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2.2 Colonização do Piauí: controvérsias

Corroborando com as mesmas idéias, mais tarde, Nunes (1974) reafirma ter sido o Piauí – um território desbravado por vaqueiros e bandeirantes – uma boa parte deles paulista, que mantinha a base da sua economia advinda da concessão de sesmarias e o provimento das patentes militares. A respeito disso, Nunes (1972, p.3) também escreve: “Domingos Jorge Velho e seus sucessores repetidamente deixaram patenteado que foram efetivamente pioneiros

de nossa economia”. Padre Cláudio (1993, p.12) também se pronuncia, ao afirmar a

“O bandeirante Domingos Jorge Velho, com um grupo destemido de outros paulistas, por

volta de 1662, ocupou a mesopotâmia do centro norte piauiense, dando começo, em nossa

terra, a atividade pastoril”.

Com o mesmo pensamento e ponto de vista semelhante ao de Nunes, Monsenhor Chaves trata do assunto, acrescentando, também, a importante participação do baiano, além do paulista, na colonização do Piauí, destacando que:

Imbuídos dos mesmos propósitos, de par com a ocupação da terra para a instalação de suas fazendas de gado, foi que pisaram o solo piauiense no fim do século XVII bandeirantes paulistas e curraleiros baianos da Casa da Torre, na época do devassamento. (MONSENHOR CHAVES, 1998, p.182).

Além desses, outros historiadores apontam outro grupo étnico como responsável pela ocupação do solo piauiense, dentre eles Noé Mendes que, ao fazer relato da colonização do Piauí, assegura que:

Paulistas, baianos e pernambucanos foram os primeiros desbravadores do imenso espaço habitado por inúmeras nações indígenas. Eles implantaram suas fazendas de gado numa terra conquistada palmo a palmo, a custo de sangrentas lutas. (BARROS, 2007, 31).

Percebe-se, ainda, que a herança social, cultural, política e econômica do piauiense não é proveniente somente da inter-relação entre os bandeirantes paulistas, mas também de outras etnias que aqui chegaram para ajudar a erguer a cidade.

Dessa forma, quando se fala do soerguimento e construção de Teresina, não se pode deixar de tratar também do Piauí, posto que o soerguimento do Estado deu-se primeiro, via estabelecimento da capital, destacando-se que a construção de um meio social surge da dinâmica e da imperativa movimentação social entre os diferentes agentes que compõem uma

sociedade. Essa dinâmica costuma ser „natural‟ e sem planejamento, fato que não se deu com

Teresina, que foi uma cidade pensada e planejada, trazendo consigo a necessidade de construir vínculos sociais artificiais. De fato, não existia uma sociedade, economia ou cultura teresinenses, ou melhor, piauiense, essa cidade estava nascendo no afã de uma civilização. E com o passar dos anos e dos tempos, Teresina ia se configurando, e todos os seus elementos prenunciavam as características de sua identidade social – a da nova capital do Piauí.

Um fator considerado também importante para a constituição da futura sociedade piauiense era o contingente de grupo social – ou melhor – os novos habitantes que vieram de

outras partes da província, atraídos pela nova cidade, os migrantes e retirantes do século XIX

que fugiam de „grandes secas‟ (SILVA, 2005), como a de 1877. Nesse contingente incluem-se

os negros e escravos que ergueram a cidade e eram presenças marcantes na vida urbana, embora fossem excluídos e alijados do processo de urbanização de Teresina. Como se observa, esta cidade agrupa populações diversas decorrentes da própria formação do Estado.

