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PARTE I PAN-AFRICANISMO

Capítulo 1: PAN-AFRICANISMO: AÇÃO, CONCEITO E AUTO-DESENVOLVIMENTO

1.11 Congressos Pan-africanos

Na diáspora africana, militantes anticoloniais como Henry Silvester Wilians de Trinidad Tobago, Dusé Mohamed Ali do Egito, Amy Ashwood Garvey da Jamaica, Ras T. Makonnem da Guiana, George Padmore de Trinidad e Ladipo Felix Solanke da Nigéria participaram de conferencias internacionais sobre o tema racismo e colonialismo. No ano de 1898 o advogado Silvester Wilians fundou a Associação africana para organização de encontros e projetos de apoio a interesses de afrodescendentes. De acordo com Adi (2003, pág. 234), o programa da Associação Pan-africana objetivava em sua plataforma:

1. Garantir os direitos civis e políticos para os africanos e seus descendentes em todo o mundo; 2. Incentivaras relações amistosas entre caucasianos e africanos; 3. Incentivar o empreendimento educacional, industrial e comercial entre os africanos; 4. Influenciar a legislação que dizia respeito à População Negra; 5. Melhorar a condição de" negros oprimidos" em África, na América, o Império Britânico e em outras partes do mundo.

Após criar a Associação Pan-africana, em julho de 1900, Silvester Wilians obteve apoio de Buker T. Washington e Web Du Bois dos EUA, Bishop James Johnson da Nigéria, James Holly do Haiti para organizar em Londres, onde vivia como imigrante, uma Conferencia Pan-africana. A Conferência tratou temas como direitos iguais nos EUA e nas colônias britânicas, a exploração de empresas no continente africano e a opressão e escravidão na África do Sul.Foram debatidos na conferência a filosofia darwinista, os movimentos eugênicos impregnados de racismo, e o lugar do continente africano como origem das civilizações, nascedouro de cientistas, artistas e escritores.

Nesta Conferencia Henry Silvester Wilians trabalhou como secretário geral e WEB Du Bois o redator, a conferência reuniu representantes dos Estados Unidos, Canadá, Jamaica, Antigua, Trinidad Tobago, St. Lucia, Cuba, Haiti, Dominicana, Libéria, Costa do Ouro, Serra Leoa, Costa do Marfim, Etiópia e Guiné Bissau. Durante o evento a conferência Silvester Willians elaborou o projetodo jornal Pan Áfrican, que no ano seguinte entrou em circulação. Este encontro é considerado como referência na articulação do Pan-africanismo enquanto pensamento político intelectual e como base para os Congressos Pan-africanos.

Os congressos Pan-africanos possibilitaram diálogos e trocas de experiências entre povos africanos em todo o mundo. O primeiro Congresso Pan-africano foi organizado por WEB Du Bois em Paris no ano de 1919, compareceram 57 representantes de colônias nos Estados Unidos e do Caribe, uma das questões mais debatidas foi à autodeterminação e

direitos internacionais dos povos africanos e da diáspora. O apoio político do parlamentar senegalês Blaise Diagne foi fundamental para a realização do evento, uma vez que havia ameaças da própria França e de outras metrópoles à produção de atividades anticoloniais dentro do continente. O Congresso contou com 57 congressistas de Colônias francesas, americana e inglesa, além de representações da América Central. Ao final do Congresso foi elaborado um documento oficial pela Liga africana sobre a exploração colonial no continente africano .

O Segundo Congresso Pan-africano foi realizado em três seções, Londres, Paris e Bruxelas durante o ano de 1921. O encontro foi organizado por WEB Du Bois, estiveram presentes 113 delegados oriundos de territórios africanos e da diáspora para discutir sobre o progresso político e social das comunidades afrodescendentes na diáspora. Um dos destaques de resultados desse congresso foi à confecção da Declaração ao Mundo em nome de justiça e igualdade entre povos pretose brancos, o documento foi elaborado por WEB Du Bois.

