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CAPÍTULO III: O impacto da receção conciliar portucalense em A Voz do Pastor

1. A preparação e a vivência do Concílio na diocese do Porto

1.1. Uma diocese em preparação

Apesar do Concílio ter sido anunciado a 25 de janeiro de 1959, não existem referências com direta incidência na vida diocesana até 1961. Encontramos menções aos trabalhos preparatórios, como reportámos no capítulo anterior. A provisão de 8 de maio de 1961, de D. Florentino, foi a primeira alusão de relevo no jornal diocesano, sobre o tema que aqui tratamos361. O administrador apostólico apoiou a iniciativa papal, dando

conta do interesse do santo padre no bom êxito do futuro Concílio e da atitude compreensiva que havia recebido por parte de toda a cristandade. D. Florentino pedia ao clero e aos fiéis que tivessem bem presente, tal como pedira o papa, a intenção pelo Concílio durante a novena do Pentecostes, nas igrejas paroquiais e em todos os oratórios em que se celebrasse o mês de Maria. Exortava os sacerdotes «a que nas homilias,

361 Cf. PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – Cúria Episcopal

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alocuções (e outros meios apropriados), esclareçam oportunamente o povo de Deus sobre a natureza e os fins transcendentes dos Concílios Ecuménicos»362.

Somente no ano seguinte, na festa diocesana da catequese, subordinada ao tema do Concílio, nos chegaram novos dados a este respeito. Assim, dos mais novos aos mais velhos, começam a preparar os diocesanos para o acolhimento do grande acontecimento eclesial que se aproximava363. A iniciativa foi aplaudida por todos, incluindo o papa:

«Foi também lição oportuna esta reunião magna, a viver a ideia do Concílio Ecuménico, em união com o Santo Padre, a quem foi previamente endereçado um telegrama. S. Santidade dignou-se vir ser presente em espírito, enviando a mensagem cuja leitura abriu a festa: “Augusto Pontífice comprazendo-se reunião criancinhas Catequese toda Diocese do Porto faz votos que tal seja portadora frutos vida cristã e concede paternal Bênção Apostólica. Cardeal Cicognani”»364.

Dias depois, a 31 de maio, D. Florentino escreveu uma carta pastoral intitulada O

Concílio Ecuménico no mundo de hoje. A aproximação do grandioso acontecimento

exigia palavras aos fiéis e aos clérigos. O documento denota uma grande esperança naquilo que o Concílio poderia realizar. A grande preocupação do administrador residia na renovação interna da Igreja, ainda que admitisse que isso pudesse gerar contradições. Havia uma clara intenção de defender a vida humana e a humanidade face aos erros dos tempos que se viviam. D. Florentino confessou que parte dessas atrocidades eram devidas ideais marxistas. Se, por um lado, baseou grande parte da sua fundamentação na crítica ao comunismo, por outro não se pronunciou sobre pretensas ideologias de direita. Apelava também a uma confiança e dedicação para que Deus se fizesse presente em todas as dimensões da vida humana. Em suma, esta pastoral foi um meio de sensibilização do povo de Deus para o acontecimento que estava em preparação, mesmo se não acrescentou muito ao que sobre o Concílio se vinha dizendo no jornal365.

Dando continuidade aos esforços de promoção conciliar, D. Florentino publicou pouco depois uma oração das crianças pelo Concílio, concedendo 100 dias de indulgência a quem a rezasse: «Jesus, Amigo das Crianças, ouvimos o pedido do Santo Padre e queremos que as nossas orações e sacrifícios, unidos aos Teus, atraiam sobre o Concílio as luzes do Espírito Santo. Amen»366. Mais uma vez, antes da sua partida para participar

362 PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – Cúria, 1. 363 Cf. CATEQUESE em festa: Concílio em foco. VPast. (26 mai. 1962) 1.3.

364 CATEQUESE em festa, 3.

365 Cf. PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – O Concílio

Ecuménico no mundo de hoje. VPast. (9 jun. 1962) 1-3.

366 Cf. PORTO. Administrador apostólico, 1959-1969 (Florentino de Andrade e Silva) – Oração das

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na primeira sessão do Vaticano II, que estava prevista para 8 de outubro de 1962367, o

administrador apostólico do Porto deixava algumas orientações:

«1. Nas vésperas do Concílio e durante a sua celebração, esforcem-se os fiéis por se imbuírem mais de espírito cristão; purifiquem as suas almas na penitência e aspirem mais eficazmente à santidade de vida. O Rev.º Clero e todas as almas consagradas não se desobriguem de dar, perante o povo de Deus, o melhor exemplo.

2. Em todos os exercícios de piedade celebrados nas igrejas, capelas e oratórios semi-públicos, continuarão a fazer-se preces pelo êxito do Concílio. Pela mesma intenção será especialmente oferecida a devoção do Santo Rosário que por toda a parte deverá celebrar-se no próximo mês. Integrada nessa devoção, deverá realizar-se a Novena do Espírito Santo, a começar no dia 2 de Outubro ou, logo que possa ser, em um dos dias seguintes. Sejam os fiéis exortados a comparecerem a estes actos sagrados e a incluírem na sua própria oração individual e familiar as intenções do Concílio.

3. No dia 11 de Outubro, ao meio-dia, os sinos de todas as igrejas da Diocese deverão repicar festivamente a anunciar a abertura do Concílio. Ao longo das cidades vilas e aldeias, a alma cristã de todo o povo há-de então vibrar de júbilo e prece e de um amor mais entranhado à Santa Igreja de Deus.

4. A “Equipa Sacerdotal pro Concílio” oficialmente constituída não deixará de cumprir, com inteligência e zelo, a missão de que foi incumbida»368.

Mais algumas notícias merecem destaque, no contexto da abertura do Concílio: a Casa da Boa Imprensa publicitou uma série de livros que versavam sobre os concílios da Igreja369; a Ação Católica organizou uma velada de oração a realizar-se no dia 10 de

outubro, respondendo ao apelo do papa370; Armindo Lopes Coelho371, na Oração de

sapiência, realizada no Seminário Maior, proferiu algumas palavras sobre a importância

de um Concílio Ecuménico para a vida da Igreja, bem como as condições para a sua realização372.

Neste período, o mais importante foi informar e preparar os diocesanos do Porto para o Concílio. O jornal diocesano publicou artigos e pronunciamentos sobre algumas temáticas, mas não era suficiente. A formação dos fiéis tinha de passar também pelo empenho dos sacerdotes. O administrador apostólico insistia, por isso, que se cumprisse

367 O SENHOR D. Florentino de Andrade e Silva partirá para Roma no dia 8. VPast. (29 set. 1962) 2. 368 PORTO. Secretaria Episcopal – Concílio Ecuménico: Nota da Secretaria Episcopal. VPast. (6 out. 1962)

1.

369 Cf. SOBRE o Concílio. VPast. (6 out. 1962) 3.

370 Cf. VELADA nacional de oração na vigília do Concílio Ecuménico. VPast. (6 out. 1962) 2.

371 Naquela altura era professor de teologia no Seminário Maior. Mais tarde será bispo de Viana do Castelo

(1982-1997) e do Porto (1997-2007).

372 Cf. UM CONCÍLIO na vida da Igreja: (Síntese parcial da “oração de sapiência” do rev. dr. Armindo

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a vontade do papa. Igualmente, não causa surpresa a existência de livros ou catequeses sobre a temática. Tudo o que se dizia era bastante incerto. Todas as expectativas acabaram por ser superadas ou vincadas a partir de outubro de 1962.