Outro paulista teve grande contribuição na formação e colonização do Piauí. Trata-se de Francisco Dias de Siqueira que, conforme apontam os historiadores, foi o primeiro bandeirante paulista a se estabelecer às margens do Gurguéia4 com o fito de explorar as terras piauienses. Este muito se dedicou à nação indígena, que vivia e trabalhava na sua fazenda, tornando-se um pacificador e amigo daquele povo. A sua contribuição foi tamanha na condução da educação e catequização deste povo que a Junta Provisória governante do Brasil da época concedeu-lhe a patente de capitão-mor e administrador dos índios pela amizade conquistada. Ele foi honrado

também por apresentar “um lastro de serviços prestados ao Piauí, para onde volta com

propósitos de prosseguir na nação colonizadora” (NUNES, 1974, p. 52).

Embora haja uma controvérsia em apontar ora o bandeirante paulista Domingos Jorge Velho como o primeiro a pisar o solo piauiense, ora o baiano Domingos Afonso Sertão (o Mafrense), a maioria dos historiadores tende a creditar como precursor da colonização do Piauí Domingos Jorge Velho. E nesse sentido é que, nas páginas iniciais da Obra Devassamento e Conquista do Piauí, Nunes diz que:

Filiamo-nos à corrente dos que aceitam Domingos Jorge Velho como precursor de nossa colonização. Isso já fizemos sentir em trabalhos anteriores. Cremos que foi ele quem introduziu nos campos piauienses os primeiros rebanhos de gados vacum, cavalar, caprino, e ovino, quem lançou no seio da terra piauiense as primeiras sementes de malváceas e gramíneas, imprescindíveis ao desenvolvimento da população. (NUNES, 1972, p.3).

Conforme a literatura, apesar de Domingos Afonso Mafrense ter prestado grandes serviços ao Piauí, através do cultivo de plantações e criação de gados, a sua presença no território piauiense é registrada somente em 1676, e “como pedidor de sesmarias”, seguido da

conquista de terras que “deu-se à custa de sangue”. (NUNES, 1972; 1975).

Outro pesquisador da historiografia do Piauí do Estado – o Padre Cláudio Melo – em pesquisas realizadas nos arquivos portugueses, afirma que fora Domingos Jorge Velho que

4 Nasce a 700 metros de altitude numa das encostas da Chapada da Mangabeira, constituindo-se no maior

afluente da margem direita do Parnaíba. É o afluente que banha o maior número de municípios piauienses, segundo Adrião Neto (2003).

realmente se antecipou a Mafrense e que a “implantação dos primeiros currais marcha pela

Ibiapaba e não pelos vales do Gurguéia”. (MELO, 1993, p.13).

Pode-se perceber também o forte indício da contribuição de baianos, pernambucanos e, sobretudo, de paulistas na colonização e formação do Piauí. E essa contribuição não foi somente no aspecto cultural, possivelmente tenha sido acima de tudo linguística, visto que, durante a sua colonização, decorrente da interação entre homem e sociedade, e do contato destes últimos, houve incorporação de hábitos, atitudes e o jeito de expressar dos paulistas, adotados, consequentemente, pelos piauienses, em virtude dessa inter-relação durante a colonização do Estado.

Um fato é certo: tendo sido o Piauí colonizado por paulistas ou baianos ou ainda por pernambucanos, acredita-se que o piauiense tenha sofrido influência de todo esses falares, devido não só ao contato linguístico, mas também decorrente das relações sociais e comerciais que mantiveram durante o período de colonização. Nesse sentido, Bloomfield, ao tratar de línguas e dialetos em contato (apud WEINREICH et al 2006, p.93), assevera que:

Todo falante está constantemente adaptando seus hábitos de fala aos de seu interlocutor; ele abre mão de forma que tem usado, adota novas e, talvez mais freqüentemente que tudo, muda a freqüência das formas faladas sem abandonar inteiramente as velhas ou aceitar qualquer uma que seja realmente nova para ele.

Por essa razão, acredita-se que a fala do piauiense tenha sofrido influência de toda ordem, embora não fale exatamente igual a paulistas, baianos e pernambucanos, os piauienses compartilham traços linguísticos que distinguem seu grupo de outros, compartilhando norma e atitudes linguísticas diante do uso da linguagem, como é próprio de toda comunidade de fala.

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