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- Com tal comportamento, visaram os mesmos arguidos retardar a descoberta e dificultar a identificação do cadáver de Luís Grilo e ocultar quaisquer vestígios quanto à causa

e autoria da morte, impedindo assim a descoberta imediata do cadáver pelas autoridades policiais e assim obstarem à sua perseguição criminal, o que bem sabiam não estarem autorizados a fazer; 76. Ao esconderem o cadáver de Luís Grilo, os referidos arguidos agiram com total insensibilidade, bem sabendo que ofendiam o sentimento moral colectivo do respeito devido aos mortos, o que quiseram e lograram alcançar

No recurso do Ministério Público

Ponto 27. – No exame pericial de autópsia médico-legal nada consta nesse sentido, tendo o sr. Perito Médico forense que procedeu ao exame médico legal negado, em sede de audiência de discussão e julgamento, a existência de quaisquer lesões no cadáver ocorridas após o óbito, além das que emergiram da entrada do projéctil.

Ponto 28. - A ausência de lesões ósseas post-mortem no cadáver, além das resultantes do disparo do projéctil, aponta por essa via, para um transporte colectivo do cadáver, mostrando-se mais uma vez, a fundamentação vertida nesta sede pelo Tribunal "a quo"

manifestamente insuficiente e claramente contrariada pelas regras da lógica e da experiência, afigurando-se ter assentado mais numa questão de crença ou fé do que propriamente num juízo científico, crítico e lógico ponderado faces aos factos disponíveis.

c) A questão da arma de fogo utilizada Do Acórdão agora recorrido:

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"(…) O objetivo dessa fundamentação é, no dizer de Germano Marques da Silva (In "Curso de Processo Penal", 2ª ed., 2000, vol. III. pág. 294), o de permitir "a sindicância da legalidade do acto, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando, por isso como meio de autodisciplina". Como escreveu Marques Ferreira (In Jornadas de Direito Processual Penal, pág. 229), "estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados (thema decidendum) nem os meios de prova (thema probandum) mas os elementos que em razão das regras de experiência ou de critérios lógicos constituem o substracto racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência(…)".

Como convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da correcção e justiça do acórdão do Tribunal a quo, relativamente à identificação da arma de fogo (pistola de calibre 7,65 mm, da marca "CZ", com o n.º de série 064623) como sendo responsável pelo disparo do projéctil que foi encontrado no interior do crânio de Luís Grilo, quando a prova documental existente não corrobora o decidido, i.e., não é conclusivo o exame pericial realizado à mesma?

Relembre-se a prova produzida relativamente à matéria em apreço -identificação da arma de fogo responsável pelo disparo que vitimou Luís Grilo – sendo notório a violação das regras sobre a prova, nomeadamente a prova vinculada e das regras da experiência comum.

Se atendermos às conclusões plasmadas no Relatório do Exame Pericial n.º 201822496-FBA, presente de fls. 1228 a 1239 dos presentes autos, lê-se, no campo "Conclusão" (fls. 1238) o seguinte (o sublinhado e o bolt encontra-se no relatório, transcreve-se ipsis litteris): " (...) Não é tecnicamente possível determinar se a arma descrita em 1. foi ou não responsável pelo disparo do projéctil suspeito descrito em 17. (Inconclusivo). – (...)"

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Mais, no mesmo relatório, no campo anteriormente referido – "Conclusão" (fls. 1239) – lê-se (sublinhado nosso): "(...) A quantidade e qualidade das discordâncias de vestígios individualizadores impressos é absolutamente satisfatória, considerando-se inválida a hipótese dos elementos examinados terem sido obtidos com a mesma arma/cano.- (...)"

