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higrotérmicas para uma amostra de argamassa

8 CONCLUSÕES GERAIS

A motivação para realizar este trabalho surgiu da necessidade de desenvolver um método capaz de obter simultaneamente a condutividade térmica (λ) e a capacidade térmica volumétrica (ρ·c), a partir de um ensaio não-destrutivo que utilize as informações contidas nas oscilações climáticas, que seja de fácil implementação e necessite apenas um equipamento simplificado.

Estimar estas propriedades termofísicas em campo permite caracterizar componentes construtivos em situações mais próximas à realidade da edificação, isto é, considerando seu desempenho sob condições climáticas específicas, as variações na qualidade dos materiais construtivos, as diferentes técnicas de construção local e o desgaste dos materiais.

Para realizar a estimativa destas propriedades termofísicas, é necessário considerar um pulso de calor como estímulo. A partir da resposta do componente é possível determinar suas propriedades termofísicas. Inicialmente, o componente pode ser considerado como um meio poroso insaturado homogêneo e isotrópico. No entanto, se o pulso de calor for mantido por um tempo prolongado, o componente começará a apresentar uma distribuição não-homogênea no conteúdo de umidade, o que deve ser considerado na identificação de parâmetros térmicos que representem o componente de forma global.

Para contornar esta dificuldade, diferentes trabalhos de pesquisa, que poderiam ser aplicados em campo, apresentam métodos para estimar simultaneamente a condutividade térmica e a capacidade térmica volumétrica usando um pulso de calor breve ou de amplitude moderada para evitar distorções no conteúdo de umidade nas camadas superficiais. Porém, estes métodos encontram-se limitados ao estudo de componentes nas primeiras camadas de superfície (10 – 15 mm) ou precisam de uma bancada experimental maior, o que dificulta a sua aplicação em um ensaio não-destrutivo em campo.

Das experiências anteriores desenvolvidas para estimar diferentes parâmetros térmicos que caracterizem os componentes construtivos através de ensaios não-destrutivos em campo, destaca-se a norma internacional ISO 9869 (1994) para identificar a resistência térmica de componentes construtivos aplicada em diferentes trabalhos de pesquisa. A partir da resistência térmica observada em campo, é possível calcular a condutividade térmica do componente.

Assim, o procedimento entende a envoltória da edificação como um elemento de isolamento térmico, focando a atenção da estimativa na condutividade térmica exclusivamente.

O método desenvolvido neste trabalho de pesquisa considera um modelo de transferência de calor e massa (umidade) integrados, para ser implementado no algoritmo de estimativa de propriedades termofísicas (λ e ρ·c, simultaneamente). O método segue o modelo fenomenológico apresentado por Philip e De Vries (1957). Neste modelo, a equação diferencial para o balanço de energia considera a condutividade térmica e a capacidade térmica volumétrica como funções do conteúdo de umidade. No balanço de massa, o fluxo de umidade é modelado de forma simplificada, a partir dos coeficientes de transporte de massa que podem ser identificados experimentalmente.

Em uma primeira etapa foi desenvolvido um algoritmo para simular o comportamento higroscópico de um componente de argamassa em uma situação simplificada de regime transiente. Para os fenômenos de transferência de umidade, foi definida como condição de contorno uma situação impermeável em ambas as superfícies. Estas simulações permitem observar a distribuição interna de temperatura, fluxo de calor, conteúdo de umidade e fluxo de massa no componente, entre esses dois estados.

Uma dificuldade na utilização do modelo de Philip e De Vries (1957) é a falta de dados sobre as propriedades higroscópicas para diferentes materiais construtivos. Assim, a situação de regime transiente foi simulada para duas características do componente construtivo. Na primeira configuração, consideram-se as propriedades termofísicas, a variação de λ e ρ·c em função do conteúdo de umidade (λm e ρ·cm), os coeficientes de transporte de massa e a isoterma de adsorção identificadas por Perrin (1985) para um componente de argamassa. A segunda configuração mantém as propriedades higroscópicas do material de argamassa, porém, altera as propriedades termofísicas secas (λo e ρ·co) da matriz sólida.

Dos resultados obtidos na simulação dos dois casos, verifica-se na distribuição do conteúdo de umidade que um pulso de calor de 350 W/m2 mantido por mais de uma hora começa a alterar o conteúdo de umidade nas camadas superficiais. As propriedades termofísicas nestas camadas acompanham as variações do conteúdo de umidade. Esta é uma situação de estímulo térmico que pode ser encontrada facilmente em situações que dependem das condições climáticas. Conseqüentemente, é importante considerar os fenômenos de transferência de umidade integrados à transferência de calor para identificar parâmetros térmicos que representem o componente de forma global, a partir de medições superficiais.

