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7. AMÍGDALA MODULANDO A FORMAÇÃO DAS MEMÓRIAS

7.6. CONEXÃO DE BLA COM O HIPOCAMPO

Como acabou de ser apresentado, as modificações neuroquímicas causadas pelo estresse ativam a transmissão noradrenérgica dentro da amígdala. A amígdala, por sua vez, interage com outras regiões do cérebro na regulação da consolidação de diferentes tipos de memória (HERMANS et al., 2014; McINTYRE; McGAUGH, WILLIAMS, 2012).

Como a amígdala está ligada a várias regiões do hipocampo (PIKKARAINEN et al., 1999) pode influenciar seu funcionamento através de diferentes rotas (KIM; DIAMOND, 2002). A ativação dessa estrutura, especificamente do BLA, por estímulos emocionais (McGAUGH, 2000) regula a formação de memórias no hipocampo (STRANGE; DOLAN, 2004), mas esse papel não se limita a uma melhora da plasticidade hipocampal (ROOZENDAAL et al., 1999).

O que se sabe hoje é que a atividade noradrenérgica no hipocampo e na amígdala é essencial para converter efetivamente as experiências emocionais em memória de longa duração (MIYASHITA; WILLIAMS, 2004). Dessa forma, a melhoria da eficiência de codificação emocional dentro do hipocampo depende da integridade da amígdala (HERMANS et al., 2014), pois a codificação bem sucedida de experiências emocionais está associada a conectividade funcional e reforçada entre ambos (HAMMAN et al., 1999).

7.6.1. Efeitos do BLA sobre a plasticidade hipocampal.

A interação entre a amígdala e o hipocampo reflete a melhoria da consolidação de memórias provenientes de experiências emocionais (PACKARD; CAHILL, 2001),

pois o BLA manda fibras ao hipocampo que podem ativar ou inativar sinapses (IZQUIERDO, 2002, p. 64).

Isso resulta em efeitos de supressão ou melhoria sobre a plasticidade do hipocampo, que dependem de como a amígdala é ativada em relação a intensidade, à duração e ao contexto durante o processamento da informação (AKIRAV; RICHTER-LEVIN, 2006). Por exemplo, infusão de agonistas de receptores β-adrenérgicos no BLA normalmente melhora a formação de memória do hipocampo (McGAUGH, 2000), mas durante o estresse, pode agravar seus efeitos sobre a plasticidade hipocampal e sobre a memória (KIM; DIAMOND, 2002).

Os estudos mostram que nos animais que são expostos a um estímulo de medo condicionado ocorre uma atividade rítmica sincronizada entre a região CA1 e a amígdala que poderia promover interações entre ambos (PARÉ; COLLINS; PELLETIER, 2002).

A ativação da via noradrenérgica no BLA modula o armazenamento da memória e a plasticidade do hipocampo (IKEGAYA et al., 1997), principalmente através alterações na LTP hipocampal (NAKAO et al., 2004). Isso ocorre, pois as ações da NA no BLA promovem a indução da LTP no hipocampo (IKEGAYA et al., 1997), evidenciando que a ativação de receptores adrenérgicos podem modular os efeitos da amígdala sobre a memória hipocampal para estímulos emocionais (GELINAS; NGUYEN, 2007). De fato, drogas que aumentam ou diminuem a liberação de NA na amígdala melhoram ou prejudicam, respectivamente, a formação da memória no hipocampo em condições normais (KIM; DIAMOND, 2002).

Como foi apresentado anteriormente, os receptores α1-adrenérgicos tem um papel importante durante esse processo. Sabe-se que a ativação desses receptores melhora o armazenamento da memória (McGAUGH et al., 2003), pois é capaz de mediar os efeitos na estabilidade da LTP em CA1 através da ação da NA (KATSUKI; IZUMI; ZORUMSKI, 1997), podendo melhorar a LTP do hipocampo (IKEGAYA; SAITO; ABE, 1995). Já a ativação dos receptores β-adrenérgicos, dependendo da frequência de estimulação (THOMAS et al., 1996), aumenta a indução da LTP. Ou seja, através desses receptores a amígdala pode potenciar respostas do hipocampo à NA

(GELINAS; NGUYEN; 2007).

