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4. A BRINCADEIRA E O DESENVOLVIMENTO

4.2 Como a criança brinca?

Desde muito cedo, a criança começa a brincar. O bebê, ao manter o contato com seu corpo, tocando seus dedos das mãos e dos pés, vai descobrindo as características do seu corpo, movimentando com espontaneidade e satisfação. No terceiro mês de vida, ele se utiliza dessas ações e vai descobrindo as outras partes do corpo, como orelha, nariz, começando também a explorar o seu exterior, como o corpo de sua mãe. Consoante Bandet e Sarazanas (1973, p. 61), o primeiro brinquedo da criança, objeto favorito de sua atenção e espanto, é realmente o corpo humano, quer se trate do próprio corpo, quer seja o de sua mãe.

A confiança entre a mãe e o bebê nesse momento reforça o elo entre os dois e, quando isso acontece, a brincadeira ganha movimento, interação, exploração e inovação. Portanto, para realizar a ação de brincar, as crianças precisam ter determinada independência, tanto na escolha dos parceiros da brincadeira como o papel que irá assumir ao longo da brincadeira, pois seu desenvolvimento depende unicamente da vontade de quem brinca.

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As crianças pequenas, por meio do brincar exploratório, acumulam uma série de noções separadas sobre determinado material ou atividade, mas, depois que isso se torna familiar, ela é cada vez mais capaz de perceber padrões ou conceitos subjacentes e de iniciar, principalmente, a reestruturação. (MOYLES 2002, p. 88).

No ato de brincar, os sinais, gestos, objetos e espaços valem e significam outra coisa além daquilo que aparentam ser. Ao brincar, as crianças recriam e repensam os acontecimentos que lhes deram origem, sabendo que estão brincando.

No estádio sensório-motor, como abordou o teórico Piaget (1970), ocorrem os chamados jogos de exercício. Neste período, a criança vai adquirindo competências motoras e aumentando a sua autonomia. Vai preferindo o chão ao berço, demonstrando alegria nas tentativas de imitação da fala e revelando prazer ao nível da descoberta do seu corpo, por intermédio dos sentidos. Elabora então as suas brincadeiras à volta da exploração de objetos pelos sentidos, ação motora e manipulação - características dos "jogos de manipulação". Estes jogos oferecem sentimentos importantes de poder e eficácia, bem como fortalecem a autoestima. Deste modo, constituem peças fundamentais para o desenvolvimento global da criança.

Vygotsky (1998) ensina que tornar a brincadeira como critério de satisfação à criança não é ideia correta, por dois motivos. Primeiro, pelo fato de a sucção proporcionar grande prazer à criança e isso não ser visto como brincadeira. Por outro lado, o fato de frustrá-la quando, em um jogo onde há o vencedor e o perdedor, ela julgar o resultado para si como algo não interessante.

Acrescenta, ainda, acerca deste assunto, o fato de não existir brincadeiras sem regras, pois as regras têm origem na própria situação imaginária, e toda situação imaginária contém regras.

Ainda segundo Vygotsky (1998), ao brincar, a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, no lugar de responder apenas aos ditos fornecidos pelo ambiente externo. A brincadeira permite à criança vivenciar o lúdico e descobrir-se, apreender a realidade, tornando-se capaz de desenvolver seu potencial criativo (SIAULYS, 2005). Nesta perspectiva, as que brincam aprendem a significar o pensamento dos parceiros por meio da metacognição, típica dos processos simbólicos que promovem o desenvolvimento da cognição (KISHIMOTO, 2002).

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Estudos demonstram que a brincadeira não se desenvolve apenas quando o desenvolvimento intelectual das crianças é insatisfatório, mas também quando o é a esfera afetiva (VYGOTSKY, 1998).

Durante a brincadeira de faz de conta, é válido destacar a importância do papel assumido pela criança enquanto brinca, pois, quando ela adota diversos papéis, está agindo diante da realidade como forma de substituição das ações cotidianas pelas ações próprias do papel que assumiram.

Aprender a brincar de forma simbólica, representando a realidade, propicia à criança explorar a imaginação e a capacidade de expressão no momento da brincadeira, por isso é deveras relevante propiciar esses momentos à criança.

Do ponto de vista da esfera afetiva, parece-nos que a brincadeira se organiza justamente na situação de desenvolvimento em que surgem as tendências irrealizáveis. (VYGOTSKY, 1989). Portanto é interessante destacar que a criança busca resolver a tensão entre o mundo imaginativo e o mundo real por meio de sua imaginação, agindo na brincadeira.

A brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem neste estádio e, ao mesmo tempo, típica da vida humana como um todo – da vida natural interna do homem e de todas as coisas. Ela dá alegria, liberdade, contentamento, descanso externo e interno, paz com o mundo... A criança que brinca sempre, com determinação auto- ativa, perseverando, esquecendo sua fadiga física, pode certamente tornar-se uma pessoa determinada, capaz de autossacrifício para a promoção do seu bem e de outros... Como sempre indicamos, o brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda significação. (FROEBEL, 1912c, p. 55). Para esse autor, nas brincadeiras, a criança tenta compreender seu mundo ao reproduzir situações da vida. Assim, quando a criança brinca de faz de conta, ela tem a oportunidade de dramatizar aquilo que é vivido, faz a representação do que vê acontecer na realidade e isso possibilita a externalização de sentimentos e pensamentos.

Na brincadeira, a criança cria uma situação imaginária. Pela oportunidade de vivenciar brincadeiras imaginativas e criadas por elas mesmas, as crianças podem acionar seus pensamentos para a resolução de problemas que lhes são importantes e significativos (BRASIL, 1998, p.28)

De outro lado, a brincadeira contribui para a socialização das crianças, oferecendo-lhes oportunidades de realizar atividades coletivas livremente, além de ter

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efeitos positivos para a aprendizagem e estimular o desenvolvimento de habilidades básicas e aquisição de mais conhecimentos.

De fato, a fim de brincar, é preciso que as crianças tenham certa independência para escolher seus companheiros e os papéis que irão assumir no interior de determinado tema e enredo, cujos desenvolvimentos dependem unicamente da vontade de quem brinca (BRASIL, 1998, p. 28).

Ante tal independência, é que se caracteriza o ato de brincar como atividade livre e espontânea, discutida anteriormente, quando nos reportamos ao conceito do brincar.

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