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4 INTERESSE RECURSAL NA PERSPECTIVA DA VALORIZAÇÃO DOS

4.2 Conceitos clássicos de recurso, juízo de admissibilidade e interesse recursal

Antes, porém, de proceder-se ao suprarreferido exame, impõe-se que analisemos conceitos clássicos de institutos essenciais à boa compreensão da questão aqui deduzida, como o que são e para que servem os recursos, o juízo de admissibilidade e o interesse recursal.

A palavra recurso advém do verbo latino recursare, cujo significado seria “[...]correr para o lugar de onde se veio[...]” (CÂMARA, 2002, p.3), identificando, no contexto de aplicação da ciência jurídica, que o Estado-Juiz deve retornar no caminho e reapreciar se o provimento jurisdicional expedido conteria algum tipo de vício, dando-se a ideia de que a interposição do recurso implica a renovação do processo perante o órgão jurisdicional superior (CÂMARA, 2002, p.3).

Segundo clássica lição de Barbosa Moreira, o recurso é “[...] simples aspecto, elemento, modalidade ou extensão do próprio direito de ação exercido no processo [...]”(DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.20), ou, conforme Cássio Scarpinella (BUENO, 2010, p.68), indicativo seguro dos “[...]desdobramento do direito ação e do direito de defesa pelo SINDIFUMO encontraria amparo na manifesta necessidade de pluralização do debate, concorrendo com os elementos que julgasse úteis à melhor compreensão do quadro em exame e fossem processualmente admissíveis neste estágio do processo. Aduziu-se, ademais, que a decisão que viesse a ser tomada pela Corte durante o julgamento do recurso poderia influir na ponderação e calibração de uma linha histórica de precedentes que tratam sobre sanções políticas, sendo inequívoco que a norma impugnada se aplica especificamente às empresas produtoras de cigarro, cujo mercado parece limitado a poucos produtores. Além disso, as empresas que compõem o sindicato postulante se encontrariam em situação similar à da empresa recorrente. Daí, o interesse da postulante extrapolaria a mera conveniência e o interesse econômico de participação em processo que definirá orientação jurisprudencial aplicável a um número indefinido de jurisdicionados.” RE 550769 QO/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.2.2008. (RE-550769) (FEDERAL, S.T.,2008, p.1)

autor, pelo réu e, se for o caso, pelos terceiros intervenientes [...] e de seu efetivo exercício durante todo o processo[...]”. Alexandre Freitas Câmara, de forma elucidativa explica que:

[...] O poder de ação não é apenas o poder de tomar a iniciativa da instauração do processo. A redução do poder de ação ao poder de provocar a instauração do processo, registre-se, retiraria dela quase toda sua importância. Em verdade, o poder de ação é o poder de exigir do Estado que exerça a função jurisdicional, ocupando seu titular posições jurídicas ativas ao longo de todo o processo. Assim sendo, toda vez que, ao longo do processo, alguém ocupa uma posição jurídica ativa (como se dá, por exemplo, quando alguém produz prova, ou quando se interpõe um recurso) estará exercendo o poder de ação (CÂMARA, 2002, p.2).

O recurso é instrumento que torna efetivo o direito de ação, viabilizando a impugnação de decisões judiciais que se afastam daquilo que estabelecido pela ordem jurídica interna, pelo menos na concepção do que dele se utiliza.

Quando se pensa na atividade de interpor recurso, há que se ter em perspectiva que esta consiste num ônus, isto significa que ao ser “[...] desempenhada, quem, de regra, com isso se beneficia é a própria parte que a desempenha (e se desincumbe do ônus, portanto) [ e, ao se omitir,] as conseqüências negativas decorrentes dessa omissão voltar-se-ão exatamente contra aquele que se omitiu [...]”WAMBIER;TALAMINI, 2010, p.20). O direito de recorrer pode ser encarado ainda como direito potestativo processual, visto que “[...] objetiva alterar situações jurídicas, invalidando, revisando ou integrando uma decisão judicial [...]” (DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.20).

Tendo em conta a noção classicamente construída e de adesão majoritária da doutrina, é possível ainda perceber-se que a existência dos recursos funda-se na falibilidade do juiz e na irresignação das partes quanto a decisões judiciais contrárias a seus interesses, prevendo os sistemas processuais formas de impugnação de tais decisões através da revisão dos atos judiciais, tudo isso dentro da mesma relação processual (MARINONI; ARENHART, 2008, p.507).

