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3.3 DISPERSÕES SÓLIDAS

3.3.1 Conceito e Particularidades

As dispersões sólidas são sistemas compostos por uma ou mais substâncias ativas dispersas em um carreador ou matriz inerte, quando ambos encontram-se no estado sólido (ALVES et al., 2012; HUANG; DAI, 2014), cuja preparação é alcançada através dos métodos de solvente, fusão ou fusão-solvente (CHIOU; RIEGELMAN, 1971). Estes sistemas dispersos tem sido vastamente empregados com a intensão de incrementar o perfil de dissolução de fármacos pobremente solúveis em água, e esta movimentação é decorrente dos avanços alcançados pela química combinatória e a triagem computacional prévia de candidatos a novas moléculas terapêuticas, que indicam moléculas potenciais com fortes tendências a uma boa permeação, entretanto falham na solubilidade aquosa (SARODE et al., 2013; SUN; JU; LEE, 2012).

Os primeiros trabalhos envolvendo o emprego das dispersões sólidas foram publicados na década de 60 (CHIOU; RIEGELMAN, 1969, 1971), onde envolviam carreadores cristalinos em sua obtenção. Estes sistemas, denominados de dispersões sólidas cristalinas, compõem a primeira geração das dispersões sólidas, que são baseadas na obtenção de misturas eutéticas entre o fármaco e o carreador cristalino (ALVES et al., 2012; LEUNER; DRESSMAN, 2000). Numa mistura eutética, o ponto de fusão da mistura é menor que o ponto de fusão do fármaco e carreador isolados, e são resultado de uma recristalização simultânea entre o fármaco e o carreador. Assim, a redução do tamanho de partícula do fármaco, o incremento da molhabilidade e a mudança polimórfica constituem as principais razões para o incremento da solubilidade aquosa e da taxa de dissolução dos fármacos nesta geração de dispersão sólida (VO; PARK; LEE, 2013) .Um dos pontos críticos na obtenção destes sistemas é o de trabalhar

exatamente na composição eutética, caso contrário, um ou outro componente estará em fase separada (CRAIG, 2002). Além disso, a alta estabilidade termodinâmica decorrente do estado cristalino em que as substâncias se encontram tornam o incremento da taxa de dissolução pequeno quando comparado a dispersões sólidas no estado amorfo (CRAIG, 2002; VO; PARK; LEE, 2013).

A aplicação de polímeros hidrofílicos como carreadores de dispersões sólidas foi primeiramente realizada por Chiou e Rielgeman, na década de 70 (CHIOU; RIEGELMAN, 1971). Estes sistemas constituem a segunda geração das dispersões sólidas, e possuem a capacidade de dispersar o fármaco na rede polimérica amorfa. Devido ao estado físico da fase dispersante, estes sistemas são denominados de dispersões sólidas amorfas. Aqui, o fármaco é disperso em um tamanho muito pequeno (molecular, partículas amorfas ou pequenos cristais) na malha polimérica. Na ausência do polímero, as moléculas de fármaco tenderiam rapidamente à recristalização, por ser o estado físico mais estável na natureza. Entretanto, o confinamento molecular das moléculas de fármaco na malha polimérica retarda o encontro entre duas ou mais moléculas de fármaco para formação de um cristal. Nesse cenário, se o fármaco for miscível no polímero e apresentar uma dispersão molecularmente dispersa, este sistema é denominado de solução sólida amorfa (ou solução vítrea), enquanto que se o fármaco for imiscível no polímero, sendo a dispersão composta por duas fases distintas, o sistema é denominado de suspensão sólida amorfa.

Os carreadores poliméricos podem incrementar a molhabilidade e a dispersibilidade de fármacos, além de inibir sua recristalização quando em contato com a água, repercutindo assim no incremento da sua taxa de dissolução (SUN; LEE, 2015b; TRAN et al., 2011; VO; PARK; LEE, 2013) . Entretanto, a separação de fases e/ou a recristalização do fármaco durante o período de armazenamento constitui o principal problema a ser superado, sendo este um dos principais motivos para o baixo número de produtos no mercado que aplicam esta tecnologia (TIAN et al., 2014; TIAN et al., 2013; TRAN et al., 2011). A Figura 4 ilustra os diferentes tipos de dispersões sólidas aqui abordados.

Figura 4 - Classificação de uma dispersão ou solução sólida de um fármaco em um carreador polimérico

Fonte: Adaptado de Sun;Lee, 2015.

Ainda no contexto do incremento da solubilidade aquosa de fármacos surgiu a terceira geração das dispersões sólidas. Nela, são introduzidos agentes surfactantes ou agentes auto emulsionantes como carreadores ou aditivos, demonstrando assim um significativo incremento na solubilidade aquosa e na superação dos problemas relacionados a precipitação e recristalização do fármaco. O aumento da estabilidade do sistema disperso desta geração é defindido pela natureza anfifílica do agente emulsionante ou surfactante empregado, uma vez que este pode incrementar a miscibilidade entre o fármaco e o carreador, e assim reduzir a taxa de recristalização do fármaco. Ainda, estes compostos possuem a propriedade bem conhecida de incrementar a molhabilidade de fármacos e prevenir a precipitação do mesmo durante a dissolução, uma vez que promovem sua supersaturação (VO; PARK; LEE, 2013).

Ao envolver os polímeros na obtenção dos sistemas dispersos um novo universo de possibilidades se abre no âmbito das diferentes formas de liberação de fármacos. Assim surgiu a quarta geração das dispersões sólidas, denominada de dispersões sólidas de liberação controlada (DSLC). Nela, dois fatores chaves precisam ser alcançados: o aumento da solubilidade aquosa do fármaco e sua liberação estendida de forma controlada. Ou seja, fármacos pouco solúveis em água necessitam estar molecularmente dispersos em um polímero insolúvel ou intumescível em água, utilizados para retardar a liberação do fármaco no meio de dissolução. As DSLC podem liberar quantidade adequada de fármaco em um período de tempo estendido e assim oferecer uma série de vantagens, tais como aumento da aderência ao tratamento por parte do paciente, devido a redução de administrações diárias, redução dos efeitos colaterais e efeito terapêutico mais constante ou prolongado de fármacos pouco solúveis

em água, dentre outros (GIRI et al., 2012; NGUYEN et al., 2016; VO; PARK; LEE, 2013). Segundo Giri e colaboradores (2012), a liberação de fármacos a partir de DSLC é dependente do peso molecular e da concentração do carreador, do aporte de fármaco em relação ao polímero e do grau de reticulação do polímero.

A Figura 5 ilustra os diferentes perfis de liberação de acordo com a geração de dispersão sólida empregada.

Figura 5 - Comparação dos perfis de dissolução das quatro gerações de dispersão sólida em condições supersaturadas

Fonte: Adaptado de Vo; Park e Lee (2013). Legenda: (0) – fármaco puro; (1) – primeira geração de dispersão sólida; (2) – segunda geração de dispersão sólida; (3) – terceira geração de dispersão sólida; e (4) – quarta geração de dispersão sólida.