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Condições socioeconômicas dos estudantes das universidades federais: a necessidade da Assistência Estudantil

3 A ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL NA UFPA NOS MARCOS DO GOVERNO LULA DA SILVA: 2003-

3.2 Acesso e permanência dos estudantes na UFPA

3.2.1 Condições socioeconômicas dos estudantes das universidades federais: a necessidade da Assistência Estudantil

Durante o desenvolvimento da pesquisa procuramos identificar o perfil socioeconômico dos estudantes em cursos de graduação da UFPA. Entendemos que esse diagnóstico social é imprescindível para o estabelecimento de ações de assistência aos estudantes, especialmente aos que não possuem condições financeiras necessárias para sua manutenção no ensino superior. Além de auxiliar na formulação das ações assistenciais, tal levantamento institucional auxiliaria também, quando cruzado com outros dados, especialmente a evasão, para avaliar os impactos das ações desenvolvidas.

Desde o início da pesquisa sabíamos que os candidatos classificados/aprovados nos Processos Seletivos (Vestibulares) da UFPA, a eles são fornecidos um questionário socioeconômico para preenchimento. Neste sentido, como a UFPA participou oficialmente da pesquisa elaborada pelo FONAPRACE (2011), em que repassou informações ao referido

órgão, adotamos seus estudos, de modo a subsidiar nossas análises que contempla também os estudantes da UFPA.45

Trazemos à tona alguns dados das duas pesquisas elaboradas pelo FONAPRACE que traça o Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais Brasileiras, por região. O documento/relatório assume a perspectiva de reunir elementos de modo a concentrar esforços para “garantir a permanência de todos os estudantes, viabilizando a conclusão de seus cursos agindo preventivamente nas situações de retenção e evasão”. (ANDIFES, 2011, p. 4). As pesquisas foram realizadas, respectivamente, em 2003/2004 e 2010.

No relatório da pesquisa46 é destacado que o perfil dos estudantes da graduação vinculados às universidades federais representa de maneira razoável o perfil da população brasileira. Assim, frente a esta realidade, cai por terra a tese de que os estudantes das universidades federais, em sua grande maioria, são os que detém o maior poder econômico. Diante desse diagnóstico “[...] constata-se a necessidade de ampliação das políticas de assistência estudantil e para isso a consequente ampliação de recursos destinados a esta finalidade” (ANDIFES, 2011, p. 4).

Esses estudos utilizam como categorias para classificação das condições socioeconômicas a designação “classes econômicas”, escalonadas em ordem alfabética de A a E, sendo que as três primeiras classes tem, cada uma, dois níveis (1 e 2). Essa categorização foi feita, com pequenos ajustes, com base na classificação utilizada pela Associação Brasileira de Empresas e Pesquisas (ABEP), que considera centralmente o poder de compra das pessoas e famílias. Cada classe econômica é definida, em termos de pontuação, conjugando as condições de vida material (expressa em bens, facilidades e serviços utilizados pelas pessoas e famílias) e o grau de instrução do chefe da família. Em termos de renda a estimativa, conforme pontuação adquirida, a pesquisa da ANDIFES (2011) utilizou a tabela da ABEP de 2009, cujos dados estão expostos na tabela 6.

45 Tem-se a seguir a listagem dos Servidores da UFPA que integraram a equipe local responsável pela coordenação e aplicação dos questionários: José Maia Bezerra Neto e Waldene Brandão de Oliveira. (ANDIFES, 2011, p. 63).

46 Este relatório da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) foi encomendado ao Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE) com o objetivo de mapear a vida social, econômica e cultural dos estudantes de graduação presencial das Universidades Federais brasileiras. A implantação da pesquisa teve início em 2010. (ANDIFES, 2011, p. 4).

Tabela 5: Renda média das classes econômicas, segundo ABEP – 2009

Com base nessa estimativa e considerando a pesquisa realizada com o conjunto das universidades federais brasileiras, o FONAPRACE apresentou a distribuição dos estudantes de acordo com as classes econômicas. Esse quadro está exposto na tabela 6 e indica que a maioria dos estudantes universitários, das instituições federais, necessita, por sua condição socioeconômica, de Assistência Estudantil.