Levando-se em consideração o que dito a respeito do conceito e da função dos recursos, incumbe analisar no que consistiria o juízo de admissibilidade.

Didier e Cunha (2011, p.41-42) identificam o juízo de admissibilidade como sendo um juízo sobre a validade do procedimento, operando-se no plano da validade dos atos jurídicos complexos. Esclarece que todo procedimento judicial inicia-se por meio de um ato

postulatório geralmente de iniciativa das partes e que o exame da validade do ato postulatório, é, por consequência, o exame da validade do próprio procedimento o qual o compõe. Por fim, localiza o juízo de admissibilidade como instituto pertencente à teoria geral do processo e que se aplica ao procedimento.

Desta forma, como acontece com qualquer procedimento, os recursos estão submetidos a pressupostos, os quais são necessários para o exame de mérito do meio de impugnação(MARINONI; ARENHART, 2008, p.515) . Tais pressupostos guardam íntima correlação com os requisitos de admissibilidade do processo14.

O Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, inclusive da Corte Especial15, aplicou a classificação de Barbosa Moreira que divide os requisitos de admissibilidade dos recursos em intrínsecos, relacionados ao poder de recorrer, e extrínsecos, relacionados ao exercício de tal poder.

Os requisitos intrínsecos compreendem o cabimento, a legitimação, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer; já os extrínsecos envolvem o preparo, a tempestividade e a regularidade formal.

Por óbvio que classificações são maneiras distintas de apreciar o mesmo objeto. Não há, portanto, obrigatoriedade em aderir-se a uma ou outra, nem equívoco na escolha que

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14 Alexandre Freitas Câmara (2002, p.4): se o recurso é uma manifestação do poder de ação; e se através do

recurso provoca-se uma renovação do processo, o exame do mérito do recurso deve estar sujeito aos mesmos requisitos exigidos para que, tendo sido proposta uma ação, e instaurado um processo, possa ser examinado o mérito da causa. E tais requisitos, como sabido, são as “condições da ação” e os pressupostos processuais. Assim, pode-se dizer que as “condições da ação” e os pressupostos processuais se manifestam, também, em sede de recurso. E a tais manifestações específicas é que se deve dar os nomes de “condições do recurso” e pressupostos recursais.

15 Processual Civil. Embargos de Divergência (art. 496, VIII, e 546, I, CPC; art. 266, RISTJ). Recurso Especial

(art. 105, III, "a", "c", C.F). Prequestionamento. A Divergência Pressupõe Semelhança entre as Questões Jurídicas Versadas nos Arestos Confrontados. 1. Verificada preliminarmente a presença dos requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido. Convincentemente fundado e admitido, dá-se provimento. Apesar de admissível, infundado, nega-se provimento.2. Inadmitido pela falta de requisitos (intrínsecos e extrínsecos), o recurso simplesmente não é conhecido, obviando-se que não se examina o mérito da pretensão recursal.3. O cotejo entre arestos diferentes, um admitindo e conhecendo do mérito recursal e outros inadmitindo, não espelham dissídio pretoriano apropriado à apreciação nos embargos de divergência.4. Embargos não conhecidos.(EREsp 96.705/ES, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/1998, DJ 08/02/1999) (BRASIL, S. T. J., 1998, p.2)

se faz. A doutrina, portanto, traz diversas outras classificações, como a que divide em requisitos objetivos e subjetivos, a que se baseia em elementos da teoria geral do processo, dentre outras (CÂMARA, 2002, p.5).

No que se refere à metodologia de apreciação do juízo de admissibilidade e do mérito recursais, é importante destacar que o artigo 560 do CPC e as cortes brasileiras prescrevem que cabe aos magistrados, antes de realizar o juízo de mérito, examinar as questões preliminares. Durante o juízo de admissibilidade, analisam-se os requisitos extrínsecos e intrínsecos supramencionados, não havendo uma norma que imponha precedência de um sobre outro, tampouco imperativo lógico neste mesmo sentido. Reconhecida a inexistência de um desses requisitos, a corte está dispensada de analisar outros requisitos e até mesmo o mérito da irresignação. Nada impõe, portanto, que todas as questões sejam resolvidas16.

