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Concepção de oficina de escrita

CAPÍTULO 3 – Apresentação e Discussão dos Resultados

3.1 Perfil do animador

3.1.4 Concepção de oficina de escrita

As concepções que cada animador possuem, no fundo, uma linha orientadora das próprias oficinas e revelam algumas competências nomeadamente as humanas e técnicas que são fundamentais para a animação das oficinas. Demonstram, ainda, as convicções ou propósitos das suas oficinas bem como os seus conhecimentos literários e práticas de leitura.

A1 A2 A3 A4 Concepção de oficina Faz propostas flexíveis. A oficina é um trabalho de reparação da escrita Concebe outras formas de escrever – desenhando – e dramatizar. Divulgar a arte e usar a sua própria linguagem Dá mais importância ao processo do que ao produto final

Dar mais prazer às pessoas. Um espaço de escrita, de prazer e de fazer amizade (partilha) Fontes utilizadas Livros de autores que são animadores de oficinas Experiência de outras pessoas e a vida quotidiana Livros e a sua experiência e a experiência dos outros Livros; a sua experiência e o teatro Sequência da 1 – quebra-gelo: partilha de opiniões; 2 – exercício de escrita e explicação das 1 – quebra-gelo: aquecimento não físico; 2 – actividade principal; 3 – leitura dos 1 – contar uma história olhos nos olhos; 2 – sequência de exercícios encadeados uns 1 – introdução teórica sobre a escrita e teatro; 2 – sequência de exercícios encadeados uns

75 oficina regras; 3 – leitura dos textos; 4 – reescrita. texto; 4 – actividade final.

nos outros. nos outros;

3 – leitura dos textos; 4 – reescrita. Pontos de partida --- Um concerto, uma imagem, uma frase de uma criança, palavras soltas, uma história inacabada Uma música, jogos com cartas, exercícios com textos de autores

As ideias podem ser trabalhadas de muitas formas

Tabela 5 – Concepções dos animadores entrevistados relativamente a oficinas de escrita

Os animadores definem diferentes concepções do que é uma oficina, sendo certo que se pautam pelos diferentes objectivos que cada animador se propõe atingir.

Quando concebe uma oficina a animadora A1 tem tendência para se debruçar

sobre o texto poético pois, como já foi dito, ela associa a escrita em geral às características do texto poético. Considera, no entanto, que as suas propostas são flexíveis o suficiente para o participante enveredar por outros caminhos. Os exercícios que leva para as oficinas podem ser feitos tanto em prosa como em poesia, não sendo de maneira nenhuma estanques. A prova disso mesmo é que fez os mesmos exercícios em duas oficinas distintas, sendo que da mesma proposta, alguns participantes construíram textos poéticos, outros narrativos e outros dramáticos.

O tipo de trabalho que realiza é sobretudo um trabalho oficinal, de reparações da escrita. Como dá muita importância à palavra desce a um rigor de linguagem muito grande, debruça-se sobre os pormenores do mecanismo da escrita na tentativa de «remendar» e «polir» o texto até haver «um brilho».

Pelo contrário, para a animadora A3, o mais importante nas oficinas que realiza não é o texto final mas o processo que leva à sua construção, afirmando que o facto dos participantes se aperceberem disso, os liberta de serem “perfeitos”, de

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terem que fazer tudo bem e isso desbloqueia-os. O objectivo é mesmo esse, pôr as pessoas a escrever.

Já a animadora A2 explicita que os objectivos da oficina observada por nós era, através da exposição de ilustração de livros, levar o público a ler e a escrever de uma forma diferente:

(51) «ligada também ao livro uma outra forma de ler» (53) «outras formas

de escrever (…) desenhando» (55) «como é que nós poderíamos retirar daí (…) pequenas histórias, pequenos enredos (…) para poder depois dramatizar»

Este, no fundo, era o objectivo da instituição onde trabalhava, o CCB: colocar a população mais perto da arte; divulgar o gosto pela leitura e pôr as pessoas a contar as suas próprias histórias.

Ainda nesta sequência, e de uma forma geral, a animadora A2 concebe as

oficinas como uma oportunidade de cada pessoa, segundo a sua maneira de pensar e escrever, contar as suas histórias. Para ela é determinante o respeito pela forma como cada um escreve. Mais do que o processo de escrita ou o produto, esta animadora centra a sua atenção no sujeito escrevente, na sua forma de ser, de escrever, e de estar.

Também o animador A4 concebe uma oficina como um espaço em que não só se

escreve mas se criam laços de amizade e de prazer:

(94) «nos ateliers (…) nós consigamos ter esse espaço para estarmos uns

com os outros, para falarmos, para mostrar das nossas coisas e ao mesmo tempo ter a escrita envolvida» (360) «e tem tudo a ver com isso (…) com criar mais prazer, o que dá mais prazer às pessoas»

Neste ponto, as animadoras A1 e A3 dão mais relevância ao trabalho que se faz numa oficina, mas focam aspectos diferentes: a primeira centra-se mais no produto final resultante do trabalho oficinal, enquanto que a segunda no processo que leva o participante a escrever. Os outros dois animadores aproximam-se mais

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um do outro, e afastam-se destas duas, pois dão mais importância à pessoa e ao seu bem-estar da oficina como ponto de partida para a restauração de uma imagem positiva da escrita.