O Terceiro Congresso Pan-africano dividiu-se em duas seções no ano de 1923, em Londres e em Lisboa. Os temas variaram entre a necessidade de definição objetiva sobre cooperação entre africanos dentro e fora do continente, e a situação dos territórios coloniais portugueses, por isso a participação de angolanos e moçambicanos representados por Luanda (Angola) e Lourenço Marques (atual Maputo- Moçambique) foi de suma importância.Neste congresso foi defendida a necessidade de reformas nos sistemas de trabalho das colônias portuguesas. A população cabo-verdiana, por exemplo, viveu nas décadas de 1930 e 1940 períodos de repressão política e administrativa que geraram a escassez de alimentos, e consequentemente, a morte de milhares de pessoas. As reinvidicações do documento foram ignoradas pelo governo português.

O quarto Congresso Pan-africano ocorreuem 1927 na cidade de Nova York (EUA), no evento o número de delegados chegou a 208 e os posicionamentos concentraram-se na necessidade de abertura de diálogo entre os governos coloniais e suas possessões em África.o grupo de mulheres afro-americanas Circulo de Paz e Relações Exteriores participou ativamente deste congresso .

Para um jovem militante pan-africano do Gana chamado Kwame N'krumah (1977), um dos desdobramentos mais importantes do Quarto Congresso Pan-africano foi a criação em 1937 do International Áfrican Service Bureau, um organismo com a finalidade de promover o

bem estar continente africano e na diáspora, através da cooperação entre todos os povos do mundo. Todavia, durante a década de 1930 não ocorreram congressos pan-africanos, principalmente por causa do conflito imperialista terminado em 1945.

Entre 1932 e 1940 publicações críticas ao colonialismo como a revista Legitima Defesa e o Jornal Estudante Negro, produzidas por intelectuais da América central e do Senegal radicados em Paris. O termo “negritude” comeca e se popularizar e recebe uma ampla divulgacão ideologica a partir do poema do martinicanoAimée Cesárie em 1939. A partir de então,ativistas destacaram-se produzindo o movimento literário, acadêmico, cultural da negritude, que reuniu uma gama de intelectuais comoo próprio Aimé Césaire, o guianense Leon Damas,e o senegalês Leopold Sedar Senghor.

O historiador Boubacar Barry (2004) comenta que sob a orientação de leopold Senghor a Negritude assumiu um triângulo ideológico e hierárquico misturando os valores da civilização francesa, o socialismo e valores tradicionais africanos. Mesmo sem um posicionamento político anti-colonial firme, o movimento da Negritude colaborou para solidariedade e identidade, explorando a arte e a cultura, onde a integração da coletividade “negro-africana” tornou-se um ato político.

Os conflitos imperialistas do final da década de 1930 atingiram a juventude africana em mais de 200.000 pessoas recrutadas como soldados. O contacto mais próximo com sociedades europeias, a exclusão social e racismo direcionados aos combatentes que sobreviveram ao conflito fizeram com que africanos percebessem de forma objetiva o sistema internacional de exploração do continente africano como um todo. O historiador F. Canale (2010, pág. 192) observa a que esta experiência de deslocamento para a Europa levou vários combatentes africanos a alinharem-se aos movimentos nacionalistas de libertação colonial.

A partir de 1945 consolidaram-se movimentos de resistência social e plataformas políticas voltadas à independência nacional no continente africano. Contudo, foram necessárias novas estratégias para o enfrentamento da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e de Israel, apoiadores do colonialismo português e aliado do regime da apartheid sul-africana.

O Quinto Congresso Pan-africano foi realizado no mês de março de 1945 em Manchester(Inglaterra). O Congresso contou com a presença de 200 participantes, as sessões

foram coordenadas por lideranças africanas nascentes e com certa experiência de militância anticolonial, comoKwame Nkrumah, George Padmore, R.T. Makonem e Peter Abrahamns. No encontro foi objeto de denúncia às fronteiras artificiais e arbitrárias do colonialismo, a exploração econômica desenfreada e o controle de terras cultiváveis por colonos europeus na África, nesta oportunidade os participantes foram delimitadas ações objetivas de boicote nas colônias através de greves.

