3.1 TRABALHO ESCRAVO E AS CONSAGRAÇÕES CONSTITUCIONAIS
3.1.1 Conceito e funções dos princípios
Doravante, existe a necessidade de se elucidar acerca da teoria dos princípios. Para isso, necessário se faz relativizar os conceitos deste instituto normativo pelo posicionamento de diversos doutrinadores, bem como a função que os princípios exercem dentro do ordenamento jurídico.
Para Canotilho “os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionalismos fácticos e jurídicos.”1
Com fundamento nas palavras de Barroso, podemos entender que princípios:
são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui.2
Nas palavras de Silva, encontra-se um significado bem específico do conceito de princípios:
Definimos a Constituição como um conjunto de normas e princípios consubstanciados num documento solene estabelecido pelo poder constituinte e somente modificável por processos especiais previstos no seu texto. Revela isso que a Constituição compreende normas e princípios.3
Com toda a clareza, impõe-se o posicionamento de Melo:
Princípio é por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.4
Encontra-se acordado nas palavras de Sávio:
1 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra, Portugal: Almedina, 2000. p. 1161.
2 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 147.
3 SILVA, José Afonso da. Os princípios constitucionais fundamentais. Disponível em:
<http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/principios_constitucionais_fundamentais.pdf>. Acesso em: 25 out. 2011.
4 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. São Paulo: RT, 1986. p. 230.
Ora, sendo a Constituição um sistema de regras e princípios que resulta do consenso social sobre os valores básicos, e considerando mais, que os princípios, dada a sua qualidade normogenética, fundamentam as regras, parece bastante fácil compreender que os princípios estão no ponto mais alto da pirâmide normativa, são ‘norma das normas’, ‘fonte das fontes’.5
Para exaltarmos a importância dos princípios é notória que a “conseqüência direta do exame dos princípios constitucionais é a constatação de que não são os princípios constitucionais que se movem no âmbito da lei, mas a lei que se move no âmbito dos princípios.”6
Vale dizer ainda que “inicialmente, cumpre marcar que os princípios fundamentais são normas embasadoras e informativas de toda a ordem constitucional [...].”7
Destaca-se, o posicionamento de Canotilho acerca dos princípios fundamentais:
consideram-se princípios jurídicos fundamentais os princípios historicamente objectivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma recepção expressa ou implícita no texto constitucional. Pertencem à ordem jurídica positiva e constituem um importante fundamento para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo.8
Diante de tais circunstâncias, é oportuno ressaltar as palavras de Fontanella:
A palavra princípio designa a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por um conceito mestre, de onde todos os demais pensamentos derivam e se subordinam. Os princípios constituem-se, portanto, no fundamento de outras normas; são as normas das normas.9
Nas menções de Barroso destaca-se que, o entendimento do significado de princípios pode ser assim visualizado ao prelecionar que “apontam para estados ideais a serem buscados, sem que o relato da norma descreva de maneira objetiva a conduta a ser seguida.”10
5 SÁVIO, Camila Gomes. A superioridade dos princípios constitucionais. 2004. Disponível em: <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=1721>. Acesso em: 25 out. 2011.
6 Ibid.
7 DOMINGOS, Sérgio. Conflito de princípios e o princípio da proporcionalidade. Disponível em: <http://www.escolamp.org.br/arquivos/18_09.pdf>. Acesso em: 25 out. 2011.
8 CANOTILHO, 2000, p. 1165.
9 FONTANELLA, Patrícia. União homossexual no direito brasileiro: enfoque a partir do garantismo jurídico. Florianópolis: OAB/SC, 2006. p. 41.
10 BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 206.
Coloca-se de fundamental importância diferenciar tais conceitos que envolvem o tema de princípios, por ora, tão essenciais ao definido estudo. Por esta maneira:
Os princípios fundamentais são regras legais por excelência e que se encontram no topo da pirâmide jurídica. Num sistema constitucional, democrático e garantista, como o brasileiro, os princípios devem ser obrigatoriamente observados pelo Juiz quando da prolação de uma decisão.11
Como se percebe, os princípios e direitos fundamentais possuem ampla ligação em seu escopo garantista constitucional e social. Por esta maneira, é correto explicar que:
Os Direitos Fundamentais integram, portanto, ao lado da definição da forma de Estado, do sistema de governo e da organização do poder, a essência do estado constitucional, constituindo, neste sentido, não apenas parte da constituição formal, mas também elemento nuclear da Constituição material. Verifica-se, dessa forma, que os Direitos Fundamentais são o pilar do estado Constitucional e democrático de Direito, e qualquer afronta a tais direitos constitui grave violação.12
Ainda, para Canotilho:
Em virtude da sua referência a valores ou da sua relevância ou proximidade axiológica (da justiça, da idéia de direito, dos fins de uma comunidade) os princípios tem uma função normogenética e uma função sistêmica: são o fundamento de regras jurídicas e tem uma idoneidade irradiante que lhes permite ligar ou cimentar obectivamente todo o sistema constitucional.13
Alkmim entende acerca das funções dos princípios que “o principio constitucional impõe aos órgãos do Estado a realização de fins, a execução de tarefas, a formulação de programas.”14
Com tais apreciações doutrinárias, percebe-se a clara relevância de tal assunto para a dissertação em tese, tendo em vista todos os princípios e garantias fundamentais violados pelo ser humano em decorrência da prática do trabalho escravo no Brasil.
Como verificado, os princípios que percorrem todo o ordenamento jurídico são manifestações legais com fundamental importância, tanto para o legislador
11 CREMONEZE, Paulo Henrique. A primazia dos princípios fundamentais constitucionais e sua
aplicação nas lides forenses: verdadeira promoção da justiça. Santos, SP, 2005. Disponível em:
<www.jus.2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7306>. Acesso em: 22 ago. 2011.
12 SARLET, Ingo Wolfang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 62.
13 CANOTILHO, 2000, p. 1163.
como para o ser humano. Os princípios podem ser considerados como o norteio básico da vida em sociedade e que devem ser respeitados tanto quanto os dispositivos legais didaticamente expostos nos diplomas legais.