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4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS

4.3 Agências de Fomento

4.3.1 Conceito de acesso aberto

Todos os entrevistados mostraram-se cientes do que representa o Movimento de Acesso Aberto. Entretanto, a Capes e o CNPq demonstram preocupações que são relatadas a seguir. É possível perceber que a Capes se preocupa com a qualidade dos periódicos de acesso aberto, uma vez que os modelos de negócios estão mudando, e atualmente muitos editores cobram para publicar. Já o CNPq demonstra uma preocupação em relação às questões ligadas à propriedade intelectual.

“Esse é um dos temas que nos últimos anos tem recebido uma atenção muito grande, não só por parte de quem produz conhecimento, mas pelas agências de fomento. O que a gente tem observado é que nós estamos num período de transição, em que o cenário no longo prazo é o acesso aberto. Isso dito pelas principais editoras do mundo, em conversas aqui no Brasil e no exterior. O processo começou há tempos atrás, primeiro com material impresso. Depois esse material impresso é substituído pelo eletrônico, em

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seguida se cria um conjunto de revistas híbridas, nas quais você pode disponibilizar aquele artigo, aquele conteúdo, pagando até um conjunto de revistas que tem o acesso aberto. A grande questão é a qualidade. Hoje no mundo, 8% a 10% dos periódicos já são de acesso aberto, eu diria que de 1,5% a 2% têm qualidade, tem um processo de avaliação por pares, um processo sério. Mas a grande questão no momento é separar o joio do trigo. Como virou também um instrumento de arrecadação, até mesmo as grandes editoras já têm parte de seu conteúdo de acesso aberto, uma vez que você pague para publicar. Então inúmeras revistas viraram instrumentos comerciais, sem nenhum padrão ou com um padrão muito baixo de qualidade”. (Capes)

“Quanto ao acesso aberto, a gente precisa pensar um pouquinho, porque hoje há várias iniciativas que concorrem para isso. Porque dentro do acesso aberto há toda uma concepção a respeito, inclusive da própria propriedade intelectual. Mas o CNPq não instituiu uma política clara, definida, para acesso aberto de dados, informações, etc. Embora existam algumas ações que possibilitem a você ter acesso aberto, livre, a dados e ações do CNPq”. (CNPq)

A preocupação da Capes, no que concerne à cobrança para publicação por parte dos editores, é relevante, pois o modelo APC tem sofrido críticas. Alguns periódicos aceitam qualquer artigo, desde que a taxa seja paga. Isso faz com que a qualidade desses periódicos seja duvidosa (BELL, 2012, p. 179). Entretanto, há de se considerar que as agências de fomento têm um papel importante nessa questão, uma vez que muitos artigos publicados por meio do modelo APC são financiados por essas agências. É fundamental que haja uma avaliação criteriosa desses periódicos, com a finalidade de conceder financiamento somente a publicações em periódicos que detenham rigor científico. É importante considerar, no entanto, que a questão da qualidade dos periódicos não possui uma relação com o fato de ser ou não de acesso aberto.

As preocupações relativas à propriedade intelectual também são relevantes, na medida em que a maioria dos contratos editoriais não informa os direitos relativos ao depósito da produção científica em repositórios institucionais. O pesquisador, em muitos casos, não tem a preocupação de checar essas informações, ou mesmo desconhece os termos de seus contratos de direitos autorais nos periódicos em que publicaram seus artigos (ANTELMAN, 2006). Nesse sentido, nota-se a importância de um mediador, que possa ajudar os pesquisadores, dentro da instituição, a entender o que pode ou não ser disponibilizado em acesso aberto.

86 É importante ressaltar que a opinião dos gestores, que ocupam cargos estratégicos dentro das agências de fomento, sobre o acesso aberto, é extremamente relevante para que se possa incentivar o depósito da produção científica em repositórios institucionais. As preocupações levantadas nos dados obtidos precisam ser consideradas, pois decorrem de toda a problemática que envolve o acesso aberto (modelos de negócio, direitos autorais, propriedade intelectual).