Os delegados presentes no Quinto Congresso apresentaram propostas ligadas a nutrição, educação, direito legal de associações, sindicatos e petições voltadas à libertação colonial. Para a visibilidade destas propostas foi criado um comitê, o West Áfrican National Secretariat cujo responsável era Kwame N’krumah,delegado da Costa do Ouro (atual Gana). Na perspectiva de N’krumah, neste Quinto Congressoo Pan-africanismo e o nacionalismo africano “receberam uma expressão verdadeiramente concreta”,principalmente por causa das participações de operários, sindicalistas, agricultores e estudantes em sua maior parte do continente africano. Muitos jovens africanos engajados em movimentos nacionalistas de Angola, Moçambique, Alto Volta (atual Burkina Faso), Costa do ouro (atual Gana), Nigéria, Congo e Senegal tornaram práticas as deliberações teóricas resultantes dos congressos pan- africanos.Uma das declarações oficiais após o congresso formalizava que:

O quinto congresso pan-africano conclama os intelectuais e trabalhadores das colônias a tomarem consciência das suas responsabilidades. A longa noite terminou. Lutando pelos direitos sindicais, pelo direto de formar cooperativas, pela liberdade da imprensa, de reunião, de manifestação e de greve, de imprimir e divulgar literatura necessária à instrução das massas estará a utilizar os únicos meios que vos permitiram conquistar preservas as vossas liberdades. Atualmente só há uma maneira de atuar fixamente : a organização das massas”.-declaration to the colonial peoples of the world. (NKRUMAH, 1977, pág. 158)

A década de 1930 foi um período de forte influência comunista entre os articuladores do Pan-africanismo, principalmente na esfera dos intelectuais congressistas. Não havia homogeneidade entre os movimentos, pensadores e lideranças pan-africanas, a convergência entre diferentes tendências dos movimentos assentava-se sobre a necessidade de descolonização, integração regional e combate ao racismo, elementos centrais do Congresso de Manchester.

No congresso de Manchester que os ideais comunistas foram muito valorizados como linha de ação dos movimentos, mas a busca de um caminho ideológico e filosófico baseado nas experiências, ou valores, africanos criou certa tensão entre os participantes. Esta questão

continuaria a ser uma problemática dentro do Pan-africanismo, mesmo uma contradição carregada entre movimentos de diferentes frentes de luta. No entanto, mesmo com uma formação marxista, na prática económica, politica, teórica e militar das lutas de libertação lideranças nacionalistas conseguiram transcender a formatação política europeia, em alguns casos sem perceber, para conceber uma via africana de desenvolvimento, o endógeno.

Conclusões

Concluímos que a resistência africana contra o regime escravista entre os séculos XVI e XIX, através de movimentos quilombolas, a revolução haitiana e os movimentos abolicionistas formaram, um conjunto fundamental de práticas de resistência e solidariedade. Neste sentido, pensadores, militantes e ativistas políticos do final do século XIX como Antenor Firmin e Edward Wilmot Blyden conseguiram construir uma sistematização teórica das principais frentes de luta dos povos africanos contra o colonialismo, a opressão econômica e o racismo. Para ambos, a educação e o ensino de história deveriam ser revistos e transformados em ferramentas de conscientização histórica e política.

A importância fundamental da história e da educação foi retomada na segunda fase do desenvolvimento histórico e social do Pan-africanismo (1900-1945) por WEB Du Bois e Marcus Garvey. Os trabalhos políticos destes dois militantes em jornais, palestras e movimentos sociais tiveram na história sua base para mobilização e conscientização de pessoas. Os congressos pan-africanos ocorridos nesta fase do Pan-africanismo não seriam realizados sem um mínimo de conscientização sobre a história e identidade em comum a todos os povos africanos do continente e da diáspora, o apoio incondicional da diáspora a libertação etíope marca este processo.

Nosso próximo passo é avançar sobre as lutas de libertação colonial no continente africano como uma terceira fase do auto-desenvolvimento do Pan-africanismo. Outro aspecto importante é entender qual o lugar que a história da África assume dentro dos posicionamentos de movimentos e partidos políticos africanos anti-coloniais.

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