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CONCEPÇÕES DE APRENDIZAGEM

4 TRABALHO EM GRUPO: UMA ESTRATÉGIA DE APRENDIZAGEM

4.1 CONCEPÇÕES DE APRENDIZAGEM

como também o conceito de trabalho em grupo e suas principais características.

4.1 CONCEPÇÕES DE APRENDIZAGEM

Para discutirmos o conceito de trabalho em grupo com a intenção de encontrar caminhos que promovam a aprendizagem, apresentaremos três explicações – que vêm do campo da filosofia – a respeito de como construímos conhecimento, ou seja, como o ser humano aprende determinado conteúdo.

Estudos sobre aprendizagem têm sido amplamente discutidos por educadores, psicólogos, sociólogos, entre outros profissionais e pensadores, cada qual com interesses e objetivos específicos. Essas diversas motivações colocam na pauta da educação variadas maneiras de entender e aplicar teorias da aprendizagem, bem como iniciativas para o desenvolvimento de outras e novas teorias. Algumas delas focalizam o aspecto comportamental, enquanto outras, o aspecto cognitivo da aprendizagem.

De acordo com determinada teoria/proposta ou abordagem do processo ensino-aprendizagem, privilegia-se um ou outro aspecto do fenômeno educacional. Podem-se verificar, dessa forma, vários tipos de reducionismo: numa abordagem humanista, por exemplo, a relação interpessoal é o centro, e a dimensão humana passa a ser o núcleo do processo ensino-aprendizagem; numa abordagem comportamentalista, a dimensão técnica é privilegiada, ou seja, os aspectos objetivos, mensuráveis e controláveis do processo são enfatizados em detrimento dos demais. Apesar, no entanto, de constituírem formas de reducionismo, estas propostas são explicativas de determinados aspectos do processo ensino-aprendizagem, não podendo ser desconsideradas (MIZUKAMI, 1986, p. 1).

Mizukami (1986) diz ainda que as teorias de conhecimento em que se fundamentam as diversas linhas psicológicas e de onde surgem os posicionamentos podem ser consideradas como possíveis combinações e variações, conforme três características: o primado do sujeito, primado do objeto e interação sujeito-objeto. Todo fenômeno essencial, seja ele biológico, sociológico, psicológico, tem necessariamente uma relação do sujeito com o ambiente, ou seja, é resultado de um posicionamento epistemológico que se assume entre o sujeito e o meio.

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Para entender os pontos centrais da natureza da aprendizagem vamos nos reportar a várias correntes de pensamento que se desenvolveram e se definiram para os modelos educacionais que tiveram suas origens na filosofia.

Segundo Mizukami (1986), a corrente empirista, denominada de primado do objeto, parte do princípio de que o indivíduo é uma “tábula rasa”, um ser absolutamente passivo, uma folha em branco. O conhecimento é algo externo ao sujeito: o que se descobre, no caso, o objeto, já se encontra fora do sujeito. Na aprendizagem, o professor representa a transmissão do conhecimento e do saber. O aluno só consegue “adquirir” conhecimento pelas aulas ministradas pelos mestres.

Na corrente inatista ou nativistimo, apriorismo, denominado de primado do sujeito, parte do princípio de que o ser humano já nasce com o saber, ou seja, o saber é inato ao indivíduo. Na aprendizagem, as formas de conhecimento estão predeterminadas no indivíduo. Esse conhecimento, entretanto, está em estado latente, cabendo ao professor, tão somente, retirá-lo dos alunos, e estimulá-los para que para que eles se desenvolvam.

O interacionismo, dado pela interação do sujeito com o objeto, parte do princípio de que a origem do conhecimento está na interação entre o indivíduo e o meio. Não se pode separar o processo de ensino, do processo de aprendizado, ambos se dão em conjunto. Nessa perspectiva, considera-se o ser humano como sendo um sujeito que já traz consigo algum conhecimento. Esse conhecimento prévio deve ser aproveitado no processo de ensino-aprendizagem. A participação ativa do aluno diante do conteúdo é essencial, portanto, não basta somente ter contato com o conhecimento para adquiri-lo: é preciso "agir sobre o objeto e transformá-lo".

As concepções de aprendizagem podem, na prática, ser comparadas entre si sob as perspectivas do professor, do aluno e de suas respectivas propostas pedagógicas, conforme tabela a seguir.

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Tabela 1 – Comparação entre as Concepções de Aprendizagem

Concepção Empirista Inatista Interacionista

Professor

Conhecedor do assunto. Transmite seu conhecimento de forma objetiva e clara para o aluno.

Oferecer condições para que o aluno se desenvolva dentro das possibilidades que possui.

Interagir com o aluno, valorizando o conhecimento prévio que ele traz. Há troca de informações. Aluno Receptor passivo de informações, cumpridor de ordens. O aluno é centro e o professor tem “baixa intervenção”. Depende da predisposição individual para a aprendizagem. O aluno é ativo em seu processo de construção de conhecimento; deve ser respeitado em seu desenvolvimento individual e espontâneo. Proposta Pedagógica Organização de estímulos para a obtenção de respostas a serem premiadas ou reforçadas. Planejamento centrado nos conteúdos e nas condições, bem como ferramentas externas ao aluno para levá-lo a mudanças de comportamento.

