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CAPÍTULO III: O impacto da receção conciliar portucalense em A Voz do Pastor

2. A receção conciliar na diocese do Porto no pós-Concílio

2.1. Um Concílio em receção

Encerrado o Concílio, não esmoreceu o zelo para que ele fosse bem recebido na diocese. Quase a terminar o ano, no último dia de 1965, D. Florentino escreveu uma exortação pastoral para dar conta do Jubileu Pós-conciliar na diocese do Porto. Agradecido pela generosidade do papa em promulgar esta iniciativa, a celebrar entre 1 de janeiro e o Pentecostes de 1966, dava conta dos fins e da consciência eclesial que o

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Concílio havia despertado nas consciências408. Como tivemos oportunidade de ver, desde

1964 estavam em marcha a Missão Diocesana e a visita pastoral a toda a diocese, factos que na visão do administrador diocesano ganhariam mais relevo com a sua associação às celebrações do Jubileu. Tendo o papa concedido indulgência plenária em algumas situações, D. Florentino desejava que os fiéis obtivessem essa graça, que tratava de explicar aos fiéis. Do mesmo modo, instituiu as peregrinações à catedral, a nível concelhio ou vicarial, e aumentou o número de pontificais409. Tal como acompanhava

com breves relatos a Missão Diocesana, o jornal também procurou dar notícia das várias peregrinações à catedral inseridas no contexto do Ano Jubilar410.

No mês de fevereiro, a Comissão Diocesana de Liturgia pronunciou-se sobre as normas litúrgicas da missa, para tirar algumas dúvidas, resolver problemas e esclarecer certas dificuldades411. Na prática litúrgica, tudo deveria proporcionar a manifestação de

um espírito novo que animasse o celebrante e os seus variados cooperadores. Muito mais que «inovações litúrgicas, mais do que a presença de “actores” diversos e mais do que a própria disposição do ambiente, [seria], um “estilo novo” que havia de ajudar a conduzir os Fiéis à perceção e à compreensão das Santas Realidades que a Liturgia punha em acto»412. Dias depois, o P. Gabriel da Costa Maia, secretário da Comissão, fez um resumo

da nota de esclarecimento, que veio a ser publicado no número de 5 de março do jornal413.

Pouco mais se falou no jornal acerca do Ano Jubilar. Em dezembro de 1966 fizeram-se os preparativos para festejar o encerramento do Ano Jubilar na sé com solene pontifical e adiantava-se que no final da celebração, D. Florentino daria a bênção papal aos presentes414. Naquele dia, falou da importância do papel de Maria como chave para a

408 Cf. PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – Exortação pastoral

sobre o Jubileu Pós-conciliar. VPast. (8 jan. 1966) 4-6.

409 Cf. PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – Exortação pastoral

sobre o Jubileu Pós-conciliar, 6.

410 Cf. JUBILEU. VPast. (22 jan. 1966) 1; MILHARES de matosinhenses abriram a série das peregrinações

jubilares: Apologia da sé catedral. VPast. Porto. (19 fev. 1966) 4.6; JUBILEU Pós-conciliar: Peregrinações à sé no mês de março. VPast. (12 mar. 1966) 1.

411 Cf. PORTO. Comissão Diocesana de Liturgia – Nota da Comissão Diocesana de Liturgia:

Esclarecimentos e normas. VPast. (26 fev. 1966) 5-6.

412 Cf. PORTO. Comissão Diocesana de Liturgia – Nota da Comissão Diocesana de Liturgia:

Esclarecimentos e normas, 6.

413 Cf. MAIA, Gabriel da Costa – Resumo da nota da Comissão Diocesana de Liturgia. VPast. (5 mar. 1966)

5.

414 Cf. NA SÉ catedral: Festa da padroeira e encerramento do Ano Jubilar do Concílio. VPast. (3 dez. 1966)

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compreensão do mistério de Cristo e da Igreja e pediu a intercessão da Imaculada para que velasse pela cidade do Porto de quem era a padroeira415.

Entretanto, o jornal continuava a acompanhar as inovações litúrgicas. Em janeiro de 1967, a Comissão Diocesana de Liturgia publicou uma nova nota para resolver algumas dúvidas quanto às preces, à leitura do evangelho, homilia, cântico do ofertório, tom da recitação do cânon, comunhão dos fiéis, velas e anúncio de festas religiosas416. A

questão da restauração do diaconado, em Portugal, começava a colocar-se, mas pouco se sabia do que se pensava fazer a este respeito. Enquanto isso se ia refletindo, no Porto, haviam-se iniciado algumas experiências de estágio diaconal para os candidatos ao presbiterado, de modo a que os futuros presbíteros estivessem mais preparados para enfrentarem os novos desafios eclesiais417. Por altura da Quaresma de 1968, existiam

algumas dificuldades decorrentes da grande afluência de penitentes aos confessionários e a insuficiente preparação dos confessores, bem como da falta de exame de consciência. Gabriel da Costa Maia colocou ao dispor material para que se fizessem celebrações penitenciais que permitissem aos fiéis uma boa preparação para receberem o sacramento da reconciliação. Segundo o secretário da Comissão Diocesana de Liturgia, a iniciativa surgiu da reflexão acerca da Sacrosanctum Concilium, que recomendava que se fizesse perceber aos penitentes a importância daquele sacramento e das consequências do pecado, assim como o papel da comunidade no processo do penitente. Foi colocado à disposição um esquema de celebração penitencial e uma fita magnética com cânticos e textos para as confissões418.