Não se entende como pode Tribunal do Júri ter concluído que a arguida Rosa Grilo tirou a vida a Luís Grilo com a arma de fogo alvo da perícia antes referida, conforme se pode verificar nos Ponto 20 e 31 do Acórdão de Sentença, no seu "Capítulo II - Fundamentação, Factos Provados", que a seguir se transcreve (sublinhado e bolt nosso) não os devendo ter dado como provados:

"(...) 20. Rosa Grilo decidiu aproveitar-se da circunstância de Luís Grilo ser desportista, para, após lhe tirar a vida com um disparo como munição "hollow point", de uma de fogo, tipo pistola calibre 7,65mm., da marca "CZ", com o n.º de série 064623, manifestada em nome de António Joaquim, e ocultar o cadáver, anunciar o desaparecimento do mesmo, na sequência de um treino de bicicleta (...)"

"(...) 31. Em hora que não foi possível concretamente apurar, mas no período compreendido entre as 19:42 horas do dia 15.07.2018 e as 09:00 horas do dia 16.07.2018, em execução do plano que já havia gizado há, mais de 24 horas, a arguida, munida da arma de fogo, tipo pistola de calibre 7,65mm, da marca "CZ", com o n.º de série 06423, que se encontrava devidamente municiada com, pelo menos, uma munição de calibre 7,65 mm Browning, da marca CBC, de origem brasileira, com projéctil do tipo "hollow point", dirigiu-se ao quarto de hóspedes localizado no primeiro andar da sua residência, onde se encontrava Luís Grilo e efectuou um disparo , a uma distância não concretamente apurada, atingindo o crânio deste, no osso parietal direito, na região para mediana posterior, tendo a munição perfurado aquela região do crânio, cerca de quatro centímetros acima da sutura com o osso occipital, numa trajectória de trás para a diante, com ligeira inclinação para baixo e para a direita. (...)"

Nem como pode o Acórdão agora recorrido ter aderido à mesma convicção, ou seja, que a arma de fogo responsável pelo disparo do projéctil (que afirma o Tribunal da Relação ter sido causa de morte directa e necessária)foi a pistola de calibre 7,65mm, da marca "CZ", com o n.º de série 06423!

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Ainda que o julgador tenha à sua disposição o preceituado no artigo 127.º do Código de Processo Penal, apreciando a prova segundo as regras da experiência e a sua livre convicção, não pode, no exercício do seu raciocínio dedutivo ou indutivo, alterar os princípios elementares da Lógica, a saber: "Princípio da Não Contradição – Uma proposição não pode ser falsa e verdadeira ao mesmo tempo", e, "Princípio do Terceiro Excluído – "Toda a proposição ou é falsa ou verdadeira, não há terceira opção." (GORSKY, Samir. A semântica algébrica para a lógica modal e seu interesse filosófico, Dissertação de mestrado. IFCH-UNICAMP. 2008. http://samirgorsky.eu5.org/trabalhos/logicamodal.pdf)

Pelo que, atendendo aos resultados da perícia, devidamente documentados, e às declarações do perito responsável pela realização e relatório do exame pericial em apreço, não pode o Tribunal da Relação decidir como decidiu, com base nas proposições que ao se dispor tinha para extrair uma conclusão, i.e., se a perícia concluiu que não é possível provar que a pistola de calibre 7,65mm, da marca "CZ", com o n.º de série 06423 foi responsável pelo disparo do projéctil encontrado no interior do crânio da vitima?

Transcreve-se o ponto 34 do acórdão recorrido:

Ponto 34. - Aí chegados, o arguido António Joaquim aproximou-se de Luís Grilo e, apontando à cabeça deste a arma de fogo que levara consigo – a pistola de calibre 7,65 mm, da marca

"CZ", com o n.º de série 064623, que se encontrava devidamente municiada com, pelo menos, uma munição de calibre 7,65 mm Browning, da marca CBC, de origem brasileira, com projéctil do tipo "hollow point", efectuou um disparo, a uma distância não concretamente apurada, atingindo o crânio da vítima, no osso parietal direito, na região paramediana posterior, tendo a munição perfurado aquela região do crânio, cerca de quatro centímetros acima da sutura com o osso occipital, numa trajectória de trás para diante, com ligeira inclinação para baixo e para a direita.

