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2. Estado da arte

2.5. Comportamento acústico de argamassas

O principal objectivo na aplicação de um material isolante acústico consiste na absorção da energia sonora. Segundo Domingues (2010), citado por Pedroso (2014), esta consiste na “dissipação de energia sonora na superfície exposta de um material, transformando a energia acústica em calor”. Esta absorção depende geralmente da natureza da superfície, do ângulo de incidência das ondas sonoras e das condições de aplicação do sistema que integra o material.

Para caracterizar este fenómeno, recorre-se geralmente ao coeficiente de absorção sonora (α). Este é dado pela razão entre a quantidade de energia que num certo período de tempo se dissipa na área da superfície do material e a energia que incide nessa área (equação 2.1):

𝛼 =𝐸𝑎

𝐸𝑖 (2.1)

Em que:

Ea – quantidade de energia dissipada; Ei – quantidade de energia incidente.

O coeficiente de absorção acústica é normalmente utilizado para caracterizar materiais de absorção em projecto. Este é adimensional e varia entre 0 (reflector puro) e 1 (absorsor puro), ou seja, um material com um coeficiente igual a 1 absorve a totalidade da energia incidente, pelo que é desejável que este seja o mais elevado possível. Por vezes podem surgir valores superiores a 1, quando ocorre difracção das ondas sonoras ao longo da fronteira do material, embora estes valores estejam associados a erros experimentais e não devam ser considerados (Vigran, 2008). O coeficiente de absorção sonora é também importante para calcular o tempo de reverberação, um indicador acústico importante em projecto (Pedroso, 2014).

O Noise Reduction Coefficient (NRC) é outro indicador utilizado para avaliar o comportamento acústico de um material. Este é definido com base na norma norte-americana ASTM C423 (ASTM, 2009) como a média aritmética dos coeficientes de absorção sonora nas bandas de frequências de oitava de 250, 500, 1000 e 2000 Hz, arredondada a múltiplos de 0,05 (equação 2.2).

𝑁𝑅𝐶 =𝛼250𝛼500𝛼1000𝛼2000

4 (2.2)

O NRC é um indicador simples muito utilizado para comparar e avaliar o desempenho acústico de materiais de construção, cuja função principal é dar uma ideia generalizada da absorção sonora na gama de frequências da fala humana; no entanto, este não representa o comportamento do material para toda a gama de frequências audíveis, pelo que deve ser utilizado com os devidos cuidados (Pedroso, 2014). Um factor semelhante, αw, denominado coeficiente de absorção sonora ponderado, é calculado pela norma EN 11654 (1997) através da comparação da curva de absorção sonora obtida experimentalmente com as curvas teóricas presentes na norma. A partir deste valor os materiais podem ser classificados numa escala de A (muito absorventes) a E (pouco absorventes). Na tabela 2.4 encontra-se a correspondência dos valores de αw com a respectiva classificação.

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Tabela 2.3 – Classificação de materiais absorventes segundo a norma EN 11654 (1997)

αw Classe de absorção 0,90; 0,95; 1,00 A 0,80; 0,85 B 0,60; 0,65; 0,70; 0,75 C 0,30; 0,35; 0,40; 0,45; 0,50; 0,55 D 0,25; 0,20; 0,15 E 0,10; 0,05; 0,00 Sem classificação

Segundo Vigran (2008) os materiais absorsores podem dividir-se em duas categorias principais – materiais porosos/fibrosos e materiais ressonantes (através de membrana ou de ressoadores de Helmholtz). Estes últimos consistem normalmente em painéis de face perfurada colocados a uma certa distância de uma superfície rígida. Ambos são utilizados em construção, por vezes em conjunto. Os materiais porosos mais utilizados como isolantes são produtos de fibra mineral (por exemplo, a chamada “lã de vidro”) ou espumas de plástico (Vigran, 2008). As argamassas de revestimento podem também incluir-se nesta categoria de absorsores. Os materiais porosos podem ser também classificados como rígidos e elásticos, considerando-se um material como sendo rígido se a sua massa volúmica for superior a 150 kg/m3 (Neithalath et al, 2005). A partir da figura 2.12 observa-se que os materiais porosos apresentam altos coeficientes de absorção a partir dos 500 a 1000 Hz, embora decresçam para frequências inferiores. O efeito pode ser minimizado com o aumento da espessura do material, ou através da modificação das suas características. A vantagem da utilização destes materiais é, por isso, a elevada absorção para médias e altas frequências, aproximadamente acima dos 1000 Hz. Os materiais ressonantes, por outro lado, têm um comportamento acústico numa gama de frequências mais reduzida, com coeficientes mais elevados para baixas frequências.

