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CONDICIONANTES E POTENCIALIDADES DAS CONTROVÉRSIAS SOCIOCIENTÍFICAS NO BRASIL

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 130 REFERÊNCIAS

1 AS CONTROVÉRSIAS SOCIOCIENTÍFICAS NO ENSINO DE CIÊNCIAS: PANORAMA DE UMA ÁREA DE PESQUISA

1.4 CONDICIONANTES E POTENCIALIDADES DAS CONTROVÉRSIAS SOCIOCIENTÍFICAS NO BRASIL

Nos artigos analisados, os autores apontam as dificuldades com que se deparam os professores, pois estes, em geral, não possuem capacidades de gestão e orientação de discussões em sala de aula nem os conhecimentos necessários à discussão de questões sociocientíficas sobre a natureza da ciência e os aspectos sociológicos, políticos, éticos e econômicos dos assuntos em pauta. Além desse aspecto, eles falam sobre a dificuldade de avaliar as atividades da discussão das controvérsias sociocientíficas ou, ainda, a respeito da pressão por parte de sistemas nacionais de avaliação que não valorizam esse tipo de discussão, comprometendo a concretização dessa abordagem.

Um dos grandes problemas da docência, apontado por Shulman (1987), Carr e Kemmis (1988) e Tardif (2000), tem sido a falta de sistematização individual e coletiva das experiências dos professores, o que implica uma verdadeira ausência de história e prática, sem a qual é difícil realizar uma análise de seus princípios. Por essa razão, as pesquisas de Lee Shulman são relevantes porque acompanharam professores de diferentes níveis de ensino, constituindo um importante número de casos, nos quais foram registrados os raciocínios e as ações de professores em serviço.

As contribuições de Shulman com respeito ao conhecimento pedagógico do conteúdo são interessantes para a formação de professores, pois consideramos que esse conhecimento favorece a construção da autonomia do professor. Contudo, é importante salientar que a conquista da autonomia não está reduzida ao conhecimento pedagógico de conteúdo, que permanece ainda na dimensão pessoal do desenvolvimento profissional do professor, sendo necessário aprofundar sua dimensão social, pois a autonomia docente é especialmente um processo coletivo e não apenas um processo individual.

Os conteúdos não são mais discutidos, mas simplesmente replicados e derivados. Contrariamente, a formação é um conceito que deve ser problematizado e reformulado a partir das concepções e da finalidade da educação científica.

Para Fourez (2003), as posições são divergentes quanto à utilidade de uma formação em epistemologia em história das ciências e nas abordagens interdisciplinares em face das situações complexas ou das questões fundamentais provocadas pelos modelos científicos. Deve-se potencializar a dimensão coletiva do trabalho científico, organizando

grupos de trabalho interdisciplinar e facilitando a interação entre os diferentes grupos de professores de diferentes áreas do conhecimento e a comunidade científica.

Nesse sentido, Forgiarini e Auler (2009) apontam que a formação de professores excessivamente fragmentada e desvinculada do contexto social agrava mais ainda esse quadro. Esses autores ressaltam que a grande maioria dos professores apresenta lacunas de conhecimento, de informação em relação aos temas controversos, pois as questões sociocientíficas controversas são consideravelmente diferentes do tipo de problemas geralmente trabalhados nas aulas de Ciências.

Os autores indicam ainda que, ao utilizar temas controversos no ensino de Ciências, pode-se oferecer a abordagem de diferentes conteúdos de forma interdisciplinar, através de um trabalho conjunto envolvendo professores de diferentes disciplinas (por exemplo, Ciências, História, Geografia, Química, Física, Biologia, entre outras).

Entretanto, em alguns artigos, apesar de ser apontada a importância de trabalhar coletivamente, os professores das áreas das humanas foram colocados em posição de menores obrigações em circunstâncias de controvérsias nos assuntos científicos. As cobranças mais excessivas recaíram sobre os professores de Biologia, talvez por causa da especificidade do conteúdo vinculado a essa ciência.