Embora, haja preocupações e questionamentos, quanto mais favoráveis forem esses gestores, maiores serão as chances de serem adotados meios de incentivar as universidades brasileiras a disponibilizarem sua produção em acesso aberto.

4.3.2 Depósito da produção científica em repositórios institucionais de acesso aberto

Os entrevistados das agências de fomento consideram os repositórios importantes e até necessários. Entretanto, existe uma preocupação com os aspectos práticos da implementação e gestão desses repositórios, principalmente por parte da Capes.

“Penso que é uma excelente forma de você facilitar o acesso, porque muitas das instituições privadas hoje, conta com alunos que não têm condições de usufruir de uma assinatura, ou ter acesso a grandes bibliotecas para periódicos de ponta. Então eu acho que essa situação realmente favorece muito o acesso de todos”. (FAP-DF)

“Eu acho interessante essa centralização, pois ela também permite a peculiaridade, mas eu acho que ao mesmo tempo mantém um padrão”. (CNPq)

“Olha, isso nós já temos em pauta, em todas as renovações dos nossos contratos aqui na Agência. Isso é uma exigência legal, então a Controladoria-Geral da União nos mostra essa importância. Nós temos discutido com as editoras como tornar isso possível. Evidentemente isso requer estrutura. Será que nós temos que fazer isso para todas as instituições brasileiras? Elas têm condições de hospedar essa produção? Será que talvez a gente não poderia concentrar num órgão público, na Capes, por exemplo, dentro do portal de periódicos? Porque esse ponto é importante. Vamos supor que se criasse uma lei nesse sentido: você teria que colocar condições de infraestrutura para cada instituição que recebe recurso público pra financiar as pesquisas. Nós estamos negociando com as editoras, não é um negócio trivial isso, porque algumas delas colocam um período de embargo, que é o Green Open Access, e depois elas abrem. Aí é o seguinte, adianta você ter acesso a uma versão que não é a versão final, enorme, com um número de paginação de quando você submete o artigo, com espaço duplo e tal? Não faz muito sentido. O que nós estamos negociando muito então é dentro do Green Open Access, onde as editoras vão listar pra gente o

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período de embargo e depois isso. No caso do portal, isso não é tão importante (no aspecto interno), porque essas instituições já têm acesso. O que nós estamos falando é em disponibilizar esse conteúdo pra fora. Mas, de qualquer forma, isso faz parte hoje de nossa pauta de negociação na renovação dos contratos. Nós estamos falando que nós temos que disponibilizar. Algumas já estão fazendo isso, na submissão do artigo, às vezes você encontra isso: você é financiado pela Capes, do Brasil, aí o autor clica e isso já vai para um banco de dados. Outra situação é a seguinte: o endereço tem que estar na filiação, quer dizer, ainda há uma série de etapas que a gente precisa acertar com as editoras, mas todas elas estão cientes disso, porque isso é uma posição legal, então nós temos que ter esse repositório. O que nós estamos tentando fazer é facilitar isso via Capes para as instituições”. (Capes)

Nos dados obtidos, é possível notar que as três agências de fomento são favoráveis ao depósito em repositórios institucionais, entretanto a principal questão levantada diz respeito à estrutura das universidades para cumprir sistematicamente essa tarefa. Embora o Ibict tenha trabalhado no intuito de divulgar as vantagens e benefícios dos repositórios institucionais, bem como tem prestado suporte tecnológico às universidades que implementaram repositórios, estas, em muitos casos, não possuem condições técnicas, operacionais e humanas para manter um repositório institucional (WEITZEL; MACHADO, 2010).

Nesse sentido, as agências de fomento, especialmente a Capes, possuem ressalvas no que se refere à implementação de qualquer tipo de política que estabeleça o depósito obrigatório da produção científica em repositórios institucionais por parte das universidades brasileiras.