• Nenhum resultado encontrado

O advento da promulgação da Constituição Federal de 1988 delegou aos Estados e municípios tarefas fundamentais no direcionamento das políticas públicas de saúde. A evolução das ações do SUS, com o advento de publicação das NOB´s, em 1993 e 1996, e

da NOAS, em 2001, vieram cada vez mais comprovar a ação prioritária dos entes municipais nos programa de atenção básica à saúde.

Assim, o objetivo deste artigo foi estudar os determinantes desses gastos municipais com saúde no Brasil, tentando constatar relevâncias regionais, institucionais e políticas no direcionamento de gastos das prefeituras. Estabelecemos para isso grupos de variáveis que se mostraram relevantes através de uma análise fatorial para o controle da análise: variáveis de recursos e sócio-econômica, de saúde, espacial e política. Inicialmente, através da decomposição de diferenciais, procuramos constatar diferenças no padrão e na evolução de gastos por duas visões políticas: a dos maiores partidos nacionais – PMDB, PT, PSDB, DEM, PR e PP – e classificando-os por visão ideológica – direita, esquerda e centro.

Foi possível por esse método estabelecer algumas diferenças significativas entre os gastos políticos. Encontramos que no período 2002-2006 o PR foi o partido que mais aumentou seus gastos com saúde, mas não é verdade que isso significa ser o partido mais ativo na rubrica, visto que em 2002 ele era o que menos gastava. No sentido contrário, o PT foi o partido que menos cresceu seus gastos, visto que era o que mais despendia em 2002 e em 2006 foi o que menos gastos realizou. Na verdade, a explicação, a nosso ver, recai sobre a adequação à emenda constitucional 29 (EC-29). Como em 2002 o PT era o único que realizava gastos acima do piso mínimo estabelecido para 2004, foi o que menos precisou se adequar às pressões federais.

Mostra-se, portanto, que em 2002 o PT se diferenciava por uma política mais ativa na área da saúde pública, mas que perdeu destaque pela pressão legislativa federal. Na visão por gestões públicas partidárias, corroboramos esse resultado, mostrando que os que menos aumentaram os gastos no período foram os partidos de esquerda, justamente os únicos que na média aplicavam acima de 15% de recursos próprios na saúde em 2002.

Em uma segunda etapa analisamos os gastos através do método de regressão quantílica. O intuito era o de controlar os municípios quanto à heterogeneidade dos mesmos e analisar diferenças nos determinantes para diferentes quantis de gastos. Analisamos os gastos para os quantis baixo (0.10), mediano (0.50) e alto (0.90) nos anos de 2002 e 2006.

Constata-se relevância das variáveis sócio-econômicas incluídas, mostrando que o PIB municipal, a infra-estrutura sanitária – personificada na variável relativa ao número de fossas sépticas – e o tamanho da participação do governo no município são relevantes para

explicar os gastos com saúde. Ademais, como um dos pontos mais importantes, constatamos um grande crescimento de importância do ano de 2002 para 2006 da porcentagem de recursos próprios aplicados na saúde.

Associamos essa importância à EC-29, de 2000. Por nossos resultados, a pressão surtiu efeito, visto que na média as prefeituras aumentaram nesses quatro anos 106% a influência dos recursos próprios nos gastos com saúde.

Quanto às variáveis de saúde, encontra-se relevância decrescente nos quantis para PSF e crescente para as demais. O resultado encontrado para essas variáveis torna-se intuitivo quando analisamos o valor do coeficiente da dummy para aglomeração urbana. O valor negativo da mesma mostra que existem economias nas cidades localizadas em grandes aglomerados populacionais, em particular os municípios mais pobres desse entorno, que exportam recursos para os mais ricos numa atitude típica de um free rider.

Sendo assim, os municípios mais ricos que recebem atendimento de outros próximos ao seu entorno levam desvantagem, sendo exatamente os que necessariamente são obrigados a realizar maiores gastos per capita com saúde. Para o caso da PSF, onde o valor é decrescente, a lógica é inversa. Por ser um serviço estritamente municipal, não há exportação de serviços, e por isso os municípios mais pobres necessitam de gastos maiores por não possuírem economias de escala.

Para regiões políticas, as mais próximas foram a Sudeste e a Centro-Oeste, com nenhum coeficiente significativo para a segunda na comparação com a primeira. Já as demais mostraram, em alguns momentos, coeficientes negativos na comparação com o Sudeste, o que é intuitivo para o Norte e Nordeste, mas nem tanto para a região Sul. Aliás, foi essa a que mostrou maior significância negativa na comparação.

Quanto às variáveis políticas, a que capta coordenação Estado-município, quando procuramos captar influência de o governador ser do mesmo partido do prefeito, não foi importante em nenhum quantil dos anos. Para o caso dos partidos, constatamos ainda uma certa relevância a favor do PT no ano de 2002, mas ausência da mesma para o ano de 2006, o que corroborou o resultado da decomposição de diferenciais de maiores gastos para o PT no primeiro ano da pesquisa.

Em suma, registramos alguma política mais ativa do PT para 2002, principalmente pelo mesmo já se adequar ao piso da EC-29 proposto para 2004 no ano de 2002. Após isso, os demais partidos precisaram realizar aumento de gastos para também se adequar a esse piso, o que fez com que não houvesse mais diferenças significativa entre tais em 2006. O resultado encontrado parece evidenciar uma situação clara de grande influência de pressões institucionais nos municípios e certa irrelevância dos partidos na gestão pública de saúde. Vale lembrar que, nesse caso, o resultado aqui apresentado assemelha-se em grande monta ao encontrado por Arretche & Marques (2002).

Além disso, devemos lembrar também das necessidades regionais, dando ênfase à localização em grandes aglomerações urbanas detentoras de economias de escala, e de possibilidade de influência de grupos sociais locais, como sindicatos trabalhistas e associações comunitárias. No caso das aglomerações, sabe-se que há uma influência das aglomerações nas definições dos gastos municipais, e essa constatação abre um espaço para um campo de pesquisa no âmbito espacial do orçamento em saúde. No caso das interações sociais, não foram inclusos no modelo por falta de dados para o período considerado, mas podem exercer também pressão fundamental no direcionamento dos gastos com saúde. Fica então a observação e a possibilidade de abertura de nova agenda de pesquisa na área.

Porém, para o que se vale nosso trabalho, achamos relevante constatar a grande importância dada aos fatores institucionais. A existência de gestões ditas diferentes nos tantos partidos analisados parecia importante principalmente na diferença existente entre o PT e os demais em 2002, mas a EC-29 pode ter diluído essa diferenciação, tornando irrelevante, pelo menos no que tange à saúde, qual o partido governante no nível municipal.

Ademais, como possível agenda futura de pesquisa, citamos métodos de econometria espacial. A dependência encontrada nas variáveis regionais pode demonstrar relações importantes que só essa técnica pode ajudar a resolver. Contudo, acreditamos que a contribuição do trabalho dá-se em grande monta nesses resultados. A averiguação de grande influência de pressão federal e de localização regional e a pouca relevância política no orçamento da saúde pode ser um fator primordial para as próximas políticas públicas a serem implantadas na área e em uma maior compreensão do ambiente de saúde municipal.

Documentos relacionados