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2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 O gênero Candida

2.3 Fatores de virulência de C tropicalis

2.3.3 Formação de biofilme

O termo “filme”, que se refere à adesão, agregação e multiplicação de microrganismos sobre superfícies, foi utilizado na microbiologia marinha para distinguir bactérias aderidas (sésseis) de organismos “planctônicos” de nado livre de 1933 a 1935, e o termo biofilme foi utilizado pela primeira vez por Zobell e Allen (1935) em um estudo da aderência e crescimento de bactérias sobre lâminas de vidro submersas em água do mar (HØIBY, 2017). A primeira imagem de biofilme em uma infecção pulmonar crônica por

Pseudomonas aeruginosa foi publicada em 1977, mostrando agregados de bactéria envoltos

por um abundante lodo viscoso em escarro de paciente com fibrose cística (HØIBY, 2017; HØIBY et al., 1977).

Os biofilmes são comunidades microbianas aderidas a uma superfície e submersas em uma matriz extracelular polimérica (MEC). As células sésseis do biofilme exibem fenótipo e genótipo diferenciados das células planctônicas em relação à transcrição gênica, taxa de crescimento e resistência antifúngica. No meio ambiente, os microrganismos são predominantemente encontrados na forma de biofilme em vez da sua forma planctônica (DONLAN, 2002; DOUGLAS, 2003; RAMAGE; MARTÍNEZ; LÓPEZ-RIBOT, 2006; TOURNU; VAN DIJCK, 2012). A quantidade de nutrientes disponíveis, moléculas de

quorum-sensing liberados pelo microrganismo e o contato com superfícies são alguns dos

fatores que contribuem para a formação do biofilme (FANNING; MITCHELL, 2012; HIROTA et al., 2016).

Os biofilmes se mostram vantajosos para a sobrevivência do microrganismo uma vez que esse modo de organização celular confere proteção contra o ambiente, resistência a estresses físicos e químicos, cooperação metabólica e regulação da expressão gênica baseada na comunidade (RAMAGE et al., 2012). O material extracelular complexo que compõe a MEC do biofilme tem papel essencial na defesa contra células fagocitárias, age como suporte na manutenção da integridade do biofilme e forma uma barreira que impede a difusão das substâncias tóxicas, características essas que, junto com a complexidade arquitetônica, conferem proteção contra as defesas do hospedeiro (FERNANDES; SILVA; HENRIQUES, 2015; SANDAI et al., 2016).

Acredita-se que aproximadamente 65% das infecções nosocomiais e 80% de todas as infecções microbianas são causadas por biofilmes (RÖMLING; BALSALOBRE, 2012). Essas comunidades de células sésseis são a principal causa de infecções relacionadas a dispositivos médicos, sendo Candida um dos patógenos mais comumente isolados dessas infecções (HIROTA et al., 2016). Uma vez que Candida aderiu e evadiu o sistema imune do

hospedeiro, pode formar biofilmes que colonizam órgãos internos e implantes médicos (CUÉLLAR-CRUZ et al., 2012).

Candida spp. possuem a capacidade de formar biofilme em lentes de contato ou

intraoculares, implantes mamários, cateteres venosos, próteses articulares, acessos de diálise, válvulas prostéticas, marca-passo, dispositivo de assistência ventricular, cateter urinário, implante peniano e derivação ventrículo-peritoneal (CUÉLLAR-CRUZ et al., 2012; KOJIC; DAROUICHE, 2004). Essas infecções associadas a implantes são inerentemente difíceis de tratar e podem requerer terapia antifúngica a longo-prazo e a remoção física do implante para controle da infecção (KOJIC; DAROUICHE, 2004; RAMAGE et al., 2012).

C. tropicalis possui uma notável capacidade de aderir a superfícies abióticas,

células humanas e tecidos (NEGRI et al., 2012). Infecções por biofilme de C. tropicalis já foram relatadas em dispositivos de assistência ventricular, derivação ventrículo-peritoneal e

plug de ponto lacrimal (CECCARELLI et al., 2016; KOJIC; DAROUICHE, 2004; YOKOI et

al., 2000). Os biofilmes maduros desta espécie apresentam-se como uma densa rede de leveduras e células filamentosas evidentes, sendo os isolados clínicos de C. tropicalis classificados como ótimos formadores de biofilme (SILVA et al., 2012), por vezes com porcentagens de produção de biofilmes maiores que as encontradas para C. albicans (CUÉLLAR-CRUZ et al., 2012).

Biofilmes maduros de C. tropicalis (Figura 5) são constituídos de uma densa rede de células de leveduras e filamentos, como observado por Bizerra et al. (2008), porém algumas cepas podem apresentar biofilme composto apenas por blastoconídios (SILVA et al., 2009). Além disso, dependendo da cepa, o biofilme produzido pode ser espesso com co- agregados celulares ou monocamadas descontínuas de leveduras aderidas à superfície (SILVA et al., 2009). Deorukhkar, Saini e Mathew (2014) observaram que cepas de C. tropicalis isoladas de urina apresentaram a maior produção de biofilme entre isolados de diferentes sítios.

Um estudo realizado por Galán-Ladero et al. (2013) reportou que cepas de C.

tropicalis que apresentavam maiores taxas de filamentação e hidrofobicidade de superfície

celular apresentaram maior capacidade de formação de biofilme. O pH do meio também influencia o biofilme, sendo que C. tropicalis apresenta uma produção mais pronunciada de biofilme em pH neutro ou alcalino (pH 7 a 8), apresentando maior taxa de filamentação, espessura do biofilme e quantidade de MEC em pH 8 (FERREIRA et al., 2016).

FONTE: CEMM (2017).

Figura 5. Microscopia eletrônica de varredura (A) e microscopia confocal de varredura a laser (B) de

biofilmes maduro de Candida tropicalis. Observa-se uma arquitetura complexa composta de blastoconídios (setas pretas) e filamentos (setas brancas). Na microscopia confocal (B), células em verde são viáveis, enquanto em vermelho são células mortas. As barras laterais (B) indicam a espessura do biofilme. Aumento: 2000x (A), 400x (B).

A MEC do biofilme de C. tropicalis é composta majoritariamente por hexosamina Outros compostos são encontrados em menores concentrações, como carboidratos, proteínas, fósforo e ácido urônico (AL-FATTANI; DOUGLAS, 2006; SILVA et al., 2009). Tratamento com lipase tipo VII, quitinase e licase induz uma redução da biomassa do biofilme de C.

tropicalis, enquanto DNase I e proteinase K não apresentam efeito (AL-FATANNI;

DOUGLAS, 2006). Quando os biofilmes pré-formados de C. tropicalis são tratados com anfotericina B, há um aumento na concentração de proteínas e carboidratos na MEC (FERNANDES; SILVA; HENRIQUES, 2015).

Além dos fatores de virulência envolvidos na capacidade do fungo em causar e estabelecer infecção, é importante destacar a importância do surgimento de cepas fúngicos apresentando resistência a drogas antifúngicas utilizadas na clínica, o qual é considerado um dos fatores implicados no aumento de infecções por Candida, principalmente casos de candidemia persistente (SINGH; FATIMA; HAMEED, 2015).