Tabela 6: Distribuição percentual dos estudantes das universidades federais por classes econômicas Região Classes A1 A2 B1 B2 C1 C2 D E Nacional 2,35 12,90 17,58 23,49 19,59 14,01 9,60 0,47 Nordeste 2,20 9,96 14,57 21,26 20,11 17,10 14,00 0,81 Norte 1,18 5,14 7,96 16,66 21,64 22,29 23,78 1,36 Sudeste 2,22 16,11 21,68 25,56 18,41 11,27 4,67 0,07 Sul 2,39 14,38 21,39 27,99 20,35 10,14 3,29 0,06 Centro-Oeste 4,30 17,76 18,27 23,74 18,09 10,74 6,75 0,34 Fonte: ANDIFES, 2011.

Os dados da pesquisa de 2010 afirmam que há um contingente de 67,16% de estudantes das IFES (contidos nas classes econômicas B2, C, D e E, ou seja, cuja renda familiar era de até cinco salários mínimos)47 que necessitam de algum tipo de apoio institucional para a sua permanência e conclusão do curso escolhido. Esse auxílio a que os estudantes deveriam ter acesso denomina-se de Assistência Estudantil, tal como alimentação, moradia, atendimento médico-odontológico, psicológico, etc. Considerando apenas os estudantes que pertencem às classes mais baixas (C, D e E, ou abaixo de três salários

47 Em 2010, o valor do salário mínimo era R$510,00 (quinhentos e dez reais). Classe Renda Média (R$)

A1 11.480,00 A2 8.295,00 B1 4.754,00 B2 2.656,00 C1 1.459,00 C2 962,00 D 680,00 E 415,00 Fonte: ANDIFES, 2011.

mínimos) percebemos que esse índice é bastante elevado, alcançando 43,7% do total de estudantes das universidades federais. Cabe registrar que o percentual de contingente apresentado na pesquisa anterior (2003/2004) era de 65% de estudantes das IFES no país que demandavam algum tipo de apoio institucional no sentido da permanência e conclusão do curso escolhido, ou seja, estavam entre as classes B2 e E. Desse percentual de estudantes em “situação de vulnerabilidade social”, a maioria, 42,8%, estava nas classes C, D e E. Isso evidencia que a situação de 2010 é bastante similar ao diagnóstico realizado anteriormente (2003/2004).

Diante dessa realidade, o direito a Assistência Estudantil é uma necessidade inequívoca. Ao mesmo tempo, se faz necessário romper com o histórico do Estado brasileiro, haja vista que a educação, concebida como bem público, não se materializou como direito de todos. Como resultado forja-se um quadro extremamente injusto e desigual tanto no campo do acesso a níveis cada vez mais complexos de ensino e de formação, quanto no campo da qualidade de oferta dos serviços educacionais existentes no país (GONÇALVES, 2011).

Enfim, não há como negar o grande contingente de estudantes universitários nas universidades federais provenientes dos estratos sociais mais baixos da população brasileira. Isso, por sua vez, invoca a urgência da instauração de uma política de Assistência Estudantil às Universidades Federais. Tal política, para dar conta desta problemática, é preciso abranger de maneira unívoca o conjunto dos estudantes que demandam, em alguma medida, suporte institucional – pedagógico, psicológico, médico-odontológico e etc.

À luta pelo acesso à educação superior para todos, apenas será constitucionalmente plena, quando traduzida na garantia da permanência de todos os estudantes universitários. Assim, é necessário garantir para além da inequívoca necessidade da expansão das vagas, centralmente por meio das universidades públicas, a efetivação de uma política de Assistência Estudantil que assegure uma melhor qualidade de vida, bem como, possibilite o melhor desempenho acadêmico, para que todos os estudantes possam concluir com sucesso sua formação no tempo previsto.

Além disso, essa política precisa considerar que o cenário nacional dos estudantes das universidades federais apresenta especificidades regionais. As regiões Norte e Nordeste, assim como no caso social e econômico em geral, apresentam os maiores índices de estudantes que necessitam da Assistência Estudantil. Considerando os estudantes das classes B2 a E, percebemos que nas universidades da região Norte estão os maiores índices com 86%, seguido do Nordeste com 73%. Quando excluímos desse grupo os alunos da classe B, tais índices são, respectivamente, 69% e 52%, no Norte e no Nordeste, essa situação é mais

agravante que em 2003/2004, visto que tais índices eram de 64,3% e 47,8%, respectivamente. Isso evidencia que se ampliou, no período 2003-2010, o número de estudantes com menor renda econômica nas universidades federais dessas respectivas regiões. Essa ampliação, positiva em nossa avaliação reafirma a necessidade da intervenção estatal, nessas regiões, para garantir que o acesso ao ensino superior seja acompanhado de condições de permanência, ou seja, de assistência aos estudantes.

