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2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 O gênero Candida

2.5 Compostos que apresentam sinergismo com drogas antifúngicas

Dois compostos, quando testados juntos frente a um microrganismo em um ensaio de sensibilidade in vitro, podem ter interação sinérgica, antagônica ou nenhuma interação (ODDS, 2003). A interação é sinérgica se o efeito conjunto das drogas for mais forte do que as drogas isoladas, enquanto na antagônica o efeito é mais fraco (BOLLENBACH, 2015). Vários estudos analisaram a interação entre diferentes compostos e drogas antifúngicas frente a cepas de Candida tropicalis resistentes a azólicos, a fim de encontrar efeitos sinérgicos e alteração do fenótipo de resistência das cepas.

Muitos compostos extraídos de plantas foram estudados em combinação com antifúngicos frente a C. tropicalis. Morais-Braga et al. (2016) observaram reduções na concentração inibitória de fluconazol quando combinado com extratos das folhas de Psidium

guajava (goiaba) e Psidium brownianum. Glabridina, um isoflavano isolado do alcaçuz

(Glycyrrhiza glabra) possui fraca atividade antifúngica, porém apresenta um potente efeito sinérgico com o fluconazol frente a cepas resistentes de C. tropicalis (LIU et al., 2014). Um

peptídio semelhante à tionina isolado do fruto de Capsicum annuum (um tipo de pimenta) apresentou atividade antifúngica frente a C. tropicalis, causando permeabilização da membrana plasmática, induzindo estresse oxidativo, além de apresentar sinergismo com fluconazol (TAVEIRA et al., 2016).

Cordeiro et al. (2013) reportaram que o farnesol, um sesquiterpeno descrtito como molécula de quorum sensing em C. albicans, apresenta atividade antifúngica contra Candida spp. Ademais, farnesol reduziu consideravelmente a concentração inibitória mínima para anfotericina B, fluconazol e itraconazol de cepas de C. tropicalis. Resultados semelhantes foram encontrados para o tirosol, um composto fenólico que também é uma molécula de

quorum sensing de C. albicans (CORDEIRO et al., 2015b).

Estudos com berberina mostraram que este alcalóide de origem vegetal apresenta atividade de inibição de bombas de efluxo, diminuindo a expressão de CDR1 sozinho ou na presença de fluconazol, além de aumentar a concentração de EROs na célula (SHAO et al., 2016; SHI et al., 2017), mecanismos que podem explicar tanto a atividade antifúngica deste composto como o sinergismo com o fluconazol frente a cepas resistentes de C. tropicalis.

O efeito anti-biofilme de compostos diversos também já foi avaliado frente a cepas de C. tropicalis, podendo ser citados: óleos essenciais de Pelargonium graveolens, os quais apresentam em sua composição geraniol e linaool (SOUZA et al., 2016); sais de imidazólio (BERGAMO et al., 2015a, 2015b); e nanopartículas de óxido de zinco (JOTHIPRAKASAM et al., 2017). Além disso, sinergismo entre compostos com potencial antifúngico e drogas utilizadas na clínica também já foi relatado, os quais apresentaram resultados promissores, como os relatados para o tirosol e rubiadina (MARIONI et al., 2016; SHANMUGHAPRIYA et al., 2014).

Fármacos que não são classicamente utilizados como antifúngicos também já foram testados em combinação com drogas antifúngicas para observar sinergismo frente a cepas resistentes de C. tropicalis. Entre os compostos já reportados apresentando sinergismo com azólicos estão: almidorona, usada para o tratamento da fibrilação atrial e droga de escolha para pacientes com arritmia (SILVA et al., 2013a); cloroquina, uma droga utilizada no tratamento da malária (LI et al., 2015); ibuprofeno, um anti-inflamatório não esteróide que apresenta atividade inibitória de bombas de efluxo (SHARMA et al., 2015); tracolimus (FK506), um imunossupressor e inibidor clássico de transportadores do tipo ABC (NEVES- JUNIOR et al., 2015). Alguns desses compostos também apresentaram atividade in vitro contra C. tropicalis.