Outra consideração importante, observada tanto no caso simulado com as propriedades de argamassa como para o caso com as propriedades termofísicas da matriz sólida alteradas, é a importância do calor por vaporização (calor latente) no fluxo de calor calculado nas superfícies. Na composição do fluxo de calor nas superfícies, observa-se que a maior parte dos 350 W/m2 é transferida por condução; entretanto, uma parcela de calor latente (1 – 2%) também participa das trocas térmicas. Na prática, os sensores de fluxo de calor colocados nas superfícies não conseguem diferenciar o calor que chega por condução ou por vaporização (latente), o que gera diferenças no cálculo da condutividade térmica.

Desta forma, o programa kCúmido para estimativa de propriedades termofísicas baseado no modelo de Philip e De Vries (1957) considera como método para definir as propriedades termofísicas do componente o valor médio de cada um deles (λm e ρ·cm), entre todos os elementos infinitesimais, para todos os intervalos de tempo da simulação. Isto garante que as propriedades termofísicas identificadas pelo programa kCúmido correspondem às propriedades na condição inicial de equilíbrio térmico e distribuição homogênea do conteúdo de umidade, para a situação de superfície impermeável definida como condição de contorno. Ainda, a integração dos fenômenos de transferência de umidade no programa kCúmido permite estimar as propriedades termofísicas em condições secas e úmidas. Isto contribui para a comparação de um mesmo componente submetido a diferentes variações de umidade (por conteúdo de umidade inicial, por orientação geográfica ou por absortividade superficial de radiação) através das propriedades em condição seca como parâmetro comum.

O programa kCúmido foi aplicado de forma experimental em laboratório e em campo, utilizando uma amostra de concreto. Nos ensaios de laboratório realizados para definir as propriedades termofísicas, observou-se que a variação da condutividade térmica em função do conteúdo de umidade não acompanha a curva de variação identificada na argamassa estudada por Perrin (1985). Assim, no programa kCúmido foi adotado um comportamento linear para a condutividade térmica em função do conteúdo de umidade, a partir dos valores obtidos no ensaio fluximétrico para a condição seca e com saturação de 42,7%. A reta confeccionada com base nos valores obtidos em laboratório apresenta uma boa correlação (99,93%) com a expressão proposta por Mendes (1997) para uma saturação menor a 50,0%.

De forma geral, nos resultados obtidos da aplicação do programa kCúmido em ensaios periódicos com condições controladas de laboratório e submetidos a variações climáticas em campo, observa-se que a estimativa da condutividade térmica fornece valores mais precisos,

enquanto a estimativa da capacidade térmica volumétrica apresenta uma diferença de 20%, se comparado ao valor identificado pelo ensaio de placa quente protegida.

Deste modo, o programa kCúmido mostrou-se uma ferramenta válida para a estimativa de propriedades termofísicas e as informações contidas no sinal natural permitiram identificar as propriedades termofísicas de um componente de concreto em dias de céu claro. No entanto, os resultados obtidos mostram que esta ferramenta não deve ser entendida como um método de precisão que substitua os ensaios de laboratório, conhecidos e validados, e sim, como um complemento aos procedimentos de estimativa de propriedades termofísicas.

Para trabalhos futuros, são feitas as seguintes sugestões:

• melhorar a técnica de otimização a utilizar no programa kCúmido para reduzir os tempos de processamento e atingir uma precisão maior nas propriedades termofísicas identificadas;

• criar uma base de dados com as propriedades higroscópicas de diferentes materiais porosos usados na construção civil, visando a ampliar a aplicação do programa kCúmido para outros materiais;

• estudar a condição de contorno permeável nas superfícies, integrando as trocas de umidade por convecção;

• realizar aplicações do ensaio não-destrutivo em componentes construtivos homogêneos de edificações existentes. Para a determinação do conteúdo de umidade em campo pode ser utilizado algum dos procedimentos não- destrutivos apresentados por Said (2004);

• expandir o modelo de transferência de calor e umidade através de um algoritmo de simulação bidimensional no programa kCúmido, com o objetivo de estudar componentes multicamadas e de geometria complexa;

• integrar rotinas para estudar os fenômenos de convecção e radiação em câmaras de ar internas, como é o caso de tijolos com furos, amplamente utilizados na construção civil.