Mas há alguns estudos controversos, pois alguns mostram que a estimulação da amígdala aumenta a transmissão sináptica, a plasticidade, e a LTP no giro denteado do hipocampo (AKIRAV; RICHTER-LEVIN, 1999), porém outros estudos de estimulação elétrica do BLA mostraram um aumento da LTP no giro denteado do hipocampo (IKEGAYA: SAITO; ABE, 1995), mas bloquearam a LTP na região CA1 do hipocampo (VOUIMBA; RICHTER-LEVIN, 2005). Isso coincide com estudos que mostraram que a LTP em CA1 pode ser reduzida pelo estresse, enquanto que a LTP no giro denteado pode ser melhorada (JÖELS; KRUGERS, 2007), indicando que essas duas regiões tem suscetibilidade distinta aos hormônios do estresse (BRAMHAM et al., 1998).

A ativação do BLA também afeta a função do hipocampo por meio dos processos dependentes de glicocorticóides (AKIRAV; RICHTER-LEVIN, 2002) que afetam a excitabilidade do hipocampo e várias formas de neuroplasticidade a longo prazo (XU et al., 1998). Como relatado anteriormente, a ativação noradrenérgica é necessária para os efeitos dos glicocorticóides sobre a memória. Assim, a ativação de ambos no BLA no momento da aprendizagem pode modular os processos de memória em outras áreas do cérebro, como é o caso do hipocampo (SCHWABE et al., 2011), inclusive melhorando a consolidação de memórias dependentes dessa estrutura (PACKARD; CAHILL; McGAUGH, 1994).

Estudos comportamentais demonstraram que injeções de agonistas de glicocorticóides ou de agentes adrenérgicos no BLA podem melhorar ou prejudicar a memória dependente do hipocampo (PACKARD; CAHILL; McGAUGH, 1994). Por exemplo, estudos mostraram níveis elevados de corticosterona inibem a indução da LTP (PAVLIDES et al., 1996), enquanto que baixas concentrações melhoram essa forma de plasticidade sináptica (KERR; HUGHETT; ABRAHAM, 1994).

Sendo assim, considerando que nas últimas décadas o modelo de memória tem sido a LTP, através dos efeitos sobre essa forma de plasticidade sináptica, o estresse pode prejudicar formas de memória dependentes do hipocampo em seres humanos e animais (KLOET; OITZL; JOËLS, 1999). Isso pode ser evidenciado em ratos adultos submetidos ao estresse imprevisível e inevitável mostrando deficiências marcantes da

LTP nas células piramidais de CA1 (FOY et al., 1987).

Assim, o fato é que estímulos emocionais ativam a amígdala e o hipocampo (McGAUGH; CAHILL; ROOZENDAAL, 1996), mas os mecanismos que permitem a ativação noradrenérgica do BLA influenciar a formação de memória envolvendo o hipocampo não são completamente conhecidos. Algumas evidências sugerem que isso ocorra através de processos dependentes dos receptores NMDA. A ativação de receptores β-adrenérgicos induz a melhoria da transmissão sináptica excitatória dependente dos receptores NMDA em neurônios do BLA (WANG et al., 1996). Isso pode ser evidenciado por infusões do antagonista do receptor NMDA na amígdala que mostrou ser prejudicial para a LTP no giro denteado, sugerindo a influência desses receptores em BLA sobre a LTP no hipocampo (IKEGAYA; SAITO; ABE, 1995).

Tem se mostrado que a PKA é um candidato para modular os receptores sinápticos (LIMAN; KNAPP; DOWLING, 1989), pois a sinalização de receptores β-adrenérgicos através do AMPc e da PKA pode modular a ativação de fosfatases, proteínas dependentes de cálcio que atuam para suprimir a indução da LTP (O'DELL, 2010).

Dessa forma, a estimulação de receptores β-adrenérgicos pela NA supera o processo no qual uma fosfatase dependente de cálcio, a calcineurina, limita a entrada de cálcio na célula durante a atividade sináptica. Dessa forma, os neurônios hipocampais sustentam um longo influxo de cálcio através do receptor NMDA (RAMAN; TONG; JAHR, 1996). Sendo assim, a sinalização por AMPc estaria envolvida na inibição da atividade das fosfatases (BROWN et al., 2000) e a NA pode contribuir aumentar a excitação ou a força sináptica nos neurônios de CA1, aumentando o influxo de cálcio total nos neurônios dessa região durante um período de estimulação repetitiva (RAMAN; TONG; JAHR, 1996).

Enfim, a maior parte dos estudos indicam que todo esse mecanismo é a forma pela qual a adrenalina e os glicocorticóides liberados por uma experiência estressante medeiam os efeitos do estresse sobre a aprendizagem e a memória dependente do hipocampo (KLOET; JOËLS; HOLSBOER, 2005), através de influências sobre a LTP hipocampal durante o processo de consolidação (BLISS; COLLINGRIDGE, 1993).

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