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3.2 conceito de aluno e seus processos de aprendizagem

O aluno se estrutura conforme as ordens, da comunidade, da administração escolar e da sua sociabilidade (CANDIDO, 1971). Assim, “seu comportamento deve corresponder aos padrões gerais da comunidade e às normas pedagógicas e administrativas. Deve, também, ajustar-se ao que dele esperam os demais colegas, ou os membros do agrupamento de que faz parte na escola” (ibid., p.124). Nessa perspectiva de escola institucionalizada, o aluno deve subordinar-se às normas e obedecer.

Na proposta curricular para deficientes auditivos de 1979, a população a ser atendida pelo projeto, como visto no capítulo anterior, delimitava “média de perda auditiva no ouvido menos afetado igual ou superior a 70 dB, considerando-se os limites das freqüências de 500, 1.000 e 2.000 Hz” (MEC, 1979/v2, p. 30). Mas, nos questionamos, neste momento, sobre o que se esperava desse aluno, quais as expectativas em relação ao seu desenvolvimento.

Verificamos as orientações de outras áreas do conhecimento, pois as relacionadas à expressão e comunicação, analisadas no capítulo anterior, estão, visivelmente, predispostas à integração. Não foi nosso objetivo analisar as áreas que não sejam de ensino de Língua Portuguesa, mas não pudemos nos furtar de apontar dois aspectos fundamentais para a contextualização do processo educativo. Pois, na continuidade do documento sobre a área de Estudos Sociais, indica:

Assim, o professor tem, na área de Estudos Sociais, um meio de suma importância para integrar o aluno no meio social em que vive, sendo este o objetivo fundamental da área. Os objetivos gerais da 1a série expressam a formação de atitudes necessárias à integração do aluno na sociedade, bem como o reconhecimento e valorização dos diferentes profissionais existentes nesse meio (BRASIL, MEC, 1979/v.2, p. 54).

O indivíduo surdo é moldado conforme os padrões aceitáveis para a convivência em sociedade, mas há outro ponto do “currículo pleno” interessante, pois, além da parte geral, onde se inclui a comunicação e expressão, há outra de formação especial. Zotti (2004), ao analisar as determinações políticas e histórias para a construção desse currículo, aponta que:

No 1o grau, a educação geral é exclusiva nas séries iniciais e, predominante nas séries finais; no segundo grau a formação especial é predominante (art 5o, § 1o). Além disso, o , § 2o dispõe os objetivos da educação especial, tanto no 1o como no 2o grau o objetivo será a habilitação profissional. Tambémfixa que a definição e instalação de cursos profissionalizantes será em consonância com as necessidades do mercado de trabalho local e regional (ZOTTI, 2004, p.165-166).

Fica claro, então, o cunho civilizatório da educação, o trabalho pedagógico garante a imposição dos conteúdos culturais de grupos e classes dominantes sobre os demais no interior da escola, mantendo, assim, a perpetuação da ordem estabelecida, garantindo uma formação social durável. Essa ação uniformizante, com proposição de manter a ordem, se dá através de sua comunicação e de seu encaminhamento para o trabalho, com uma formação tecnicista e profissionalizante que, para o deficiente, é aligeirada, pois começa nos anos finais do 1o grau, buscando atender à necessidade do mercado de trabalho, procurando funções que, apesar de sua deficiência, possa desempenhar, tornando-se produtivo.

Certeau (1995) nos leva a pensar nas práticas comuns, na invenção do cotidiano, de como o homem usa a ciência na vida singular e pública. Consideramos que, no público, não lhes era permitido expressarem-se por meio da Língua de Sinais, e a escola, um dos espaços mais repressores existentes, outorgada de toda a sistematicidade, também assim, o fazia, mas a Língua de Sinais prevalece nos espaços privados.

Conforme Elias (1994), estes espaços compõem a cultura, são produtos e processos de uma significação cultural, engendrada pelos homens. Os costumes vãos sendo construídos nessas instituições, práticas e cotidianas, de significação e ressignificação, mas este espaço não é cristalizado, apenas consolida os mecanismos e determinações do corpo docente, a língua que se deve falar, ocorrendo o cruzamento de culturas. Espaço onde esses indivíduos, para terem acesso à cultura e serem civilizados, precisavam submeter-se. Por mais que

tivessem uma língua diferente construída histórica e socialmente, pois, no mercado lingüístico escolar, fica explícito o confronto social e simbólico, a língua autorizada é o Português oral e escrito.

Já no Programa de Capacitação de Recursos humanos do Ensino Fundamental de 1997 o material destinava-se ao trabalho com alunos que tenham “a diminuição da capacidade de percepção normal dos sons, sendo considerado surdo o indivíduo cuja audição não é funcional na vida comum, e parcialmente surdo, aquele cuja audição, ainda deficiente, é funcional com ou sem prótese auditiva” (MEC, 1997/v.1, p. 31). Nesse momento, aceita-se a Língua de Sinais Brasileira como um meio de comunicação eficiente para a interação com alunos surdos, ora, como Língua da comunidade de surdos, ora como recurso pedagógico. Fica evidente, porém, sua permissão. Todavia, o que se espera de resultado de todo trabalho educativo é que o surdo seja integrado à sociedade.

A legislação do Brasil (Constituição Federal, 1988; LDB 9394, 96) prevê a integração do educando com necessidades especiais no sistema regular de ensino. Assim:

... a normalização é o princípio que representa a base filosófico-ideológica da integração. Não se trata de normalizar as pessoas, mas sim o contexto em que se desenvolvem. Normalização significa, portanto oferecer aos educandos com necessidades especiais modos e condições de vida diária os mais semelhantes possíveis às formas e condições de vida da sociedade (MEC, 1997/v.2, p. 295).

Pressupõe o aluno com o indivíduo que necessita de processo educativo para que adquira a linguagem oral, da língua de sinais e da Língua Portuguesa escrita, assim, o surdo terá mais facilidade em conviver em espaços como a escola. Considera, também, a necessidade de transformação das condições externas, como: preparação dos recursos humanos, adaptação do currículo, complementações curriculares, entre outros.

No documento de 2002, o aluno surdo não é identificado por grau de surdez, mas, sim, por pertencer a uma minoria lingüística, usuária de um sistema lingüístico de natureza visual- motora, denominando-o de o aprendiz surdo de Português como segunda língua.

Em todos os documentos analisados, supõe-se uma participação ativa do aluno nos diferentes processos de exploração, seleção e organização do conhecimento. Mas, nos dois últimos (MEC 1997, 2002), o surdo é incluído, no corpo docente das propostas, como instrutor de Libras. Assim, a relação sujeito surdo - objeto de aprendizagem, em destaque nestes, a língua constitui o centro de atenção dos processos individuais de aprendizagem. Pois o surdo adulto tem como função ensinar a língua de sinais.