Mais do que a impossibilidade de refutar a dúvida que razoavelmente se possa ter instalado, mais do que a impossibilidade de confirmar a hipótese introduzida pela acusação em juízo, é uma impossibilidade lógica concluir-se o que o Tribunal a quo concluiu, e que serviu para fundamentar uma condenação a pena efectiva de 25 anos, uma vez que, sendo o resultado da perícia contrário à inferência do Tribunal, sabendo-se que o juízo técnico e científico

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inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre convicção do julgador (artigo 163.º do Código de Processo Penal) estamos perante um erro notório na apreciação da prova.

Outro aspecto que importa mencionar é a questão da distância a que efectuado o disparo.

Decide o Acórdão recorrido, contradizendo as conclusões do exame pericial referido, que a arma de fogo em apreço foi a responsável pelo disparo que vitimou Luís Grilo e que esse mesmo disparo foi efectuada "a uma distância não concretamente apurada".

Trata-se de uma questão que encerra implicações muito graves quando observado à luz da prova produzida e de um incidente invocado pela defesa do co-arguido António Joaquim, nomeadamente a queixa-crime apresentada a 18 de Setembro de 2019 contra a Magistrada do Ministério Público, Doutora Susan Salgueiral, o Coordenador de Investigação Criminal da Polícia Judiciária, Pedro Maia e a Inspectora da Polícia Judiciária, Maria do Carmo.

Os três são denunciados:

- pela prática e em co-autoria material e na consumada de um crime de falsificação de documento, p. e p. pela alínea d) d n.º 1 e n.º 3 do art.º 256 com referência ao art.º 255, alínea a) todos do Código Penal.

- um crime de denegação de justiça e prevaricação, previsto e punido pelo art.º 369, n.º 1 e 2 do Código Penal.

Basicamente o que está em apreço na referida denúncia é a manipulação de provas, mais concretamente a recolha de sangue da vítima, através de zaragatoa, no interior do cano da arma de fogo pertença de António Joaquim, a pistola de calibre 7,65 mm, da marca "CZ", com o n.º de série 064623.

Quanto ao mérito e legitimidade da denúncia, à defesa da ora recorrente nada se oferece dizer.

Já quanto ao erro na apreciação da prova obtida – a recolha de vestígios hemáticos pertencentes a Luís Grilo no interior da referida arma – impõem-se invocar de novo as regras da experiência comum.

Se o disparo foi efectuado em contacto com o crânio da vítima, única possibilidade que, muito remotamente, poderia deixar vestígio hemático NO EXTERIOR DO CANO OU NO PUNHO

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DA ARMA (o que não se verificou conforme o exame pericial realizado) NUNCA, repetimos, NUNCA DEIXARIA UM VESTÍGIO HEMÁTICO NO INTERIOR DO CANO DE UMA ARMA DE FOGO UM TIRO DE CONTACTO NA CALOTE CRANIANA DE ALGUÉM.

Mais uma vez estamos perante uma clara violação pelo acórdão a quo das regras de experiência comum.

As leis da física não o permitem, as leis da química não o demonstram: a explosão dos gases resultante do disparo de uma arma de fogo, para além de cauterizarem os vasos existentes nos tecidos da calote craniana, incineraria o vestígio hemático que pudesse existir, destruíndo o material de A.D.N. alvo de exame pericial.

Como já foi referido anteriormente, a presente investigação, julgamento, recursos, e demais incidentes supervenientes, são, salvo melhor opinião em contrário, um alerta muito sério para todos aqueles que fazem parte do sistema de justiça em Portugal.

Tudo o que resultou destes autos, os incidentes ocorridos e as decisões recorridas, obrigam necessariamente o reenvio do processo para novo julgamento, relativamente à totalidade do objecto do processo, nos termos dos art.º 426 n.º 1 e n.º 2, sem prejuízo do disposto no art.º 426-A, ambos do C.P.P.

VIOLAÇÃO DAS REGRAS SOBRE O VALOR DA PROVA VINCULADA E SEUS