Para Levinson (2001), os professores de Ciências e de Humanidades têm forças e fraquezas complementares. Enquanto os professores da área das Ciências Humanas ficam mais à vontade com a controvérsia, os professores de Ciências têm um conhecimento maior dos conceitos da ciência. A colaboração pode oferecer contribuições úteis; infelizmente, os professores dessas diferentes áreas raramente trabalham em colaboração.

Dessa forma, a sala de aula pode se tornar um local de discussão em que os estudantes participem ativamente, demonstrando seus interesses e conhecimentos sobre os mais variados temas, que podem ser trabalhados não apenas em relação ao conhecimento científico, mas também quanto ao seu significado e impacto social. Assim, eles poderão vivenciar a experiência de diferentes formas ou por diferentes olhares com pontos de vista nos distintos grupos sociais, o que possibilita ainda o diálogo sobre limites e possibilidades para os debates acerca de temas sociocientíficos controversos.

Entendo que não é possível trabalhar com temas controversos através da formação unicamente disciplinar. São necessárias contribuições de vários campos do conhecimento. Por isso, a realização

de trabalhos coletivos torna-se de extrema necessidade para que, cada um, na sua área de conhecimento, contribua para a análise das várias dimensões presentes.

Faz-se também indispensável a realização de estudos aprofundados a respeito dos temas controversos, para evitar simplificações de questões complexas. É necessária também uma reflexão epistemológica coerente sobre ciência e tecnologia, que admita a impossibilidade de obtenção de respostas para todas as questões a partir, unicamente, de conhecimentos tecnocientíficos (REIS; GALVÃO, 2005), assim como a escolha de modos de trabalho que estejam de acordo com os objetivos a que se destina a discussão de questões controversas em sala de aula.

2 A INTEGRAÇÃO CURRICULAR E A PERSPECTIVA DA PEDAGOGIA DE PROJETOS

No atual contexto em que a sociedade está desenvolvendo-se, não é coerente nos atermos a modelos tradicionais de ensino e aprendizagem que se caracterizam pela concepção empirista de que o conhecimento se estabelece pela recepção passiva de informações vindas de fora. Essa perspectiva não dá conta da complexidade dos problemas reais existentes e, nesse sentido, a mudança na postura do professor faz parte das exigências de uma realidade em que os processos comunicativos são cada vez mais acelerados e a função social da ciência fica ainda mais explícita. Urge a busca da melhoria da qualidade do processo de ensino- aprendizagem de Ciências como forma de minimamente atender às necessidades atuais que apresentam características de um mundo globalizado. No contexto da educação em Ciências, alguns estudos, tais como os de Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2007), de Santos e Mortimer (2000) e de Galiazzi et al. (2008), apontam a necessidade do estabelecimento de relações entre situações socialmente relevantes que envolvem o cotidiano do aluno e os conteúdos científicos a serem estudados na escola.

Mesmo não sendo nosso objetivo avançar na discussão do uso do termo “temas” no Ensino de Ciências, reconhecemos que, apesar de sua polissemia e de seu uso nas pesquisas da área (HALMENSCHLAGER, 2014), as discussões acerca da organização do currículo escolar vêm propondo que o planejamento seja desenvolvido por meio do que chamaremos de “temáticas significativas”, ou seja, capazes de abarcar as disciplinas curriculares, ressignificando-as, e capazes de dar conta das problemáticas atuais da sociedade.

Porém, um dos obstáculos que encontramos é o currículo. Pretendo aqui apresentar um panorama geral da pesquisa sobre o currículo integrado e da proposta de integração curricular, especialmente relacionada ao ensino de Ciências. Para isso, apresentarei uma breve discussão sobre a interdisciplinaridade e o modo como ela se faz presente nos documentos legais e, também, a proposta da pedagogia de projetos, apontando condicionantes e potencialidades na escola básica.