Chegados a meados de 1969, previam-se grandes mudanças na vida diocesana. D. António Ferreira Gomes viu-se livre do impedimento de entrada em Portugal, por parte do Governo, e iniciou a sua viagem de regresso a 18 de junho, dirigindo-se para Fátima. Aí permaneceu até ser resolvida a questão da Administração Apostólica de D. Florentino419. Reassumiu o governo da diocese a 2 de julho420 e deu entrada no paço

episcopal no dia 5421. Recebendo os jornalistas no paço, frisou que o seu programa seria

415 Cf. PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – A mensagem da

Imaculada Conceição para o nosso tempo. VPast. (17 dez. 1966) 1.3.

416 Cf. PORTO. Comissão Diocesana De Liturgia – Nota da Comissão Diocesana de Liturgia. VPast. (14

jan. 1967) 5.

417 A RESTAURAÇÃO do diaconado em Portugal. VPast. (1 abr. 1967) 3.

418 Cf. MAIA, Gabriel da Costa – Celebração comunitária da penitência. VPast. (2 mar. 1968) 4. 419 Cf. O REGRESSO a Portugal do senhor bispo do Porto. VPast. (28 de jun. 1969) 1.5.

420 Cf. PORTO. Bispo, 1952-1982 (António Ferreira Gomes) – Mensagem do senhor bispo aos seus

diocesanos: “À nossa Igreja episcopal do Porto”. VPast. (5 jul. 1969) 1.5.

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«realizar a obra da Igreja, na linha do Vaticano II e a caminho do Vaticano III, tendo em conta o Vaticano I e até o Concílio de Trento, mas sem voltar para trás»422. O regresso do

bispo ficou também marcado por uma renovação da cúria, nomeadamente com a nomeação do P. Manuel Martins para o cargo de vigário geral e do P. Arnaldo Cardoso de Pinho para seu secretário particular423. Com a chegada do bispo, cessava, igualmente,

a Missão Diocesana. Um mês depois, D. Alberto Cosme do Amaral foi nomeado bispo auxiliar de Coimbra424.

Numa entrevista concedida ao Boletim de informação pastoral425, reproduzida na

A Voz do Pastor, o bispo do Porto referiu que na diocese, depois do Concílio, era

necessário estruturar o Conselho de Pastoral em que leigos e padres teriam espaço para se manifestarem. Esperava, também, que o Conselho Presbiteral funcionasse realmente, de maneira a que os padres pudessem participar nas responsabilidades e na tomada de decisões. Considerava que os acontecimentos vividos tinham ajudado ao crescimento espiritual da diocese426 e aludiu à necessidade de se repensar a imprensa católica no

quadro diocesano427. No dia 8 de dezembro de 1969, celebrou missa pontifical com Te

Deum, como forma de assinalar o centenário da abertura do I Concílio Vaticano. A

comemoração daquela data permitiu mostrar a adaptação da Igreja aos novos tempos e também que o I Concílio do Vaticano foi importante para o que se lhe seguiu 428.

Fruto das diretrizes conciliares, a reunião com o clero pautou-se pela plena abertura e diálogo. A renovação diocesana desejada por D. António Ferreira Gomes levou à convocação de uma reunião, com todo o clero, tendo por objetivo o debate de diversos assuntos da vida diocesana. Nessa reunião, resumida no jornal, o bispo falou sobre alguns princípios de reorganização diocesana, definindo o poder do vigário geral e anunciando a criação de vigários episcopais para alguns setores: ministério e educação eclesiástica; clero paroquial e pastoral; educação e cultura; religiosos e associações de fiéis. Entre

422 PORTO. Bispo, 1952-1982 (António Ferreira Gomes) – O bispo tem de ser o homem de todos ao serviço

do povo de Deus e de todos os homens de boa vontade - afirmou o senhor D. António Ferreira Gomes.

VPast. (12 jul. 1969) 1.5.

423 Cf. NOMEAÇÕES diocesanas. VPast. (5 jul. 1969) 1.5.

424 Cf. O SR. D. ALBERTO Cosme do Amaral foi nomeado bispo auxiliar de Coimbra. VPast. (20 set.

1969) 1.

425 O Boletim de informação pastoral é o título da publicação do Secretariado de Informação Religiosa,

organismo da Conferência Episcopal Portuguesa, publicado entre 1959-1970.

426 Cf. O SENHOR bispo do Porto fala de alguns problemas da diocese [Entrevista ao Boletim de

informação pastoral]. VPast. (13 set. 1969) 1.4.

427 Cf. ALGUNS problemas da diocese analisados pelo senhor bispo (Conclusão) [Entrevista ao Boletim de

informação pastoral]. VPast. (20 set. 1969) 1.5.

428 Cf. PORTO. Secretaria Episcopal – Nota da Secretaria Episcopal: Concílio do Vaticano I. VPast. (6 dez.

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outros assuntos falou-se, ainda, sobre a composição da cúria diocesana e a organização das zonas pastorais429.

O último facto que marcaria a diocese como resultado das ideias conciliares, no tempo de A Voz do Pastor, foi a reestruturação do jornal diocesano que passou a designar- se Voz Portucalense, em janeiro de 1970430. Com esta medida concretizou-se o desejo de

repensar a imprensa católica na diocese, que D. António trazia do exílio e expôs na sua entrevista ao Boletim de informação pastoral431. A Missão Diocesana e as peregrinações

à catedral foram os momentos mais marcantes da receção conciliar na diocese do Porto, pois envolveram todas as comunidades, como se depreende do jornal. No entanto, outros factos marcariam a vida da diocesana, designadamente a criação do Conselho Presbiteral e as iniciativas de formação.