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A seguir são apresentadas as principais conclusões obtidas a partir do desenvolvimento do trabalho experimental em escala piloto. Portanto essas conclusões devem ser interpretadas considerando-se as condições experimentais avaliadas e as limitações inerentes à escala dos experimentos.

Nas diferentes condições de coagulação testadas, o filtro de camada dupla foi capaz de promover eficiências de remoção dos oocistos de Cryptosporidium variando na faixa de 1,2 a 2,4 log, para as amostras de água filtrada tomadas no início da carreira de filtração (período de amadurecimento), e de 1,4 a 3,2 log, para as amostras de água filtrada durante a operação regular do filtro. A ampla faixa de eficiência de remoção obtida confirma a importância das condições de coagulação (dosagem de coagulante e pH de coagulação) na remoção de oocistos de Cryptosporidium por filtração direta descendente, bem como o relevante papel da qualidade da água.

Os dados obtidos revelam que o período de amadurecimento apresenta maior vulnerabilidade quanto à passagem de oocistos de Cryptosporidium quando comparado ao período de operação regular dos filtros. Os valores de eficiência de remoção de oocistos de Cryptosporidium no filtro durante o período de amadurecimento foram de 0,1 a 1,0 log menores do que os obtidos durante a operação regular dos filtros. Em função da forma de lavagem adotada nos experimentos, sugere-se que a menor eficiência de remoção oocistos de Cryptosporidium está relacionada à menor eficiência dos mecanismos de aderência durante a fase inicial da carreira de filtração. Em escala real, o risco de passagem de oocistos pelo meio filtrante no início da carreira de filtração poderá ser ainda maior, pois o efeito da presença de oocistos na água residual de lavagem no meio filtrante (intersticial) se somará ao efeito da menor eficiência da aderência.

Os experimentos realizados em valores de pH de coagulação mais baixo, em torno de 5, promoveram as melhores eficiências de remoção de oocistos de Cryptosporidium, particularmente em relação ao período de operação regular do filtro.

Para o pH de coagulação em torno de 5, a dosagem ótima necessária para promover uma maior remoção de oocistos de Cryptosporidium recaiu em uma região que de um modo geral se caracteriza pela predominância do mecanismo de adsorção e neutralização de cargas, mecanismo esse normalmente recomendado quando se utiliza a filtração direta. Nesse mesmo valor de pH de coagulação a adoção de super-dosagem de sulfato de alumínio (aproximação da “coagulação melhorada”) não pareceu afetar notadamente a remoção de oocistos de Cryptosporidium no filtro de camada dupla, porém promoveu a redução da duração da carreira de filtração.

A análise estatística revelou que as diferentes condições de coagulação testadas não influenciam significativamente no diâmetro equivalente do floco, porém, de forma geral, os flocos obtidos em condições de dosagem ótima e pH baixo apresentaram uma estrutura mais regular e menos porosa em relação aos flocos formados em condições de super- dosagem de coagulante e pH entre 6,3 a 6,7 os quais exibiram uma estrutura irregular e porosa. Os resultados sinalizam uma possível relação entre as propriedades morfológicas de regularidade dos flocos e as taxas de crescimento das perdas de cargas.

Praticamente todas as carreiras de filtração, com exceção daquelas realizadas em condições de super-dosagem de coagulante e valor de pH de coagulação baixo, produziram água filtrada com valores de turbidez inferiores a 0,2 UT, atendendo os padrões de potabilidade exigidos e recomendados pela legislação brasileira. Ao mesmo tempo verificou-se que, para água bruta contendo entre 102-a 103 oocistos de Cryptosporidium/L, foram produzidos residuais consistentemente inferiores ou iguais a 2 ooc/L, com predominância de resultados inferiores ou iguais a 1 ooc/L. Esses residuais de oocistos de Cryptosporidium obtidos nos experimentos de filtração não atendem as legislações americana e inglesa quanto à dose infectante.

Os resultados obtidos no presente trabalho também mostram não haver relação entre as eficiências de remoção de oocistos de Cryptosporidium e as eficiências de remoção de coliformes totais e E.coli, resultados estes comparáveis com outros estudos, reforçando o fundamento de que essas bactérias não são indicadores de oocistos de Cryptosporidium. Os resultados obtidos sugerem, portanto, que para a filtração direta, o uso de pH de coagulação próximo de 5, associado ao uso de dosagens de coagulante que favoreça a

predominância do mecanismo de adsorção e neutralização de cargas, é preferível a outras combinações de pH de coagulação e dosagem de coagulante que também promovem baixos residuais de turbidez e elevadas remoções de bactérias do grupo coliforme. É importante destacar que o baixo valor do pH de coagulação pode estar influenciando a remoção dos oocistos de Cryptosporidium também por favorecer a hidrofobicidade dos oocistos e reduzir, independentemente do mecanismo de coagulação, a carga repulsiva dos mesmos (potencial zeta mais próximo de zero).

Em função dos resultados obtidos neste trabalho, em decorrência de um número pequeno de repetições e das dificuldades e observações verificadas ao longo do mesmo, sugerem-se algumas recomendações para estudos futuros referentes à remoção de oocistos de Cryptosporidium por filtração direta descendente:

(1) Investigar a utilização de meio filtrante de dupla camada de antracito e areia, em granulometria diferente, ou seja, mais grossa, com o objetivo de obter penetração mais profunda das partículas e consequentemente carreiras de filtração mais longas e observar o comportamento das remoções dos oocistos de Cryptosporidium.

(2) Avaliar a influência da pré-floculação associada à filtração direta na remoção de oocistos de Cryptosporidium e verificar conjuntamente a atuação da morfologia dos flocos na remoção dos oocistos nestas condições.

(3) Realizar um número maior de repetições para cada condição de coagulação testada, especialmente em condições de baixo pH, e inserir a medida do potencial zeta para agregar mais informações sobre os mecanismos de coagulação e possibilitar com mais segurança o entendimento e conclusão dos resultados obtidos.

(4) Utilizar outros tipos de coagulante, como o cloreto férrico e o policloreto de alumínio (PAC) nos estudos de remoção de oocistos de Cryptosporidium por filtração direta descendente.

(5) Analisar a presença de oocistos de Cryptosporidium em águas de lavagem dos filtros rápidos de ETAs de filtração direta em escala real, para avaliar os riscos potenciais para a

saúde humana associados à prática da re-circulação das águas de lavagem na estação de tratamento de água.

Os resultados dos escassos estudos sobre a presença de oocistos de Cryptosporidium em mananciais e água tratada realizados no Brasil têm mostrado a necessidade de ações mais efetivas na busca do conhecimento da realidade brasileira com relação a esse protozoário e os riscos a saúde. Com base nesse enfoque recomenda-se ainda:

(6) Realizar estudos para verificação da presença e quantificação desse protozoário no ambiente aquático, para avaliar possíveis riscos de infecção inerentes às concentrações da água bruta e definir metas de remoções nos sistemas de tratamento compatíveis com a realidade brasileira.

(7) Pesquisar novos indicadores microbiológicos e/ou físico-químicos que melhor expressem a qualidade da água quanto à ocorrência de oocistos de Cryptosporidium, principalmente em função do alto custo das análises de detecção de oocistos de Cryptosporidium e das reais condições econômicas e técnicas em que trabalham as ETAs no Brasil.