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2.8.1 A COMUNIDADE DE MANSAN

No documento LUCELIA SANTOS DE LIMA (páginas 70-75)

2.8 AS SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE OS FAXINAIS DE INÁCIO MARTINS-PR

2.8.1 A COMUNIDADE DE MANSAN

É importante ressaltar que apenas duas comunidades no município de Inácio Martins que mantêm o criadouro comunitário ativo: Mansani e São Miguel. Nessas comunidades notamos a manutenção de muitas práticas tradicionais, uma delas é a dificuldade na documentação escrita que garanta a posse da propriedade que praticamente foi herdada por todos os moradores dessa comunidade. Segundo relatos dos moradores poucos tocaram inventário, em virtude das dificuldades, segundo eles, do alto custo para essa legalização. Podemos considerar a ausência de documentação como um demonstrativo da manutenção de características tradicionais na comunidade, uma vez que, devemos levantar em conta que, antes a terra era um meio de subsistência que era passado de geração em geração, não se tinha muito a preocupação de transformá-la em mercadoria e então vendê-la, como se tem hoje.

O Faxinal Mansani tem uma distância de 25 Km da sede do município de Inácio Martins. Conta com 28 famílias residentes, as quais segundo relatos da entrevistada A, que tem 69 anos e sempre residiu na comunidade são compostas por uma média de 5 a 7 membros, sendo a maioria de descendência cabocla (brasileiros/portugueses) e apenas 3 à 5 de poloneses. De acordo com a entrevista A é comum os moradores se referirem à comunidade como Potinga, pois o Rio Potinga, corta a comunidade. O nome Mansani se refere a uma antiga serraria que pertencia ao Senhor Daniel Mansani. A serraria teria falido após um incêndio, portanto a serraria já não existe mais, mesmo assim alguns moradores ainda denominam a comunidade de Mansani e outros de Potinga.

Marques (2004) retrata as principais dificuldades e faz algumas sugestões com relação ao Faxinal Mansani com as quais comungamos das dificuldades e acreditamos nas sugestões uma vez que, pois para que os moradores da comunidade tenham uma maior condição de manutenção no campo é necessário um investimento em assistência técnica para melhorias na produção, sem deixar de criar animais.

A partir das informações de 2004 para compará-las com 2011, uma vez que foram novamente citadas pelos moradores organizadas no Quadro 4:

Dificuldades Sugestões

- Cercas velhas e sem manutenção nenhuma. As cercas são dos proprietários das fazendas vizinhas ao faxinal, os quais querem acabar com o faxinal;

- A maioria das famílias não são proprietárias das terras. A maioria das propriedades está como “cessão de direitos”, não têm escritura própria (posse de terra) e não podem averbar; - Houve desmatamento, no faxinal, por

parte das grandes empresas madeireiras, ocasionando diminuição da água;

- Está piorando a vida das famílias por não conseguirem renda suficiente para o seu sustento. A maioria das pessoas saem durante alguns meses do ano para trabalhar fora, nas fazendas, para corte de pinus (uns 08 meses de serviço); - Não acontecem mais mutirões; falta

união das pessoas, emprego e renda; - Existe um problema de relacionamento

entre a D. Zoraide (liderança da comunidade) e outras famílias ("ela quer tudo para a casa dela") => intrigas, desconfiança, etc. A comunidade não participa, não se une;

- Não tem nenhum tipo de assistência técnica para a comunidade;

- Está tendo “pressão dos fazendeiros” vizinhos para terminar com a criação solta. "Se continuar assim, dentro de um ano vai terminar o criadouro" (Sr. Hamilton de Lara).

- Os de fora do faxinal estão matando os animais (os fazendeiros, firmas de madeira e os sem-terra que estão em volta);

- Os jovens é que estão saindo da comunidade (cerca de 50%) para buscar trabalho fora (indo para cidades de Santa Catarina);

- Faltam recursos financeiros para pagar a emissão dos documentos da terra; - Não conhecem nada sobre a legislação

existente e nunca participaram de nenhuma discussão sobre isso.

- Necessidade de apoio governamental e motivar as pessoas a se unirem;

- O faxinal deve continuar, desde que ocorra ajuda para melhorar as condições de vida das famílias. Necessitam de melhorar a produtividade das lavouras, cultivar mais, ocupar melhor a terra, sem deixar de criar animais, e melhorando as pastagens;

- Ajuda financeira e técnica, para melhorar as atividades agrícolas no faxinal;

- Ter apoio para os de fora pararem de “matar” os animais; punir os responsáveis; fazer um acordo ou negociação com os fazendeiros;

- Apoio para as famílias cercarem as áreas que estão tendo problemas de entrada e morte de animais, ou fazer os proprietários grandes fecharem suas áreas;

- Melhoria do transporte, para os alunos chegarem na cidade para estudar, principalmente para o 2º grau (melhorar, para que chegue na comunidade, pois já existe, mas é longe);

- Melhorar a conservação das estradas, colocando cascalho;

Buscar alternativas de comércio/mercado para as criações do faxinal, gerando mais renda para as famílias

QUADRO 4: Dificuldades e Sugestões para o Faxinal Mansani em 2004 (Inácio Martins) FONTE: MARQUES (2004, p. 172- 173) ORG por LIMA, L.S. de (2011).

