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É preciso que quem tenha o que dizer saiba, sem dúvida nenhuma, que, sem escutar o que quem escuta tem igualmente a dizer, termina por esgotar a sua capacidade de dizer por muito ter dito sem nada ou quase nada ter escutado. (FREIRE, 1996, p. 132 e 133)

A abordagem deste estudo esteve orientada a uma concepção mais abrangente do turismo, expondo suas múltiplas relações, que o tornam não uma mera atividade econômica, muito embora esteja nesta dimensão seu viés mais forte, mas sim, um fenômeno.

Enquanto fenômeno, o turismo pode mostrar-se muito vantajoso, porém muito nefasto, a ver como exemplo contextos expostos e argumentados no início deste trabalho. Certamente suas implicações irão depender dos interesses individuais e coletivos dos envolvidos em seu planejamento e organização, assim como, de uma ética e estética coerentes a tais interesses.

Desta forma, buscou-se, nos princípios do turismo sustentável, a construção de um diálogo voltado a um turismo de inclusão social, focalizando as potencialidades não unicamente nos cenários naturais, mas nos seres humanos acima de tudo.

Neste sentido, a água, enquanto recurso natural em maior evidência e, portanto, representante do cenário natural identificado no município, foi reconhecida como tema gerador de toda a pesquisa coletiva, permanecendo como tal neste estudo, porém atuando também como elemento estratégico, considerando, neste caso, a expressão “caminhos das águas”, cujos benefícios foram o diálogo, a reflexão e a transformação na realidade da população local.

Observando-se o interesse deste estudo, é possível destacar que a água, enquanto tema gerador, associada à discussão do turismo sustentável e orientada pelo método da pesquisa, permitiu a compreensão da comunidade para um significado mais profundo do turismo sustentável, considerando sua capacidade de dialogar com outras dimensões, a exemplo das águas, já reconhecidamente um múltiplo-tema.

Esta compreensão, remete ao desenvolvimento de uma reflexão crítica por parte dos indivíduos participantes deste estudo sobre a realidade do município, estabelecendo, assim, uma desejada transformação.

Esta transformação, enquanto tema emergente deste estudo, parte da crença de que não se busca, prioritariamente a produção do conhecimento, pois a mesma é subjacente a um processo criativo, replicável, que visa a ativação de uma mudança. Ativar no sentido de deixar que esta flua naturalmente, do contrário, os envolvidos não se “sentirão parte”, conseqüentemente, não “tomarão parte”, e, logo, não “farão parte” desta transformação. (BORDENAVE, 1986).

Atribui-se esta transformação a inúmeros fatores, dentre eles a composição de uma dinâmica espiral, criativa, construtivista, participante e eticamente solidária. Porém, é preciso redizer alguns destes fatores a partir dos seguintes atributos:

• participação e cooperação (não houve o estabelecimento de uma hierarquia, de modo que os pressupostos estabelecidos, a exemplo dos cuidados éticos, representaram mais do que pedir licença, e, sim, a busca efetiva pela motivação e entusiasmo daqueles que “tomaram parte”, pois não havia o mais forte, o mais sábio e conhecedor, afinal, todos aprendiam ao mesmo tempo);

• criação de mecanismos de cooperação (embora este tenha sido um processo de pesquisa participante construtivista, foram definidas algumas atividades estratégicas, cuja a função além de estabelecer um direcionamento, baseou-se na divisão da responsabilidade, em integrar, com a mesma importância, cada componente da equipe, tornando útil a presença de todos os envolvidos);

• ações construtivistas (não houve um jogo de preencher lacunas, não foi elaborada ou replicada uma receita, mas também não foi desenvolvido um processo solto e deslocado, as ações estratégicas e os pressupostos estabelecidos compuseram a linha dorsal deste estudo, gerando reações flexivelmente orientadas);

• diálogo multidisciplinar (o contexto interdisciplinar a que remete este estudo sem dúvida foi precursor desta transformação, a partir da construção de pequenas, grandes, às vezes isoladas, porém não menos importantes, ações para o processo de construção da autonomia local. Acredita-se que sem autonomia não há transformação);

• saber prático e coletivo (a formação de um núcleo comum de pesquisadores representou mais do que a troca de diálogo e reflexão, pois devido a esta comunicação transformou-se a ação, inicialmente individual e posteriormente coletiva, em ação comunitária e educativa).