Destaque-se, ademais, a regra geral de que o juízo de admissibilidade seja exercido pelos juízos a quo e ad quem, sendo que este juízo, além dele, realiza o juízo de mérito. Ressalte-se, todavia, que há “[...] uma tendência no sentido de que o juízo de mérito seja exercido pelo juízo a quo: isso ocorre tradicionalmente com o agravo, o juízo de retratação, e também pode ocorrer com a apelação, na hipótese do art.296 [...]”(WAMBIER;TALAMINI, 2010, p.616), sendo uma prova de tal constatação a previsão do art.518, §1º do CPC, em que há hipótese de rejeição liminar do recurso de apelação contra sentença que esteja em conformidade com súmula do STJ ou do STF (WAMBIER;TALAMINI, 2010, p.616).

Outro aspecto digno de nota a respeito do juízo de admissibilidade são os efeitos da decisão que o reconhece ou não. Sendo o juízo positivo, isto é, admitido o recurso, verifica-se a natureza declaratória com efeitos ex tunc.

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16 PROCESSO CIVIL. RECURSOS. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE. EXAME.1. Comporta-se no

juízo preliminar de admissibilidade do recurso o exame dos seus requisitos intrínsecos (dentre os quais o interesse de recorrer) e os extrínsecos (dentro os quais a existência de preparo). A ausência de qualquer deles autoriza o Tribunal a não conhecer do recurso, com o que fica dispensado o exame dos demais requisitos bem como do mérito da irresignação. 2. Recurso especial improvido.(REsp 665412/RJ, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/09/2006, DJ 05/10/2006, p. 241) (BRASIL, S.T.J, 2006, p.2)

Entretanto, quando se fala em juízo negativo de admissibilidade, três correntes principais se delineiam: a) declaratório, com efeitos retroativos; b) constitutiva negativa, sem efeitos retroativos; c) mista (eclética): declaratória e sem eficácia retroativa17.

A posição da primeira corrente encontra como fundamento as premissas de que somente os recursos admissíveis são hábeis a produzir efeitos e de que o juízo de admissibilidade simplesmente declara a existência ou inexistência dos requisitos necessários para proceder-se à análise do mérito dos recursos (DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.70). Diante desta posição, verifica-se importante consequência prática consistente no impedimento de formação da eficácia de coisa julgada em relação ao recorrente, porquanto sem efeitos o ato de recorrer, salvo a hipótese de tal efeito ser causado pela interposição de recurso por outro interessado, sendo certo que o trânsito em julgado acabará por ocorrer na data em que as causas de inadmissibilidade se perfectibilizarem (ASSIS, 2011, p.219).

Portanto, para esta primeira corrente, sendo inadmissível o recurso, o trânsito em julgado e, por conseguinte, o prazo para ajuizamento de ação rescisória, terá como termo inicial a publicação da decisão que se buscou impugnar.

Para a segunda corrente, a inadmissibilidade constituiria espécie de sanção de invalidade ao ato-complexo viciado, configurando verdadeiro juízo constitutivo negativo. Tal corrente entende que a regra seria a eficácia ex nunc do provimento, visto que os atos processuais produziriam efeitos até que decretada a invalidade, entretanto, nada impediria que fossem previstas hipóteses de retroatividade dos efeitos de eventual decisão no sentido da inadmissibilidade (DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.79). Para esta corrente, o trânsito em julgado só começaria a correr a partir da análise da admissibilidade pelo órgão ad quem.

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17 “O juízo de admissibilidade proferido pelo órgão de interposição, se positivo, tem como efeito precípuo o de

abrir ao recorrente a via de acesso ao órgão ad quem; se negativo, o de trancar-lhe essa via. Ressalve-se a possibilidade, que se enseja ao recorrente, de interpor, para o órgão a que competiria o julgamento do recurso denegado, outro recurso, ou remédio análogo, contra a decisão que , no grau inferior, lhe barra a via recursal. Passado em julgado essa decisão, a situação da outra, contra a qual se interpusera recurso inadmissível, se este já o era ab initio, equipara-se à situação que ela teria caso não houvesse ocorrido a interposição, que não impediu a formação da res iudicata; se o recurso era admissível, e só deixou de o ser por fato superveniente, a interposição obstou à produção de coisa julgada, mas o obstáculo desapareceu no momento em que se configurou a inadmissibilidade posterior. (...) Recurso inadmissível, ou tornado tal, não tem a virtude de empecer ao trânsito em julgado: nunca a teve, ali, ou cessou de tê-la, aqui. Destarte, se inexiste outro óbice (isto é, outro recurso ainda admissível, ou sujeição da matéria, ex vi legis, ao duplo grau de jurisdição), a coisa julgada exsurge a partir da configuração da inadmissibilidade. Note-se bem: não a partir da decisão que a pronuncia, pois esta, como já se assinalou, é declaratória; limita-se a proclamar, a manifestar, a certificar algo que lhe preexiste.” (MOREIRA, 2005 apud DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.71)

A terceira corrente prestigia as duas outras. Entende que o juízo de admissibilidade é declaratório, mas opta por conferir efeitos ex nunc, ressalvadas as hipóteses de manifesta intempestividade ou não-cabimento18.