Com relação ao tamanho da comunidade e propriedades, destacamos: “A comunidade tem ao todo 150 alqueires minha propriedade tem 53 alqueires, nos quais retiramos erva-mate a cada três anos, plantamos pinus, fazemos roçada de caíva e carvão, vendidos para a madeireira Beto Bazia” (Entrevistada A).

Ainda quanto a criação de animais e lavouras a Entrevistada A retratou: “Os animais são criados de maneira coletiva porcos, vacas, carneiros, galinhas, mas apenas para o consumo. E ainda 2,5 alqueires da propriedade são feitas lavoura (fechada), com milho feijão também para o consumo e alimentação complementar dos animais. Mas só três famílias do faxinal têm lavouras justamente pela manutenção do criadouro comunitário”.

Marques (2004, p.20) retrata que a área total de 532,40 ha, a área do criadouro é de 474,32 Matas/florestas: 242,0 ha (Parte da área do criadouro está na APA da Serra da Esperança. Sobre as cercas existentes nessa comunidade e sua conservação Marques relata:

As cercas que existem são feitas pelas “fazendas” em torno da área do criadouro (nas divisas), tendo perto de 3.000 m de comprimento. São cercas com 4 fios de arame, pouco conservadas ou não têm conservação; são velhas (perto de 40 anos), estão caindo e ninguém faz a manutenção (os proprietários deveriam fazer a manutenção) (MARQUES, 2004, p.19)

A Figura 10 demonstra a manutenção outra prática tradicional, os faxinalenses do Faxinal Mansani separando a carne da gordura de porco que será frita no fogão à lenha que fica em uma cozinha de chão ao lado separada da casa, depois a carne será guardada na lata, segundo eles para melhor conservar o sabor.

FIGURA 10: Faxinalenses manuseando a carne ao lado cozinha de chão batido no Faxinal Mansani (Inácio Martins-Pr).

FONTE: LIMA, L. S. de. (2011).

obtenção de renda e manutenção do criadouro o entrevistada A afirma: “Acredito que vai terminar o criadouro porque os fazendeiros que moram ao redor querem terminar com as criações à solta, porque estragam o pinho e não dão lucro. Alguns, não só jovens famílias inteiras estão saindo por não terem condições de sobrevivência. Meus filhos estão sem estudar porque à noite não tem condução para puxar os alunos até o ponto e trabalham durante o dia”.

Outra dificuldade é refere-se aos conflitos religiosos, pois segundo a entrevistada A, a comunidade tinha a maioria de católicos, mas a Igreja Matriz e alguns moradores vão contra a sua decisão de construir outra capela no seu terreno, gerando conflitos como relata:

“Meus bisavós, há anos passam o Divino Espírito Santo de geração em geração, bem como os ensinamentos de fazer às curas, mas a igreja católica é contra, então decidi construir uma capela para o divino na minha propriedade, como são contra a construção, queriam até chamar a polícia para impedir. O resultado é que meus filhos e netos, por causa disso, estão virando evangélicos, então como vou repassar o que aprendi com meus bisavós a eles se agora pertencem a outra religião?”.

A Figura 11 demonstra o interior da capela construída pela moradora da comunidade Mansani em terreno próprio.

FIGURA 11: Capela do Divino em Mansani e ao lado a Benzedeira mostrando o Divino que teria recebido de seus bisavós.

FONTE: LIMA, L.S. de (2011).

Com base no relato da moradora notamos há uma rejeição por parte da igreja católica quanto aos conhecimentos tradicionais da Entrevistada A que também é benzedeira, curandeira. Essa rejeição a fez construir, há três anos outra capela do Divino Espírito Santo na sua propriedade em oposição à capela de São Sebastião frequentada pela maioria da comunidade. Essa igreja já existe há cerca de 70 anos, na qual é feita a catequese e as missas

uma vez ao mês. Já os casamentos, batizados, comunhão e crisma que no passado eram feitos na Capela de São Sebastião, hoje são feitos na Igreja Matriz, situada na área urbana de Inácio Martins.

A entrevistada A afirma que todos os anos na Quaresma ela junto com outra benzedeira realizam outra prática tradicional a Recomenda e disse que fazem ainda a procissão do Divino Espírito Santo e todos da comunidade participam desses momentos, nos quais ela atua como coordenadora.

Já a Dança de São Gonçalo (Romaria) não é realizada já há uns 15 anos por falta de tempo, mas querem voltar a realizar

“Sou conselheira da comunidade, faço parte da Pastoral da Criança, do movimento da saúde e sou vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, no mês de passado participei em Brasília da luta nacional pelos direitos das mulheres, a Marcha das Margaridas de 6 Km”.

A Figura 12 ilustra a Entrevistada A, Coordenadora da comunidade Mansani, mostrando as bandeiras usadas em sua atuação defendendo seus direitos na Marcha Nacional das Margaridas 2011, no mês de Agosto em Brasília.

FIGURA 12: Coordenadora da comunidade mostrando as bandeiras usadas na Marcha Nacional das Margaridas 2011

Fonte LIMA, L. S. de (2011).

Desta forma, procuramos evidenciar as características da comunidade Mansani relacionadas as suas manifestações territoriais que demonstram a penetração de novas fontes de renda em oposição ao criadouro comunitário e a religião católica em oposição as práticas tradicionais na comunidade.

No documento LUCELIA SANTOS DE LIMA (páginas 70-75)