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4 SIMULAÇÃO COM MODELOS DE TRANSFERÊNCIA DE CALOR E UMIDADE INTEGRADOS

4.1 Importância do conteúdo de umidade nas propriedades termofísicas

O modelo de condução apresentado no capítulo 2 (equação de difusão de calor) considera que a transferência de calor é devida exclusivamente ao gradiente de temperatura em um material homogêneo. No entanto, os materiais utilizados comumente na envoltória de edificações são materiais porosos em que existe um conteúdo de umidade interno.

Considerando que este volume de poros internos pode ser preenchido por água ou por ar, é importante mencionar que as propriedades termofísicas da água podem ser significativamente diferentes das propriedades termofísicas do ar (Tabela 4.1). A condutividade térmica (λ) da água em fase líquida é 23,6 vezes maior do que a condutividade térmica do ar. Isto afeta o desempenho térmico do componente construtivo de forma global,

pois os poros do material podem conter água ou ar, dependendo das condições climáticas em que se encontra o componente.

Tabela 4.1 – Propriedades termofísicas de diferentes materiais.

λ ρ c

Material [W/m K] [kg/m3] [J/kg K]

Ar* 0,026 1,161 1000

Água saturada (liquida)* 0,613 1000 4180

Água saturada (vapor)* 0,019 0,025 1872

Argamassa** 1,150 1950 1000

Tijolo comum** 0,900 1500 920

Madeira (pinus)** 0,120 400 1340

* Para uma temperatura de 300 K (INCROPERA e DEWITT, 2003) ** (ABNT-2, 2005)

Na Tabela 4.1 é possível observar também que a água saturada (em fase líquida) possui um calor específico (c) que pode ser 4 vezes maior que o calor específico de materiais cerâmicos (argamassa e tijolo maciço), comumente usados na construção (SINPHA, 1999).

Dos Santos (2003) apresenta um trabalho em laboratório com cinco amostras de concreto refratário confeccionadas com a mesma quantidade de cimento, mas com diferente volume de poros, que varia de 17,1% a 37,4%. Todas as amostras foram submetidas a uma condição isotérmica com uma umidade relativa constante de 75% durante 15 dias. A relação entre a porosidade e o conteúdo de umidade determina a saturação do componente construtivo. Para as diferentes amostras, os resultados obtidos mostram claramente que existe uma relação inversa entre a condutividade térmica e a porosidade do material. Isto porque quanto menor a porosidade, maior a densidade do material e, assim, maior é a sua condutividade térmica. Os resultados mostram que a condutividade térmica pode variar em aproximadamente 100% entre o concreto com menor porosidade (17,1%) e o concreto com maior porosidade (37,4%).

Para o calor específico, os resultados mostram variações mais atenuadas e com uma correlação menor com o volume de poros nas amostras.

O ensaio para estimar λ e ρ·c foi realizado em uma faixa de temperatura entre 60 e 1000°C, observando-se picos de máximos e mínimos para as duas propriedades dentro desse intervalo de temperaturas. O autor explica que esses picos nas propriedades termofísicas podem ser explicados por fenômenos de transferência de umidade, geração de calor latente e secagem das amostras.

Osanyintola e Simonson (2006) apresentam um estudo em que é utilizada a madeira compensada como exemplo de material higroscópico para analisar o impacto que esses materiais tem no desempenho térmico de edificações. Como parte de um estudo prévio das propriedades higrotérmicas da madeira, o trabalho considera medições em laboratório da condutividade térmica efetiva de amostras para diferentes condições de umidade relativa em regime permanente, obtidas a partir do método de soluções salinas saturadas. Os autores apresentam resultados em que a condutividade térmica do material aumenta de forma não- linear de acordo com o aumento da umidade relativa. A faixa de variação da condutividade térmica medida (com 1% de incerteza) vai de 0,082 W/mK para o material seco a 0,091 W/mK para uma umidade relativa do ar de 75%. Estes valores são comparáveis aos valores apresentados na Norma NBR 15220-2 (ABNT-2, 2005), em que a condutividade térmica do compensado de madeira é de 0,12 – 0,15 W/m K.

Portanto, o trabalho mostra que, para compensados de madeira, a condutividade térmica pode variar em 12,2% quando a umidade relativa do ar varia entre 0 e 75%. Os autores destacam que para cada nível de umidade relativa foram necessários 14 dias para atingir o regime permanente, enquanto que, para as medições de condutividade térmica efetiva, foram necessários apenas 30 minutos. Logo, as flutuações de umidade relativa durante a medição de condutividade térmica são desprezíveis.

O trabalho realizado por Suleiman (2006) observa as variações na condutividade térmica de dois tipos de tijolos maciços tipicamente utilizados na Líbia. As medições de condutividade térmica foram realizadas através do método TPS - transient plane source, em inglês (GUSTAFSON, 1990), que permite um ensaio rápido e com um aumento de temperatura de apenas 1 K nas amostras. Isto evita o problema de haver uma distribuição não- uniforme de umidade na amostra devido a um gradiente de temperatura mantido por um longo período de tempo. Mantendo uma temperatura ambiente uniforme de 25 °C, as amostras foram testadas em condição seca e com 40% de conteúdo de umidade no material. Para a condição seca, a condutividade térmica medida foi de 0,8 e 1,5 W/m K para as densidades de 1444 e 1985 kg/m3, respectivamente. A norma brasileira NBR 15220-2 (ABNT, 2005) apresenta para a cerâmica de tijolos uma condutividade térmica de 1,05 W/m K nessa faixa de densidade. As medições com 40% de conteúdo de umidade apresentam variações na condutividade térmica de 65% para o tijolo de menor densidade, e de 20% para o tijolo de maior densidade.

A influência do conteúdo de umidade nas características térmicas de diferentes componentes construtivos encontra-se resumida no trabalho de Kumaran et al (2002). Assim, é importante considerar a situação higrotérmica dos componentes construtivos por meio de modelos físicos corretamente simulados para materiais porosos (Stopp et al, 2003). Um exemplo é o estudo desenvolvido por Mendes et al. (2003) no qual, a partir de diferentes simplificações no modelo de transferência de umidade, é possível observar que os fenômenos de transferência de umidade simulados representam um parâmetro importante no cálculo de cargas térmicas de resfriamento em edificações em climas quentes e úmidos, como é o caso do Brasil.