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4 A REFORMA DO ENSINO MÉDIO NO BRASIL E OS IMPACTOS NO

4.2 Como ficarão as Ciências Humanas com a Reforma do Ensino Médio no

O campo das Ciências Humanas74 nas escolas sempre teve como característica uma luta incessante pela sua permanência nos planos governamentais e, ao longo dos anos, particularmente a Sociologia e a Filosofia sofrem com inclusões e retiradas. Não seria diferente neste momento em que temos uma sociedade dividida, quando há pessoas que colocam em dúvida até mesmo questões científicas já comprovadas.

Foi nesse cenário político que os professores viram as aprovações da Reforma do Ensino Médio acontecer e agora é um momento de pensar como será distribuída, na prática, essa carga horária na escola e como serão inseridas as disciplinas para os estudos. Isso porque as únicas disciplinas que estão definidas como obrigatórias são Língua Portuguesa e Matemática nas três séries do Ensino Médio.

Após assumir Ministério da Educação – MEC75, Abraham Weintraub, com apoio do Governo Federal, fez inúmeros ataques aos educadores, inclusive declarando não havia necessidade de existirem, nos currículos escolares, as disciplinas ligadas às Ciências Humanas e nem necessidade de investimentos. Além dos insultos à Universidade.

74Resolução do Conselho Nacional de Educação – CNE, nº 4, de 17 de Dezembro de 2018. Parágrafo único. A

adequação dos currículos à BNCC-EM deve estar concluída até início do ano letivo de 2020, para a completa implantação no ano de 2022.

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Desde o início da gestão, em abril de 2019 até sua saída em junho de 2020, o ex-ministro Abraham Weintraub fez várias declarações polêmicas sobre as Ciências Humanas. Além de efetivar cortes nas universidades e bolsas que seriam destinadas aos pesquisadores.

Com isso tudo acontecendo desde a saída da Presidente Dilma, vimos uma rápida aprovação da Lei da Reforma do Ensino Médio aprovada e a BNCC homologada. Resta aos governos estaduais elaborarem seus currículos e tentarem, juntamente com os educadores e gestores, construírem um formato curricular com as disciplinas que permaneceram e pensar em estratégias para os itinerários formativos.

Sobre as competências sugeridas pela BNCC para a área de Ciências Humanas e Sociais aplicadas foram elaboradas e aprovadas as seguintes, conforme ilustração 03,

Ilustração 3 – Competências específicas de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

Fonte: BNCC (BRASIL, 2018c).

Em um estudo realizado por Bodart e Feijó (2020), os autores demonstram como a Sociologia estará presente nessas mudanças na BNCC enquanto componente curricular, sua importância para os jovens do Ensino Médio e também explicam cada competência atribuída à área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas,

[...] cabe ressaltar que as competências trazidas na BNCC precisam dos conhecimentos específicos das disciplinas escolares para serem apropriadamente promovidas. Nossas análises voltaram-se às potencialidades das Ciências Sociais na formação do aluno do Ensino Médio, seja nas questões de cidadania, tolerância, análise de fenômenos sociais, conhecimento e reconhecimento da cultura, desenvolvimento da alteridade e apreço pela democracia, direitos humanos, compreensão de que é resultado de ações coletivas, dentre muitos outros conteúdos fundamentais para desenvolver o conhecimento necessário à compreensão e reflexão crítica da realidade social que os cerca. Fernandes (1976) já indicava tal perspectiva, na década de 1950, ao considerar como papel do ensino da Sociologia munir o

estudante de instrumentos de análise objetiva da realidade social, além de sugerir- lhe pontos de vista com os quais pudessem compreender seu tempo e normas e construir sua atividade na vida social. (BODART; FEIJÓ, 2020, p. 230).

As Ciências Humanas aparecem desde o Ensino Fundamental, porém somente com as disciplinas de História e Geografia. Já no Ensino Médio, temos a inclusão de Sociologia e Filosofia. Na BNCC, a área já aparece com a nova denominação: Ciências

Humanas e Sociais aplicadas e contempla quatro categorias: Tempo e Espaço; Territórios e

Fronteiras; Política e Trabalho; e Indivíduo, Natureza, Sociedade, Cultura e Ética. Todas essas categorias já são resultados dos documentos oficiais elaborados para a área de Ciências Humanas desde os Parâmetros Curriculares.

Com base na Resolução nº 3 de 21 de novembro de 2018, que atualizou as Diretrizes Curriculares do Ensino Médio, as Ciências Humanas e Sociais Aplicadas devem procurar promover,

[...] aprofundamento de conhecimentos estruturantes para aplicação de diferentes conceitos em contextos sociais e de trabalho, estruturando arranjos curriculares que permitam estudos em relações sociais, modelos econômicos, processos políticos, pluralidade cultural, historicidade do universo, do homem e natureza, dentre outros, considerando o contexto local e as possibilidades de oferta pelos sistemas de ensino. (BRASIL, 2018a).