O ensino é organizado a partir de uma “pseudo autonomia” do aluno diante de um conhecimento, não enfatizando o papel de um mediador na consecução dos objetivos pedagógicos. Valorização da compreensão do processo de resolução de dado problema ao invés do mero resultado, enfocando os aspectos qualitativos da inteligência e da forma como cada sujeito vai dando significado à realidade circundante. Fonte: autor – extraído e adaptado pelo autor

Das concepções apresentadas, a linha interacionista é a que apresenta maior aderência aos princípios relacionados ao trabalho em grupo e dialogam com a proposta pedagógica de Freinet e as teorias de Vygotsky.

Elias (1997), ao estudar textos de Freinet, observou que a aprendizagem está voltada para o desenvolvimento do conhecimento de forma coletiva. Sua pedagogia tem como eixo de sustentação a prática e a cooperação. As pessoas são naturalmente seres sociáveis e agentes formadores da sua história que buscam dar sentido às suas atividades e à ideia de trabalho em grupos. O ser humano tem uma estrutura complexa e seu desenvolvimento está estabelecido na sua história individual e social (ELIAS, 1997).

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A escola deve colocar à disposição do aluno o meio para, depois, organizar, sistematizar enriquecer ou ampliar suas experiências; deve criar situações desafiadoras que despertando curiosidade, a levem a pensar, mas não sem, antes, procurar resolver. Método natural, qualquer criança pode retirar na natureza seus ensinamentos. (ELIAS, 1997, p. 35). Oliveira (2002), estudiosa da Vygotsky, afirma que, para o autor, a aprendizagem é processo pelo qual a pessoa adquire informações, habilidades, atitudes, valores, etc. a partir do seu contato com a realidade, o meio ambiente e outras pessoas. Menciona também que a relação das pessoas com o mundo não é uma relação direta, mas fundamentalmente mediada. Aprender e ensinar nas relações interpessoais, tais como no trabalho em grupo, faz buscar apoio conceito de mediação de Vygostsky em que Oliveira (2002) cita que a mediação é representada por um processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação, que deixa de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento. A relação da pessoa com o mundo não é uma relação direta, mas, na sua essência, é uma relação mediada. Entre ela e o mundo à sua volta existem elementos mediadores que auxiliam a atividade humana.

O processo de mediação, por meio de instrumentos e signos, é fundamental para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, distinguindo o homem dos outros animais. A mediação é um processo essencial para tornar possível as atividades psicológicas voluntárias, intencionais, controladas pelo próprio indivíduo (OLIVEIRA, 2002, p. 33).

Sob essa perspectiva, Freinet e Vygotsky dialogam com suas práticas e teorias de modo que o conhecimento vai sendo construído com a participação do outro e do meio social. Suas teorias trazem luz para a importância das experiências e interações sociais: o conhecimento é adquirido nas trocas e cooperação mútua.

É interessante notar as conexões entre as teorias de Vygotsky e as técnicas pedagógicas de Freinet, que têm base em princípios fundamentais como a aprendizagem de forma colaborativa, o desejo de expressão e o desenvolvimento como resultado de um processo sócio-histórico e cultural. Os dois autores enfatizam o papel da linguagem e da aprendizagem no desenvolvimento do indivíduo que interage com o meio.

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No trabalho em grupo, os alunos tendem a desenvolver de forma coletiva o conhecimento e aplicá-lo na solução de um problema e, mesmo que inconscientemente, utilizam competências de maneira complementar, adaptando-se aos diferentes estilos comportamentais e psicológicos. Além disso, possuem histórico de vida e formação que podem dar contornos diferentes aos resultados e ao desempenho de um grupo, influenciando direta ou indiretamente a aprendizagem.

Zabala (1998), formado em Filosofia e Ciências da Educação pela Universidade de Barcelona, referindo-se à concepção construtivista, ressalta que aprendizagem é uma construção pessoal e social. Esta construção, por meio da qual o aluno pode atribuir significado a um determinado objeto de ensino implica a sua ação, sua disponibilidade e seus conhecimentos prévios.

O aluno precisa ser orientado a ser protagonista do seu aprendizado, não havendo espaço para sua passividade no sentido de que sua contribuição é relevante e imprescindível para a construção do seu conhecimento. Na perspectiva do professor que utiliza essa forma/metodologia de ensino, é interessante compreender como ele percebe e entende esse contexto e trabalha as relações causais entre a interação social e o desenvolvimento cognitivo do aluno e do grupo.

Nesse sentido, o professor é o referencial em experiência. Ele pode conduzir os alunos a uma reflexão crítica de mundo, imaginar e explorar as possibilidades que os cercam e levar a uma compreensão de como tudo impacta o seu desenvolvimento e aquisição de conhecimento.

A organização tradicional das instituições escolares torna difícil a criação de culturas e estruturas colaborativas abertas na escola. No entanto, cada vez mais, considera-se que essas estruturas devem permear todo o sistema escolar, facilitando a participação e compromisso ativo dos professores em relação às circunstâncias dinâmicas e em constante transformação que enfrenta seu trabalho (PARRILA e DANIELS, p. 17, 2004). Ao professor cabe também o papel de criar situações de aprendizagem para os grupos de trabalho para que sejam auxiliados mutuamente na construção do conhecimento, tanto na troca entre os alunos e entre ele (professor) e os alunos.

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Para tal, a formação de um professor deve ser compreendida como um processo contínuo, permanente e, principalmente, dinâmico, considerando-se a velocidade das mudanças e complexidade do mundo contemporâneo. Nesse contexto, o trabalho de grupo, como estratégia de aprendizagem, pode favorecer o desenvolvimento cognitivo e social do aluno.