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A comunicação consiste num processo social complexo de assimilação de diferentes informações, que implica uma apropriação de algo simbólico por parte de um recetor. A definição geral de comunicação pressupõe, então, que haja “interação social através de mensagens” (Fiske, 2002, p. 14). Nesta aceção, considera-se que é através da comunica- ção, nomeadamente da linguagem, que as pessoas aprendem, transmitem informações e expressam a sua compreensão.

O estudo da comunicação envolve três componentes relacionáveis entre si: a transmis- são de informação, o significado da informação pela utilização de códigos linguísticos e a interação social entre os sujeitos (Guerreiro, 2011). Na educação matemática, os dife- rentes componentes caracterizam-se pela “informação matemática, pela linguagem matemática e pela interação entre alunos e entre estes e o professor na sala de aula” (Guerreiro, 2011, p. 15). As orientações curriculares para o ensino da Matemática en- globam estas três componentes, configurando a comunicação matemática como um recurso significativo para que os alunos: partilhem ideias; reflitam sobre compreensão da Matemática; estabeleçam relações entre as suas ideias e as novas aprendizagens; cla- rifiquem e consolidem os conceitos matemáticos; e façam conexões dentro e fora da Matemática, entre outros aspetos (Guerreiro, 2011; NCTM, 2007; Ponte et al., 2007b).

O processo comunicativo, na sala de aula, é caraterizado por Brendefur e Frykholm (2000), citados por Guerreiro (2011), através de quatro modos de comunicação matemá- tica: a comunicação unidirecional (em que o professor domina o discurso da aula), a comunicação contributiva (em que os alunos concretizam intervenções curtas, exercen- do o professor o papel de constante avaliador), a comunicação reflexiva (em que o discurso é objeto de reflexão, por parte do professor e dos alunos), e comunicação ins-

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trutiva (pressupõe uma dimensão metacognitiva, em que os alunos integram as ideias através de processos de comunicação). Isto significa que os “modos de comunicação unidirecional e contributiva relacionam-se com a comunicação como transmissão de informação, e os modos de comunicação reflexiva e instrutiva relacionam-se com a co- municação como um processo de interação social” (Guerreiro, 2011, p. 92).

O PMEB (2007) surgiu no intuito de reajustar e atualizar o programa anterior, datado da década de noventa. Este documento é inovador nas orientações para o ensino da Mate-

mática em Portugal, pois preconiza uma mudança nos processos de ensino- -aprendizagem, valorizando o paradigma da interação em substituição do da transmis-

são. Nesta lógica, a comunicação matemática é indicada pelo PMEB (2007) como um processo de interação social, entre os alunos, o professor e o conhecimento (Guerreiro, 2011; Sousa, Cebolo, Alves, & Mamede, 2009).

A comunicação enquanto processo de interação social (onde ocorrem processos de ne- gociação, partilha, construção e reconstrução de significados matemáticos entre os intervenientes) faz parte de uma aprendizagem significativa da Matemática, proporcio- nando aos alunos o contacto com a atividade matemática e ajudando-os a estabelecer pontes entre as conceções informais/intuitivas e a linguagem abstrata e simbólica (Boavida et al., 2008). O PMEB (2007) destaca ainda a comunicação matemática como uma capacidade transversal e estruturadora da aprendizagem matemática, porque é atra- vés do discurso, da leitura, da audição, da escrita e da representação que os alunos aprendem Matemática e aprendem a comunicar matematicamente (NCTM, 2007).

Assim, ao conceber-se a comunicação matemática como um processo de interação soci- al e transversal a toda a aprendizagem da Matemática, esta é entendida como uma experiência inerente à atividade matemática, de tal modo que a produção de conheci- mento passa pela linguagem (Godino & Llinares, 2000 citados por Guerreiro, 2011). A linguagem matemática não se aprende a falar no seio familiar, esta aprende-se na escola e necessita do suporte da Língua materna. Isto é, a linguagem matemática é híbrida uma vez que resulta do cruzamento da linguagem matemática com a Língua natural – o por- tuguês (Menezes, 2000). De acordo com Usiskin (1996, citado por Menezes, 2000) e Cabrita et al. (2010), a linguagem matemática possui três vertentes: a linguagem oral, a linguagem escrita e a linguagem pictórica.

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No 1.º CEB, o desenvolvimento do ensino-aprendizagem da Matemática ocorre, essen- cialmente, através da linguagem oral pois esta é simples e natural para os alunos (Ponte

et al., 2007a). É através dos atos de ouvir e falar (componentes da oralidade) que os

alunos ampliam o vocabulário matemático e partilham as suas ideias e negoceiam signi- ficados matemáticos, que poderão conduzir a reflexões e, consequentemente, a um aperfeiçoamento e desenvolvimento da própria compreensão matemática (Guerreiro, 2011; NCTM, 2007). A observação, por parte do professor, da comunicação oral dos alunos (vocabulário utilizado, silêncios, gestos, sons e vacilações) conduzirá à tomada de “decisões no momento acerca de quais os aspetos da discussão matemática [que] deve estimular e quais os que deve deixar cair, e sobre quando deve deixar os seus alu- nos debaterem-se com um assunto e quando os deve orientar” (NCTM, 2007, pp. 229- 230).

A linguagem escrita não possui rapidez e maleabilidade da oralidade (Cândido, 2001), porque “se comunicar oralmente o nosso pensamento a terceiros exige um esforço de organização de ideias, passá-lo ao formato escrito é ainda mais exigente” (Boavida et

al., 2008, p. 68). Segundo o NCTM (2007), os alunos, em algumas circunstâncias, pode-

rão expor as suas ideias informalmente através da linguagem comum e de esboços, no entanto, deverão progredir para uma linguagem escrita mais formal, usando a termino- logia matemática convencional, até ao final do ensino básico. Este aperfeiçoamento dos registos escritos permite uma reflexão mais profunda, “pois o acto de escrever obriga a reflectir sobre o próprio trabalho e a clarificar pensamentos sobre as ideias desenvolvi- das” (Boavida et al., 2008, p. 68), e, concomitantemente, possibilita a preservação dos conhecimentos matemáticos ao longo do tempo (Cabrita et al., 2010).

A linguagem pictórica corresponde às representações que podem ser elaboradas através da utilização de materiais manipuláveis estruturados e não estruturados, e que corres- pondem a formas de representação visual: figuras, desenhos, esquemas, diagramas, símbolos, entre outros. As ideias matemáticas podem ser representadas por: representa- ções ativas (associadas à ação – materiais manipuláveis e outros objetos), representações icónicas (associadas à organização visual e uso de imagens, desenhos e esquemas), e representações simbólicas (correspondem à utilização de símbolos e voca- bulário matemático) (Boavida et al., 2008). Estes três tipos de representações, quando diversificadas, utilizadas em paralelo e em contextos vários, permitem o estabelecimen- to de relações matemáticas, pois os alunos têm oportunidade de recorrer aos

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conhecimentos anteriores (as âncoras para as novas ideias) de forma a construírem no- vos conceitos ou procedimentos (ibidem).

A linguagem matemática, nas suas várias vertentes, é influenciada por diversos fatores, nomeadamente: as conceções dos professores e a sua formação, as aprendizagens ante- riores dos alunos e o nível sociocultural (Menezes, 2000). Em suma, o desenvolvimento da linguagem matemática, desde o 1.º CEB, permite a construção de um caminho que visa dotar os alunos da capacidade de escrever argumentos matematicamente válidos, bem construídos, com recurso ao vocabulário formal e símbolos universais (Boavida et

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