Na Sociologia, são inúmeros temas que podem ser contemplados com essa definição da área, porém não se sabe ainda como ficará distribuída a carga horária para a disciplina, o que já vai ocasionar uma perda nos currículos que foram elaborados para as três séries do Ensino Médio nas escolas. Sem contar que o MEC continuará com as avaliações na Educação Básica e os conteúdos acabam se adequando a essa realidade. No caso das Ciências Humanas, especificamente no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM.

Sendo o Ensino Médio a última etapa da Educação Básica, as várias modificações que serão feitas vão exigir mudanças nas avaliações de larga escala como Sistema de Avaliação da Educação Básica – SAEB, Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM e também o Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica do Ceará – SPAECE, no caso do Ceará.

Com a Portaria nº 0576 publicada em maio, a partir de 2021 já começariam as alterações para os estudantes e para as escolas. O SAEB será realizado anualmente em todas as séries a partir o segundo ano do Ensino Fundamental, de acordo com a BNCC e as diretrizes curriculares de cada etapa. O ENEM, também realizado anualmente, terá uma

76A Portaria Nº 458, de 05 de maio de 2020. Institui normas complementares necessárias ao cumprimento da

possibilidade de avaliações em série. Com isso, as avaliações em larga escala continuarão influenciando a dinâmica dos conteúdos na escola.

Mesmo com as escolas todas sem funcionamento, diante de um ensino remoto provocado pela Pandemia que ocorre mais forte no Brasil desde março de 2020, onde muitos estão se adequando e tentando fazer com que o aprendizado chegue aos alunos, o MEC ainda continuou modificando as leis e alterando a dinâmica do planejamento já para o ano de 2021. Então, agora, além de adequação da Base Comum e os Itinerários Formativos no Ensino Médio, haverá a preocupação com as avaliações externas, que continuam contribuindo para uma mercantilização da educação.

É fato que se trata de um momento especial da luta de classes da sociedade capitalista, que tem na educação um espaço ressignificado para a reprodução do capital. O cenário atual é a concretização do processo da mercantilização da educação, que traz novos atores, como as fundações Airton Senna e Lemann, com funções e papéis estratégicos na organização das políticas educacionais. No acirramento dessas políticas, pautadas nas diretrizes ensino a distância, formação aligeirada e parceria público e privado, avanços na desregulamentação dos direitos sociais, ou melhor, na perda de direitos de cidadania, os trabalhadores e seus filhos se veem excluídos de um modo extremamente estarrecedor, pois não basta o desemprego, o sucateamento da escola pública, o baixo salário dos seus professores e o descuido com a infraestrutura, é necessário também banir do currículo as poucas possibilidades de acesso à cultura. (MENDONÇA; PENINTENTE; MILLER; 2018, p. 12).

São muitos os retrocessos que ocorrem, principalmente na educação pública, desde a aprovação da Reforma do Ensino Médio. E não será fácil para os professores, gestores e alunos contornaram essa situação sem um envolvimento e conhecimento das leis e documentos oficiais que vão passando através do Congresso Nacional, além da chegada de instituições privadas interferindo na dinâmica da organização pedagógica.

Nas áreas de Ciências Humanas foram vários os momentos que as disciplinas sofreram com os interesses políticos e foram retiradas dos currículos nas reformas educacionais. Com a obrigatoriedade somente de Língua Portuguesa, Matemática e Língua Inglesa para as três séries, veremos uma fragmentação dos conteúdos para que se atendam às exigências da carga horária e dos itinerários formativos.

De fato, é necessário compreender e ficar atento com os cenários que serão construídos pelas escolas. Os professores de Sociologia, História, Geografia e Filosofia fiquem atentos. Para onde vão as Ciências Humanas e Sociais Aplicadas no currículo do Ensino Médio? Alguns alertas já são sinalizados por Simões (2017),

[...] o lugar das C.H. no processo de escolarização da educação básica não está dado, mas que a ocupação e a produção deste lugar resultam, sobretudo, de disputas de ordem política. Cada componente curricular desta área, sobretudo nos últimos 30

anos, procurou trilhar uma trajetória visando fortalecer seu potencial pedagógico na formação humana, constituindo a área de C.H. um lugar de poder formativo crítico- reflexivo na educação básica. Na atual reforma do E.M., aos moldes just in time e a partir de interesses empresariais-neoliberais, este lugar é novamente contestado, abrindo brechas suficientes para promover a fragilização de seu potencial pedagógico e a subalternização de seu lugar no processo de escolarização. (SIMÕES, 2017, p. 56).

Portanto, não será uma novidade para os que fazem as Ciências Humanas permanecer nesta constante luta pela manutenção das disciplinas no currículo, para que, juntas com as demais, possam contribuir com a formação dos jovens do Ensino Médio. Este espaço precisa de um lugar coletivo e que as várias falas possam se unir em torno de um currículo amplo e com espaço para um debate.

4.3 O que pensam os professores de Sociologia de Fortaleza sobre a Base Nacional