Figura 2.12 - Curvas-tipo de absorção sonora de vários materiais, em bandas de oitava (adaptado de Neves e Sousa (2013), citado por Pedroso (2014). Legenda: MP - Materiais porosos; RH - Ressoadores de Helmholtz;

Os materiais porosos são constituídos por duas fases – uma sólida, que forma o seu esqueleto, e uma fluida, composta pelo ar presente no seu interior. Ao serem excitados por uma onda incidente, as moléculas de ar da fase fluida são obrigadas a oscilar, dissipando a energia da onda. Este fenómeno faz com que a parte da energia associada à vibração do ar seja transformada em calor, através de perdas térmicas e viscosas, na sua viagem através dos interstícios do material. A contribuição das perdas por fricção neste processo é determinado pelo tamanho dos poros relativamente à camada de fronteira viscosa. Nas baixas frequências, esta fronteira tem aproximadamente as mesmas dimensões dos poros e as perdas viscosas são elevadas, enquanto que nas altas frequências a fronteira viscosa pode ter um tamanho muito inferior ao dos poros e a perda viscosa torna-se mais reduzida (Pedroso, 2014). Esta relação é explicada em mais detalhe no capítulo 5, sendo quantificada pelo modelo de Allard-Johnson através dos parâmetros de comprimento térmico e comportamento viscoso característicos, traduzidos dos termos em inglês thermal length e viscous length, respectivamente (Vigran, 2008). Segundo Pedroso (2014), a presença de material sólido pode também provocar alterações na direcção de propagação das ondas, para altas frequências, provocando perdas de energia; por outro lado, já que a velocidade das mudanças de pressão aumenta com a frequência da onda, e os materiais porosos se caracterizam pela sua estrutura tortuosa, a sua eficiência aumenta com a frequência, já que as perdas devido a fricção aumentam com a velocidade da partícula.

A dissipação de energia num meio poroso, e por extensão a sua capacidade de absorção sonora, é influenciada por diversos factores macroscópicos conjugados em modelos de previsão teóricos. Entre estes modelos, dois dos mais utilizados são os desenvolvidos por Attenborough (1983, 1992) e por Allard (1993) e Johnson et al (1986, 1987). Os principais parâmetros tidos em conta nestes modelos para caracterizar o comportamento acústico de um material poroso são a porosidade aberta e a resistividade ao fluxo de ar, sendo considerados também outros factores empíricos relacionados com a geometria e dimensões dos poros (tortuosidade, comprimento térmico e comprimento viscoso), cujo método de medição qualitativa é explicado no capítulo 3.

A porosidade de um material é definida como a razão entre o volume de vazios num material e o seu volume total, sendo a absorção acústica principalmente afectada pela porosidade aberta. A geometria, quantidade e tamanho dos poros é também determinante, bem como a existência de poros na superfície do material, já que a dissipação da energia acústica depende das perdas por fricção que ocorrem quando as ondas sonoras entram nos poros (Pedroso, 2014).

A resistividade ao fluxo de ar quantifica a dificuldade com que o ar penetra num material, relativamente à área do provete. Quanto mais elevado for este parâmetro, maior será a resistência oferecida à passagem do ar no seu interior, o que se traduz numa menor capacidade de absorver as ondas sonoras (Vigran, 2008). Note-se que a compacidade do material não influencia directamente a resistividade ao fluxo de ar, dependendo esta por outro lado da estrutura porosa do material (Hopkins, 2007). Allard (1993) refere valores típicos de resistividade em materiais de espuma e fibra de vidro entre 1 e 100 kPa.s/m2; no entanto, em argamassas de revestimento com agregados rígidos podem

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esperar-se valores de resistividade superiores. Hopkins (2007) refere valores médios entre 20 e 300 kPa.s/m2 para paredes de alvenaria lisas com espessuras inferiores a 200 mm.

A tortuosidade pode ser descrita simplificadamente como uma medida da desordem na estrutura do material, fornecendo uma indicação sobre a direcção dos poros (Vigran, 2008). A tortuosidade está relacionada com dois factores (Mafra et al, 2005):

 Mudanças na direcção do fluxo do ar no interior da estrutura porosa do material: Num material com elevada tortuosidade, o fluxo é restringido ao longo do percurso, produzindo-se uma força de reacção contra as paredes da estrutura que por sua vez provocam uma força de reacção correspondente.

 Forças de interacção viscosas: as forças viscosas do escoamento de um fluido na estrutura porosa são amplificadas pela tortuosidade, o que se traduz numa maior perda de energia ao longo do percurso e numa maior absorção.

De forma geral, a uma maior tortuosidade corresponde uma maior capacidade de absorção de energia e consequentemente de absorção das ondas. Não existem formas directas para medir a tortuosidade, sendo esta avaliada qualitativamente no âmbito deste trabalho.

O comprimento térmico e comprimento viscoso são factores introduzidos por Johnson et al (1986) para descrever a forma dos poros, sendo explicados em mais detalhe no capítulo 5. Neste estudo, ambos os parâmetros foram medidos qualitativamente através das imagens obtidas através de observação por lupa binocular e microtomografia de raios-X.

2.6. Estudos já realizados sobre argamassas de comportamento térmico

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