A prometazina ((RS)-N,N-dimetil-1-(10H-fenotiazina-10-il)propan-2-amina), um composto pertencente à classe das fenotiazinas, é um antagonista do receptor H1 de primeira geração que apresenta efeitos anti-histamínicos, antieméticos e sedativos (CANTISANI et al., 2013). Possui baixo peso molecular e característica lipofílica, não sendo substrato para a glicoproteina-p, a qual é responsável pelo efluxo de moléculas pela barreira-hematoencefálica (BAUMANN-BIRKBECK et al., 2014).

Além de bloquear os receptores H1, atuando como antagonista para a histamina, a prometazina também apresenta afeta canais iônicos dependentes de ligantes, como os receptores purinérgicos (P2) e receptores colinérgicos (ACh), e canais de íons dependentes de voltagem, como os canais de sódio, cálcio ou potássio. A prometazina também inibe a bomba Na+/K+-ATPase do cérebro e a abertura do poro de transição de permeabilidade mitocondrial

(CANTISANI et al., 2013). Ademais, as fenotiazinas, classe à qual a prometazina pertence, são considerados compostos que apresentam atividade inibidora de bombas de efluxo (KOLACZKOWSKI; MICHALAK; MOTOHASHI, 2003).

Na clínica humana, a prometazina é utilizada no tratamento de náuseas e vômitos pós-operatórios (DEITRICK et al., 2015), cinetose (DIAZ-ARTILES et al., 2017), náuseas e vômitos na gravidez e hiperêmese gravídica (TAYLOR et al., 2017), sintomas alérgicos (CANTISANI et al., 2013), enxaqueca (ASADOLLAHI et al., 2014) e agressão induzida por psicose (HUF et al., 2016). Na clínica veterinária, a prometazina é utilizada como tratamento para choque anafilático em aves (MILBRADT et al., 2017) e apresenta efeitos antieméticos em gatos (KOLAHIAN; JAROLMASJED, 2012) e efeitos antioxidantes em testes realizados com cavalos adultos (PÉTERS et al., 2009).

Brilhante et al. (2012) observaram que a prometazina, quando testada em concentração sub-inibitória, reduz a concentração inibitória do fluconazol e itraconazol frente a cepas de C. albicans e C. tropicalis resistentes à azólicos. O mesmo foi observado em outros estudos com Candida spp. (CASTELO-BRANCO et al., 2013; ROCHA et al., 2016), nos quais a prometazina aumentou a sensibilidade de cepas resistentes, alterando o fenótipo de resistência a azólicos. Os autores sugerem que essa interação se deve a inibição de transportadores do tipo ABC, que estariam sendo superexpressos nessas cepas resistentes. Porém, os efeitos da prometazina sobre as células e a atividade antifúngica dessa droga, principalmente em cepas resistentes a azólicos, não foram o alvo desses estudos. Sendo assim, são necessários estudos mais aprofundados para uma melhor compreensão dos mecanismos de ação dessa droga frente a células fúngicas.

Entre as metodologias que podem ser utilizadas para o estudo dos mecanismos de ação de compostos com atividade antifúngica, a citometria de fluxo se destaca como uma importante ferramenta, sendo empregada na investigação de muitos aspectos fisiológicos e biologia celular de leveduras. As vantagens do uso da citometria de fluxo incluem aquisição de dados em alta velocidade, não-dependência do crescimento das células, investigação e isolamento de células individuais e alta significância estatística dos dados provenientes de um grande número de células individuais (OVERTON, 2015).

Entre os mecanismos de ação contra células de C. tropicalis que podem ser analisados através da citometria de fluxo estão a inibição da atividade de bombas de efluxo (NEVES-JUNIOR et al., 2015), mudanças no tamanho e complexidade interna da célula, danos causados à membrana celular, alteração da atividade mitocondrial, indução de apoptose (SILVA et al., 2016) e detecção de níveis intracelulares de íons (JIA et al., 2016). Através dessas metodologias, é possível estabelecer quais os possíveis efeitos de um determinado composto sobre as células fúngicas e avaliar seus possíveis sítios de ação.