Cabe destacarmos que, como vemos, o Norte brasileiro, cuja maior instituição desse espaço geográfico é a UFPA, desponta com os mais elevados índices de estudantes com situação socioeconômica que necessita em potencial de Assistência Estudantil para manter-se na universidade. Essa necessidade se confirma quando observamos também que essa região detém o menor percentual de estudantes entre as Classes A (6,32%) e B1 (7, 96%), em 2010. Enfim, se observarmos atentamente a tabela 6 percebemos que a região Norte apresenta as maiores discrepâncias: quanto maior a renda (definida na Classe), menor o agrupamento de estudantes universitários e quanto menor a renda, maior o agrupamento de estudantes.

Outro dado importante da pesquisa de 2010 que evidencia a condição econômica dos estudantes e a necessidade da Assistência Estudantil é à distribuição dos mesmos de acordo com a renda familiar. De acordo com o levantamento realizado 41% das famílias dos alunos das universidades federais recebem até três salários mínimos. Também nesse indicador há grandes assimetrias regionais, visto que nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, esse percentual cai para 31%, 32% e 33%, respectivamente, enquanto aumenta significativamente nas regiões Nordeste (50%) e principalmente Norte (63%).

Diante desse quadro urge a questão do direito a Assistência Estudantil por meio da intervenção do governo federal e que leve em consideração as especificidades regionais, ou melhor, as assimetrias regionais que historicamente marcam o atraso e o diminuto investimento nas regiões Norte e Nordeste, ao mesmo tempo, que serviu de exploração às elites nacionais e internacionais articuladas ao grande capital, a exemplo dos grandes projetos de exploração das riquezas minerais e energéticas na região Norte.

Para que a educação se efetive como direito de todos, inclusive em seus níveis mais elevados, a Assistência Estudantil se configura como elemento fundante, haja vista grande parte da população brasileira estar submetida à precárias condições de vida, o que, por sua vez, provoca a negação do direito de estudar e progredir no processo de formação, que se traduz em elevados índices de retenção e evasão.

No sentido de combater esse perverso quadro é preciso que se crie uma política estruturante nas universidades federais que atenda ao conjunto de estudantes, no sentido de

prover moradia, alimentação, creche, acessibilidade e condições materiais para estudar e concluir seus estudos em condições satisfatórias.

Cabe ainda destacarmos que, no atual contexto de expansão da educação superior brasileira também se faz presente, inserido no discurso da democratização do acesso, a política de reserva de vagas etnorracial. O lapso de tempo entre as duas pesquisas também foi importante no sentido de captar o recente fenômeno da adoção das políticas de ações afirmativas. Também como resultado desse processo:

Os estudantes de raça/cor/etnia branca são a maioria (54% contra 59% em 2004), em especial na classe A (74%). O percentual de estudantes de raça/cor/etnia preta aumentou de 5,9% em 2004 para 8,7% em 2010. Este aumento ocorreu em todas as regiões, com destaque para a região Norte, que praticamente dobrou o seu percentual (13,4% contra 6,8% em 2004), e a região Nordeste, que teve um aumento de 46% (12,5% contra 8,6% em 2004). O universo de estudantes de raça/cor/etnia preta e parda também aumentou (40,8% contra 34,2% em 2004) e sua maior concentração está nas classes C, D e E (53,3% contra 43,7% em 2004). (ANDIFES, 2011, p. 23).

Cabe ressaltar que a pesquisa evidencia que há relação direta entre a raça/cor/etnia e a classe econômica. A maioria dos estudantes autodeclarados como brancos estão na classe A, em contrapartida, a maioria daqueles que se declaram pretos ou pardos estão nas classes econômicas C, D e E. Por um lado isso confirma a tese de parte dos movimentos sociais, em grande medida incorporada em políticas públicas, que aponta a necessidade de ações afirmativas de corte etnorracial e/ou de condição econômica dos estudantes. Por outro, os dados demonstram que se amplia o percentual de pretos e pardos, em condições econômicas desfavoráveis, o que exige das universidades, para além do acesso, ações que garantam também a permanência desses sujeitos. Como veremos adiante, na UFPA, tal política tem limitado apenas na questão do acesso.