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3 INDÚSTRIA CULTURAL: ESCLARECIMENTO OU ALIENAÇÃO?

2.2 A avaliação escolar e suas múltiplas relações

2.2.1 Concepções de aprendizagem e avaliação

Será iniciada essa análise a partir da compreensão dos vínculos entre as teorias da aprendizagem e a avaliação, destacando algumas possibilidades.

O processo de ensino-aprendizagem, em tese, é o que move o educador, a escola e os sistemas educacionais. Ensinar objetivando que os alunos aprendam é a razão de ser da escola. Para compreender como esse processo ocorre várias teorias da Psicologia da aprendi- zagem foram elaboradas ao longo do tempo, permitindo que se teorizasse e explicasse como as pessoas, em especial aqueles submetidos a um processo de educação formal, aprendem.

Em linhas gerais, apesar das diferenças, será possível dizer que existem três gran- des grupos de teorias psicológicas que se debruçam sobre esse tema. As perspectivas empiris- ta, racionalista e relativista ou interacionista. No primeiro grupo encontramos teorias positi- vistas, como o Behaviorismo. No segundo, enquadra-se a Gestalt, enquanto no terceiro grupo encontram-se as teorias de Piaget, Vygotsky e Ausubel, por exemplo (RABELO, 2009). Cumpre observar que, serão tecidas alguns comentários sobre as duas primeiras correntes.

A perspectiva empirista, por exemplo, defende que conhecimento é um produto da relação entre o sujeito e o meio externo, sendo este último mais importante na produção do conhecimento. O sujeito não age, pois ele é concebido, em geral, como uma tábula rasa, uma folha em branco. A defesa da passividade com que o sujeito recebe as informações transmit i- das pelo meio é a grande característica dessa corrente, que acredita que o conhecimento é da- do objetivamente ao sujeito. No campo educacional, por exemplo, o conceito de educação bancária, desenvolvido por Paulo Freire (1987), é um exemplo dessa concepção de aprendi- zagem.

Para o Behaviorismo a aprendizagem é concebida como “mudança de comporta- mento, como resultado de treino e da experiência, sendo, portanto, identificável com o condi- cionamento” (RABELO, 2009, p. 40). Aprender é, assim, mudar o comportamento por meio de um condicionamento. É por isso que, para essa corrente, o treino constante na resolução de exercícios de matemática ou a memorização de verbos ou mesmo a repetição de textos por meio de cópia, por exemplo, permite a mudança de comportamento, permitindo a aprendiza- gem.

Com base nisso, se aprender é mudar o comportamento, avaliar é, consequente- mente, “[...] medir a quantidade da mudança do comportamento e isso na chamada avaliação por objetivos”. Definimos previamente os objetivos, que são elaborados em função da mu- dança de comportamento desejada, e, de forma pontual, após a realização do ensi- no/aprendizagem, “[...] medem-se os resultados alcançados pelo aluno e comparam-se os re- sultados obtidos com os objetivos pré-estabelecidos, sempre segundo a conduta observável” (RABELO, 2009, 41).

Assim, avaliar, nessa perspectiva, é medir quantitativamente se os objetivos pré- determinados formam alcançados pelos alunos, se houve mudança de comportamento. Dessa forma, a utilização de testes, exames e provas, em especial as objetivas de múltipla escolha, realizadas de maneira pontual, são instrumentos que servem imensamente para a realização desse fim.

Por outro lado, a concepção racionalista afirma que o sujeito não é passivo no processo de ensino/aprendizagem, pois a razão, e não somente os sentidos, é a fonte do co- nhecimento. Desde a teoria platônica na Grécia antiga, passando por Descartes, que há uma desconfiança na confiabilidade dos sentidos na construção e validação do conhecimento. Pla- tão (1987), por exemplo, dizia que o homem é dividido em corpo e alma e que é esta última que é a verdadeira fonte do conhecimento. Descartes (1987), por seu turno, afirmava que era preciso duvidar de tudo, sobretudo dos sentidos, pois a verdade estava no cogito, na razão, e não no mundo empírico.

Na perspectiva da Gestalt, vinculada à concepção racionalista, a relação ensi- no/aprendizagem ocorre de forma de distinta. O debate ocorre entre a relação parte todo, pois “o fenômeno não é apenas a soma de suas partes, mas é diferente dela”, uma vez que “não são as partes que determinam a natureza do todo, mas sim, a natureza das partes é determinada pelo todo”, observa Isabel Freire (1997).

Assim, para essa corrente, “a aprendizagem não contribui para a estruturação do conhecimento e se confunde, basicamente, com a solução de problemas, que não decorre de aprendizagem mas de insight” (RABELO, 2009, p. 43-44). Como se percebe, a concepção de aprendizagem é diferente aqui na concepção racionalista pois o sujeito é um elemento ativo nesse processo.

Acrescentemos a isso a ideia de que “o comportamento não é a soma das sensa- ções e percepções, como querem os behavioristas”, porque “os processos psicológicos (apren- der, raciocinar, relacionar-se, agir, motivar-se, etc.) não formam um conglomerado sem senti- do, são organizações de dentro para fora e são significativas” (FREIRE, 1997, p. 116).

Se a Gestalt entende a aprendizagem dessa forma, a avaliação também mudará de perspectiva, diferindo do modelo Behaviorista. Enquanto para a concepção empirista avaliar é medir o quanto o comportamento fora modificado a preocupação da Gestalt, por seu turno, ocupa-se em avaliar também quais habilidades foram adquiridas no processo ensino/ aprendi- zagem, habilidades estas que nem sempre podem ser observadas (RABELO, 2009).

Com efeito, em vez de utilizar os testes quantitativos padronizados (provas, exa- mes, etc.), uma vez que privilegia a individualidade, “busca-se uma maior valorização da au- to-avaliação, do estudo de aspectos afetivos e emocionais que interferem na aprendizagem”, recorrendo a instrumentos avaliativos diferentes da proposta empirista, eis a orientação da Gestalt (RABELO, 2009, p. 44-45).

Pelo exposto, será possível afirmar que uma determinada concepção de conheci- mento, expressa em uma concepção psicológica da aprendizagem específica, produzirá tam- bém uma percepção do que é e qual a função da avaliação. Se o objetivo for medir quantitati- vamente a aprendizagem, estar-se-á, mesmo que seja de forma inconsciente, fundamentado nas concepções empiristas. Por outro lado, se o objetivo for avaliar também elementos subje- tivos, nem sempre presentes nos comportamentos observáveis, serão as concepções raciona- listas que sustentam tal prática pedagógica.