Mas claramente, esta transformação, pautada na participação da comunidade, foi gerada por estar sendo interpretado o fenômeno do turismo como uma possibilidade de formação humana, promotor de uma nova auto-estima, renovador das esperanças e desejos mais íntimos e inconscientes, aliado ao fator simbiótico de sua relação com o desenvolvimento, com o progresso, com a afluência, com a busca de ser feliz e mais saudável.

Além disto, em concordância com Morin (2004, p. 73), acredita-se que a transformação freqüentemente acontece no momento em que os compromissos assumidos e estabelecidos são cumpridos, “quando se soluciona o problema”.

Neste estudo, os compromissos não apenas foram cumpridos e devolvidos, mas seus resultados foram inesperados para a comunidade, à medida que, inicialmente, houve a surpresa pelo desconhecido (os cenários locais são alheios aos moradores de seu entorno, isto é, as comunidades são vizinhas, porém, não se comunicam), e, posteriormente, houve a certeza da incerteza (não bastava ouvir sobre a existência dos problemas, era preciso ver, quase como São Tomé, para crer nos problemas, e mais, para finalmente torná-los coletivos. A inexistência da fossa séptica do vizinho agora não é problema exclusivo deste vizinho, pois foi percebido que sem uma boa prática de saneamento, sem uma organização social, sem discutir a proteção do manancial, a conservação do meio natural, não há como levar adiante a prática de um turismo sustentável).

Diante deste contexto, percebe-se a possibilidade concreta de trabalhar a temática de um turismo – socialmente justo, organizado e de “bem com a natureza”, a exemplo do turismo sustentável, como um elemento estratégico em processos de construção da gestão ambiental participativa.

Como recomendações gerais, percebe-se a necessidade de dar continuidade a este processo socialmente construído, tendo em vista que a comunidade já mostra sinais de amadurecimento e percepção de sua autonomia, de modo que ainda falta sensibilizar, com a mesma ética e estética, a vertente executiva e institucional, visando à consolidação de uma verdadeira parceria e responsabilidade compartilhada, anseios de um processo de gestão ambiental participativa.

Mais especificamente, há um amplo espaço a ser trabalhado acerca dos interesses da comunidade, que se abrem para a consolidação de um RTI – Roteiro Turístico Integrado municipal, que, por sua vez, implica formas interligadas de ações educativas, técnicas e estruturais.

As medidas educativas visam à continuidade deste processo de sensibilização, informação e esclarecimento da população, frente à prática de um turismo de inclusão social, ético e ambientalmente sustentável. Esta é uma questão que perpassa pela formação de multiplicadores, tal como o núcleo de pesquisadores locais, que remete a um ponto crucial para a consolidação de um RTI, visto que seu caráter operante depende de uma relação de compromisso e parceria com a população residente e a receptora. Para citar um único exemplo do peso desta questão, vale mencionar a preocupação com o manejo inadequado dos espaços naturais, que já refletem práticas (inclusive culturais) de um turismo interno desvinculadas de qualquer tipo de preocupação com a integridade física e de regulação destes ecossistemas.

As medidas técnicas concentram-se nas atividades de capacitação pessoal, instrumentalizando tanto a população receptora quanto os demais envolvidos, sobre as boas práticas do turismo, do receptivo, da administração, da fiscalização, do planejamento e da organização do Município.

Finalmente, as medidas estruturais refletem as implementações físicas, inclusive a implantação do COMTUR, a fim de que passe de provisório a efetivo, além das necessárias mudanças e transformações na infra-estrutura local, sempre buscando, nas medidas técnicas e educativa, a orientação e o bom senso a favor de uma ética e estética voltada aos princípios da sustentabilidade.