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2 O ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA COMO NEGÓCIO JURÍDICO

2.5 Condição de eficácia do acordo de colaboração premiada

Embora existente e válido, o negócio jurídico do acordo de delação pende de eficácia futura, ou seja, fica condicionado ao adimplemento de ao menos uma das cinco condições, previstas como resultados, nos incisos I a V do artigo 4º da Lei n. 12.850/13, e também de outra condição que possa advir das negociações de cada acordo nos casos concretos.

A própria Lei de Combate às Organizações Criminosas prevê que será a sentença que apreciará a eficácia do acordo homologado (§11 do artigo 4º). Por conseguinte, a existência e a validade do acordo serão analisadas no momento da homologação do acordo, enquanto no julgamento verificar-se-á a sua eficácia. Assim, a eficácia fica condicionada a evento futuro e incerto, “porque o delator não tem ciência do arranjo probatório existente e de que peso cada prova/indício exercerá na convicção do julgador” (ROSA, 2018, p. 246).

Como condição entende-se pela definição do artigo 121 do Código Civil, que prevê que “considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto” (BRASIL, 2002a).

As condições que eventualmente forem dispostas pelas partes deverão seguir as regras dos artigos 122, 123 e 124 do Código Civil28.

Ainda que a eficácia do acordo fique condicionada ao cumprimento das cláusulas nele previstas, não se pode esquecer que a colaboração premiada é apenas um meio de obtenção de prova. Ou seja, ao colaborador é imposta a obrigação de passar informações que resultem em uma das hipóteses dos incisos I a V do artigo 4º da Lei n. 12.850/13, porém, sem que essas informações necessariamente se constituam em provas capazes de por si só ensejar a condenação de eventuais delatados.

28 Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes;

entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.

Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados: I - as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas; II - as condições ilícitas, ou de fazer coisa ilícita;

III - as condições incompreensíveis ou contraditórias.

Art. 124. Têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível. (BRASIL, 2002a).

Gustavo Henrique Badaró esclarece a diferenciação entre um meio de prova e um meio de obtenção de prova29 ao explicar que “enquanto os meios de prova são aptos a servir, diretamente, ao convencimento do juiz sobre a veracidade ou não de uma afirmação fática [...], os meios de obtenção de provas são instrumentos para a colheita de elementos ou fontes de provas, estes, sim, aptos a convencer o julgador” (BADARÓ, 2017, p. 130).

No caso da colaboração premiada, o Ministro Dias Toffoli, em seu voto na Questão de Ordem da Pet 7.074/DF, dispôs que

[...] o acordo de colaboração não se confunde com os depoimentos prestados pelo agente colaborador. Enquanto o acordo de colaboração é meio de obtenção de prova, os depoimentos propriamente ditos do colaborador constituem meio de prova, que somente se mostrarão hábeis à formação do convencimento judicial se vierem a ser corroborados por outros meios idôneos de prova. (BRASIL, 2017c, p. 125).

Sendo a colaboração premiada um mero meio de obtenção de prova, Alexandre Morais da Rosa discute o fato da obrigação do delator ser de meio ou de fim/de resultado, como forma de se verificar se a colaboração foi eficaz ou não. Para o autor,

[...] as informações do delator podem ser verdadeiras, mas a condenação do delatado depende de elementos mais extensos de prova. [...] a delação como obrigação de meio visa ser um meio de garantir também a boa-fé do Estado, no sentido de que este não formule cláusulas “isca”, que sejam de cumprimento impossível, e formuladas apenas para atrair o delator, que “cai” no calor do momento e na perspectiva dos prêmios (recompensas) oferecidos. [...] Portanto, é a partir do dever de boa-fé que se sustenta ser a obrigação de meio; o Estado não pode exigir o resultado que a delação é apenas instrumento (ROSA, 2018, p. 257).

Destarte, para a eficácia da colaboração o que se necessita é que o colaborador entregue as informações com as quais se comprometeu no acordo, e não que os delatados sejam de fato condenados, pois a colaboração do agente seria um mero instrumento de obtenção de prova de outros delitos.

Sobre essa questão, o Ministro Edson Fachin, na discussão em plenário sobre a Questão de Ordem da Pet 7.074/DF, que abordou os limites de atuação do relator em homologação de colaboração premiada e a distribuição do processo por prevenção, afirmou, que “o direito subjetivo do colaborador nasce e se perfectibiliza na exata medida em que ele cumpre seus deveres. São como “condictio sine qua non” para que o colaborador possa fruir desses direitos.” (BRASIL, 2017c, p. 337). Nesse contexto, em síntese, o acordo homologado como regular, voluntário e legal gera vinculação, condicionada ao cumprimento dos deveres

29 Para uma melhor compreensão desta diferenciação, sugere-se a leitura do tópico n.2 de Badaró (2017), em que

o autor explica de forma contundente e com muitos exemplos as diferenças entre meio de prova e meio de obtenção de prova.

assumidos pela colaboração, salvo ilegalidade superveniente apta a justificar nulidade ou anulação do negócio jurídico (BRASIL, 2017c, p. 338).

Logo, para que o acordo de colaboração premiada seja eficaz, o colaborador precisa cumprir com os deveres pelo acordo impostos, o que destaca a importância de uma boa redação das cláusulas que o compõem, de forma a não dar margem a muitas interpretações, pois somente o acordo de colaboração premiada eficaz, ou seja, que produz resultados, garantirá que ao colaborador sejam concedidos e aplicados os benefícios neles previstos, que serão discutidos no próximo capítulo.