (iii) cancros, reconhecidos como porções de

tecido de casca necrosado, resultado do crescimento de microrganismo patogênico e do apodrecimento do lenho subjacente à casca (ex.: Hypoxylon spp.)

5ª. Tolerância ao dessecamento: em certas circunstâncias, a parte superior

de uma árvore pode tornar-se sujeita ao dessecamento ou a flutuações drásticas do teor de umidade do lenho, seja por doença ou atividade fisiológica alterada. Nestas condições, alguns fungos (ex.: vários ascomicetos e basiodiomicetos oportunistas especializados) toleram os baixos ou flutuantes teores de umidade do lenho, tornando- se uma vantagem seletiva, estratégica para a colonização da planta.

Essas estratégias propostas por Rayner (1986 apud RAYNER; BODDY, 1988) não podem ser consideradas excludentes, podendo várias delas serem utilizadas por alguns fungos na colonização de uma árvore. A proposta deve ser considerada, portanto, como uma classificação artificial para o entendimento do processo de biodeterioração e/ou declínio de uma árvore.

As estratégias de apodrecimento do cerne e de oportunismo não-especializado (apodrecimento do alburno) estão, normalmente, associadas às injúrias e são os processos de biodeterioração mais significantvos nas árvores, em termos econômicos e de risco de ruptura. Estes processos não estão associados, necessariamente, a fungos específicos e/ou ao declínio, como estabelecem as outras estratégias de colonização por fungos (oportunismo especializado, patogenia ativa ou tolerância ao dessecamento).

Para a estratégia de apodrecimento do cerne, Rayner e Boddy (1988) propuseram duas classes distintas, freqüentemente observadas, sendo, o

apodrecimento no topo (top rot), com origem na copa e com propagação em direção à

parte inferior da árvore e o apodrecimento na base (butt rot), com originem nas raízes ou no colo do tronco que se propaga em direção à parte superior da árvore. As rotas de infecção/colonização mais significativas (Figura 5) são: i) grandes injúrias que expõem o cerne provenientes, normalmente, de podas e quebra de galhos; ii) pequenos galhos secos e podres, sem cerne formado, mas cujo apodrecimento pode atingir o cerne do tronco; iii) galhos ou raízes com cerne formado, cujo processo de deterioração pode iniciar-se no alburno, propagando-se para o cerne e depois para o tronco; iv) infecção ectotrófica de raízes; e v) contato entre raízes sadias e afetadas pelos fungos.

Figura 5 - Rotas de infecção/colonização de fungos apodrecedores em árvores: (A) grandes feridas que expõem o cerne; (B) pequenos galhos secos e podres, sem cerne formado; (C) galhos e raízes com cerne formado; (D) infecção ectotrófico em raízes; (F) contato entre raízes sadias e afetadas por fungos. (Fonte: RAYNER; BODDY, 1988). (Desenho: OLIVEIRA-NETO2)

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OLIVEIRA-NETO, M.A. de Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A. apodrecimento no topo apodrecimento na base

(E)

(D)

(B)

(C)

(A)

Foelkel e Busnardo (1986) relataram a ocorrência de apodrecimento do cerne de Eucalyptus saligna e E. grandis (podridão branca), tendo como causa o apodrecimento de galhos. Os insetos, principalmente, as brocas-de-madeira podem também influenciar no apodrecimento do lenho das árvores, como o besouro-de- ambrosia Monothrum scutellare (família Scolytidae) observado por Svihra e Kelly (2004) no processo de infecção e de apodrecimento do tronco de árvores de Quercus agrifolia (carvalho), relacionando-se a maior atividade do inseto com o aumento do apodrecimento do cerne.

Apesar das diversas rotas, o apodrecimento do cerne está mais associado às injúrias causadas no sistema radicular, tronco e/ou galhos, que expõem o cerne (FELIX; SHIGO, 1977; YOUNG, 1984; FOELKEL; BUSNARDO, 1986; RAYNER; BODDY, 1988; SHORTLE; SMITH, 1998; BLANCHETTE, 2003). As outras rotas possuem, normalmente, especificidade com fungos patógenos e/ou oportunistas seletivos. Entretanto, a seletividade e capacidade de colonização do lenho pelos fungos que causam o apodrecimento do cerne estão relacionadas, principalmente, às condições micro ambientais nesta porção da madeira.