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As agências reguladoras independentes brasileiras foram concebidas no intuito de consolidar os ideais da moderna regulação, marcada notadamente pela dispersão dos poderes estatais e intervenção indireta na economia. Para cumprir este desiderato, características que reforçam a autonomia frente ao poder de direção do Chefe do Executivo, como vedação à exoneração ad nutum, ausência de subordinação hierárquica e amplo poder normativo, foram conferidas àquelas.

Esta configuração não está imune a críticas, as quais atacam a constitucionalidade do instituto frente aos princípios da legalidade, separação de poderes e soberania popular. Parte da doutrina rebate, afirmando que a concepção clássica dos dois primeiros princípios citados deve ser relativizada, ademais as agências reguladoras possuem expressa previsão constitucional (artigos 21, XI; 37, XIX e 177, § 2º, III da Constituição Federal) e intensificam o sistema de freios e contrapesos, próprio da separação de poderes, ao se submeterem aos controles judicial e legislativo.

A crítica do déficit democrático imputado a atual configuração das agências é bastante válida, contudo a crise da falta de legitimidade é fenômeno que abrange a totalidade da Administração Pública. O princípio da soberania popular não pressupõe uma Democracia meramente representativa. É essencial o reconhecimento do direito fundamental à participação popular, concretizando-o através da adoção de mecanismos que possibilitem a intervenção cidadã.

Para cumprir esta tarefa, as leis instituidoras, regulamentos e resoluções das agências reguladoras independentes; em consonância com o artigo 37, § 2º da CF/88 e artigos 31 e 32 da Lei nº 9.784/99, já preveem audiências públicas, consultas, ouvidorias, conselhos consultivos e convênios como instrumentos viabilizadores da participação popular.

Todavia, uma Democracia participativa exige mais. Esses mecanismos não podem ser somente previstos de forma facultativa, pois, destarte, não constituem elemento de validade do processo, impedindo o controle, quando desrespeitados.

Nesta senda, salta aos olhos a importância da aprovação do Projeto de Lei nº 3.337/2004. Este prevê que os instrumentos de participação popular sejam inseridos, de forma obrigatória, nos processos administrativos regulatórios das agências. Desta feita, qualquer ato decisório ou normativo que reflita interesse dos regulados, consumidores ou usuários de serviço público será precedido do diálogo entre sociedade e Administração Pública, visando a encontrar a melhor solução regulatória para o setor em questão.

A previsão de obrigatoriedade garante que o processo administrativo perfectibilizado em descumprimento ao direito fundamental de participação popular seja anulável pelo controle do Poder Judiciário ou revogável pelo princípio da autotutela administrativa.

Mesmo que as autoridades reguladoras independentes não acatem o contributo social, deverão motivar sua opção de forma mais intensa do que em outros atos administrativos. Este ônus argumentativo impostos àquelas é necessário para se evitar uma participação popular cosmética, apenas para cumprir os requisitos formais da lei. Deste modo, evita-se que as agências procedam às audiências, consultas, etc. sem a real intenção de permitir o diálogo com a sociedade.

Por fim, exige-se que a publicidade da realização dos procedimentos participativos seja ampla. A internet desponta como importante ferramenta para divulgar a realização e resultados, atingindo um número maior de interessados. O princípio aludido também exige que o caráter técnico, próprio das atividades das agências, não impeça a participação cidadã, devendo a Administração preocupar-se em traduzir os signos científicos, a fim de evitar que a publicidade revele-se ineficaz.

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