Para a preparação da oficina, os livros são, sem dúvida, a fonte mais utilizada. Tal revela a vontade que os animadores entrevistados têm de cultivarem os conhecimentos literários e a procura de novos exercícios de escrita. A outra fonte mais utilizada é a experiência que pode advir tanto de cada um, como da experiência de outros animadores. Esta experiência de que se fala é devida sobretudo à participação destes animadores em outras oficinas e da partilha de

experiências com outros animadores. A animadora A2 também referiu a vida

quotidiana e o animador A4 o teatro como importantes para estruturar o plano geral das oficinas.

Quanto à sequência da oficina, as animadoras A1, A2 e A3 admitem que,

mesmo tendo em conta o tipo de participantes e as suas idades, existe uma estrutura já predefinida para as suas oficinas. Qualquer uma das sequências apresentadas toca nas etapas propostas por BONIFACE (1992) mas nenhum animador as verbaliza. No entanto, baseando-nos nas entrevistas e nas observações, para poder dizer que todos têm uma primeira parte de motivação (que pode ser em forma de conversa ou de história), de seguida propõem a

produção de textos escritos e todos dão a oportunidade de comunicarem o que

escreveram. Somente a animadora A1 e o animador A4 dão espaço para a

reacção, isto é, para os participantes reescreverem os seus textos. No entanto

fazem-no com objectivos diferentes. Enquanto que a animadora A1 sugere

mudanças com o intuito de aperfeiçoar o texto, o animador A4 emite novas

instruções com vista a trabalhar as etapas do texto dramático e a criação teatral. A animadora A1 planifica as suas oficinas de acordo com o público-alvo. Quando a convidam para uma oficina, a primeira informação que pretende ter é sobre o seu público e a partir desta planifica a oficina. Embora haja esta preocupação, a animadora A1 tem uma estrutura já pensada para todas as oficinas que incluem um primeiro momento a que a animadora dá o nome de «quebra-gelo». Para este

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momento realça a partilha de ideias e opiniões sobre a escrita, a troca de experiências relativamente à escrita e a relação com a escrita. Só depois desta primeira parte é que a animadora A1 faz a proposta de trabalho. Ela insiste muito na importância de definir bem as regras e de os participantes as perceberem e as aceitarem, principalmente se forem crianças ou adolescentes.

A animadora A2 explica que, tal como a animadora A1, também tem uma

estrutura predefinida, o que não quer dizer que por vezes se afaste dela ou por adaptação às diversas situações ou por improviso do momento. No entanto, esta sequência já pensada dá-lhe uma certa segurança. A sequência consiste num primeiro momento, o qual também chama de «quebra-gelo» e que é uma espécie de aquecimento não físico. É mais uma ambientação que em princípio já dará algumas pistas para a actividade seguinte. É o equivalente àquilo que BONIFACE (1992) apelida de motivação, isto é, a primeira parte da oficina e é o ponto de partida para a escrita. Depois passa para a actividade que quer realmente fazer e por fim uma actividade final e uma reflexão sobre o que se passou na oficina, que não passa pela reescrita dos textos

A animadora A3 começa sempre as suas oficinas por contar uma história, olhos nos olhos, sempre adaptada à faixa etária dos participantes. O momento seguinte é uma sequência de pequenos jogos de escrita encadeados uns nos outros.

Sequência semelhante tem o animador A4 que, segundo as observações

efectuadas, começa por uma parte mais teórica, em que conversa sobre teatro e escrita teatral e há partilha de ideias. Depois lança os participantes na escrita através da sucessiva instrução de actividades de escrita e de actividades teatrais. Neste aspecto, os animadores A3 e A4 assemelham-se, pois ambos recorrem a um encadeamento sucessivo de jogos de escrita. Tal não é de espantar se pensarmos que os dois fizeram oficinas no Teatro da Trindade, o que significa que tiveram a mesma “escola” de formação em escrita oficinal.

A animadora A1 foca a necessidade de explicar as regras e os restantes

animadores focam os pontos de partida. Estes podem ser feitos com materiais e

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diversificada de pontos de partida que utiliza nas suas oficinas que podem ir desde um concerto de música a uma notícia de jornal:

(159) «podemos começar numa imagem, podemos partir de um concerto

(…) de uma música (…) de uma frase de uma criança, dum início de uma história inacabada, de palavras soltas, de uma história do jornal mas para mim [são] importante[s] (…) essas ligações»

No entanto, e tal como refere o animador A4, o importante nas oficinas de escrita é que se tenha a noção de que a mesma ideia pode ser trabalhada de formas variadas:

(356) «existe muito o dar às pessoas mais pontos de partida» (358) «e

perceber que se podem encontrar as ideias ao contrário e essas ideias podem ser trabalhadas das formas mais variadas»

Através do que foi escrito, percebemos que os animadores possuem algumas competências específicas, segundo os estudos de PIMET & BONIFACE (1999). Podemos afirmar que estes animadores entrevistados possuem experiências humanas e profissionais, ao nível da leitura e da escrita, da animação e participação em oficinas de escrita. De seguida iremos debruçar-nos nas competências técnicas, incidindo o nosso olhar sobre a acção de cada animador para tentar perceber como faz a gestão da oficina em vários aspectos: temporal, espacial, recursos humanos e didácticos.