O fato é que a aplicação dos três entendimentos ainda não está cristalizada no âmbito da jurisprudência do STJ, havendo diversas decisões casuísticas, principalmente em razão do fato de que com o reconhecimento de que seria declaratório o juízo de admissibilidade cria-se a bizarra situação em que o recorrente não pode ajuizar a ação rescisória porque há recurso pendente e, a despeito disso, ainda é punido com o reconhecimento da decadência do direito, apesar de tal direito nunca poder ter sido exercitado (DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.72).

Considerando que o escopo do presente trabalho monográfico centra-se na figura do instituto do interesse recursal, não se tecerão maiores considerações a respeitos dos outros requisitos que compõem o juízo de admissibilidade.

No que se refere ao interesse recursal, impede destacar que o exame deste segue a metodologia do exame do interesse de agir, é dizer, assim como neste, a provocação do Estado para expedir um provimento jurisdicional que vise a reformar, anular ou integrar uma decisão judicial dependerá fundamentalmente da necessidade e utilidade da tutela requerida, porquanto “[...] o Estado não se dispõe a exercer função jurisdicional em casos em que o demandante esteja em juízo postulando algo que não seja capaz de, objetivamente, oferecer- lhe alguma vantagem[...]”(CÂMARA, 2002, p.9).

Quanto à análise dessa vantagem a ser alcançada pelo recorrente, a doutrina e a jurisprudência parecem haver chegado a um raro consenso no sentido de que esta se liga à melhora da posição jurídica do legitimado à prática do ato. Portanto, não é suficiente que seja “parte”, impõe-se que “[...] haja prejuízo ocasionado pela decisão e que o recurso tenha aptidão para removê-lo[...]”(BUENO, 2010, p.70), sendo certo que “[...]a depender da situação concreta, há uma inegável sobreposição entre legitimidade e interesse recursal[...]”(BUENO, 2010, p.70).

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18 TST Enunciado nº 100 -RA 63/1980, DJ 11.06.1980 -Nova Redação -Res. 109/2001, DJ 18.04.2001 -

Incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 13, 16, 79, 102, 104, 122 e 145 da SBDI-2) -Res. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005 Prazo de Decadência -Ação Rescisória Trabalhista [...]III -Salvo se houver dúvida

razoável, a interposição de recurso intempestivo ou a interposição de recurso incabível não protrai o termo inicial do prazo decadencial. (ex-Súmula nº 100 -alterada pela Res. 109/2001, DJ 20.04.01)

Ao se falar em “parte”, utilizam-se as aspas porque, na dicção do próprio artigo 499 do Código de Processo Civil, há possibilidade de interposição de recurso pela parte vencida19, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público. Destaque-se, ainda, a questão relativa à sucumbência, equivocadamente considerada essencial à aferição de interesse recursal quando esta não pertence à categoria do juízo de admissibilidade dos recursos.

Não há como relacionar de forma automática a sucumbência ao interesse recursal, principalmente porque terceiro, por ser terceiro, não sucumbe e o autor de pedido subsidiário, muito embora haja saído vitorioso, possui interesse recursal para postular o pedido principal (DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.51). O abandono da análise da utilidade do interesse recursal com base na existência ou não de sucumbência e a adoção da noção de proveito do recurso, aferível através da comparação entre o que impugnado e as postulações do recorrente, “[...] uniformiza, vantajosamente, o tratamento da parte, do Ministério Público e do terceiro prejudicado [...]”(ASSIS, 2011, p.163).

Desta forma, recai a análise do interesse recursal muito mais no futuro do que no passado. É o que se poderia considerar como uma ênfase prospectiva na análise do interesse recursal, visto que incide naquilo que o recorrente busca obter com a nova decisão ( MOREIRA, 2005 apud DIDIER JR.; CUNHA, 2011, p.51).

Bastante relevante, ainda, é a discussão a respeito do reconhecimento de interesse recursal na busca de provimento definitivo de mérito. O debate gira em torno de hipóteses em que a coisa julgada é secundum eventum probationis, como ações populares, ações coletivas que envolvam discussão sobre direitos difusos e coletivos, mandados de segurança, ou nas quais as sentenças são terminativas.

Há duas correntes principais: uma que reputa não existir interesse recursal na persecução da coisa julgada material e outra que o admite.

Uma corrente entende que “[...] o réu não tem direito ao julgamento de mérito, _______________

19 Araken de Assis(2011, p.163) critica a utilização do termo parte vencida, pois, conquanto “o interesse em

recorrer se origine, de fato, relativamente aos pronunciamentos desfavoráveis emitidos em resposta à iniciativa das partes, revela-se manifesta a insuficiência da diretriz presa unicamente a este lado da questão. Ficariam a descoberto todos os atos decisórios em que o órgão judiciário, independentemente de manifestação das partes, se pronuncia ex officio, mostrando-se expressivos os casos de pedido implícito (art.293). E a fórmula “parte vencida”, em si, soa antiquada, relembrando uma concepção já superada de processo, qual duelo ou jogo entre as partes, quando hoje se busca a colaboração das partes com o órgão judiciário para obter o provimento justo”.

mas a uma resposta jurisdicional que considere sua defesa[...]”(MARINONI; ARENHART, 2008, p.516), mormente porque, “[...] entender de forma contrário é o mesmo que concluir que o processo que termina em sentença de extinção do processo não atende ao direito do réu, ou ainda que o processo sempre deve culminar em sentença que aprecie o mérito[...]”(MARINONI; ARENHART, 2008, p.516).

A outra corrente, muito bem respaldada pelos argumentos de Araken de Assis (2011, p.165), e que reverberou até mesmo no Superior Tribunal de Justiça20, entende que o princípio da eventualidade exigiria ao réu que alegue todas as matérias de defesa, sendo inadmissível que possa ter suas faculdades restringidas por atender a preceitos legais, principalmente porque, se não o fizer, sujeita-se às sanções do artigo 267, §3º. Destaque-se que o juízo de improcedência obsta a renovação do processo (art.268), o que protegeria o réu de constantes investidas do adversário e justificaria a existência de interesse recursal no julgamento de mérito21.

Portanto, de acordo com a segunda corrente, verifica-se o interesse recursal nos benefícios jurídicos que decorreriam da indiscutibilidade provida pela coisa julgada material. A resolução do mérito da lide com uma resposta definitiva, por conseguinte, mostrar-se-ia útil para o réu.

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20 PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI VIOLADO.

INADMISSIBILIDADE DA APELAÇÃO. INTERESSE DE RECORRER. EXISTÊNCIA.As partes - tanto o autor quanto o réu - têm interesse em obter a solução da lide. Por isso, o réu também está legitimado para recorrer contra a extinção do processo, sem julgamento do mérito.

(REsp 710287/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em

06/10/2005, DJ 07/11/2005, p. 279)

http://www.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp?newsession=yes&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&livre=%2 0710287#

21 Basta ver que também o Ministério Público que atua como custos legis, assim como o terceiro prejudicado,

que não podem ser considerados sucumbentes, poderão ter interesse em recorrer. Ademais, o vencedor também pode ter interesse em recorrer, em busca de situação jurídica que lhe seja ainda mais vantajosa. Pense-se, e.g., no caso de em uma “ação civil pública” o pedido do autor ser julgado improcedente por insuficiência de provas. O demandado, ainda que tecnicamente possa ser tido como vencedor, terá interesse em recorrer se, em sua impugnação à sentença, postular a reforma da decisão para que se declare que o pedido é improcedente por não ter havido qualquer ato lesivo ao interesse metaindividual que se queria proteger. A utilidade do recurso, in casu, é evidente, já que a sentença de improcedência por insuficiência de provas, em sede de “ação civil pública”, não é capaz de alcançar a autoridade de coisa julgada material. A sentença que julgue o pedido improcedente por fundamento diverso desse, porém, é perfeitamente capaz de alcançar a auctoritas rei iudicatæ. Há, pois, interesse em recorrer. (CÂMARA, 2002, p.10)

Essa lógica de reconhecer-se interesse na busca pela coisa julgada material decorre da evidência de que há um liame entre a utilidade, que é um elemento do interesse recursal, e o modo como regulado os limites objetivos da coisa julgada, isto é, aquilo que na sentença se recobre de imutabilidade.

O Código de Processo Civil denomina como coisa julgada a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário (Art.467), restringindo sua incidência ao comando fixado no dispositivo da decisão judicial (acórdão ou sentença), não se estendendo, portanto, aos motivos, à verdade dos fatos e às